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domingo, 26 de dezembro de 2021


Gouveia e Melo: Mais Um Daqueles?


"A palavra que reténs nos teus lábios é tua escrava;  a que dizes fora de propósito é tua senhora".

Ninguém conclua, das linhas que se seguem, que não estou, como qualquer português deve estar, grato ao, a partir de amanhã, ex-Vice-Almirante que, recentemente, desempenhou funções como coordenador da assim designada task force da vacinação anti-COVID. Claro que estou!

Tal não me obriga, porém, a deixar-me ofuscar pelo brilho do sucesso da reconhecidamente válida ação por ele desenvolvida enquanto executante do enunciado atual - que não encontro, se é que existe... - do Plano Nacional de Vacinação*) iniciado em 1965 com a aceitação, pelo Estado Português, de um donativo da Fundação Calouste Gulbenkian destinado à vacinação contra a poliomielite*), difteria*), tétano*) e tosse convulsa*) (Decreto-Lei n.º 46533, de 09 de Setembro de 1965)*), continuado  com a implementação do velhinho mas, então, indispensável Boletim Individual de Saúde (Decreto-Lei n.º 46621, de 27 de Outubro de 1965)*) (Decreto-Lei n.º 46628, de 11 de Novembro de 1965)*) e assim sucessivamente.

Não me ofusca, pelo menos, a ponto de evitar que fique perplexo, desagradado e apreensivo com o que leio nas entrelinhas das recentes respostas do amanhã promovido a Almirante, como "o futuro a Deus pertence", "não se deve dizer 'dessa água não beberei'" ou "até lá muita coisa pode acontecer", produzidas quando interpelado acerca de uma eventual candidatura futura à presidência da República.

A ter, de facto, sido proferido este chorrilho de lugares-comuns*), há que questionar, antes de mais, a capacidade para o desempenho de tão altas funções por parte de um cidadão que, ainda há poucos meses atrás - e, porventura, antes de o terem aconselhado a ter tento na língua - sobre o mesmo assunto dizia coisas de sentido contrário, tão claras e sem margem para dúvidas como "Não sou político", ou "vou tirar esta farda, mas é para vestir outra. Eu sou militar, não tenho jeito para político. Fecho essa porta*).

Tudo isto é muito estranho. Principalmente, tratando-se de um militar, de uma pessoa que pertence à elite de uma estrutura conhecida pela solidez da palavra dada. Enfim...

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Mas há mais.

Enquanto desempenhou as referidas funções, o Senhor Almirante notabilizou-se como executante privilegiado, como mero coordenador de esforços e de boas-vontades. Não como gestor; muito menos, como um velho sábio a exercer uma magistratura de influência presidencial. Nem me parece, dada a sua notória apetência pela ação, talhado para tal.

Como explicar, então, que alguém que se assume como não político, que desempenhou funções que em nada se assemelham àquelas que de um presidente da República será de esperar, abra agora uma porta, pelo próprio há pouco inequivocamente fechada para sempre, para, mais ano, menos ano, vir a candidatar-se ao lugar?

Já se sabe que, pelo menos até agora, ninguém, num dos partidos políticos do costume, se tem vindo a perfilar como candidato às mais altas funções do Estado. Já se sabe, também, que não se vislumbra quem poderá ter carisma suficiente para, sem fazer muito triste figura, as desempenhar na sombra do atual Presidente da República, o qual dificilmente alguém, num futuro mais ou menos próximo, poderá, no plano mediático, sequer sonhar em igualar. O que suscita, inevitavelmente, a pergunta: qual dos partidos estará a piscar o olho ao Almirante? Quem o estará a empurrar?

Além do mais, começa, como vimos, a dar a ideia de que o talvez putativo Candidato tem uma imagem bastante difusa de si próprio, o que não convém ao mais alto magistrado da nação: disse, em tempos de que já não parece lembrar-se, não ser um político, mas a recente inversão de marcha nos seus projetos futuros acaba de demonstrar que, embora inábil, afinal, o é.

No entanto, diz quem é sensato que a imortalidade, quando já está garantida, mais vale defender do que desbaratar. Por isso, a sério, alguém lhe diga que, mesmo quando movidos pelas melhores intenções, se não somos ou não nos sentimos competentes - ou alguma coisa nos diz que, mais ou menos suavemente, estão a passar-nos a mão pelo pelo -, bem melhor faremos, no interesse daqueles que, supostamente, iríamos servir, em em não insistir em avançar; em não nos tornarmos... mais um daqueles.

Honesta fama est alterum patrimonium

terça-feira, 23 de novembro de 2021


PAN: O Partido do Frei Tomás

Aquilo sempre me fez uma certa confusão, um assim designado Porta-voz - que secretário-geral e presidente já não se usa - de porte atlético, alto e espadaúdo, num partido ecologista em que o dito Porta-voz, em campanha eleitoral, se exibe sentado num comboio a deliciar-se com uma mísera saladinha. Se ali não havia à mistura umas viandas menos convencionais compradas em nome dos vizinhos para compensar as contas das alfaces e do tofu...

Enfim, o Porta-voz vai-se, e uma Porta-voz*) vem, com uma carinha laroca e um corpinho de fazer inveja a qualquer deputado do PEV - que, honra lhe seja feita, nos mostra deputados a condizer com a dieta que outros dizem ter adotado.

As dúvidas quanto à bondade dos propósitos não melhoram, compreensivelmente, a tal nova Porta-voz - 'vegana, feminista e workaholic'*) e de ar tão positivo e proativo, como agora se diz, nas múltiplas declarações que profere - parece ter andado envolvida em negócios um bocadinho enviesados, digamos, relativamente àquilo que o Partido diz defender. A fazer fé no que dizem os meios de comunicação, claro está...

Ah, e corre, também, por aí uma história acerca de uma acumulação indevida de funções no setor privado e no Estado*), que deve ser absolutamente falsa, ou não teria sido tão enfaticamente negada, tal como falsa também deve ser uma estupidez qualquer que para aí inventaram acerca de não ter declarado ao Tribunal Constitucional uma imobiliária em nome do marido*), empresa que faria parte dos bens comuns do casal.

Já se sabe que tudo isto são coisas da campanha eleitoral, sem qualquer correspondência com a realidade - ou, pelo menos, muito mal interpretado -, que não é, apenas, a ponta do iceberg, e que, na política, os adversários são todos "Feios, Porcos e Maus".

Convenhamos, no entanto, que já são maldades a mais, não vos parece?

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A ser verdade - não deve ser... -, será que esta gente que se mete na política nunca ouviu falar de computadores, de bases de dados e dessas coisas todas que, cada vez mais, tornam impossível esconder o que quer que seja da comunicação social? Acaso pensam que basta um sorriso de plástico e meia dúzia de palavras fortes e monocórdicas para fazer esquecer o mais ou menos discutível passado que, por uma razão ou por outra, a maioria de nós acaba por ter?

Episódios semelhantes deveriam inibir tanto alguém que os viveu de ir para a política, como alguém que ouve mal de dirigir uma orquestra. Mas não: ao que parece, continuam a ter o desplante de, politicamente, se promover, supostamente na defesa de causas absolutamente incompatíveis com os seus anteriores - e, quem sabe, atuais...- comportamentos.

Em véspera de eleições, claro que o PAN sempre diria que "mantemos total confiança" na dita Porta-voz. O contrário, seria mergulhar no mesmo charco em que os partidos da direita andam, desesperadamente, a esbracejar para se manterem à tona do, cada vez menos molhado, oceano de votos.

Pobres animaizinhos portugueses, que, se aquilo implode, ainda acabam por ter de se contentar com o esforço abnegado de algumas mais interventivas associações particulares e organizações não governamentais!

Muito fala Frei Tomás: faz como ele diz, mas não faças como ele faz

sábado, 6 de novembro de 2021


Desventurosa Retratação!

 

Mesmo tendo a retratação pública sido imposta, não bastaria dizer que,
afinal, a família injuriada não era composta por bandidos,
impondo-se que o Presidente do Chega! perentória e expressamente reconhecesse o erro moral,
a censurabilidade social da conduta e do pensamento e da ideologia a ela subjacentes


A inevitável subjetividade inerente ao modo como a retratação pública é realizada apenas é comparável à subjetividade da avaliação da eficácia da mesma por aqueles a quem ela compete, designadamente no que se refere à proteção do bem jurídico da honra do ofendido, sem esquecer o valor que a ampla divulgação da execução da sentença deverá representar para a prevenção da proliferação de condutas do mesmo tipo.

Maior ou Menor Carga Subjetiva
A despeito da maior ou menor carga subjetiva que comporte, o cumprimento de qualquer obrigação deve ser pautado pelo princípio da idoneidade, da adequação ao bem jurídico e social prosseguido, não sendo, pois, admissíveis, quer a retratação equívoca ou incompleta, quer a que se revista de falsidade ou hipocrisia.

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Para que seja plenamente eficaz, bastará a uma retratação equívoca ou incompleta ser clarificada ou complementada com os elementos indispensáveis à perfeita compreensão, não apenas do sentido, mas também da sinceridade da intenção.

Já uma retratação falsa, hipócrita, expressamente manifestada como mero cumprimento da obrigação imposta e acompanhada do esclarecimento de que se está a proferir palavras meramente formais, sem qualquer substância - naquilo que, numa visão desfocada e distorcida do direito e do conceito de reparação, o ofensor considera o estrito mas eficaz cumprimento da sentença condenatória - não resulta, de facto, no menor desagravo da ofensa feita ao merecimento social do ofendido, tampouco em nada desculpando as injúrias proferidas, antes as agravando na medida em que afasta qualquer resquício de dúvida que, quanto à firmeza da intenção de ofender, pudesse ainda persistir nos mais benevolentes espíritos.

Constitui, além do mais, intolerável ofensa aos tribunais e aos demais agentes judiciários intervenientes no processo, escarnecendo, não apenas das doutas decisões proferidas, mas também do frágil significado e do débil conteúdo intrínseco aparentemente subjacentes à execução deste tipo de penas e, por via deles, ao muito relativo impacto social da própria condenação.

No topo da desfaçatez estará, necessariamente, uma eventual e acintosa menção ao facto de que as ocas palavras de retratação apenas terão sido proferidas ou escritas a fim de evitar a ruína económica do condenado, decorrente da hemorragia de multas que diariamente seriam devidas por força do aresto condenatório, sanção pecuniária que apenas poderia considerar-se objetivamente cumprida uma vez material e liquidadas aquelas.

Se é verdade que, ao concluir pelo carácter equívoco de uma retratação, estaremos mais próximos de uma ponderação subjetiva da proporcionalidade, a retratação falsa ou hipócrita é facilmente identificável e objetiva, na medida em corresponde à inversão do sentido, da própria razão de ser da decisão, uma vez que o condenado, não só a não cumpre de forma efetiva, como  acaba por fazer exatamente o contrário daquilo que, espontaneamente, deveria ter feito ou lhe fora determinado.

Não há, por outro lado, como considerar que, quer a falsidade, quer a hipocrisia, não excluem a presença da componente fundamental de qualquer retratação: o arrependimento. Se é verdade que a mera reparação material e objetiva - mediante a execução de penas de prisão ou de multa, por exemplo – o dispensa, o mesmo não se aplica à retratação, da qual ele deverá, afinal, constituir a própria essência.

Dar por Encerrado o Processo
O mesmo é dizer que a retratação inexiste sem claro e manifesto arrependimento, o que é incompatível com uma eventual declaração, no momento em que é proferida ou escrita ou em data próxima posterior, de que os pressupostos da injúria se mantêm intactos, apenas se retratando o ofensor a fim de, para si, evitar males maiores.

Jamais se poderá, num tal caso, dar por encerrado o processo ou considerar extinta a punibilidade do crime, antes se tornando evidente ao menos juridicamente instruído dos homens médios que uma sentença executada num tal contexto continuará por cumprir, com todas as legais consequências, entre as quais a acumulação da multa diária alternativa eventualmente imposta.

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Por “ofensas ao direito à honra e ao direito à imagem” nas pessoas de membros de uma família residente no Seixal*), foi o presidente do partido Chega! sentenciado, em Maio de 2021, a delas se retratar publicamente, tal como o Partido*).

Porém, à semelhança do que recentemente aconteceu com uma retratação pública imposta ao Presidente da República Federativa do Brasil*), o alegado cumprimento da sentença consistiu em pouco mais do que uma firme declaração de manutenção dos pressupostos das ofensas pelas quais fora condenado.

Não pode, é verdade, legitimamente esperar-se que, acontecendo a retratação na sequência da prolação de sentença judicial, alguma vez possa ela corresponder a um impulso genuíno e espontâneo do ofensor. Mas não pode ela também, mesmo nessas circunstâncias, ser despudoradamente desvalorizada e ridicularizada, sobretudo na imediata sequência do próprio ato em que se materializa a suposta execução do decidido pelo tribunal*).

De facto, e embora possa não ser, neste caso, de afastar completamente a presença de hipocrisia, encontramo-nos, sobretudo, perante uma retratação confessadamente vazia, falsa, como não pode deixar de se extrair de um texto em que é dito que, com ela, apenas pretende o Réu, por receio de um inevitável impacto económico negativo, dar cumprimento formal ao que foi exigido, mantendo-se, não obstante, a essência das ofensivas declarações.

Especificando, mesmo tendo a retratação pública sido imposta, não bastaria dizer que, afinal, a família injuriada não era composta por bandidos, impondo-se que o Presidente do Chega! perentória e expressamente reconhecesse o erro moral, a censurabilidade social da conduta e do pensamento e da ideologia a ela subjacentes.

A situação parece, assim, corresponder a um cumprimento aberrante e, até, pernicioso da medida imposta*), atendendo a que, a não ser a retratação dada como inexistente e sancionado o Réu por desrespeito, se estará, provavelmente, a criar condições muito favoráveis à futura invocação do episódio como precedente, arriscando-se a completa desvalorização da figura da retratação pública, que passará a ser contemplada como mera retórica ineficaz, que, afinal, nada reverte e nada resolve, ganhando as futuras decisões que a outros a imponham o estatuto de atos meramente decorativos.

Será, em conclusão, de esperar que o Tribunal declare inexistente o cumprimento da obrigação pelo Presidente do Chega! e mande contabilizar as multas diárias vencidas e vincendas até que aconteça uma efetiva retratação.

Não podemos, além do mais, deixar de, com toda a legitimidade, nos questionar da validade do discurso de alguém que, sem aparentes constrangimento ou pudor, afirme que falou por falar, inexistindo qualquer correspondência, entre as palavras que proferiu e aquilo que, efetivamente, entende.

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Não está aqui em causa qualquer característica intrínseca da pessoa ou da organização condenadas, já que apenas a Deus é dado avaliar objetivamente as pessoas por aquilo que são, cabendo aos tribunais julgá-las, unicamente, por aquilo que fazem. Também, já que nem queixa houve, tampouco será legítimo afirmar que um crime foi cometido, como por essa blogosfera há quem sustente..

No entanto, e independentemente do que venha a acontecer à decisão – ainda não transitada em julgado -, bem poderá a Justiça considerar-se ofendida pela forma como àquela foi, alegadamente, dado cumprimento, forma que em nada dignifica, quer os ofendidos, quer a sociedade, de um modo geral.

Não podem, pois, aqueles a quem compete fiscalizar a execução das sentenças ficar indiferentes a estes factos, já que, como alguém disse, “o padrão de uma sociedade civilizada é a qualidade da sua justiça”.

Ou não?

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sábado, 23 de outubro de 2021


PAN - A Outra Exploração Infantil

 
Apenas nos fez, uma vez mais, sentir que a designação mais apropriada
seria Partido dos Animais e da Natureza, já que pouco fala das pessoas e das causas delas,
nem se coibindo, para se manter por mais uns tempos na espuma dos votos,
de explorar a imagem das crianças e dos jovens que diz defender


Partido dos Animais e da Natureza
Quando era miúdo, aconteceu levarem-me às touradas, espetáculo que nunca apreciei nem consegui compreender: arte, no sentido de manifestação do espírito, não lhe encontro; e, quanto a manifestações da mente, parece-me ficarem bastante aquém até das que poderão, apesar de tudo, estar presentes num desafio de futebol.

Tampouco alguma vez conseguir entender a razão pela qual, com total indiferença pelo sofrimento infligido, na lide a cavalo um mamífero (Homem) utiliza um também mamífero (cavalo) para torturar um outro mamífero (touro); ou por que, na lide a pé, o primeiro mamífero, supostamente dotado de mente e espírito muito além dos dotes do último, experimenta alguma satisfação pelo facto de sair supostamente vitorioso de um artificiosamente provocado combate entre a força mental de um e a força bruta de outro.

Sempre me ensinaram que um combate, para o ser realmente e para, sendo-o, ser também valoroso e leal, haverão de estar equilibradas as forças em presença, o que, evidentemente, não acontece quando se confrontam, de um lado, uns oitenta quilos e do outro uns seiscentos; quanto, de um lado, ter-se-á, vá lá, uns cem e do outro lado escassos vinte, no que se refere a quociente intelectual.

Será a espécie humana tão pouco segura de si que necessite de martirizar uma bem mais volumosa besta para conseguir demonstrar a mais do que conhecida supremacia intelectual? Ou será tão pouco valorosa que, tendo abdicado do combate corpo a corpo entre iguais em prol da venda de armas de destruição maciça e à distância, apenas lhe resta coragem para, com grande aparato, fingir que trava um combate que tem, afinal, como substância, coisa nenhuma, que apenas existe para inglês ver?*)

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Às coisas ditas e feitas para inglês ver nos vem a política, desde tempos imemoriais, habituando, a ponto de, graças à prática demagógica quotidiana da generalidade dos lusitanos partidos, instintivamente havermos substituído, nos nossos espíritos, a suposta nobreza da política e da missão governativa pela quase certeza da mesquinhez, da jogada vil, do golpe de rins, da mais chã, vazia, inevitável e corrupta hipocrisia.

Partido Comunista Português (PCP)
Há, todavia, quem entenda que estes atributos definem o modus operandi *) unicamente dos maiores partidos, ficando imunes a estas maleitas aqueles que, por incipiência ou entropia, mais pequenos são, já que se persistem em manter-se ativos, estarão, pensa-se, animados das melhores intenções.

Como exemplo da segunda situação*), a da entropia, já aqui se trouxe o caso do Partido Comunista Português (PCP)*) que, manifestamente, hoje para pouco mais serve do que para garantir algum protagonismo às suas eternas glórias, defendendo o indefensável e obstaculizando a formação de um novo e verdadeiro partido dos trabalhadores, que zele eficazmente pelos seus interesses e os desencoraje de, a velocidade crescente, migrar para o extremo oposto do espectro político.

Já quanto à primeira situação, a dos partidos incipientes, acaba o Pessoas, Animais e Natureza (PAN)*) de, com todo aquele  patético folclore em torno da enorme vitória*) conseguida com a imposição de limitações à assistência de menores às touradas, fornecer a prova acabada do que acabo de dizer.

Deixo aos especialistas a discussão científica sobre a influência perversa que a assistência ao abestalhado espetáculo possa exercer sobre a formação da personalidade e do carácter das crianças. Sobre este assunto, direi, apenas, que não tenho memória de alguma vez ter lido ou ouvido notícia de evidência científica quanto a um caso que fosse de um inveterado criminoso cuja propensão para o delito se haja formado por haver, na infância, frequentado as praças de touros*).

Não entrarei, também, na discussão primária e de conclusão impossível sobre se será mais traumatizante ver picar um touro – não digo toiro, com i, porque dizem que esta forma é mais poética e, poesia, a tourada tem nenhuma… - ou as continuadas agressões ao adversário num relvado de futebol, ou qualquer catástrofe ou atrocidade que, à hora de jantar, um menor de dezasseis ou, até, de doze ou de seis anos não tem como evitar ver na televisão dos progenitores.

Tudo isso é subjetivo, depende da propensão e das idiossincrasias de cada um, e, a despeito das incomensuráveis fortunas despendidas a tentar provar o impossível, jamais qualquer ciência nomotética*) logrará enunciar, para além da dúvida razoável, uma regra universal.

Muito menos me questionarei quanto à forma como o PAN não deixará, por certo e para ser coerente, de exigir do Partido Socialista (PS)*) que proíba, sem demora, que menores de dezasseis anos assistam, na terra dos pais e dos avós, à matança do porco*) e ao espetáculo de puro horror que a subsequente abertura e limpeza do cadáver constitui. Que assistam e, por maioria de razão, que participem.

Toiros
Não será, também, de esquecer, naturalmente, a Festa Brava*), durante a qual também se pica touros – embora não esteja bem a ver o que poderá aí fazer-se para controlar os acessos dos nossos juvenis.

- x -

O que venho aqui salientar é a inanidade, a inutilidade, o impacto absolutamente ridículo da proibição que o PAN conseguiu, a troco de um punhado de votos, forçar o PS a impor àquela que todos sabemos ser a incontável quantidade de jovens entre os doze e os dezasseis anos que gosta de ir, sozinha, ver a corrida sem estar acompanhada por um adulto.

Incontável, porque o que não existe não se pode contar.

A verdade é que a oca e pírrica vitória agora conseguida pelo PAN apenas afeta a meia dúzia de jovens, se tanto, que por lá passava sem ter, a acompanhá-las, um adulto, que nem um dos pais tem de ser!*)

O número 6 do art.8º do Decreto-Lei nº 23/2014, de 14 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 90/2019, de 5 de julho, é taxativo: “O promotor do espetáculo de natureza artística ou de divertimento público deve negar a entrada de menores quando existam dúvidas sobre a idade face à classificação etária atribuída, avaliada pelos critérios comuns de aparência, salvo quando acompanhados dos pais ou de um adulto, devidamente identificado, que se responsabilize”.

Simplificando: qualquer criança, desde que tenha mais do que os três anos de idade mínima previstos na mesma lei, pode assistir a qualquer espetáculo, desde que acompanhada por um qualquer adulto que por ela se responsabilize.

Note-se que, isto, nem o vitorioso PAN desmentiu…

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O que conseguiu, então, o PAN?

Nada. Absolutamente nada com que valha a pena desperdiçar um minuto sequer.

Apenas nos fez, uma vez mais, sentir que a designação mais apropriada seria Partido dos Animais e da Natureza, e não Pessoas, Animais e Natureza, já que pouco fala das pessoas e das causas delas, nem se coibindo, para se manter por mais uns tempos na espuma dos votos, de explorar a imagem das crianças e dos jovens que diz defender.

O que perdem as crianças com isso? Nada, claro. A não ser pela falta, com o que não existe, é difícil perder.

Por outro lado, com todo este teatro barato, com toda esta estapafúrdia demonstração de prosápia ignorante, o que ganham os desinteressantes zelotas do PAN?

Talvez uma inscrição no clube dos satélites de um Partido Comunista Português mais do que desiludido com o inerte desempenho do Partido Ecologista ‘Os Verdes’ (PEV)*), que já só dois ou três votos lhe garante e do qual nem se ouve falar.

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Eis, pois, o perfeito exemplo de uma vitória meramente formal, que garantiu a um partido minúsculo umas linhas na imprensa escrita e uns escassos minutos de televisão, mas sem qualquer efeito prático, sem substância, destinada apenas a promover, a qualquer preço, a imagem de um partido moribundo, de mais um fanático da suposta proteção animal, em que o termo Pessoas na marca parece meramente instrumental, marginal.

A menos que as crianças e os jovens não sejam consideradas pessoas, e possam impunemente servir de mote à promoção dos os outros dois bem legítimos e importantes ideais.


sábado, 9 de outubro de 2021


Matusalém - A Relíquia Comunista Portuguesa

 "Não há no resultado em Lisboa qualquer mérito para o Partido Comunista
ou para o seu eterno Candidato, nem tal prenuncia qualquer surpresa agradável
para uma eleição posterior: simplesmente, aconteceu
"

Não se entende como há, no Partido Comunista Português,tantos ateus que, ao mesmo tempo,
dizem ser tão crentes 
e fiéis seguidores de tamanhos dislates

Não é livre nem defensável um estado de onde as pessoas não podem sair
para outro que seja povoado por quem livremente escolheu lá ficar


  
Plano do Ensaio

   1. Capitalismo e Socialismo
   2. Comunismo
   3. Engodo
   4. Delírio
   5. O Enigma Português
   6. O Partido de Hoje
   7. O Futuro sem Partido

1. Capitalismo e Socialismo

Já se sabe que uma boa parte dos portugueses anda para aí insolvente, falida, endividada até mais não poder ser. Alguns, devido a percalços familiares ou sanitários que não há como antever ou evitar, mas, porventura, a maior parte porque gastou mais do que podia e devia, pressionada por uma premente necessidade de embasbacar a vizinhança com a viagem à inevitável República Dominicana, ou com o carrito novinho em folha “mais potente e maior que o teu, que até já tem uma matrícula do mês passado”.

Dá, até, ideia de que estes lusitanos que tão bem cuidam da própria imagem não são minimamente inteligentes ou detentores de uma instrução básica, requisitos mais do que suficientes para se saber muitíssimo bem que, primeiro, se cria riqueza e, só depois, se distribui o que se amealhou; que primeiro se ganha e só depois se gasta, sob pena de, talvez por uma vida inteira, ficarmos reféns do crédito e, connosco, quem connosco vive e quem em nós confiou.

Isto, qualquer pessoa minimamente formada e com dois dedos de testa é capaz de entender; e nisto se baseiam, dito de forma muito simples, os sistemas capitalistas que, privilegiando a racionalidade na governação, se opõem aos regimes socialistas que pretendem, a qualquer preço, distribuir pelos trabalhadores a riqueza antes de a ter. Falo, naturalmente, dos regimes socialistas puros, e não daquela alaranjada coisa portuguesa que, além do punho fechado e da desafinada cantilena “Portuguesas e Portugueses”, de socialista só o nome ainda tem.

Esquerda Mais à Esquerda
Por isso mesmo, nunca chegam os estados governados por estes regimes da esquerda mais à esquerda a acumular o pecúlio mínimo necessário à viável, prudente e relativamente segura gestão económica das populações, já que, tal como os portugueses que compram com o dinheiro dos outros mais tarde ficam a saber, rapidamente tais regimes se afogam em dívida soberana que nunca irão pagar, diariamente engordada por juros que não param de se acumular, assim absorvendo qualquer valor acrescentado que pudesse, um dia, contribuir para a prometida, desejável e saudável riqueza popular.

- x -

Como também toda a gente sabe, o grande problema do capitalismo está em, sabendo ele – e se sabe! - criar riqueza, muitas vezes se esquecer de, ainda que por via dos salários ou dos impostos, parte dela distribuir por aqueles graças a cujo esforço é amealhado aquilo que o bem sucedido capitalista acumulou.

Alguns, não distribuem porque se esquecem, ou porque nem tal coisa lhes passa pela cabeça. Outros, porque a instrução primária e a educação em casa não foram grande coisa, e na escola do capitalismo não se ensina a distribuir. Em qualquer caso, torna-se, por causa desse recorrente lapso, essencial que quem trabalha se organize em partidos políticos ou em grupos de pressão contra o tendencial domínio de um capitalismo cada vez mais predador.

Como escreveu um conhecido e polémico sacerdote português do séc.XVII, "entre todas as injustiças, nenhumas clamam tanto ao Céu, como as que tiram a liberdade aos que nasceram livres, e as que não pagam o suor aos que trabalham"*)

Sucede, porém, que, tal como há capitalismo bom e capitalismo pior do que mau, também há socialismo bom e socialismo pior do que mau. Quanto a isto, não tenhamos ilusões.

O capitalismo bom e o socialismo bom são, afinal, uma e a mesma coisa, tal como tudo o que é verdadeiramente bom, aquilo que habita em qualquer de nós que seja sensível ao estado de necessidade em que vive a maior parte da população mundial e se disponibilize, pobre ou rico, a partilhar aquilo que tem.

Não se trata, aqui, de sistemas de organização social, mas daquela bondade, pura e simples, que, se fosse universal, dispensaria a existência de capitalismos e de socialismos, de esquerdas e de direitas, de fações e dessas coisas todas com que diariamente os meios de comunicação social, para vender publicidade, nos enchem os há muito saturados ouvidos nas rebuscadas mas vazias palavras de politólogos e de outros sabichões, muitas vezes contratados apenas para preencher tempo de antena nas televisões.

A verdade é que, se não fosse o facto sem remédio de cada um se preocupar apenas com o seu umbigo, bastaria uma organização elementar e consensual do Estado para que todos vivessem com a comodidade e o conforto necessários ao desempenho voluntário e empenhado de tarefas socialmente relevantes, bem como ao lazer e à produção lúdica e artística, essenciais àquela pausa que a cada vez mais martirizada mente sempre requer.

Utopia do Partido
Não passando isto de utopia, resta a eterna querela entre o capitalismo*) mau e o socialismo*) mau, o segundo exigindo do primeiro aquilo que este não quer distribuir; e cuja posse, muitas vezes, nem detém, seja porque o capitalista individual não tem como aumentar regalias e salários, seja porque o capitalista Estado que não tem como… fazer o mesmo, um e outro, simplesmente porque ainda não amealharam o suficiente, ou porque tiveram de despender mais do que o esperado.

Para o socialismo mau, no entanto, isto são pormenores, como se sabe, já que reivindica incessantemente tudo, como se nada tivesse um custo, atirando, depois, a responsabilidade pelos inevitáveis desequilíbrios causados pelos seus desmandos para os ombros dos governantes que tiverem acabado por ceder à ameaça de sucessivas greves e à infernal gritaria de braço esticado e punho erguido.

A diferença reside, afinal, na opção quanto ao momento de gastar: loucamente, antes de ter, ou sensatamente depois, quando já se tem.

 

2. Comunismo

Um pouco além do socialismo, temos o comunismo*) a procurar impor, se necessário pela força, a distribuição igualitária dos bens e dos rendimentos, num mundo - para os seus defensores, ideal - em que cada um colabora em função das respetivas capacidades, mas recebe unicamente de acordo com as suas necessidades.

Por outras palavras, para os comunistas, cada um é obrigado a dar tudo o que pode e, se puder mais, acaba por receber tanto ou menos do que os outros; o que, olhando para dentro de nós mesmos e para a cara de cada um com que na rua nos cruzamos, se vê logo que não é, de facto, o sistema político e social mais adequado para quem quer ser feliz

Exemplificando, seria esse um mundo idílico em que, designadamente, os milionários que ganham a vida a dar pontapés numa minúscula bola para a enfiar naquelas gigantescas balizas lá teriam de trocar o magnífico Porsche do último modelo por um carrito do povo, como o Volkswagen carocha do meu tempo. Mais ou menos isto…

Claro que há burros em todas as ideologias, da mais à esquerda à mais à direita. Todavia, como só alguns comunistas é que são burros, a grande maior parte está cansada de saber que tamanho disparate é de concretização impossível, e que, mesmo no imaginário, só há mais de cem anos atrás poderia ter feito algum sentido, quando não havia redes sociais, nem ao menos informática de uso doméstico, e o futebol era coisa para verdadeiros desportistas e da qual apenas começava a ouvir-se falar.

Sabedoria
Sabendo, como sabem, tudo isto, os que se dizem comunistas, conhecem minimamente a natureza humana e não são burros só podem estar na política de má-fé, a enganar.

- x –

O facto de ser, evidentemente, tolo o ideário comunista não obsta, porém, a que, como já se disse, para fazer face aos desmandos capitalistas reste, a quem trabalha, organizar-se em partidos políticos, em sindicatos, em outros grupos de pressão.

A solução não passa, porém, pela existência de um partido único de esquerda, muito menos um partido cuja cartilha considere normal a liquidação de quem com ele se não identifique ou lhe não obedeça, liquidação essa por vezes até física, como é inevitável em quem advoga a tomada do poder pela força.

Tal é a ideia muito sua que os verdadeiros comunistas têm de liberdade e de democracia, de progresso, de abertura de espírito, daquilo a que alguns chamam democracia avançada, entre outras coisas que não podem deixar de nos trazer à lembrança a prática dos talibãs - que também já se dizem avançados e modernos*).

Tampouco pode a dignificação do trabalho e de quem o executa – ou seja, o reconhecimento de que a mão de obra não equivale à mera instrumentalização por uns da pessoa humana de outros - ser promovida à custa do esbulho de património alheio legitimamente detido e, muito menos, da liberdade ou da vida dos respetivos detentores, os maiores dos direitos fundamentais de qualquer membro da chamada Humanidade, como atualmente (ainda) julgamos conhecê-la.

Não pode, também, a solução ser imposta à bruta, como durante décadas o foi – e ainda o é… -sobretudo em lugares lá mais para o Oriente, mantendo-se os seus supostos promotores entrincheirados atrás de um muro constitucional e legal de privação de direitos, e de outros muros bem reais, de rede ou de betão, impiedosamente apartando famílias pela força, pelo terror de apanhar uma bala; famílias, note-se bem, maioritariamente dos mesmos trabalhadores que os regimes comunistas deveriam proteger, de Leste ou de Oeste ou, na sua maior parte, de lado nenhum.

Não é livre nem defensável um estado de onde as pessoas não podem sair para outro que seja povoado por quem livremente escolheu lá ficar.

 

3. Engodo

Goradas todas as tentativas viáveis de negociação com as ditaduras à margem das quais os ideais socialistas floresceram, descredibilizada a ação política tradicional e pacífica de uma oposição de esquerda, como levar as massas ignorantes a aderir à luta que alguém por elas se proponha travar? Só mesmo acenando com o poder das armas contra a ditadura opressora.

Força bruta como meio
O argumento da força bruta como meio eficaz de subjugar o adversário sempre será convincente e apetecível junto das massas incultas, pelo menos junto de quem pensa que, para ganhar contra uma equipa que joga melhor à bola nada como inutilizar o adversário com uma mais ou menos subtil pisadela com os pitons da bota bem cravados nos tendões e nos músculos da perna do infeliz futebolista, por forma a enviar para as boxes o craque principal, impedindo-o de continuar em jogo.

A mensagem da tomada do poder pela força bruta aceitava-se há uns cinquenta e tal anos, quando ainda escassos sessenta tinham passado sobre a Revolução Russa.  Hoje, apenas serve a nostalgia de uns poucos que se lembram desses tempos, e para inflamar os ânimos de uns quantos, bem mais jovens, que também têm, da função social do desporto, uma leitura inqualificável.

Quanto ao resto, a cada vez mais mirrada quantidade de votos mostra bem que, por todo o Mundo, em democracia são incomensuravelmente mais os chamados pela causa da liberdade do que os escolhidos pelos ideologicamente desnorteados eleitores que se dizem comunistas até que, desiludidos, começam a votar em partidos… da extrema direita em que também não acreditam.

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Talvez os promotores dos muros – a Leste e, agora, também a Oeste, na fronteira com o México*) - não comam criancinhas ao pequeno-almoço, mas não deixa de ser verdade que sempre souberam e continuam a saber muito eficazmente tratar da saúde das suas mamãs e papás...

Além das sucessivas violações dos mais elementares direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, todas as experiências ditas comunistas que foram tentadas em qualquer parte do Mundo redundaram em retumbantes fracassos sociais e económicos, quer ainda se arrastem graças aos bons ofícios do carrasco, quer tenham soçobrado e sido os partidos que as promoveram extintos ou reduzidos à mais simbólica expressão.

Dificilmente assim não aconteceria com regimes que, longe de efetivamente defender trabalhadores e pensionistas, a coberto da doutrina marxista-leninista acenavam com essa suposta defesa a indivíduos maioritariamente pouco instruídos e muito relativamente dotados do ponto de vista intelectual; regimes em que, uma vez tomado o poder, rapidamente passavam os seus detentores a oprimir e a reprimir também os mesmíssimos trabalhadores e pensionistas que neles votaram, a par dos tais capitalistas que constituíam o seu principal alvo – e, alegadamente, o único.

A tentação é grande
A verdade é que a tentação é grande, e diz a História que o poder e o dinheiro transformam igualmente o comportamento e a atitude perante a vida de capitalistas, de socialistas e de comunistas, apesar da já tão gasta desvalorizada e risível promessa de que, elegendo verdadeiros socialistas ou comunistas, as benesses e o dinheiro irão todos para os operários e para os trabalhadores.

Onde, de facto, alguma vez terá existido semelhante paraíso na Terra? Pois…

Defender as classes trabalhadoras dos excessos do capitalismo sustentando-se ideologicamente - e contra a mais elementar lógica - na irracionalidade e na negação da evidência para além dos limites da mais pobre lucidez, parece, não apenas incompetência e loucura, como despudorada má-fé para com os tais menos esclarecidos e instruídos seguidores, que vão sendo mantidos na mirífica ilusão de uma vida melhor, aparentemente com o fito único de politicamente sustentar o poder ilegítimo de quem enganosamente nas suas mãos ávidas o tomou.

 

4. Delírio

Os recentes acontecimentos em Cuba*) não passam de mais uma demonstração, entre tantas outras, de que, de tanto andar por aí nu, o rei comunista morreu, porque a pneumonia demagógica há muito o fez soçobrar.

Certo é que a situação da economia cubana foi fortemente penalizada pela quebra de uma atividade turística da qual quase exclusivamente depende e que, em tempos de pandemia, praticamente desapareceu; mas não é menos certo que de igual dependência do turismo padece este Portugal onde, apesar de tudo, um regime (ainda) não comunista parece ter evitado um descalabro económico comparável ou, sequer, parecido.

Não nos esqueçamos, porém, de que, em qualquer parte do Mundo e seja qual for o sistema político vigente, a defesa dos interesses dos mais pobres e desfavorecidos é, em si mesma, causa de dignidade tamanha que não necessita de suporte, ideológico ou não, além da insofismável evidência daquilo que o coração nos diz.

Não há, aliás, programa político que, de boa ou de má-fé, a não alardeie, ainda que apenas por estar bem ciente de que, caso o não fizesse, nenhuma esperança de sucesso um partido poderia ter numa democrática eleição, por serem os pobres muito mais do que os ricos.

A fim de assegurar a pluralidade e evitar qualquer possibilidade de domínio ilegítimo, importa, no entanto, garantir um quadro democrático e pluralista no qual, em lugar de um partido comunista único, marxista-leninista, existam partidos que pugnem por que esses sentimentos elevados sejam plasmados, não apenas em programas eleitorais, mas na prática social quotidiana e na governação.

Pai Natal
Não faz, porém, qualquer sentido que, comunistas ou não, partidos de uma certa esquerda demagógica, indiferentes à sobejamente conhecida inexistência de capital suficiente nas empresas ou no Estado para satisfazer as suas desvairadas reivindicações, nestas teimem, adotando a atitude pueril de quem quer muito defender os méritos do seu brinquedo escangalhado, ou de quem, sabendo impossível vir a ter um novo, continua a pedi-lo ao Pai Natal.

Agem tais partidos num estado de delírio, de negação idêntico ao que poderia levar um cientista a continuar a insistir em algo que, há décadas produzisse resultados negativos, não se vislumbrando a mais remota possibilidade de chegar a outro resultado, ou a mais remota racionalidade económica em continuar a experimentação.

Perante a esmagadora evidência do clamoroso desastre das muitas populações já condenadas à miséria pelos seguidores da doutrina socialista e da prática comunista, já nem o conhecimento aprofundado da teoria tem qualquer interesse prático: apenas interesse histórico, este, bem relevante, para evitar que alguém volte a cair em tão alucinadas loas.

Mesmo assim, insidiosamente e contra a mais elementar razão, continuam os partidos comunistas a impingi-las aos menos afortunados, aos espoliados, aos explorados, a toda essa panóplia de adjetivos artificiosos e coloridos com que, à falta de melhor, procuram, em vão, apimentar um discurso cada vez mais anquilosado e sediço, que já ninguém de juízo é capaz de suportar.

Numa civilização ocidental que se diz cada vez mais instruída, os poucos alvos que restam para a besta comunista são, convenientemente, os representantes menos educados e menos informados da população, suficientemente néscios e ingénuos para acreditar que, uma vez atingido o poder, pelo voto ou pela força, eles mesmos, os iludidos desafortunados, o poderão exercer; que os outros os deixarão, efetivamente, mandar e que se lá chegarem, acabarão por copiosos frutos tirar das aberrantes reformas então implementadas e da sua impreparada e incompetente gestão.

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Não é, naturalmente, de excluir por completo a possibilidade de existir gente ingénua ou mal informada, mas genuinamente revoltada com a injustiça e o sofrimento de outros, que se filia em organizações ditas comunistas pensando que nelas se poderá entregar com denodo à causa do bem-fazer. Mas também não pode deixar de se suscitar as maiores dúvidas quanto à eficácia e à qualidade da governação de um país num dia em que essas abnegadas mas ingénuas ou mal informadas almas que facilmente se deixam embalar pela irracional e desrazoável cantilena socialista – a pura e dura, não a lusitanamente travestida – ocuparem funções de destaque na gestão da coisa pública de qualquer natal torrão.

5. O Enigma Português

Da ineficácia prática dos propósitos comunistas tivemos, por cá, um belo exemplo na Reforma Agrária do final dos anos setenta do século passado*), bandeira fortemente agitada pelo então pujante Partido Comunista Português (PCP).

De então para cá, a inexistência de vocação capitalista do Estado tem vindo, por sua vez, a ser cabalmente demonstrada no retumbante fracasso económico da generalidade das empresas públicas, inevitavelmente condenadas à bancarrota a menos que passem a vida a tomar gigantescas injeções de adrenalina vindas do supostamente inesgotável dispensário do centro de saúde do Tesouro, alarvemente alimentado pelos nossos impostos.

No PCP de outrora, a evidente capacidade maior do Secretário-Geral então reinante granjeava-lhe o temor e o respeito de quem, para primeiro dirigente, não via alternativa minimamente credível àquela diferenciada pessoa que tanto se preocupava com o caminho capitalista que entendia estar a sociedade dele coeva a tomar.

Tinha, também, o Partido, comparativamente aos comunistas de hoje, a superior vantagem de, ao tempo do seu período áureo, termos estado bem mais próximos do que agora da data da Revolução, pelo que muita fé havia ainda nas monocórdicas promessas interminavelmente projetadas pela cassete nos megafones aparafusados nos tejadilhos dos automóveis dos solícitos e prestáveis camaradas.

Se não houvesse fé, havia, pelo menos o benefício da dúvida relativamente a pressupostos e a teorias que, aos menos atentos ou esclarecidos, não ocorria serem, já então, velhinhas de quase três quartos de século, e provirem de uma cultura substancialmente diferente da portuguesa, desenvolvida em condições e em conjunturas que evoluíram a largos milhares de quilómetros de distância e que com as nossas gentes nada tinham a ver; condições essas que, nesta sociedade de brandos costumes, muito a Oeste, com outro clima cultural, político e, até, atmosférico seria impossível estabelecer. Quanto mais agora, tanto tempo depois, em que a cultura do facilitismo, da anestesia política, dos influencers e das cada vez mais pategas redes sociais, todo o entusiasmo pela defesa de quaisquer verdadeiros valores vertiginosamente faz esmorecer.

O Secretário-Geral de antanho sabia-o bem, porque, inteligente como poucos, não podia deixar de o saber; e, sabendo-o, sabia também que a via da conquista do poder pelas armas já então era uma impossibilidade quase material, nem sequer o crédito de uma utopia podendo merecer.

Entendimento
Como, então,  entender que este homem superior, esta alma aparentemente boa, artística e estruturalmente honesta, tenha assumido e aceitado manter durante tanto tempo a liderança de uma força política que agora cumpre cem anos a lutar contra a ditadura... enquanto, dissimuladamente, não desiste de procurar implementar uma outra?

Um ser humano bondoso e dotado de superior inteligência jamais acreditaria na eficácia do chorrilho de disparates que o aranzel marxista-leninista indubitavelmente é. Terá, então, a capa comunista do Secretário-Geral sido meramente instrumental na sua luta pela liberdade e pela  igualdade?

Dá que pensar…

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Astérix*) lutava contra o invasor. O irredutível PCP lutou e luta para nos impor legisladores e governantes ideologicamente imbuídos de uma fé cega e ácida em postulados anquilosados e ruinosos, que o trato do tempo arrasou, mostrando, na prática, a inevitabilidade do desastre social e económico a que levaria a tresloucada e alienada insistência na sua imposição – como em Cuba e em outros malogrados países levou.

Tão impossível é explicar pela lógica quem é Deus, como os fundamentos da defesa comunista de regimes como os da Coreia do Norte e de Cuba ou da Venezuela. Não se entende, pois, como há, no Partido Comunista Português, tantos ateus que, ao mesmo tempo, dizem ser tão crentes e fiéis seguidores de tamanhos dislates.

Não pode, todavia, acusar-se o outrora Secretário-Geral de desonestidade intelectual, dada a inequívoca bondade das suas intenções. Como explicar o que propunha, então?

Que mistérios da história íntima do PCP ocultará a cortina opaca que forra as tão propaladas paredes de vidro do hermético e compacto partido que, mais do que qualquer outro, mereceria o nome de bloco?

 

6. O Partido de Hoje

Forçado a aderir a um tipo de marketing que com ele nada tem ou alguma vez terá a ver, o Partido Comunista Português já encomenda cartazes num dominante azul bandeira, relegando para enésimo plano a foice e o martelo, e estando, por vezes, o vermelho quase ou totalmente desaparecido.

Festa do Avante
Outro disfarce - outra demonstração de modernidade, perdão… - vem do festival anual*) com que lá vai financiando a estrutura partidária e onde a música no palco alterna com palavras lidas que a ninguém interessam, que já ninguém ouve, tiradas do repertório fantasma de quem, porque já cá não está, já ninguém vê. Quem, de fora, ouvir, for lúcido e intelectualmente honesto, nem fará ideia do que estão a falar.

A propósito de financiamentos do Partido, diga-se, entre parênteses, que não parece intelectualmente honesto afirmar que, na Grécia, o grande erro do governo de extrema-esquerda foi não querer sair do euro*), enquanto o eurocético PCP mantém, no Parlamento Europeu, deputados que, de alguma forma, também financiam o Partido com os chorudos ordenados que, mês a mês, lhes não perdoa.

Não obstante o PCP insistir em continuar representado no Parlamento de uma Comunidade Europeia sobre a qual lançou o anátema, a efetiva sede de assumir a governação nacional é, praticamente, nula, já que, nas hostes, ninguém acredita na cada vez mais remota possibilidade de lá chegar, pela força ou pelo voto; por outro lado, dada a patente incapacidade governativa mínima por parte de velhos e cristalizados ou jovens mas cada vez mais desiludidos militantes; por fim, por bem se saber que, uma vez no poder, nenhuma das prometidas medidas poderiam implementar, sob pena de um inevitável fracasso que representaria, para o Partido, o golpe de misericórdia que vem conseguindo adiar.

Reduz-se, assim, à expressão mais simples a utilidade e eficácia do PCP como partido político, limitada a algumas intervenções interessantes dos deputados mais jovens em comissões parlamentares - um dos quais, batizado com o pseudónimo do Mestre*), já tinha regressado à sua geologia profissional e agora procura fazer esquecer um pouco a decrépita cúpula, regressando à cena com o seu ar entediado e arrogante para ajudar a salvar o que resta, ou para com o barco se afundar.

Continuarão, pois, esses jovens elementos a ser os apaniguados de um Mestre que já não têm e alguns nem chegaram a conhecer pessoalmente, o qual, com o seu perfil único, convencia uns e outros da suposta bondade de ideais que talvez nunca tenham chegado a ser os dele, mas apenas o meio que lhe terá parecido mais promissor para uma mente superior e um espírito sensível pugnarem pelos mais desfavorecidos, pelos quais abdicou da liberdade com coragem nobre e exemplar.

Nova gente com chama que, iludida, lá pelo Partido agora apareça, esbarrará inevitavelmente na intransponível barreira da mensagem caduca, pequenina, ridícula ao ponto de considerar uma ofensa à democracia a supressão, da toponímia, de nomes de gente cuja memória apenas perdura na nostálgica lembrança dos indefetíveis e só a eles poderá interessar*).

Defende o Partido o indefensável porque, para sobreviver politicamente, importa desesperadamente mostrar uma bandeira, um ideal, ainda que o mesmo se limite a uma visão maníaca e alienada, do Mundo, acompanhada de uma incurável mesquinhez quotidiana e de uma visão retrógrada do que, aqui e nos nossos dias, Portugal deve ser.

Anquilosados Legionários e Votantes
Para ter alguma coisa com que acenar à última meia dúzia de legionários e votantes, manifesta-se o Partido contra medidas sanitárias de comprovada eficácia e de alternativa inviável ou, mesmo, impossível*); e a população responde vacinando-se quase toda e confinando-se, na maior parte, dessa forma demonstrando à meia dúzia de duros sobreviventes do PCP que, com sucessivos tiros no pé, este fica cada vez mais manco e se arrisca a, em breve, ficar mesmo... orgulhosamente só.

Disse o atual Secretário-Geral que a alternativa não poderia ser o confinamento agressivo, mas o reforço do Serviço Nacional de Saúde, “o reforço dos profissionais com reconhecimento pelo seu trabalho”. Como sempre e como seria de esperar, ficou por explicar onde arranjaria meios humanos e técnicos para o conseguir num curto espaço de tempo, e onde iria buscar o dinheiro para tudo isso.

Claro que isso de arranjar dinheiro não interessa, já que os inimigos do capital dele nunca falam quando devem, apenas se lhe referindo depreciativamente comportando-se como se o que exigem não tivesse qualquer custo e só a má vontade de quem governa o impedisse a sua obtenção. Assim demonstram, para lá de qualquer dúvida, a total incapacidade para legislar, para governar, para gerir, logo, a inutilidade de como partido político continuar.

Por que não, nesse caso, deixar-se absorver pelo seu satélite Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – INTERSINDICAL, já que, aqui, parece ser o planeta principal que orbita o satélite, e não o contrário, como manda a ordem universal?

A INTERSINDICAL, essa sim, é eficaz enquanto grupo de pressão, natureza a que, afinal, o ineficaz, politicamente inane e condenado Partido Comunista Português acaba por estar reduzido, perdido que anda no reino da mera ilusão.

 

7. O Futuro Sem Partido

O PCP fala de futuro com a convicção de um velho habitante de uma abandonada aldeola do interior que, sabendo que futuro já pouco tem, diz ao neto que estuda em Lisboa que quando eu morrer “esta vai ser a tua casinha” - casinha essa que, de tão pobre e humilde, faz morrer de vergonha o dito neto tuga, já todo garboso e importante assessor na autarquia de onde sonha que, um dia, a secretário-geral ou presidente de alguma coisa o ádem catapultar, ou todo embevecido no seu lugar subalterno numa multinacional qualquer de onde sai à hora do almoço para pavonear a camisola sete na ciclovia, ao volante da bicicleta a motor.

Passado e Presente
Associados a um partido comunista, pregões com a palavra futuro, como “O Futuro Tem Partido”, despertam tanta confiança e simpatia como a birra da criança que quer muito uma coisa e, a ver se pega, não para de falar nela e de choramingar. Não passam, em boa verdade, do estertor da morte de uma estrutura que, por falta de razão para existir, no pântano eleitoral cada vez mais se está a afundar.

Para funções de relevo no tal imaginário Futuro, o PCP conta com um candidato que, apesar do seu ar algo parado, apagado, inseguro e deprimido, é aparentemente o pau para toda a obra, o único ainda disponível: é deputado europeu, candidato à presidência da República, candidato à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, e vira o disco, e toca o mesmo até ao porto de destino como secretário-geral, de ar, se não muito fresco, pelo menos renovado.

Na campanha para as eleições presidenciais de 2021, limitou-se o Candidato a acenar com a Constituição da República como se do seu programa político se tratasse. Ao mesmo tempo, concorria contra quem a cumpre, assim demonstrando que, bem vistas as coisas, não tem o Partido quaisquer propostas novas, diferentes dos ditames do Texto Fundamental; e que, ao atual estado das coisas, nada de especial tem a acrescentar ou a modificar.

Nesse caso, para quê nele votar?

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Se o PCP chegou a ter algum peso nas autarquias, não terá sido por nele terem votado umas dezenas de milhar de combatentes armados até aos dentes, prontos a tomar o poder em nome da classe operária - tal como não foram quinhentos mil fascistas portugueses que, em 2021, na eleição presidencial votaram no candidato apoiado pelo Chega!.

Ora, mesmo esse peso autárquico – que apenas confirma que as ideias nada valem, mas apenas o conhecimento de proximidade de alguns candidatos - diluiu-se e continua a diluir-se num processo entrópico já impossível de reverter.


Fonte: Wikipedia

Os resultados eleitorais*) são, assim, catastróficos e continuarão a sê-lo, já que muitos dos eleitores não sabem nem querem saber no que estão a votar, nem estão aptos a, do comunismo, absorver o que quer que seja além das ritmadas cacofonias e ladainhas, e do tom inflamado dos discursos, do punho no ar.

Resultados Eleitorais do PCP
O que é certo e sabido é que o estribilho constante e recorrente de teorias retrógradas e apoucadas queimam, aos olhos dos eleitores, excelentes autarcas que, noutras forças políticas, muito melhor contributo talvez podessem dar.

Das vinte e quatro presidências de câmara apesar de tudo ainda conseguidas nas eleições de 2017 – menos dez do que em 2013 - , passou o PCP, em 2021, para apenas dezanove, ou seja, pouco mais de metade das trinta e quatro que há apenas cinco anos ainda eram suas.

Bem tenta o Secretário-Geral escamotear o desaire enaltecendo o resultado positivo, em Lisboa, do eterno Candidato. Parece ignorar que a tíbia vitória do novo Presidente – que, por muito sério, competente e honesto que possa ser, nenhum carisma ou traquejo político tem para ganhar o que quer que seja – se deveu a pouco mais do que à hemorragia de votos em que, por razões sobejamente conhecidas, se esvaiu o seu antecessor, votos esses que, à esquerda, fluíram, em boa parte, para o PCP, como expetável e inevitavelmente sempre haveria de acontecer.

Não há, pois, no resultado em Lisboa qualquer mérito para o Partido Comunista ou para o seu eterno Candidato, nem tal prenuncia qualquer surpresa agradável para uma eleição posterior: simplesmente, aconteceu.

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O que está na base do descalabro eleitoral?

Em eleições presidenciais, o PCP fica sempre de rastos por total inexistência de personalidades empáticas e persuasivas. Nas restantes, o desastre deve-se a inoperância e a falta de resultados práticos da ação política do Partido: os trabalhadores portugueses melhoram de vida por razões que, patentemente, nada têm a ver com o comunismo ou com quem o defende, apercebem-se da inutilidade da coisa, mudam de interesses, e segue-se a imparável descida nas sondagens e nas urnas, até ao há muito anunciado fim.

Tirando a mainça de indefetíveis que, a fumar um desolado cigarrito, lá vai aparecendo junto aos eternos portões fechados das fábricas, os supostamente muito conscientes e politizados milhares de trabalhadores envolvidos nos dias de greve já ignoram alegremente apelos à luta e passam os ditos dias em casa, a beberricar uma jola enquanto, desalentados, veem a bola na televisão.

Tivesse, agora, o PCP a tresloucada mas coerente e corajosa ideia de incitar à luta armada que o seu programa preconiza, e os resultados eleitorais rapidamente cairiam para o quase subsolo próprio de quem continua a fazê-lo noutras paragens.  Mas não: não se atrevem a alardear, abertamente, os ideais de luta armada associados ao nome que ostentam, porque bem sabem que, em Portugal, isso significaria o descalabro, o nunca mais, a precipitação do anunciado e inevitável fim.

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Serviço às classes trabalhadoras
Embora unanimemente reconhecido como honrado nos compromissos que assume com os seus adversários, sob a capa enganadora de salvador da pátria, está o Partido Comunista Português a prestar um péssimo serviço às classes trabalhadoras, pretendendo, unicamente para assegurar uma ténue aparência de sobrevivência política de umas quantas relíquias mumificadas nas suas magras reformas, captar outros tantos distraídos que, por não terem mais quem, a nível nacional, pareça defendê-los, até dão de barato essa coisa da via revolucionária, que consideram uma mera palermice, coisa de velhos.

Está, porém este penoso arrastar de si mesmo do velho Partido apenas a atrasar, irrecuperavelmente, a formação de um sensato, razoável, esclarecido e novo e por criar partido de esquerda, combativo, com gente fresca e renovados ideais sustentados num saudável conceito de democracia: algo muito mais dinâmico, vibrante e empenhado do que a aparentemente corrupta amálgama de interesses que, alegadamente, hoje nos impõe um governo de faz-de-conta, incoerente e sem que qualquer estratégia ou substrato ideológico a sua atuação permita identificar.

O grande problema é que, para isso seria imperioso que cometessem suicídio político os velhos do Restelo que, no interior das paredes de vidro*), ainda impõem uma disciplina férrea, macambúzios, falhos de adrenalina, enfadados, contrariados, bruscos, agressivos, nada atraentes, cujo orgulho comunista os impede até de aceitar, vinda de fora, a mais tímida sugestão.

Alternativamente, para que o Partido Comunista Português se renovasse, haveria que ver todas essas múmias - embora valorosos combatentes antifascistas de outrora - sair definitivamente de cena, juntamente com as suas teimosias genuinamente socialistas, pensadas por gente que vivia as tais realidades necessariamente bem diferentes, em paragens bem longínquas e mais de cem anos atrás.

Uma alternativa seria mudar de nome. Mas o PCP não pode mudar de nome porque quem vota nele são fervorosos defensores de um comunismo que não fazem ideia do que seja: tal como o Benfica, perderia os associados quase todos se o fizesse. Além do mais, estaria a seguir o exemplo de um rebatizado partido de extrema-direita que procura, desesperadamente, erguer-se*).

No entanto, claro está que o Partido Comunista Português nada tem a ver com ditaduras. Pelo menos, de direita, não obstante negar o Holodomor*) com descoco igual àquele com que a dita extrema-direita teima em negar a existência do holocausto nazi.

De um modo geral, o Partido nega aquilo que a logica lhe proíbe explicar.

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Génese de um movimento ou partido
A génese de um movimento ou partido pode radicar no sentimento e na emoção, mas é da realidade e da razão que devem emanar a gestão e a atuação.

Isto, é inconciliável com o facto de, em entrevista recente a um canal de televisão, termos, de novo e sem qualquer pudor, ouvido o atual Secretário-Geral referir-se à eterna “democracia avançada” da qual ainda vai, sabe-se lá onde, buscar ânimo para continuar a falar; e de um “movimento sindical unitário” cuja simples designação nos leva, rapidamente, a associá-lo a um também único e indesejável partido.

Na verdade, é preciso alguém ser mesmo muito desmiolado para se dignar dar ouvidos durante escassos segundos que sejam a quem, cego e surdo ao que se passa à sua volta e sem deixar qualquer dúvida quanto aos verdadeiros propósitos, continua a advogar, como solução para os dramas da Humanidade, a “superação revolucionária do capitalismo*), ou seja, a tomada do poder à bordoada.

Na sociedade consumista e cada vez mais indiferente em que vivemos, é caso para dizer que, se é com bombas e espingardas que esperam suster o trambolhão nas urnas, mais valeria procurar pescar um ou outro voto num asilo de alienados, nele centrando a campanha eleitoral.

A atual militância mais não é, afinal, do que o reflexo do estado de negação  de quem passou toda uma vida a defender algo em que já não consegue acreditar, mas nada mais tem a que, emocionalmente, se agarrar.

Enquanto os patéticos desvarios comunistas e os seus ferrenhos e patéticos defensores estiverem na base das linhas programáticas do partido dos trabalhadores, estarão os ditos trabalhadores condenados a continuar sem defesa efetiva contra as políticas de direita, como tanto gostam de chamar àquilo que faz quem não navega na esteira do ainda PCP.

Não é que não haja elementos jovens e válidos para levar a luta dos trabalhadores avante, por aquilo que de essencial ela sempre representará. Não é que não haja, nas atuais cúpulas do Partido, elementos capazes de o manter a esbracejar à tona de água por mais uns anos. Mas, o muro inamovível que a desoladora ineficácia económica de todas as experiências de implementação de ideais comunistas lhe põe à frente impede a progressão, a evolução, o desenvolvimento de ideias que, por condenarem as economias a uma inevitável falência, estão hoje condenadas à condescendente irrisão.

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Os trabalhadores portugueses necessitam, urgentemente, de um partido novo, moderno, nascido na sociedade dos tempos atuais, pragmático, virado, não para a disseminação de uma estafada cartilha ideológica, mas para a resolução de problemas concretos das classes representadas.

Necessitam de um partido credível, bem definido, e também não daquela amálgama algo estranha, ainda mais à esquerda, que entendeu tudo isto rapidamente e, para namorar os votos dos tontinhos mais à direita, agora se travestiu, em bloco, com a pele de cordeiro social-democrata*).

Mergulhado num intenso processo entrópico, manifestamente irreversível, cada vez se torna mais evidente a inutilidade atual de um Partido Comunista Português reduzido a, no limite, servir como muleta dileta do Partido do Governo.

Contrariamente ao que rezam uns cartazes há tempos espalhados por aí, o Futuro não tem Partido.

Pelo menos, este.

* *

A ditadura dos patriarcas não é, como alguns poderão pensar, um exclusivo de uma organização comunista em vias de extinção, como o PCP. Coexiste, em Portugal, pelo menos um outro modelo de subjugação, ainda efetiva, das camadas jovens à tirania de velhos incompetentes e completamente ultrapassados, mas agarrados como lapas ao poder.

[leia aqui a sequência]