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quinta-feira, 26 de maio de 2022


Rex Stout


"Sempre que possível, é mais sensato confiar na inércia. É a maior força do Mundo"


"It is always wiser, where there is a choice, to trust to inertia. It is the greatest force in the world"

Rex Stout *)
in "Fer-de-Lance"


Trata-se, é verdade, de um pensamento atribuído a uma personagem tão pouco ativa como Nero Wolfe *).

Existe, todavia, uma tendência para nos esquecermos de que, no que à Física diz respeito, inércia é a incapacidade de qualquer corpo alterar, por si só, o seu estado de repouso ou movimento. Não apenas de repouso, portanto.

De outra forma dito, inércia é, ora o fluir tranquilo de uma situação ou de um processo - como a vida, a nacionalidade, a sociedade, a profissão -, ora a pausa indispensável a qualquer atividade. Quer as situações, quer os processos, tendem a evoluir ao seu ritmo natural, sem sobressaltos, em paz, o que não deve, nem pode, ser confundido com estagnação, marasmo. Nem umas, nem outros, se interrompem ou suspendem por si sós: apenas por um impacto exercido sobre eles, um ato de vontade, uma ação exógena, um grão de areia na engrenagem, até.

Esta tendência de crescimento pacífico e natural, quase inerte, apropriado à capacidade de aceleração saudável do ser humano, em todas as vertentes, não se quebra, pois, por si só, mas apenas por algo que venha desestabilizar as pacíficas águas sobre as quais desliza a vida, quantas vezes desnecessária e inutilmente agitadas por nada mais do que a ânsia de conquistar eleitorado, de gerar avultados resultados económicos ou de conseguir narcísico protagonismo.

Assim nascem, por esse Mundo fora, guerras de diversa ordem e de âmbito mais ou menos restrito, desde invasões de estados por outros a meras questiúnculas restritas do quadro empresarial ou familiar.

A vontade de quebrar a inércia em prol dos outros, seja da Humanidade, seja do núcleo restrito que nos rodeia, será sempre de saudar dentro dos limites de uma razoável moderação e de respeito pelo próximo, do que lhe pertence, da maior ou menor capacidade de cada um para acompanhar o nosso entusiasmo.

No entanto, tal como é absolutamente inaceitável a invasão arbitrária de uma nação por outra, também será sempre de condenar a invasão arbitrária e egoísta de um espírito em paz por outro que dele, de alguma forma, pretende aproveitar-se.

Pensemos em política, em publicidade, em qualquer forma de exibicionismo.

Pensemos no que quer que seja suscetível de nos proporcionar protagonismo desejável apenas por nós; e tenhamos a moderação e a temperança essenciais à manutenção dos equilíbrios sem os quais jamais chegaremos, onde quer que seja, de forma sustentada e duradoura, apenas semeando em volta a morte, a dor, a ansiedade, a destruição.

Na Ucrânia, como bem junto a qualquer de nós.

* *

Por falar em inércia, no meio desta confusão toda gerada pela invasão, de todas as acusações ou insinuações de responsabilidade que lhe são feitas, onde pára, agora, Angela Merkel, a chanceler alemã que terá aberto a, Vladimir Putin, as portas da Ucrãnia, ou de qualquer estado da antiga União Soviética que resolvesse invadir?

[continua aqui]


segunda-feira, 2 de maio de 2022


O Estranho Caso dos Copinhos de Feijão

Não, não é o título de um romance policial. Não passa de um pequeno e indignado texto acerca de uma descarada aldrabice na área da doçaria, impunemente repetida por, pelo menos, um pequeno fabricante, com a complacência de grandes superfícies de retalho.

Poderá ser ingenuidade, excesso de confiança ou, até, mania. Mas, quando passo pela loja de uma marca de supermercados na qual confio, parto do princípio de que os produtos vendidos correspondem, dentro do razoavelmente expetável, ao que é anunciado na embalagem, supostamente para permitir ao potencial consumidor uma informação esclarecida.

Claro que tudo isto é bastante relativo, sobretudo numa sociedade que, ao mesmo tempo que impõe normas e controlos cada vez mais apertados e rígidos à produção e comercialização de tudo e mais alguma coisa, continua - e muito bem, diga-se - a permitir, em feiras e mercados, a venda a granel de produtos das mais diversas naturezas e origens, obtidos segundo processos de cultivo, colheita e processamento maioritariamente artesanais e sem controlo sanitário visível.

Não obstante, em ambientes estritamente controlados pela fiscalização económica - seja a da famigerada ASAE, seja outra entidade qualquer -, torna-se caricato encontrar, num hipermercado do século XXI, uma embalagem que revela, no rótulo, conter um produto composto por açúcar, ovos pasteurizados, água, coco, farinha de trigo, amido de milho, óleo de girassol, sal, lecitina de soja, levedante E500, açúcar em pó com amido de milho, conservantes E200 e E202...  e 0,5% de feijão, chamando à mistela "Copinhos de Feijão".

Ora, segundo a Wikipedia*), "o pastel de feijão é um doce típico de Portugal, confeccionado em Torres Vedras desde os finais do século XIX. Embora a receita varie um pouco consoante o fabricante, tem como ingredientes base a amêndoa e o feijão branco cozido".

Não se tratando, como é evidente, de pasteis propriamente ditos, poderá, mesmo assim, alguém considerar legítimo que se entenda que uma percentagem de 0,5% de feijão basta para que se anuncie que determinado produto como de feijão, quando, em boa verdade, não passa de uma mistela com resquícios de feijão? É que é óbvio e indesmentível que uma percentagem tão ínfima como 0,5%, de feijão ou do que quer que não seja um aromatizante, nada acrescenta ao sabor ou a qualquer outra caraterística do produto final.

De outra forma dito, a admitir-se que algo tão ridículo como 0,5% é suficiente para determinar ou influenciar a designação, os anunciados "Copinhos de Feijão" facilmente se transformariam, com minúsculas alterações ao processo de fabrico, em "Copinhos de Maçã", ou "Copinhos de Kiwi", ou "Copinhos de Cenoura" ou do que quer que fosse, na certeza de que, no que à percepção pelo consumidor diz respeito, o sabor e a consistência se manteriam completamente inalterados.

- x -

Conduzindo a discussão a outro patamar, ocorre, inevitavelmente, a necessidade premente de o legislador se interessar sobre esta temática, designadamente definindo qual a percentagem mínima necessária para que determinado produto possa designar-se como sendo feito de alguma coisa - e não com alguma coisa... -, no sentido de que isso corresponderá à inclusão de determinada componente em quantidade suficiente para alterar as características relevantes para quem o irá adquirir.

Diversos problemas emergem desta questão, como a natureza do produto em causa e a subjetividade inerente à variação da sensibilidade entre uma infinidade de consumidores.

Quanto à natureza, será oportuno referir, num extremo, a obrigatoriedade de quase exclusividade de determinada casta*) na composição de um vinho para que aquela possa constar da designação da variante (como "Touriga Nacional", "Aragonês", "Alvarinho", "Cabernet Sauvignon") dentro da marca.

Claro está que, transposta para o produto aqui tratado, tal imposição tornaria materialmente impossível a fabricação de um pastel com cem 100% de feijão. Mas, haverá, seguramente, medidas intermédias que poderão ser fixadas como mínimos aceitáveis para viabilizar o processo de fabrico garantido, simultaneamente, a diferenciação.

Quanto às diferentes sensibilidades entre consumidores, não será, seguramente, impossível, através de estudos adequados, determinar os mesmos pesos mínimos de forma a assegurar que não daremos connosco a ingerir a mesma mistela, levados ao engano por uma mais ou menos criativa e fantasiosa designação.

Eis, pois, um caso claro de publicidade enganosa decorrente, simplesmente, da incorreta utilização de uma preposição.

quinta-feira, 21 de abril de 2022


20 Palavras em Latim que Usamos Frequentemente

Após este título, lista aqui um sítio dito de cultura: Ad aeternum; Agnus Dei; Alibi; a priori; a posteriori; a fortiori; ad hoc; Curriculum Vitae; Cogito, ergo sum; Carpe diem; Ex libris; Errare humanum est; Ex nihilo nihil fit; in extremis; In loco; Ipsis verbis; Quid pro quo; Sine Qua Non; Sine die; Veni, vidi, vici.

Há que dizer, antes de mais, que a ideia de divulgar, junto da população menos atenta a estas coisas, temas da língua portuguesa em linguagem que se esforça por facilitar a compreensão e a aprendizagem, aparece como uma iniciativa sem dúvida louvável, faceta que seria injusto não salientar. Isto, apesar de essa linguagem se afastar, por vezes, tanto de algum cuidado na escrita que acaba por redundar em erros gramaticais ou, pelo menos, num facilitismo excessivo, numa ausência de rigor e de precisão na utilização do mesmo idioma que, supostamente, estariam a ensinar - como é o caso, por exemplo, da utilização, no referido título, de usamos em lugar do quiçá mais apropriado utilizamos, uma vez que utilizar de palavras as não torna usadas ou desgastadas, assim sendo aqui preferível o verbo utilizar.

Mas como aceitar que o à-vontade seja tal que nem se trate de cuidar que o título corresponda ao que é apresentado? Vejamos.

Palavras diferentes, não são vinte: são mais de quarenta; e, se se referem a artigos da lista compostos por uma única palavra, resumem-se a um: Alibi. Tudo o resto são locuções, conjuntos de mais de uma palavra.

Além do mais, tem o caro Leitor por hábito utilizar frequentemente a expressão Ex nihilo nihil fit? Sabe, pelo menos, o que significa? Ou Agnus Dei, comum na missa em latim que há muito tempo praticamente acabou? Quid pro quo? Carpe diem? "Frequentemente" utilizadas?

Mas, por quem, afinal?

E o alibi? Por que estranha razão estaremos, a proferi-lo, a utilizar a forma latina, quando, também em português, se encontra dicionarizada? Será que quando dizemos vida estamos, também, a proferir ou escrever uma palavra espanhola que, em português, é frequentemente utilizada?

Mesmo as restantes, serão elas "frequentemente" utilizadas pelos destinatários do artigo? Ou, de outra forma visto, que interesse terá um artigo como este para as pessoas que tais "palavras" utilizam "frequentemente"?

Nem vou gastar o meu tempo e a paciência do caro leitor a referir-me aos numerosos artigos dos dez mais isto ou dos trinta mais aquilo, tudo de acordo com critérios absolutamente subjetivos e sem a mais pequena parcela de fiabilidade, a não ser para quem os escreve.

Lamentavelmente, estas coisas são ad nauseam - esqueceram-se desta, que é, pelo menos, mais utilizada do que Ex nihilo nihil fit... - pespegadas naquela coisa chamada Discovery da Google, que me aparece cada vez que alguma coisa no motor de busca vou procurar.

Desta forma lamentável se desvaloriza, se subverte uma ideia com inegável potencial, sacrificando-a à vontade ou à necessidade de publicar à viva força, "frequentemente"; de manter as audiências e o interesse da Google e dos anunciantes que, no meio de muito disparate, as coisas mais incríveis e desinteressantes vêm divulgar.

Pobre língua portuguesa, e pobre de quem ainda pensa que, a páginas dessas, alguma coisa de verdadeiramente válido ainda irá buscar...


Não perca, no correspondente separador no topo desta página,
outros artigos polémicos sobre diversos temas relacionados com a

LÍNGUA PORTUGUESA

quinta-feira, 14 de abril de 2022


Braga: A Arcada

 

Situada na Praça da República, a Arcada*) é um dos mais emblemáticos edifícios da Cidade.

Sacrificada aos imperativos da desejada rentabilidade e da implacável moda, a vista desafogada que o postal velhinho nos mostra foi, entretanto, substituída pelos inevitáveis mamarrachos típicos do desenvolvimento de aglomerados que, alguns dos respetivos ex libris, com a dignidade devida não souberam conservar.

domingo, 13 de março de 2022


"Baking News"

Habitualmente traduzida como "notícias de última hora", a expressão inglesa "breaking news" exprime, mais propriamente, uma interrupção, uma quebra (break) do curso normal da programação de um canal de radiofonia ou de televisão, devida à superveniência do conhecimento, pelo emissor, de informação cuja divulgação justifique tal sobressalto.

Os critérios para a classificação de determinada notícia como "breaking news" são, necessariamente, subjetivos, além de fortemente condicionados pela apetência do auditório pela respetiva natureza e, consequentemente, pelos inerentes interesses comerciais que cada vez mais nos surgem como o verdadeiro motor das decisões táticas a cada momento tomadas pelos responsáveis pela gestão corrente das diversas estações.

Caso bem conhecido e que ainda hoje permanece na memória de muitos é, corria o ano de 2007, o da saída abrupta de estúdio por parte de um comentador da SIC Notícias*) que viu o seu comentário político interrompido pela inadiável e importantíssima cobertura da chegada ao aeroporto de um então bem sucedido treinador de futebol.

Para alguns aparentemente no mesmo patamar, temos, agora, a invasão da Ucrânia pela Rússia a ameaçar a segurança da Europa e, desta vez, a objetivamente mais do que justificar que qualquer notícia relevante e de última hora sobre o tema ere uma imediata interrupção da regular programação.

- x -

No entanto, quem, por gosto discutível ou pontual falta de alternativa, passar parte do dia com o aparelho sintonizado na frequência do canal recentemente rebatizado como CNN Portugal, ouvirá, inúmeras vezes ao longo do dia, papaguear algo como "Boa tarde, eu sou a Maximiana e estamos em 'breaking news' na CNN Portugal" (o nome fictício da locutora foi propositadamente escolhido dada a facilidade com que as evidentes artificialidade e impropriedade da designação e da mensagem poderiam levar-nos a confundi-la com uma rábula de um programa humorístico como o Crime na Pensão Estrelinha *) ou o Humor de Perdição *)).

O que nos traz, de imprevisto, de inesperado, de importante, de novo, aquilo que se segue a tão espampanante introdução?

As mais das vezes, a partida, o trânsito ou a chegada de mais um entre tantos camiões com ajuda humanitária generosamente recolhida em Portugal; a chegada de mais um desolado grupo de deslocados da guerra; a comovente história do pequeno Alexis que, na fuga, apenas conseguiu trazer consigo o mais pequeno dos seus já poucos brinquedos; o aproveitamento fácil e indecoroso da fragilidade das vítimas para as pôr a chorar diante das câmaras, ou a pungente história de um Oleg que, perdido nas agruras da guerra, não tem como encontrar a irmã ou outro ente querido do seu coração.

Tudo isto é triste, é dramático, é chocante, claro. A menos que sejamos bestas apenas comparáveis aos abomináveis agressores, tudo isto nos toca profundamente, e não deixa de ser instrumentalmente relevante na congregação e na mobilização de esforços para valer a quem tanto de nós necessita.

Mas, o que tem a ver com "breaking news" toda esta informação já mais do que requentada, passada até à nausea, sempre com as mesmas imagens de fundo - ainda conseguem ver "em direto" aquela explosão de um míssil russo a destruir um edifício administrativo em Kharkiv*)

De manhã à noite, e seja lá o que for que transmita que tenha, ainda que remotamente, a ver com a invasão da Ucrânia, é, para a mais sensacionalista do que informativa CNN Portugal, notícia de última hora, ou assim é anunciada a fatias menos cultas, menos atentas e menos inteligentes da população espetadora, as únicas que, numa postura predominantemente acrítica, ainda conseguirão absorver, sem reagir, tão enganadoras e intensas mensagens que, supostamente, ajudarão o recauchutado Canal a vender alguma publicidade.

Em vez de breaking news, servem-nos baking news, destinadas a entorpecer, a cozinhar em lume brando as meninges de quem as vê e ouve, intercaladas pelos anúncios que, esses sim, aqui e ali as vêm interromper.

Ávidos de verdadeiras notícias, lá continuamos assim pregados à têvê...

Caso se interesse por
QUESTÕES SOCIAIS
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domingo, 30 de janeiro de 2022


O Circo sem Fim

Cumpriu-se, ontem, o dia de faz-de-conta, o chamado 'dia de reflexão'. Um dia miserável para os órgãos de comunicação, em que, já e ainda, não se pode 'fazer' política; em que jornalistas, comentadores e politólogos não podem atirar-nos as suas já gastas e mais do que previsíveis opiniões, baseadas em sondagens cada vez menos credíveis e em desempenhos enviesados e esquivos dos protagonistas e daqueles que gostariam de, um dia, vir a sê-lo.

Hoje, o circo mediático volta à bilheteira, já que o 'dia de ansiedade' se segue ao 'dia de reflexão'.

Ansiedade dos candidatos na corda bamba e dos que se julgam a um passo da eleição. Ansiedade das as agências de marketing e das de sondagens, que nas urnas vão ver decididos os negócios da próxima campanha. Ansiedade para os compadres dos eleitos e dos perdedores também. Ansiedade para os adeptos do clube político, que, como se a final de ontem da Taça da Liga não bastasse, não sabem se vão sair em ombros ou humilhados, se vão ter ou não coragem para aparecer no café no dia seguinte ao do jogo... que dizer, da eleição.

O circo mediático suspendeu-se ontem. Hoje regressa com o ar beatífico, confiante e bem disposto do candidato com o boletim meio introduzido na urna à espera do fotógrafo; com declarações firmes que fazem lembrar as do recentemente derrotado candidato à Câmara Municipal de Lisboa, a meio da tarde do dia da eleição; com os discursos de vitória e de fingida vitória.

A partir de amanhã, mais forte e barulhento fica o circo, com dias e dias dedicados à especulação e à cacha quanto às negociações em curso que dificilmente do pântano nos tirarão. Tudo isto, com muita, muita publicidade à mistura, que se não pode parar o circo da desinformação.

Os acrobatas, são os candidatos. Politólogos e quejandos, os palhaços e restantes atores.

Os animais... nós, desgraçados e enganados eleitores.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2022


Inferno e Traição

Isto, preocupa-me. Seriamente.

Hoje de manhã, ao entrar calmamente num supermercado, atraiu-me o olhar uma fileira de capas de revistas habilmente dispostas por forma a chamar a atenção. Revistas daquelas de grande tiragem versando, maioritariamente, sobre os importantes temas relativos a diversas telenovelas, bem como às sem dúvida muito interessantes aventuras e desventuras daquelas criaturas que se consideram personalidades, colunáveis, membros do jet set, ou que ascenderam a qualquer outro patamar porque o elevador social nele os deixou, ou por terem trepado a pulso para o atingir - o que, aqui no Retângulo, cada vez mais parece corresponder a uma especial habilidade para abrir, fechar e movimentar sacos azuis e outras habilidades que tais, a maior parte das quais com significativas repercussões fiscais e outras que tais.

Das ditas capas, sobressaiam os títulos "Inferno e Traição", "Tragédia e Traição", "Amor Proibido", "Todos os Segredos", "Acusado de Pedofilia" e, last but not the least, "Expulsos do BB Famosos".

Como os proprietários da tabacaria não estão ali para perder dinheiro, evidente se torna que sabem muito bem que é aquilo o que mais se vende, o que mais chama clientes, e não os títulos sensaborões  (leia-se "mais sérios") dos representantes da imprensa escrita que, efetivamente, informam e que cada vez menos existe o hábito de ler.

Num dois próximos Domingos, serão estes educados leitores, às centenas de milhar, que, juntamente com os que se deleitam com o conteúdo de pasquins de índole e filiação diversa, juntamente com as notícias fresquinhas da indústria futebolística - que também estavam no escaparate, logo a seguir -, irão, conscienciosa e criteriosamente votar em mais uma eleição.

São estes indivíduos sumamente ocupados e preocupados com a visibilidade do próprio umbigo*) que irão escolher quem, a si, caro Leitor, e a mim irá governar nos próximos quatro anos - se tanto aguentar.

São estas pessoas sem Norte, vazias de si, refugiadas na mirífica ilusão daquilo que nem merece ser -  porque não tem razão válida para existir além da subserviente devoção ao marketing predador que sopra nos lubrificados cataventos destas pequeninas cabeças e destes minúsculos corações -, são estes infelizes que, talvez maioritariamente, irão tomar uma decisão fundamental para o futuro próximo de cada um de nós, e do todo que todos integramos.

Isto, preocupa-me. Seriamente.

terça-feira, 28 de dezembro de 2021


Títulos que O não São


Concordará o caro Leitor com a minha interpretação de que, a um título bombástico como este, se seguiria uma notícia sobre uma queda em desgraça do Juiz, ou de uma ação disciplinar séria com suspensão à vista, ou qualquer outro evento digno de notícia, mormente antecedida de um título de tamanho impacto.

Desengane-se. Como poderá confirmar no link que antecede o asterisco acima, continuação da leitura logo esclareceria que se trata, apenas, de redistribuir processos a cargo de um outro juiz por estar este exclusivamente dedicado a dois outros de maior exigência; e, logicamente, um eventual sorteio que inclua os novos magistrados recentemente admitidos*) poderá "resultar na perda de processos que estão, neste momento, com Carlos Alexandre", o que não passará de uma consequência natural do facto de, no Tribunal Central de Instrução Criminal existirem agora mais juízes pelos quais repartir a carga de trabalho.

Não se trata, obviamente, de uma notícia falsa. Mas, será coisa tão insonsa realmente uma notícia?

Tampouco estamos perante um título falso. Mas não se tratará de um título que viola a mais elementar fronteira da racionalidade e, até, da legitimidade, da boa fé?

Se o objetivo de títulos sensacionalistas com este for levar pessoas a adquirir jornais impressos ou a aceder a conteúdos eletrónicos a fim de, por qualquer dos processos, gerar receitas, até que ponto será a atitude de quem, impune mas deliberadamente escolhe um destes títulos, diferente daquilo que é geralmente considerado publicidade enganosa?

Com uma agravante, claro: enquanto a publicidade relativa a produtos indiferenciados é da responsabilidade de empresas não vinculadas a qualquer nobre missão que não seja a de obter lucros para quem nelas investe - e não estão protegidas por qualquer estatuto especial ou estão vinculadas a qualquer código de ética além daquele que, mais ou menos intuitivamente, vincula cada um de nós -, os jornalistas estão, supostamente, incumbidos da nobre missão de informar objetivamente, com verdade, sendo estes pressupostos parte importante dos privilégios que o Estado lhes concede para que possam, em liberdade, desempenhar a sua função.

Até que ponto será, então, legítimo a um órgão de comunicação social estar no mercado com a mesma postura que qualquer indiferenciado fabricante de macarrão?

Aqui fica a questão...



quinta-feira, 25 de novembro de 2021


A como É o Camarão?

A cartelização dos preços parece estar a institucionalizar-se como prática corrente nos hipermercados, supermercados e mercados que tais: os mesmos que passam o tempo a aliciar-nos com cartões de desconto, promoções incríveis, fabulosas ofertas e outros daqueles chavões que a fértil imaginação dos publicitários não cessa de inventar.

Claro que a semelhança entre qualquer cadeia deste tipo e a Santa Casa da Misericórdia não passará de uma miragem aos olhos de alguns. Mas, se esta eticamente discutível estratégia de marketing continua a vingar, não será, certamente, por não ter acolhimento entre os menos esclarecidos fregueses - que são muitos... - que para as suas comprinhas por lá continuam a passar.

Um caso que há anos ocorre e em que nenhuma autoridade parece ter reparado, ou faz vista grossa, é a do preço do quilo de camarão numa destas cadeias que visito com alguma frequência. Não é que aprecie particularmente o petisco, nem é coisa que compre muitas vezes. Calhou, simplesmente, olhar um dia e outro, e aquilo começou a fazer-me alguma confusão.

- x -

Quem estiver atento, por certo reparará que, nessa cadeia de supermercados, em, pelo menos 90% dos dias do ano o preço do camarão de calibre 20/30 está em promoção, descendo, supostamente, de uns catorze euros para um pouco mais de dez, com muito ligeiras variações. A cadeia tem, sempre, o cuidado de escrever na etiqueta do preço "promoção de 15/11/2021 a 30/11/2021", por exemplo. Até aí, nada de mal.

Acontece, no entanto, que, logo no dia seguinte ao do termo da promoção, invariavelmente aparece outra etiqueta com "promoção de 01/12/2021 a 15/12/2021" ou coisa parecida, e assim sucessivamente, numa pretensa promoção infindável e em contínuo ao longo de (quase) todo o ano.

Fica a pergunta: o que é, afinal, uma promoção?

Parece legítimo assumir que por promoção se entende uma campanha destinada a promover pontualmente um produto novo; ou, pelo menos, um que registe uma quebra significativa nas vendas, caso em que, pela via da baixa de preço, se pretende voltar a captar o interesse do mercado, dessa forma chamando a sua atenção. Seria razoável, parece-me, que uma verdadeira promoção como estas, estivesse limitada a, digamos, uns 15% ou 20% por cento dos dias do ano, assim se evidenciando, de forma inequívoca, que de uma ação pontual se tratava, e não de uma verdadeira armadilha para atrair clientes distraídos ou menos informados para um produto cujo preço habitual é, afinal, o da  dita promoção, assim não constituindo esta qualquer situação de exceção.

A contínua baixa de preço ao longo do ano tem, como único efeito, o de simular condições pontualmente favoráveis que, afinal, não existem, visando o promotor unicamente induzir em erro o consumidor, indiscutivelmente burlá-lo de forma despudorada, apelando ao muito lusitano querer ser  o tal chico esperto que aproveitou uma grande promoção

Seria, assim, como uma Black Friday todos os dias. O Paraíso!

Claro está que não acontece apenas com o camarão. São, pelo menos, dezenas os produtos que nessa cadeia  - e, provavelmente, em outras... - passam praticamente todo o ano em promoção, como é o caso escandaloso de certos vinhos tintos que parecem já ter nascido com 65% de desconto, e estão, há vários anos, nessa fantástica... promoção.

Os funcionários das autoridades competentes não costumam ir ao "super"? Andam distraídos? Ou acham absolutamente normal este tipo de manipulação?

Ou andará por aí alguma outra motivação?

* *

Não é nova, esta questão das promoções mal pensadas ou pensadas à revelia de certos princípios que todos gostaríamos de ver seguir.

Exemplos não faltam, como alguns relativamente recentes encontrados aqui e ali.