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segunda-feira, 30 de maio de 2022


Vila Viçosa

Vila Viçosa - Vila Ducal
Vila Viçosa Hoje

As imagens não deixam dúvida: Vila Viçosa está muito mais arborizada hoje do que nos tempos idos em que a fotografia do postal foi obtida.

Quanto ao mais, quem a visitar encontrará uma vila que, sem prejuízo de uma equilibrada evolução, soube conservar a traça e o ritmo que se esperaria encontrar numa terra de tão grandes tradições, impossível de separar de trechos inesquecíveis da História de Portugal.

Existe, todavia, uma espécie de crendice primária de que enfermam os espíritos de certos autarcas que os leva a procurar compensar eventuais défices de competência técnica e política com tiradas tonitroantes para consumo da comunicação social, levando-os a nem se aperceber, não apenas do porventura irreversível erro de julgamento que a elas subjaz, como da figura triste que acabam por fazer perante quem sobre estes assuntos quiser pensar, a par da indiferença daqueles a quem já parece que nada, além do vício das redes sociais, poderá interessar.

Vai daí, que Vila Viçosa anunciou, recentemente, a intenção de propor à Assembleia da República a sua elevação a cidade *), a fim de garantir "mais valias, quer ao nível do acesso a determinados fundos comunitários locais ou regionais, como ao nível de fundos diretamente em Bruxelas". Nas palavras do recém-eleito Presidente da Câmara, "o ser elevado a cidade é um reconhecimento que da Assembleia da República, que reconhece a evolução de Vila Viçosa, reconhece a sua importante e relevante história, o seu enorme património, e acha que é uma terra com grande relevo para o país. É no fundo, reconhecer a nossa identidade como uma terra que cresceu, que evoluiu, que tem história e que tem relevância".

Entende, assim, o ilustre entrevistado ser necessária a elevação de Vila Viçosa a cidade para que a Assembleia da República reconheça o seu importante passado - o que não passa de um rematado disparate -; e para que lhe reconheça a grande relevância presente, quiçá esquecendo-se ou procurando fazer esquecer que tal relevância terá sido conquistada em sucessivas presidências de câmara do Partido Socialista e do Partido Comunista Português (PCP), já que, consultados os dados oficiais, o Partido Social Democrata a que o atual primeiro autarca pertence não elegia um presidente desde os idos de 1993.

Eis-nos, pois, perante um flagrante caso de aproveitamento político daquilo que, durante décadas, os adversários derrotados vieram fazendo muito antes de nós.

Além do mais, não será despiciendo perguntarmo-nos até que ponto será necessária a elevação a cidade para que uma terra progrida, tendo em conta os casos, entre outras, das vilas de Cascais e de Oeiras, caracterizadas pela teimosia em permanecer vilas sem que tal haja, aparentemente, beliscado, mesmo ao de leve, a sua fulgurante expansão e projeção internacional nas áreas que lhes são de interesse.

Não terá, então, a evolução de uma vila muito mais a ver com a competência e dedicação dos seus autarcas do que com os títulos, com os estatutos a que procura ascender? Sobretudo quando a proposta do PCP de realização de um referendo municipal sobre o assunto foi preterida pela da maioria que impõe que a candidatura a cidade avance, quer a população queira, quer não.

Vamos, assim, ter a Cidade de Vila Viçosa, uma gota de água quando comparada com as cidades de Nova Iorque, de São Paulo, de Tóquio, de Paris e, mesmo, do Porto ou de Lisboa, num país que, de tão ridiculamente pequenino que é - mais nas mentalidades do que no território - até tem cidades com menos de 2000 habitantes, graças à demagogia de certos governos e à necessidade de rapar o tacho dos votos até gastar o teflon.

Auri sacra fames, o que importa é a captação de fundos*) para mais umas rotundas, uns parques infantis, enfim, para aquilo a que as mentes pequeninas chamam desenvolver o que resta das vilas históricas portuguesas, esquecendo-se - ou nem notando... - que, muitas vezes, desenvolver é sinónimo de estragar.

sexta-feira, 13 de maio de 2022


Lisboa a Quarenta à Hora


"O que, verdadeiramente, polui o ar as cidades é o constante pára-arranca, as horas esquecidas passadas nos engarrafamentos, o desespero de quem vê o tempo útil esvair-se enquanto procura, em vão, um lugar para estacionar"

"Nas horas de ponta, quando a poluição mais acontece,
quantas vezes ultrapassará os vinte ou trinta quilómetros por hora a velocidade de circulação?
"

"Tamanha e inane arbitrariedade, digna das mais abjetas ditaduras de extrema-esquerda,
demonstra bem que para, enquanto extremista, ainda mais se assemelhar ao "Chega!",
ao "Livre" apenas falta um ponto de exclamação ao nome acrescentar
"


Aliada aos maus tratos verbais recebidos - quer das bancadas das diversas assembleias ditas democráticas, quer de uma imprensa ávida de palavras fortes que vendam publicidade, quer, também, da ululante mole que, em manifestações sediças e rançosas a que já ninguém liga, faz coro com os dichotes cacafónicos expelidos por ferrugentos megafones -, a cada vez menos prestigiante imagem que, por muito boas razões, a generalidade da população tem da política e dos seus mais destacados agentes tem, como efeito imediato e indissociável, o progressivo desinteresse dessas andanças por parte de quem lhes poderia, ainda, emprestar uma réstia de credibilidade, de eficácia e de desinteressada dedicação.

O défice de formação, de educação e de conhecimento da natureza humana que encontramos nas hordas de filisteus que, cada vez mais, vão ocupando cargos eletivos nas diversas instâncias decisórias dos destinos da Nação amiúde os leva, por sua vez, a acreditar que, se os eleitores não agem da forma cívica como, ingénua ou desesperadamente, os políticos pensam que todos os cidadãos gostariam de se comportar, tal se deve à endémica falta de condições recorrentemente apontada como desculpa já mais do que esfarrapada para quando as coisas correm mal; ou, simplesmente, não correm, como acontece nas mais das ocasiões.

Deixaram-se, assim, certos executivos mais recentes da Câmara Municipal de Lisboa convencer, anos atrás, de que a solução para certos males que apoquentam os alfacinhas e os envergonhavam e envergonham lá fora seria uma vistosa sementeira de ciclovias na Cidade das Sete Colinas, elevações estas que poucos ciclistas teriam apetência ou, até, capacidade para subir a pedalar.

No imaginário destas pessoas, de um momento para o outro os automóveis passariam a ficar na garagem, à porta de casa, ou, pelo menos, nos parques dissuasores da periferia; a circulação tornar-se-ia fluída; o estacionamento, acessível por toda a cidade; o ar, cristalino e límpido por toda a parte; e Lisboa tornar-se-ia um paraíso para os habitantes e para os exércitos de turistas que a vêm financiar.

Ora, como o português quer saber é dele mesmo e o carrinho porta-a-porta é requisito indispensável, não só àquilo que considera qualidade de vida, mas, tal como a piscina no relvado da vivenda decorada com águias ou leões, aquilo que lhe dá um status, um mais do que parolo pseudo-estatuto social, o bom resultado foi, já se sabe, o de sempre: nenhum.

- x -

Acontece, porém, que aqueles dos autodenominados políticos que não passam de impreparados e ineptos indivíduos não entendem estas coisas. Embasbacam-se, incrédulos, quando lhes dizem que o problema da boa gente lusitana não é tanto a falta de meios ou de condições, como a imensa e já estrutural falta de formação, de educação e de conhecimento da natureza humana, a mesmíssima que afeta os ditos decisores que o são apenas por estarem inscritos num ou noutro partido, por outro modo de vida não lhes terem conseguido arranjar.

Vai daí que a solução para povoar as até então ineficazes ciclovias de Lisboa passou a ser - pasme-se! - semear ainda mais algumas destas ineficazes ciclovias de Lisboa, desta vez pondo-lhes mesmo ao lado bicicletas elétricas, a fim de procurar convencer a utilizá-las quem por esses montes e vales se recusava a pedalar.

Começou, por isso, Lisboa a encher-se de ciclistas, e a ver automóveis e motorizadas desaparecer do horizonte visual e olfativo das aflitas e intoxicadas famílias da Capital? Claro que não!

O trânsito continuou caótico, nauseabundo, às zonas de estacionamento verde, amarela e encarnada vieram juntar-se a castanha e a negra - penso que, tal como operação militar especial, o termo negra ninguém irá censurar...*) -, e, tal como dantes, os níveis de poluição não param de aumentar.

Não deixa de ser verdade que, principalmente nas horas de ponta, lá circulam por essas dispendiosas ciclovias uns quantos cidadãos. Circulam, mas de forma não controlada nem fiscalizada. Circulam, mas caótica e irresponsavelmente saindo das ditas vias e pedalando sobre os passeios, ignorando semáforos, atravessando artérias à toa, assim pondo em risco a segurança dos transeuntes, às mãos e aos pés de absolutos ignorantes das disposições do Código da Estrada, que nem exame de código necessitam de fazer, para mais os atrair para cima da miraculosa e impoluta bicicleta. Para facilitar...

Feitas as contas, evidente se tornou, pois, a inutilidade de andar por aí a espalhar mais um ror de ciclovias numa terra cujos habitantes não gostam, nem alguma vez irão gostar, de pedalar.

- x -

Chegado a esta conclusão, o irresistível e inigualável prazer que o Partido da Maioria Absoluta parece experimentar sempre que estende a mão à já irrisória extrema-esquerda portuguesa redundou, uma vez mais, numa demonstração da brilhante e fulgurante demagogia a que o Partido Socialista há muito nos vem a habituar: reduzir em mais dez quilómetros por hora a velocidade máxima de circulação automóvel em Lisboa*).

Do ponto de vista da despesa, a ideia é genial, já que o custo é praticamente nulo, além de uma ou outra campanha na comunicação social. Fora isso, poucos são os sinais de trânsito que terão de ser alterados, já que se trata de uma medida de aplicação genérica, e não pontual. Assim, quando se constatar que foi mais uma ideia abstrusa que fracassou perante a monolítica falta de educação e de consciência social dos destinatários, pelo menos ninguém poderá assacar à insignificante força política proponente denominada "Livre" qualquer responsabilidade pelo custo; ou, se alguém o fizer, ela facilmente a descartará.

Mas, por que é, afinal, que a medida vai falhar?

Muito simplesmente porque, como qualquer um entende, a maior parte da poluição saída do tubo de escape não ocorre quando um veículo circula a uma velocidade estabilizada, como acontece em horas de baixa densidade de tráfego, seja essa velocidade de quarenta, de cinquenta ou, até, de oitenta quilómetros por hora: o que, verdadeiramente, polui o ar as cidades é o constante pára-arranca, as horas esquecidas passadas nos engarrafamentos, o desespero de quem vê o tempo útil esvair-se enquanto procura, em vão, um lugar para estacionar.

Quantas vezes ultrapassará os vinte ou trinta quilómetros por hora a velocidade de circulação nas horas de ponta, quando a poluição mais acontece? Nessas horas em que o ar se pinta de partículas castanhas e cinzentas enquanto os motores queimam, inutilmente, preciosas toneladas de combustível perante a impotência e incompetência camarárias para fazer face ao comodismo e à falta de educação de quem, tendo alternativa, por aí anda a circular?

- x  -

Por falar em alternativa, a alternativa disponível ao Estado e à Autarquia para por termo a este lastimável estado de coisas seria, como todos sabemos, dotar a Cidade de uma rede de transportes públicos digna desse nome. Uma rede atrativa, económica, confortável, eficiente e digna de todos os encómios que cada um de nós gostaria de lhe poder associar.

Em vez disso, e porque estas coisas são caras, levam tempo, Roma e Pavia não se fizeram num dia e toda a lista de argumentos à disposição do mamute socialista de cuja cultura é característica essencial o bem típico hábito indígena de procrastinar, temos uma rede de autocarros lenta, aborrecida, atrasada, entediada, onde abanam ao sabor das curvas milhares de portugueses que nem um carrito hiper-usado têm dinheiro para comprar, porque, se tivessem, seria nele que se iriam deslocar; e uma rede de metropolitano que, comparada com outras europeias mais parece a de um comboio de brincar. Da rede de amarelos da Carris que ficam horas parados na calçada para não arrancar o farolim de trás de um selvagem mal estacionado, nem vale a pena falar.

Os táxis, os ubers e quejandos estão pela hora da morte e poluem tanto como qualquer outro automóvel, pelo que nenhum bem a este quadro negro vêm acrescentar.

- x -

O partido extremista que propôs e, sabe-se lá como, fez o pusilânime Partido da Maioria Absoluta aprovar a ridícula e aberrante medida de reduzir ainda mais a velocidade em Lisboa, tem a liberdade no nome, mas não no coração. Tamanha e inane arbitrariedade, digna das mais abjetas ditaduras de extrema-esquerda, demonstra bem que para, enquanto extremista, ainda mais se assemelhar ao "Chega!", ao "Livre" apenas falta um ponto de exclamação ao nome acrescentar.

Qual partido de extrema-direita, não hesitou o suposto "Livre" em fazer limitar, ainda mais, aos lisboetas a liberdade e a fluidez de circulação nas horas menos complicadas, unicamente a troco da fútil esperança num protagonismo desbragado que redundasse num magro punhado de votos numa próxima eleição, e em nada contribuindo para melhorar a situação nas horas de ponta em que os trabalhadores deixam as suas casas e a elas regressam depois, com as paciências esgotadas e ansiosos por, finalmente, repousar.

A moda, tida por politicamente correta por quem apenas a sua paróquia governa, de aproveitar o mais ínfimo pretexto para, por medo da crítica ou por mais ou menos inconfessável interesse, impor, aos veículos motorizados, reduções drásticas na velocidade de circulação conduz, por vezes, a aplicações tão excessivas e descabidas que acabam por tornar o politicamente correto em eleitoralmente perigoso, dada a desrazoabilidade ou mera inutilidade das decisões tomadas, bem como o manifesto desequilíbrio entre os interesses em presença.

A bárbara redução do limite de velocidade nas cidades não é, seguramente, o caminho adequado à resolução dos prementes problemas da circulação automóvel, do estacionamento e da poluição atmosférica.

Para os eleitores, a resposta está em encontrar quem saiba, queira e tenha a coragem necessária a implementar uma eficaz, eficiente, económica e confortável rede de transportes públicos que, efetivamente, incentive a imobilização do parque automóvel por parte dos habituais utilizadores.

Como tão providencial criatura parece inexistir no qualitativamente muito limitado recheio das forças políticas atuais, inevitável se torna que despropositados cuidados paliativos como este se tornem irresistíveis para os mais incompetentes daqueles que se dedicam à governação.

Para os lisboetas, para os portugueses, os problemas do trânsito nas cidades continuarão, assim, sem solução.

Tal como o problema da poluição...

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quinta-feira, 5 de maio de 2022


A Inenarrável Conferência das Laranjas


"Seja qual for o ponto de vista de onde olhemos a questão, mostra-se desrazoável classificar
como "excelente" o desempenho da maior fatia dos docentes - ou de quaisquer outros trabalhadores"

"Pensará a dita personagem que os professores dignos de ser assim chamados encaixarão, de ânimo leve,
o insulto à respetiva lucidez e capacidade de análise, por parte de quem a eles acaba por, indelevelmente,
colar a imagem de um discurso primário como este, sem qualquer base científica em que se arrimar?
"

~Exemplo de Demagogia
Quando nos pedem um exemplo de demagogia, acabamos, quase invariavelmente, por falar do discurso deste ou daquele dirigente partidário, de qualquer quadrante político, que, com o intuito de impressionar o auditório - leia-se, "o eleitorado"... - ilustra a parlenga com supostos casos práticos de substância nenhuma, mas de forma suficientemente barroca e prenhe de aspetos mais ou menos folclóricos para fazer emergir sentimentos, sejam eles de aquiescência ou de aplauso, de mágoa ou de indignação.

Nesta arte, atrás dos dirigentes políticos não ficam, seguramente, os sindicais, do que é exemplo recente o Coordenador do Sindicato dos Professores da Região Centro, Conselheiro Nacional e Secretário-Geral da Federação Nacional dos Professores (como esta gente gosta de títulos compridos e pomposos!...), Dirigente da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública e Membro do Conselho Nacional e da Comissão Executiva da CGTP-Intersindical Nacional.

Talvez para fazer crer aos mais distraídos que alguma chama ainda arte no cada vez mais enfezado Partido Comunista Português (PCP) - que, todas estas importantes e representativas estruturas, agora na quase clandestinidade lá vai continuando a manipular -, decidiu o pugnaz e pertinaz dirigente proceder, em conferência de imprensa, a uma chaboqueira demonstração das limitações e da ineficácia do Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho da Administração Pública (SIADAP) e do pauperismo a que, do seu ponto de  vista, ela condena os profissionais representados pela Federação que dirige, demonstração essa que, antes de continuar a leitura, recomendo ao caro Leitor que aqui não deixe de apreciar.

Além de ter decidido enveredar, na apresentação, por ações tão violentas como o partir pratos em público - atitude surpreendente vinda de alguém afeto a uma estrutura tão pacifista como o PCP... -, recorreu o distinto conferencista a uma indescritível demonstração baseada em três pratos de laranjas pelos quais espalhou uma amostra de quinze delas.

Atribuiu-as desta forma: ao primeiro prato, sete peças de fruta; ao segundo, "por exemplo, sei lá", cinco; e, ao terceiro, "vamos admitir" três. Tudo muito cândido e descontraído, como se do mais natural do Mundo se tratasse.

O senão desta aparentemente improvisada e ingénua distribuição reside, todavia, no facto de, ao primeiro prato, ter feito corresponder a quantidade de docentes que, na amostra, seria classificada com excelente (sete); ao segundo prato, a que obteria muito bom (cinco); e, ao terceiro, quem teria obtido, apenas, bom.

- x -

Dois vícios lógicos e objetivos logo saltam à vista, por dizerem bem do descoco com que estas demonstrações são feitas, e da irremediável fragilidade de uma argumentação eivada, quer de insanável erro no pressupostos de facto, quer de notório e despudorado viés.

O primeiro vício consiste na patente falta de correspondência, com a realidade, dos pesos atribuídos a cada classe, já que, seja qual for o ponto de vista de onde olhemos a questão, se mostra desrazoável classificar como "excelente" o desempenho da maior fatia dos docentes - ou de quaisquer outros trabalhadores, o que, entre outros males, desde logo desvirtuaria o próprio conceito de excelência.

Excelència é a qualidade daquele que se destaca dos restantes, do quase perfeito, do virtualmente inigualável, definição universalmente aceite e que, inquestionavelmente, pulveriza qualquer tentativa de vulgarização em que se procure confundir tão raro e sublime nível de desempenho com outro de mera normalidade.

Por muito bom se designa, por sua vez, aquele que se não limita a demarcar-se, em algum grau, do normal - como acontece com o simplesmente bom -, mas que, embora sem atingir um patamar de excelência, o faz de forma suficientemente expressiva para merecer que o adjetivo qualificativo seja elevado a um grau superlativo - o que também pressupõe uma escassez assinalável, na medida em que se aproxima do topo da escala.

Por si só, este escalonamento tornaria evidente que, a menos que passemos a atribuir, a excelente e a muito bom, os significados quase opostos dos atuais, a distribuição proposta na conferência de imprensa é, meramente, anedótica e pensada para consumo de pessoas suficientemente elementares para, com tamanha parvoíce, não ficarem incomodadas; não, seguramente, para docentes dotados do sentido crítico indispensável a quem trabalha para um ministério que se propõe educar.

Como se não bastasse a pouco invejável fase que a nobre profissão atravessa - com uma carreira que se afigura pouco motivadora para aqueles que, com qualidade, brio e dedicação a exercem -, pensará a dita personagem que os professores dignos de ser assim chamados encaixarão, de ânimo leve, o insulto à respetiva lucidez e capacidade de análise, por parte de quem a eles acaba por, indelevelmente, colar a imagem de um discurso primário como este, sem qualquer base científica em que se arrimar?

Ter-se-á, outrossim, o improvisado comediante esquecido de incluir os pratos de laranjas correspondentes às restantes três classes do SIADAP: suficiente, medíocre e mau? Ou será que a qualidade dramaticamente elementar da aprendizagem manifestada pelo ror de alunos que acaba, quase analfabeto, o ensino secundário permitirá, paradoxalmente, concluir que não existem, em Portugal, professores com desempenhos suficientes, medíocres e, muito menos, maus?

Considerará a dita pessoa ter, com tão triste espetáculo, prestado um serviço útil e digno aos seus representados, cuja inteligência, afinal, ali apenas foi, de alguma forma, insultar? Ou serão os argumentos disponíveis tão escassos e débeis que se torne necessário atirar para a frente com o folclore para, em desespero de causa, tentar impressionar? É, pelo menos, a ideia com que se fica, queiramos ou não...

Ou tratar-se-á, mais simplesmente, do reconhecimento da completa incapacidade para, de forma minimamente elaborada, sobre esses argumentos discursar?

Tendo presente que "a qualidade da expressão verbal consiste em ser claro sem cair na banalidade", a ser a última a razão, a situação reveste-se de singular gravidade, dado que tal incapacidade comunicacional residirá em alguém que, não nos esqueçamos, além da tal lista de pomposos cargos é, também, professor. Ou foi? Ou já se esqueceu de que foi?

Que exemplo dá aos alunos um docente que se vê forçado a recorrer a um espetáculo destes, que muitos eles não deixarão de ver, para fazer passar uma mera reivindicação salarial?

Que classificação ser+a de atribuir ao desempenho de um comunicador destes, que prefere refugiar-se na vulgaridade de quem entende que o gesto é tudo, a primar por alinhar devidamente as ideias e, de forma articulada e minimamente elegante, com elas saber impressionar?

Suficientemedíocre ou... mau?

* *
Bem, mas isto é nada, quando comparado com a epidemia de palavrões - ou de um certo palavrão - que por aí grassa graças a um desajeitado comentador da guerra, que não sabe quando deve ficar calado.

quarta-feira, 6 de abril de 2022


Luís de Camões


"Um rei fraco
faz fraca a forte gente
"

Luís de Camões*)              
(Lusíadas, III 138)                       


Referia-se o Poeta a Dom Fernando I*), no tempo em que o poder executivo se encontrava nas mãos do monarca, e não nas do chefe do governo.

Naquele tempo, não existiam eleições; tampouco partidos políticos aos quais, na sequência de indesejáveis resultados daquelas, o rei tivesse de se coligar, ficando refém de cedências desmesuradas e fortemente lesivas do interesse nacional.

Naquele tempo, também havia, por toda a parte, escaramuças, guerras e invasões; mas, dominada pelo soberano, a população que aguentasse os impactos bélicos, políticos, sociais e económicos, já que outro remédio não tinha, e a vida  fácil não passava de uma ilusão.

Naquele tempo, existiam ainda mais pestes e pragas sanitárias; mas o incipiente estágio da medicina pouco ou nada permitia fazer para as controlar, pelo que, sob esse aspeto, pouco importava se o rei era forte ou fraco, competente ou não, já que impotente seria, certamente, para resolver problemas de tamanha dimensão.

Naquele tempo, não havia, liberdade, direitos humanos, e eram muito elementares a justiça, a educação e os outros pilares de uma democracia então inconcebível, e da qual, hoje, muita gente não tem a mais ínfima noção.

Hoje, sabe-se que todas estas novidades existem; e que, mesmo em detrimento da ordem pública e da paz social, muito tuga que por aí anda delas chorudos proventos procurará extrair, em lugar de pensar como poderá assegurar o respetivo gozo aos concidadãos.

Hoje, depois dos brutais impactos recentemente sofridos, há fundos europeus generosamente distribuídos em volume suficiente para, não apenas procurar minorar os efeitos daqueles, como para proporcionar oportunidades únicas de suster o nosso já proverbial trambolhão económico, seja absoluto, seja relativo face aos parceiros da União.

Hoje, mais do que nunca, tornou-se de suma importância, para o Estado, ter ao leme um primeiro-ministro que seja, não apenas popular, habilidoso e flexível, mas, pelo menos, um gestor convincente, recrutador eficaz, estratega competente, administrador incorruptível, educador culto e informado, legislador experiente.

Hoje, como naquele tempo, um governo chefiado por alguém ideologicamente débil, politicamente elástico, gestor inseguro, justiceiro complacente, comunicador fechado, planeador disperso, andarilho ausente, apenas faria ainda mais fraca a nossa cada vez mais fraca gente.

quarta-feira, 23 de março de 2022


Paulo Portas

Paulo Portas

"
Quando se pretende ser tudo e o contrário de tudo,
não se acredita em nada.
É essa falta de fé no mais pequeno valor
que faz a miséria moral de muitas democracias modernas
"

Paulo Portas*)              
(O Independente)                  


A crescente tendência para navegar sem carta, sem bússola, sem planear, ao sabor do vento, das conveniências, da popularidade, da notoriedade e do desenfreado culto do eu conduziu a Humanidade ao beco sem saída à vista em que todos nos encontramos, situação em que a maior parte continua a preferir não pensar ou, em estado de negação, rejeita encarar com a coragem necessária a procurar reverter.

Os governos e os políticos que os integram limitam-se a fugir para a frente, para um destino desconhecido*), ou adivinhado e temido, que pouco ou nada fazem para evitar ou para dele nos defender. Cada vez mais, vamos ficando nas mãos de meros e anódinos administradores do inevitável, do que tem de ser, que pelos corredores do poder deambulam ao ritmo das aparições na televisão e dos posts nas redes sociais, promovendo-se o melhor que podem para que, pelo menos, quando saem desta mirabolante confusão algo de seu ou para contar ainda possam vir a ter.

Por seu turno, o iludido, manipulado, pouco instruído e mal educado eleitor lá vai votando*), a esmo, em quem lhe parece mais espetacular, quem faz mais barulho, mais promessas, na esperança de que quem hoje vota delas amanhã se irá esquecer.

O cenário está montado para que emerja desta amálgama, deste caos, mais um ditador de pantomina, ávido de riqueza pessoal e de poder, envolto numa aura de respeitabilidade e de resplandecente fulgor que, de início, os pacóvios que somos irá deslumbrar, para, mais tarde e como sempre, amargar num regime autocrático de sofrimento, de pobreza, de tirania, de insuperável torpor, de excruciante dor.

* *

As portas para a entrada da ditadura estão escancaradas, dados o desnorte e a inabilidade política por parte da maior parte dos partidos que nos deveriam representar.

(leia aqui o desenvolvimento)



quarta-feira, 19 de janeiro de 2022


André Ventura

 


"O que é que vale mais:
a vontade do povo português,
ou a Constituição da República?"

André Ventura*)     
(Entrevista à RTP - 01.12.2001)


Não entenderá o Presidente eleito e, regularmente, auto-demitido e reeleito do Chega! que, numa democracia representativa - cuja verdadeira natureza, apesar de se apresentar a eleições, parece ter significativa dificuldade em entender -, a vontade do povo se encontra plasmada, acima de tudo e antes de mais, na Constituição da República?

Doutorado que é em direito, não se aperceberá de que a alarvidade que disse equivale a perguntar se vale mais a vontade de roubar do que as disposições penais que tal ato proíbem?

Que tipo de gente insistirá, tendo alternativa, em confiar o voto a alguém com pensamentos como este, subversivos da ordem pública, da paz e da estabilidade que a todos são essenciais e estruturantes da vida em sociedade?

Poderá, por mero capricho, um cidadão ou grupo de cidadãos fazer, impunemente, prevalecer os ditames da sua vontade à letra da lei ou do próprio Texto Constitucional?

- x -

A prática política e as sucessivas declarações do mesmo género permitem excluir que se tenha tratado de um lapso - aliás sempre deslocado em pessoa de tão viva e aguda inteligência. A enormidade da ideia contida na pergunta não pode, assim, deixar de suscitar as mais sérias dúvidas quanto à verdadeira motivação do Autor ao deixar o Partido Social Democrata para fundar o Chega!.

Este partido é, inegável e assumidamente, nacionalista e de extrema-direita. Mas, sê-lo-á, também, o seu Fundador? Até que ponto poderá um outrora quadro destacado de um partido democrático inverter, no seu íntimo, de forma tão fraturante e do dia para a noite, o seu posicionamento político?

Qualquer pessoa, para ser eficaz, tem de acreditar naquilo que faz. Qualquer político, para ser eficaz, tem de acreditar naquilo que diz.

Perante os resultados até agora conseguidos e com tamanha rapidez, dificilmente poderá considerar-se ineficaz o Presidente do Chega! Ficam, no entanto, as perguntas: quais serão os seus verdadeiros propósitos? Estará, afinal, a ser eficaz em quê?

Será, como se apresenta, um genuíno radical, empenhado em defender uns estranhos, aberrantes, anquilosados e patéticos ideais?

Será, quem sabe, um genuíno democrata que terá, em dado momento, decidido manipular uma crescente mole humana que ia surgindo na extrema-direita, inicialmente com um discurso firme e agressivo para depois, insinuando-se junto do PSD, a neutralizar?

Será, como alguns pretendem, um mero oportunista sem escrúpulos, um perigoso ditador unicamente interessado na exaltação da própria imagem e na rápida ascensão ao exercício do poder - eventualmente como ministro da justiça... -, manipulando e usando tudo e todos ao serviço desse desiderato?

Pouco importa, de facto.

Do que não pode haver dúvida é de que se trata de uma personagem de ambiguidade perigosa, politicamente escorregadia, despudorada e subversiva a ponto de insinuar que deve a vontade do legitimamente descontente povo português sobrepor-se, por ilegítima, antidemocrática e injustificada ação direta, aos preceitos que essa mesma vontade popular, expressa no voto, na Constituição fez plasmar.

Preside, assim, a um partido que dói ver merecer um lugar no boletim de voto da supostamente democrática eleição de quem nos irá governar.


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sábado, 8 de janeiro de 2022


O Português não Gosta da Democracia

"Se a educação é a matéria-prima da democracia, o voto é a estrutura, o que lhe dá forma. Quando a maior parte dos cidadãos com capacidade eleitoral repudia o direito ao voto, deixamos de estar numa democracia, deixamos de ser, efetivamente, governados pela vontade popular"

"Não ir votar, podendo fazê-lo, é um claro sinal, não apenas de egoísmo, mas de estupidez, de boçalidade, de iliteracia. Não importa quantos canudos em casa se tenha, nem quantas loas se cante ao sublime ideal da democracia"


Democracia - Regime
No momento em que rabisco estas linhas que vêm na sequência do texto do passado Sábado*), reza a Wikipedia que "Democracia *) é um regime político em que todos os cidadãos elegíveis participam igualmente — diretamente ou através de representantes eleitos — na proposta, no desenvolvimento e na criação de leis, exercendo o poder da governação através do sufrágio universal".

Goste-se ou não da Wikipedia, olhemos, ou não, para ela como um referencial com algum rigor e a possível validação, será difícil negar que a definição é admirável em toda a sua simplicidade, clareza e precisão.

Aplicada ao caso português, onde vigora uma democracia representativa, significa ela que o regime, o Estado, as pessoas, nós, todos esperam que decidamos, através do voto popular universal, a quem iremos conferir mandato para tão importantes funções.

Voto universal, mas não de todos. Dantes, porque nem todos tinham o direito de votar, agora, porque apenas o exercem aqueles que se levantam da poltrona para o fazer; e são cada vez menos, como insistem em fazer-nos ver os números da abstenção. A COVID não é desculpa, a partir do momento em que quase todos fazem a sua vida normal, e tanta gente por aí anda em grandes eventos desportivos e outros de muita animação.

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Embora as circunstâncias e a legislação de então fossem outras, comparando os 16,7% da taxa de abstenção nas eleições de 1976 com os 51,4% das mais recentes, em 2019*), poucas dúvidas podem restar quanto à atual falta de empenhamento da maior parte dos possíveis votantes em cumprir o dever cívico que sobre eles impende.

Paradoxalmente, nada impede quem não vota de não parar de reclamar, depois. É vê-los, por tudo e por nada, lastimar-se de violações de direitos, liberdades e garantias que, num regime político não democrático, muito dificilmente veriam reconhecidos, mas que nem mereceram o imenso incómodo de uma deslocação a uma assembleia de voto. Mesmo agora, que nem é época de passeatas ou de mergulhos no mar.

Nada disto é novo e, se nada for feito - mas, o quê?... -, chegaremos a um ponto em que não haverá retrocesso, já que a situação não parará de se agravar.

Intelectualmente menos provido
Mesmo antes de chegar esse dia, não custará ao mais desatento ou intelectualmente menos provido entender que, com tanta gente a demitir-se daquilo que, por qualquer concidadão, lhe é legitimamente exigível para que o sistema funcione - o tal sistema de que todos se queixam... -, os resultados eleitorais se tornam cada vez mais vazios de conteúdo: cada vez mais não correspondem à efetiva vontade coletiva da população, sendo a cada dia maior o risco, ou a certeza já, de que, se a taxa de abstenção voltasse aos tais 16,7%, a composição da Assembleia da República seria bem diferente, e até o governo poderia, à direita ou à esquerda, ficar em diferentes mãos.

Se a educação é a matéria-prima da democracia, o voto é a estrutura, o que lhe dá forma. Quando a maior parte dos cidadãos com capacidade eleitoral repudia o direito ao voto, deixamos de estar numa democracia, deixamos de ser, efetivamente, governados pela vontade popular.

Cada vez mais, os chamados eleitores, não o são, não votam: preferem ficar em casa a ver, na televisão, o que resultou  do voto dos que, por eles, assumiram a responsabilidade por uma escolha que os primeiros olham, afinal, com a mesma importância, interesse e dignidade que a votação de um festival da canção ou evento similar.

Esquecem-se de que não ir votar, podendo fazê-lo, é um claro sinal, não apenas de egoísmo, mas de estupidez, de boçalidade, de iliteracia. Não importa quantos canudos em casa se tenha, nem quantas loas se cante ao sublime ideal da democracia.

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Assentemos, pois, em que a maior parte dos cidadãos portugueses não gosta da democracia; ou, pelo menos, não respeita a democracia. De que gosta, então?

O Partido Chega! sabe-o bem, como bem o sabe o seu Chefe Máximo. Os portugueses gostam, de facto, é daquilo que os faz transferir a escolha diretamente de decadentes e não democráticos partidos de extrema-esquerda ou de partidos maiores e ainda ditos democráticos mas minados por uma imparável tendência para a corrupção -, para incipientes e não democráticos partidos de extrema-direita. Assim, de repente, de uma vez só, como há dois anos aconteceu*) e se prepara para, ainda com maior e mais preocupante expressão, voltar a acontecer.

Não será despropositado lembrar as sábias palavras de quem disse que "um governo seria eterno com a condição, de todos os dias, oferecer ao povo um fogo de artifício, e à burguesia um processo escandaloso". Qualquer político português que prefira esta receita às tradicionais longas e sofisticadas parlengas que ninguém ouve ficará cada vez mais próximo de ganhar uma eleição.

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Partido Chega!
Mas há mais quem saiba do que gostam os eleitores portugueses: o presidente do partido em que o chefe do Chega! anteriormente militou.

Nada tendo, decididamente, a ver com qualquer coisa que se pareça com a extrema-direita, o Presidente do PSD há muito aprendeu que aquilo que, noutras terras, se exprime pelo equivalente à palavra portuguesa demagogia corresponde ao muito nosso conceito de democracia. Essa democracia desiludida, trôpega, quase inerte, que se arrasta sob a alçada de políticos de missão indefinida que procuram, a todo o custo, manter-se alcandorados num poder que de competência e de autoridade pouco ou nada já tem.

Bem o sabendo, optou o dito Presidente por um estilo de linguagem popularucho, por fazer comentários e observações de cariz quase populista com uma ou outra gafe à mistura; por apresentar, ainda ontem, o programa eleitoral falando em estilo informal, espontaneamente, apenas com recurso pontual a tópicos; por recorrer à insinuação, por procurar estimular de qualquer forma as mentes atrofiadas dos tugas mais ávidos de escândalos e de fogos de artifício. É neles, e não nos eruditos e sofisticados -ólogos que, pouco sabendo do que vale a pena saber e nada sabendo do como chegar às massas, ganham rios de dinheiro para mutuamente se copiarem, comentando tudo e mais alguma coisa baseados, unicamente, na sua supostamente erudita mas raramente fundamentada opinião.

"The history of the World is the history of the triumph of the hartless over the mindless" e, neste cantinho da Europa, quem quiser, efetivamente, subir nas urnas há de cuidar de comprazer as hordas de medíocres que se deleitam com a desgraça dos outros. Há de tratar de cativar, sobretudo, essa gentinha inconsciente, oca, falha de ideais, de vontade, de interesse até pela identidade de quem decide o seu destino: essa gente do diz-que-disse e dos cochichos, que passa o tempo a criar formas de sujar o mais possível a roupa que o vizinho acabou de pôr a secar.

A educação e o ensino ministram-se em sede própria, e não em campanha eleitoral. Não é, assim, eficaz nem política ou economicamente razoável insistir em fazer uma campanha elaborada, sofisticada; deve, antes, ser vazia e barulhenta, vocacionada para uma mole humana que outra coisa não sabe apreender ou apreciar.

Isto, o Presidente do Chega! não tardou a entender e, dessa forma, lá vai, apesar da indisfarçável cacofonia e dos inconfessáveis ideais que as suas vibrantes palavras escondem, conseguindo algum ascendente num ou outro debate eleitoral.

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A propósito da insinuação há uma dúzia de dias feita pelo Presidente do PSD, de que a captura de João Rendeiro*) na África do Sul estaria, de alguma forma relacionada com a proximidade do ato eleitoral que se avizinha e, implicitamente, com a necessidade de o Governo apresentar resultados que facilitem a reeleição, contra o dito Presidente muita gente se insurgiu; e com razão, já que a insinuação não tinha em que, racionalmente, se sustentar. Mesmo que tivesse, seria praticamente impossível de provar - apesar de, se a juntarmos ao mais recente e tão oportuno sucesso na aprovação do plano de recuperação da eterna TAP, alguns maldizentes poderem começar por aí a sussurrar...

Houve, no entanto, quem chegasse ao ponto de vaticinar que, com essa atitude, teria o Presidente condenado o PSD à derrota no ato eleitoral.

Não sei como: pois não são, precisamente, as insinuações torpes e escandalosas que fazem viver, que fazem vibrar as hostes eleitorais portuguesas? Não é a trampolinice, a acrobacia fácil, a desfaçatez além do admissível que granjeia simpatias? Que as atrai muito mais facilmente do que belas promessas que todos sabem falsas, pouco sinceras e muito provavelmente inexequíveis?

Quem acredita, ainda em programas políticos jamais cumpridos, em promessas vãs papagueadas ao vento, em palavras de ordem sem sentido, desordenadas, desconchavadas? Pois não são os sound bytes, as bocas muito mais giras, muito mais engraçadas? O tipo até tem piada, aquele é que sabe! Chegou para eles! Este é que vai ! Vamos votar nele. Bora lá!

Acaso não é o folclore político que enche os noticiários, as páginas dos jornais? Quantas ideias dignas desse nome fazem ir às urnas aquela massa caótica e inerte de espetadores passivos e maldicentes apenas ansiosos por ler ou ouvir destratar ou maldizer?

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Não, o PSD não perdeu, naquele dia, as eleições. As pouco elegantes charlas do seu dirigente máximo, o seu quiçá enganador à-vontade, o seu premeditado estilo popularucho, alternando com uma ou outra pose mais formal, são a receita ideal - para não dizer a única exequível - para garantir uma vitória eleitoral nesta terra de eleitores ignorantes, sós, desiludidos, tristes e macambúzios que dão tudo por uma por uma vitória, mesmo pírrica, do clube, do partido, seja lá do que for. Até, por uma piada ordinária, sem graça, partilhada numa rede social qualquer, que, por uns segundos, pelo menos, os faça sorrir.

Se o Partido não ganhar, será por pouco. Talvez, até, por muito pouco. Os votos que perder não serão, seguramente, por inabilidade política, já que a habilidade dos outros, mesmo a do mais habilidoso, é isto que se vê.

Serão, quando muito, esses votos perdidos os daquela meia dúzia que ainda reage mal à demagogia.

Serão, enfim, os dos cada vez menos portugueses que com a vacuidade se arrepiam, e que verdadeiramente, respeitam e honram a democracia que todos dizem defender.

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quinta-feira, 6 de janeiro de 2022


Negacionistas - Juiz ou Médico: o que É pior?

Definindo de uma forma muito simples, negacionismo é uma forma básica, boçal, rudimentar, elementar de rejeição da mais evidente e clara razão.

Para a condenação de tal teoria e da correspondente prática, releva, assim, da mesma forma a atuação de um magistrado judicial que negue a existência de uma pandemia, como a de uma médica que ensine a manipular testes*) por forma a que produzam resultados negativos em doentes infetados.

A atuação da médica é, no entanto, bem mais grave, roçando a do próprio homicídio com dolo eventual: é que, enquanto o juiz negacionista incitava ao incumprimento da lei, a médica ensinava a falsificar testes cujo resultado manipulado permitirá a indivíduos infetados andar por aí a espalhar o virus, transmitindo-o a eventuais futuras vítimas, designadamente mortais.

Como explicar, então, que o juiz tenha sido expulso da magistratura pelo Conselho Superior - e muito bem! -, enquanto a médica apenas foi condenada, pela Ordem a seis meses de suspensão*), reduzidos a três em sede de recurso?*)

Que matéria de direito terá prevalecido? Que influência?

Que corporativismo desbragado?

* *

O suposto liberalismo dos defensores da abolição da máscara não passa, muitas vezes, de encapotado negacionismo, perante uma realidade bem presente como é a COVID-19.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022


Jerónimo de Sousa

Jerónimo de Sousa


"O capital não só não tem pátria, como não tem sentimentos, é amoral, e a sua lei suprema é o lucro"

Jerónimo de Sousa*)  
(em Comício)                 
             

Diz isto, ao mesmo tempo que, supostamente, defende o apoio do Estado às pequenas e médias empresas, as mais numerosas representantes do famigerado capital - e que, a propósito, dão emprego à esmagadora maioria dos trabalhadores portugueses. Será que já ninguém tem sentido crítico, no Partido Comunista Português (PCP), para lhe dizer "Olhe lá, Camarada, não é bem assim!", ou já só quem tem patine é que por lá ainda pode opinar?

Ninguém há que lhe diga que, por muito espontâneas, comoventes e emotivas que possam ser, as generalizações baratas nem sempre são muito recomendáveis? Que lhe diga que capital é sempre capital, independentemente da dimensão e das intenções e idoneidade dos seus detentores?

Com cantilenas profundamente eleitoralistas e demagógicas como esta, num país que, embora tímida e ineficazmente, lá vai, pelo menos, procurando enriquecer o nível de instrução dos eleitores, como espera esta gente cristalizada na memória do antigamente*) conseguir evitar uma votação cada vez mais humilhante nas sucessivas eleições? Atacando um imenso tecido empresarial que gera emprego, como irá convencer alguém de que defende os interesses dos trabalhadores?

A coisa está tão negra, que os comunistas de hoje já nem têm, como os de antigamente, a lata de, por muito que desçam, continuar a dizer, cada vez que perdem, que acabaram de ganhar...

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Independentemente das razões por que possa tê-lo feito, é impossível negar o contributo essencial que o PCP teve na motivação das ações que culminariam com a queda da ditadura em Portugal. No entanto, isso apenas adensa o mistério, torna mais patética a teimosia, quanto à insistência em continuar, num estado de negação dificilmente compreensível, a defender o indefensável, ainda que à custa de ter de rejeitar a mais clara evidência e a mais lúcida razão.

Aponta-se à Igreja Católica um indesejável alheamento da realidade ao insistir na difusão de aspetos mais anacrónicos da sua doutrina;  aponta-se, e penso que bem, já que todos os princípios, mesmo os mais sagrados, devem ser formulados - e, mais tarde, reformulados - atendendo ao tempo em que irão ser observados. Mas como explicar e legitimar, então, o ainda maior desfasamento, face à sociedade atual, da doutrina do PCP?

Pouco importando a forma mais ou menos hábil como o disfarçam os programas partidários, a doutrina comunista ortodoxa, propriamente dita, não se limita a sustentar a importância de defender os interesses das classes de trabalhadoras: isso, qualquer partido democrático, inevitavelmente, alardeia, sob pena de nele quase ninguém votar. O que distingue o comunismo puro é a proposta de que se defenda tais interesses pela força das armas, mensagem terrível que, admitamos, será, na sua plenitude, apercebida por muito poucos dos seus mais ingénuos e menos cultos eleitores. Muitos poucos deles quererão andar por aí, de arma em punho, a matar, a fuzilar: votam no Partido por não ver alternativa, por clubismo, ou pelo simples e nada esclarecido hábito de assim votar.

O PCP é, hoje, um partido anódino que tem na cada vez menos eficaz greve a principal forma de luta. Uma vez perdida a paciência ou confrontado com o fim inevitável, deixará, seguramente, de ter como único braço armado uma central sindical: não nos admiremos se a por muitos esquecida ARA (Ação Revolucionária Armada)*), ou alguma descendente mais preparada e sofisticada, vier um dia desestabilizar, ainda mais, este já tão desnorteado Portugal.

(continua aqui)

domingo, 2 de janeiro de 2022


60.000 Candidatos a Operador de "Call-center"


"Sessenta mil candidatos a bolsas de estudo receberam o pagamento relativo ao mês de Dezembro", ouvi há dias já não sei em que estação de televisão. Não sei se terão, também, noticiado os pagamentos relativos aos meses anteriores, nem se irão massacrar-nos com outras notícias igualmente desinteressantes nos meses que se seguem.

Não é novidade a figura ridícula de quem não tem notícias com interesse para dar, nem reportagens prontas para entrar no ar quando escasseia a matéria-prima das picardias políticas, dos fora de jogo que não eram, dos que eram e não chegaram a ser e das catástrofes que, felizmente parece que só acontecem por esse mundo fora. Mas mais ridícula tal figura se torna ainda por anunciar, como se de grande coisa se tratasse, algo que não passa de chamariz para o embuste em que continuam a cair os infelizes estudantes que, ou saem da universidade com notas altas - mesmo muito altas - e lá acabam por se orientar lá por fora, ou, com uma muito maior frequência e probabilidade, irão parar a um call-center, tábua de salvação para os que, simplesmente, tiveram aquelas notas que, não sendo excecionais, revelam, pelo menos, que andaram na escola a fazer o que se esperava que andassem a fazer.

Para estes, todos sabemos que, ao nível dos conhecimentos adquiridos, não existe emprego compatível para todos, ou, sequer, para a maior parte; muito menos, na respetiva área de formação. Mas, como é preciso mostrar números lá para fora, ninguém lhes diz que vão ficar atrasados na vida profissional indiferenciada em que outros começam a singrar e a ganhar o sustento antes deles: eles que correm desesperadamente pelo canudo que permitirá, um dia, aos babados e mais ou menos parolos mamãs e papás, convidar os vizinhos, parentes e amigos para uma grande festa, com um enorme bolo que diz: "Temos Doutor!".

Será esse, para muitos, o ponto alto da carreira académica. O derradeiro, também...

Em Portugal, "Licenciado", quer dizer "igual a todos os outros que se arrastam pelos call-centers", sonhando com a maravilhosa vida há muito imaginada... que jamais chegarão a ter.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021


João Lobo Antunes


João Lobo Antunes sobre a liberdade

"É mais fácil aprender as regras da democracia do que aprender a viver em liberdade"

João Lobo Antunes*)              
(Entrevista ao programa ´Por Outro Lado´ (RTP 1)

terça-feira, 21 de dezembro de 2021


Liberalismo ou Encapotado Negacionismo?

De entre tantos outros defeitos herdados da educação que recebi, ressalta o da convicção de que a nossa liberdade termina precisamente onde começa a dos outros. Ou, como já aqui citei, que "a única maneira de defender a liberdade é limitar a liberdade de cada um".

Corolário inevitável deste facilmente compreensível pressuposto, é que o liberalismo que extravasa a fronteira precisa em que entramos no domínio do interesse social legítimo dos nossos concidadãos não passa de incitamento à mais abjeta e caótica anarquia, ao primado do egoísmo e do egocentrismo, à irracionalidade de quem pretende, à viva força, que a liberdade individual de qualquer um - ao que quer que seja e por mais doentia e desvairada que ela seja - se sobrepõe, sempre e incondicionalmente, a qualquer esforço sério e socialmente legítimo do Estado de direito na defesa dos interesses da população.

Esquece-se, porventura, quem o defende de que, se ele e os outros acérrimos defensores circulam em segurança pela via pública e se sentem seguros nos seus lares, tal se deve à ação do Estado na perseguição, detenção, julgamento, condenação e - quando não os deixa fugir... - detenção de quem comete crimes, designadamente contra as pessoas e contra a propriedade, em tais atividades estando o mesmo Estado, afinal, a fazer precisamente aquilo que dele se espera e que é, ao fim e ao cabo, parte importante da sua razão de ser.

Olvidam, também, essas pessoas que, tal como a lei penal considera criminoso quem mata, quem fere, quem, de alguma forma, causa prejuízo grave a outrem, criminoso é, também, quem causa ou se arrisca a causar-lhe sério dano à saúde. Isto, seja o agente um mal intencionado e mal formado ser humano  ou um virus na sua atividade legítima e habitual.

Pretender, mesmo sem assumir contornos negacionistas, que cada indivíduo tem a liberdade de escolher ser vacinado ou não quando estão em causa a eficácia, a eficiência e, mesmo, a sobrevivência do Sistema Nacional de Saúde - não apenas no tratamento de doentes com COVID-19 mas no dos que padecem de qualquer outra doença - é ultrapassar todas as linhas encarnadas do que é natural, legítimo, razoável; é ultrapassar o mais liberal limite da própria definição de humanidade.

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Dar eco, como há dias deu o jornal Observador, a um arrazoado de infindáveis aberrações*) por parte de uma representante da assim chamada Oficina da Liberdade*) que sustenta que se torna cidadão de segunda quem vive em países que, à falta de alternativa, se vêem constrangidos, para evitar a propagação da pandemia, a decretar a vacinação obrigatória não estará, propriamente, a agir no exercício da liberdade de imprensa, antes talvez a propagar ideias perigosas, bem próximas de um acéfalo e parolo negacionismo e que, numa altura tão crítica para estas andanças como é a do Natal, se arriscam a prejudicar gravemente o mais legítimo e sagrado interesse nacional.

Pretender, por exemplo, que "por toda a Europa, parece renascida a ideia de que quaisquer medidas adotadas pelo poder político, em nome da saúde pública, são legítimas, mesmo que sejam absurdas, como é o caso da irónica divulgação de dados pessoais de saúde para aceder a um restaurante de fast food" diz bem da verdadeira natureza das ideias expressas, quando é certo e sabido que, para aceder a qualquer restaurante, basta apresentar um certificado digital a uma aplicação que apenas responde "Válido", sem especificar se o é por a pessoa ter contraído anteriormente a doença, por ter sido vacinada ou por qualquer outra razão admissível. Ou seja: sem revelar qualquer dado pessoal de saúde, mas apenas o estado de conformidade ou de inconformidade perante uma lei que vai de encontro ao mais básico e universal interesse nacional.

Como pode, de facto, alguém pretender que é do interesse ou do bem-estar de qualquer indivíduo estar permanentemente sujeito a uma contaminação potencial?  Como pode alguém de boa-fé alegar que a administração de uma vacina viola a dignidade humana? Ou que está a ser discriminado alguém impedido de entrar num restaurante por não apresentar a prova possível de que tudo fez para não contaminar outros?

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O apodado "certificado digital da discriminação" não passa de um "certificado digital da diferenciação", apenas condenável por aqueles que defendem a liberdade de tudo e a qualquer preço, não hesitando em, a contrario, violar a própria Constituição que dizem defender, já que insistem em considerar tudo igual a tudo. Mesmo ao que, manifestamente, por natureza ou por estado é tudo menos igual.

A manipulação da comunicação com os espíritos de leitores menos críticos ou menos preparados a troco de algo que, num tal quadro, poderá ser facilmente confundido como ânsia de protagonismo ou de promoção social ou profissional parece pouco prudente, nada profícua e, até, contraproducente para a imagem própria de alguém que ciosamente se possa estar a procurar promover ou socialmente alardear.

A defesa dos interesses e direitos de cada cidadão é fundamental para evitar abusos e desmandos como aqueles que durante décadas conhecemos em Portugal. Mas é pernicioso e atenta contra os mais elementares e nobres propósitos de qualquer organização societária insurgirmo-nos contra aquilo que, objetiva e fundamentadamente, a Ciência e os seus representantes consideram uma precaução essencial.

ª ª

No âmbito da defesa dos interesses e direitos, até que ponto será lícito o Estado conceder gratuitidade de tratamentos a pessoas que, simplesmente, se recusam a tomar as precauções consideradas essenciais a limitar a propagação da doença?

(continua aqui)

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021


Mark Twain


Mark Twain - Opinião Petrificada


"
A lealdade a uma opinião petrificada nunca quebrou uma cadeia ou libertou uma alma humana"


   "Loyalty to petrified opinion never yet broke a chain or freed a human soul"     

in "Consistency"  


Por certo algo em que os nacionalistas na extrema-direita e os comunistas na extrema-esquerda bem fariam em ter presente nas suas mentes cristalizadas e empedernidas, esquecendo as ânsias de protagonismo e a sobrevivência política a todo o custo, contra quase tudo e contra quase todos, e pensando, por uma vez, no interesse da população, bem como na democracia como, apesar de tudo, um regime menos mau...

Visto, como está, que esta coisa de extremos leva a nada, resta questionarmo-nos quanto à verdadeira motivação dita altruísta de quem a eles se agarra... para não desaparecer politicamente.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021


Joacina Katar Moreira e o Elogio da Oligofrenia

"Razões fortes, compromissos claros".

Esta mensagem num cartaz do Bloco de Esquerda terá provocado na rede social Twiter, a mensagem "A dicotomia claro/escuro no discurso político já mudava*).

Salvo o devido respeito, a imbecilidade da coisa apenas é comparável à manifesta ignorância vocabular de quem a produziu, bem como à pobreza gramatical evidenciada pela construção frásica pseudo-moderna e pseudo-progressista do  seguido do pretérito imperfeito do indicativo pretendendo significar que já se poderia isto ou aquilo (neste caso, já mudava, em lugar da expressão correta já se poderia mudar. Ou, na forma popular, já se podia mudar).

Claro, significando evidente, preciso nada tem, em sentido estrito, a ver com claro, no sentido de luminoso, pouco escuro. O adjetivo é o mesmo, mas a utilização que dele é feita num e noutro caso quase as torna palavras homónimas, apenas o não sendo na medida em que a classificação gramatical é a mesma.

Não há, assim, como considerar que se trata de um ataque aos ideais anti-racistas, mais a mais vindo de quem vem. Não passa de uma patetice, de uma alarvidade, da tentativa desesperada de quem politicamente se arrisca a desaparecer para manter um protagonismo que não merece, se é que alguma vez mereceu.

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O aproveitamento abusivo de tudo quanto cai ao alcance dos nossos olhos para o distorcer, para o enviesar à medida da conveniência de uma causa ou argumentação a ele completamente alheia apenas tem como resultado imediato a evidenciação do vazio daquilo que se defende e da fundamentação de suporte que temos para lhe oferecer. No presente incidente, apenas serve para menorizar a nobre causa do racismo, que, é caso para dizer, bem melhores defensores poderia merecer.

Alguém me dizia, há tempos, que para se obter um grau de mestre ou de doutor é mais necessária capacidade de trabalho do que inteligência. Dir-se-ia que alguns parecem profundamente empenhados em o demonstrar...

Se certos doutorados que por aí há trabalharam ou não, jamais saberei. Mas da oligofrenia que caracteriza algumas das suas afirmações não será difícil convencer.

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quarta-feira, 3 de novembro de 2021


O Caos Seria a Alternativa...

Não há como não nos sensibilizarmos perante a angústia de pais que, apenas por quererem educar os seus filhos de acordo com as suas convicções, tenham acabado por provocar a reprovação dos mesmos na sua vida académica, como aconteceu no caso bem conhecido daquela família de Vila Nova de Famalicão.*) Nem perante os anos de prejuízo que a sua vontade de combater ideologias absolutamente espúrias à mais elementar ideia de democracia aos jovens estudantes não deixarão de provocar.

No entanto, mesmo sem conhecer o processo, não me ocorre como poderia um tribunal vinculado a decidir no estrito cumprimento da lei, deixar de indeferir o pedido de providência cautelar, da mesma forma que não vejo como poderá outro tribunal deixar de prolatar uma decisão definitiva em desfavor da pretensão da família, pretensão essa moralmente legítima mas legalmente inadmissível.

Como alguém, que anteriormente citei, recentemente disse, "um juiz, quando vesta a toga, tem de despir as suas convicções".*)

Não é, pois, o sistema judiciário que deve ser responsabilizado, mas sim um Governo que, focado em garantir a sua permanência no poder durante esta meia dúzia de anos que agora finda, sempre tendeu a ceder, com a maior das facilidades, a sucessivas exigências de uma extrema-esquerda radical, também ela preocupada com a sobrevivência política de ideias completamente desfasadas da realidade e da prossecução do bem-estar e da estabilidade das populações.

Não obstante insistir em declarar-se democrática, essa esquerda radical continua a agir sem qualquer contemplação pela vontade e pelos valores defendidos pela maioria, a procurar impor ideologias e originalidades sem qualquer justificação, substância ou conteúdo, à partida condenadas a permanecer tanto tempo na memória dos vindouros quanto qualquer irrelevante banda de garagem alguma vez permaneceu no top de vendas apenas porque resolveu que, pelo simples facto de existir, tanto mérito merecia quanto os The Beatles, os Bee Gees ou outros de igual valor.

Por muito que nos revolte a situação daí resultante, podemos, naturalmente, insurgir-nos e indignar-nos quando confrontados com ela, mas haverá que considerar que sempre será preferível a um Estado levado à anarquia pela eventual capacidade de qualquer cidadão discordante das opções políticas de quem governa poder, por um simples ato de vontade, ignorá-las e agir como muito bem entendesse, lançando no caos social e económico o que, a breve trecho, deixaria de ser um país, para se tornar, ainda mais do que agora, numa monstruosa amálgama de interesses.

Em democracia, a vontade popular manifesta-se através de canais próprios e há muito consagrados, designadamente por via do voto sempre que são convocadas eleições.


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sábado, 23 de outubro de 2021


PAN - A Outra Exploração Infantil

 
Apenas nos fez, uma vez mais, sentir que a designação mais apropriada
seria Partido dos Animais e da Natureza, já que pouco fala das pessoas e das causas delas,
nem se coibindo, para se manter por mais uns tempos na espuma dos votos,
de explorar a imagem das crianças e dos jovens que diz defender


Partido dos Animais e da Natureza
Quando era miúdo, aconteceu levarem-me às touradas, espetáculo que nunca apreciei nem consegui compreender: arte, no sentido de manifestação do espírito, não lhe encontro; e, quanto a manifestações da mente, parece-me ficarem bastante aquém até das que poderão, apesar de tudo, estar presentes num desafio de futebol.

Tampouco alguma vez conseguir entender a razão pela qual, com total indiferença pelo sofrimento infligido, na lide a cavalo um mamífero (Homem) utiliza um também mamífero (cavalo) para torturar um outro mamífero (touro); ou por que, na lide a pé, o primeiro mamífero, supostamente dotado de mente e espírito muito além dos dotes do último, experimenta alguma satisfação pelo facto de sair supostamente vitorioso de um artificiosamente provocado combate entre a força mental de um e a força bruta de outro.

Sempre me ensinaram que um combate, para o ser realmente e para, sendo-o, ser também valoroso e leal, haverão de estar equilibradas as forças em presença, o que, evidentemente, não acontece quando se confrontam, de um lado, uns oitenta quilos e do outro uns seiscentos; quanto, de um lado, ter-se-á, vá lá, uns cem e do outro lado escassos vinte, no que se refere a quociente intelectual.

Será a espécie humana tão pouco segura de si que necessite de martirizar uma bem mais volumosa besta para conseguir demonstrar a mais do que conhecida supremacia intelectual? Ou será tão pouco valorosa que, tendo abdicado do combate corpo a corpo entre iguais em prol da venda de armas de destruição maciça e à distância, apenas lhe resta coragem para, com grande aparato, fingir que trava um combate que tem, afinal, como substância, coisa nenhuma, que apenas existe para inglês ver?*)

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Às coisas ditas e feitas para inglês ver nos vem a política, desde tempos imemoriais, habituando, a ponto de, graças à prática demagógica quotidiana da generalidade dos lusitanos partidos, instintivamente havermos substituído, nos nossos espíritos, a suposta nobreza da política e da missão governativa pela quase certeza da mesquinhez, da jogada vil, do golpe de rins, da mais chã, vazia, inevitável e corrupta hipocrisia.

Partido Comunista Português (PCP)
Há, todavia, quem entenda que estes atributos definem o modus operandi *) unicamente dos maiores partidos, ficando imunes a estas maleitas aqueles que, por incipiência ou entropia, mais pequenos são, já que se persistem em manter-se ativos, estarão, pensa-se, animados das melhores intenções.

Como exemplo da segunda situação*), a da entropia, já aqui se trouxe o caso do Partido Comunista Português (PCP)*) que, manifestamente, hoje para pouco mais serve do que para garantir algum protagonismo às suas eternas glórias, defendendo o indefensável e obstaculizando a formação de um novo e verdadeiro partido dos trabalhadores, que zele eficazmente pelos seus interesses e os desencoraje de, a velocidade crescente, migrar para o extremo oposto do espectro político.

Já quanto à primeira situação, a dos partidos incipientes, acaba o Pessoas, Animais e Natureza (PAN)*) de, com todo aquele  patético folclore em torno da enorme vitória*) conseguida com a imposição de limitações à assistência de menores às touradas, fornecer a prova acabada do que acabo de dizer.

Deixo aos especialistas a discussão científica sobre a influência perversa que a assistência ao abestalhado espetáculo possa exercer sobre a formação da personalidade e do carácter das crianças. Sobre este assunto, direi, apenas, que não tenho memória de alguma vez ter lido ou ouvido notícia de evidência científica quanto a um caso que fosse de um inveterado criminoso cuja propensão para o delito se haja formado por haver, na infância, frequentado as praças de touros*).

Não entrarei, também, na discussão primária e de conclusão impossível sobre se será mais traumatizante ver picar um touro – não digo toiro, com i, porque dizem que esta forma é mais poética e, poesia, a tourada tem nenhuma… - ou as continuadas agressões ao adversário num relvado de futebol, ou qualquer catástrofe ou atrocidade que, à hora de jantar, um menor de dezasseis ou, até, de doze ou de seis anos não tem como evitar ver na televisão dos progenitores.

Tudo isso é subjetivo, depende da propensão e das idiossincrasias de cada um, e, a despeito das incomensuráveis fortunas despendidas a tentar provar o impossível, jamais qualquer ciência nomotética*) logrará enunciar, para além da dúvida razoável, uma regra universal.

Muito menos me questionarei quanto à forma como o PAN não deixará, por certo e para ser coerente, de exigir do Partido Socialista (PS)*) que proíba, sem demora, que menores de dezasseis anos assistam, na terra dos pais e dos avós, à matança do porco*) e ao espetáculo de puro horror que a subsequente abertura e limpeza do cadáver constitui. Que assistam e, por maioria de razão, que participem.

Toiros
Não será, também, de esquecer, naturalmente, a Festa Brava*), durante a qual também se pica touros – embora não esteja bem a ver o que poderá aí fazer-se para controlar os acessos dos nossos juvenis.

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O que venho aqui salientar é a inanidade, a inutilidade, o impacto absolutamente ridículo da proibição que o PAN conseguiu, a troco de um punhado de votos, forçar o PS a impor àquela que todos sabemos ser a incontável quantidade de jovens entre os doze e os dezasseis anos que gosta de ir, sozinha, ver a corrida sem estar acompanhada por um adulto.

Incontável, porque o que não existe não se pode contar.

A verdade é que a oca e pírrica vitória agora conseguida pelo PAN apenas afeta a meia dúzia de jovens, se tanto, que por lá passava sem ter, a acompanhá-las, um adulto, que nem um dos pais tem de ser!*)

O número 6 do art.8º do Decreto-Lei nº 23/2014, de 14 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 90/2019, de 5 de julho, é taxativo: “O promotor do espetáculo de natureza artística ou de divertimento público deve negar a entrada de menores quando existam dúvidas sobre a idade face à classificação etária atribuída, avaliada pelos critérios comuns de aparência, salvo quando acompanhados dos pais ou de um adulto, devidamente identificado, que se responsabilize”.

Simplificando: qualquer criança, desde que tenha mais do que os três anos de idade mínima previstos na mesma lei, pode assistir a qualquer espetáculo, desde que acompanhada por um qualquer adulto que por ela se responsabilize.

Note-se que, isto, nem o vitorioso PAN desmentiu…

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O que conseguiu, então, o PAN?

Nada. Absolutamente nada com que valha a pena desperdiçar um minuto sequer.

Apenas nos fez, uma vez mais, sentir que a designação mais apropriada seria Partido dos Animais e da Natureza, e não Pessoas, Animais e Natureza, já que pouco fala das pessoas e das causas delas, nem se coibindo, para se manter por mais uns tempos na espuma dos votos, de explorar a imagem das crianças e dos jovens que diz defender.

O que perdem as crianças com isso? Nada, claro. A não ser pela falta, com o que não existe, é difícil perder.

Por outro lado, com todo este teatro barato, com toda esta estapafúrdia demonstração de prosápia ignorante, o que ganham os desinteressantes zelotas do PAN?

Talvez uma inscrição no clube dos satélites de um Partido Comunista Português mais do que desiludido com o inerte desempenho do Partido Ecologista ‘Os Verdes’ (PEV)*), que já só dois ou três votos lhe garante e do qual nem se ouve falar.

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Eis, pois, o perfeito exemplo de uma vitória meramente formal, que garantiu a um partido minúsculo umas linhas na imprensa escrita e uns escassos minutos de televisão, mas sem qualquer efeito prático, sem substância, destinada apenas a promover, a qualquer preço, a imagem de um partido moribundo, de mais um fanático da suposta proteção animal, em que o termo Pessoas na marca parece meramente instrumental, marginal.

A menos que as crianças e os jovens não sejam consideradas pessoas, e possam impunemente servir de mote à promoção dos os outros dois bem legítimos e importantes ideais.