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quinta-feira, 28 de julho de 2022


"Alien"

Olham-me, quando por eles passo na rua.

Uns, com ar divertido, outros com ar trocista; uns com ar de pena, outros de censura, outros ainda com o olhar fugaz dos que se apressam a desviá-lo porque parece mal ficar a olhar.

O mesmo numa loja, num qualquer espaço público, ou quando me levanto, no restaurante, para ir lavar as mãos antes de começar.

Também eu não sei como os contemplar. Nem sei, mesmo, se devo desviar ou devolver o olhar.

Estão, claro, no pleno uso do seu direito à liberdade de ser, de estar, de observar, de uma opinião formar e de, a todo o tempo, a inverter ou renovar.

Sou eu o desenquadrado, o retrógrado, o pária de uma sociedade virada para a frente e para a ânsia de aproveitar ao máximo, enquanto isto da guerra não alastra, o ar que respira e aquilo que, da vida, vai podendo tirar.

Por que não? Por que não, afinal, se o mesmo parecem fazer quantos por aí vemos deambular?

Pouco importa. Faço o que faço, ajo como ajo, e continuarei a agir enquanto uma culpa minha puder pôr em risco o bem-estar comum, a economia do Estado e a estabilidade dos outros que por cá têm de andar.

Uso máscara, e continuarei a usar enquanto o bicho por aí andar.

Uso-a, por muito que uns e outros prefiram esquecer o assunto e assobiar para o ar.

segunda-feira, 27 de junho de 2022


Marta Temido, António Costa e os Gráficos da SIC

Faz uma certa confusão...

Baseando-se em informação facultada pelo Observatório Português dos Sistemas Saúde, o Comentador do horário nobre da SIC, ao Domingo, apresentou a habitual sequência de gráficos, segundo a qual, entre 2015 e 2022:

  • a quantidade de profissionais - médicos incluídos - afetos ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) aumentou significativamente;
  • a produtividade dos profissionais afetos ao SNS diminuiu significativamente;
  • os salários do pessoal médico baixaram, enquanto os da maior parte dos restantes setores - incluindo outros profissionais de saúde - subiram;
  • a quebra de produtividade deve-se, além das saídas por redução do nível salarial, em boa parte à tensão nervosa em que toda aquela gente vive, resultando num crescente absentismo.

Mesmo sem aqui especificar números, evidente se torna ao cidadão menos informado, ao telespectador mais distraído, que tudo decorre, por um lado, de absoluta incapacidade de planeamento e, por outro, de notória incapacidade até para assegurar a gestão corrente; e, antes que alguns comecem a culpar a COVID, será oportuno salientar que a Senhora Ministra da Saúde se encontra em funções desde Outubro de 2018, embora a doença apenas tenha sido promovida a pandemia já em 2020.

Assim, houvesse a indispensável reforma estrutural começado a ser desenhada ano e meio antes, pelo menos duas coisas bem positivas teriam ocorrido:

  1. a situação no SNS estaria, hoje, razoavelmente controlada e estabilizada, não dando azo àquilo a que temos assistido;
  2. teria sido incomparavelmente menos complicado gerir a pandemia.
Perguntemo-nos, pois:

  • o que andou, nesse primeiro ano e meio, a Senhora Ministra a fazer?
  • o que espera o sorridente Senhor dos Nossos Destinos para a substituir?

Faz uma certa confusão...

(leia aqui o desenvolvimento)

quarta-feira, 22 de junho de 2022


Marta Temido: Uma Ministra Sinistra?


"A Senhora Ministra da Saúde não fica aquém da calamitosa média do nível de quem nos vem governando:
não passa de mais um militante da última fornada, de mais um ministro bem exemplificativo daquilo que resta de um Partido Socialista
outrora grandioso e, agora, apenas... grande
"

"O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) parece um contentor repleto de flores artificiais,
para deslumbre de meia dúzia de tontos e gáudio de quantos dele julgam que alguma coisa irão 
sacar
"

"Haverá, apesar de tudo, quem queira e consiga fazer melhor do que o Partido Socialista
e o seu Secretário-Geral para gerir os destinos da Nação? Assim de repente, talvez... não
"


Dos vícios da direita, muitos falamos à boca cheia, em grande parte devido à ditadura no tempo da "outra senhora" e, mais recentemente, aos desmandos de uma extrema-direita que, em Portugal, se torna cada vez mais difícil saber, exatamente, o que é.

Esquecemo-nos, porém, de que, quando a irracionalidade e o fanatismo a levam ao extremo, também a esquerda (sinistra, em italiano) se torna sinistra (em português). Tal acontece sempre que as opções políticas comprometem, seriamente, o tal serviço à população, que, em princípio, qualquer político deveria ter como primeira meta da governação.

- x -

Da fraca resiliência - como agora gostam de dizer - da Senhora Ministra da Saúde já aqui escrevi, a esta me tendo, também, referido a propósito das consequências do manifesto défice de comunicação do Governo. Ambas as questões se tornam, porém, menores quando comparadas com a verdadeiramente sinistra opção da Governante pelo suposto afastamento tendencial e tendencioso da iniciativa privada da área da prestação de cuidados de saúde.

Só a própria o saberá se esse manifesto afastamento se deve a uma básica, elementar, obstinada, extremada opção por políticas de esquerda, a uma preocupação infantil ou oportunista por fazer parecer que é de esquerda, ou, mais simplesmente, a mero folclore destinado a obnubilar uma mais ou menos absoluta falta de rumo e de convicções

Certo é que, como, de alguma forma, todos deduzimos daquilo que vemos e lemos, Portugal não tem - e, pelo menos no curto e no médio prazo, não terá - capacidade financeira para assegurar, a todos os atuais potenciais doentes mais ou menos graves, um Serviço Nacional de Saúde (SNS) que, mesmo de longe, corresponda às mais modestas e legítimas aspirações de quantos para ele obrigatória ou voluntariamente contribuem, das mais diversas formas e nos mais diversos graus.

Embora intuído por todos, isto deveria ser dito claramente aos eleitores - mas, por razões muito claras e precisas, não pode ser, já que aquele inconveniente dos votos teima em continuar pegado que nem uma lapa à qualidade dos cuidados de saúde; e, votos, ninguém quer perder...

Da irresponsável insistência da Ministra - e de quem a convidou e, declaradamente ou não, sanciona as suas decisões - na aparente exclusão, muito além do limite do razoável, da iniciativa privada, outro desenlace não pode esperar-se além do que temos diante dos olhos: forte insatisfação dos operadores do SNS e dos utentes que servem, em muitos casos conduzindo, por parte dos primeiros, àquele baixar de braços a que leva a desesperança no resultado do desempenho de quem manda, e a consequente, inevitável e patente desmotivação.

Este afastamento dos privados é apenas aparente, já que não passa, note-se, de um gigantesco equívoco, ou de uma operação de cosmética para, pelas tais razões que lá saberá quais são, a Senhora Ministra se mostrar como de esquerda: por um lado, porque a desastrosa política salarial apenas serve para empurrar os melhores profissionais para o setor privado, que, à sua maneira, agradece à esquerda o tiro no pé; por outro, porque as empresas de trabalho temporário são, evidentemente, privadas e, simultaneamente, porventura as maiores fornecedoras de mão de obra para as urgências dos hospitais públicos.

Ninguém duvida de que a saúde é a área que movimenta mais milhões. Será por isso que a respetiva Ministra não gosta de parcerias público-privadas (PPP)? Não admira:.independentemente de quem as promova e mantenha, a história recente imediatamente lhes associa o labéu do oportunismo e da corrupção.

No entanto, o problema não reside no instituto das PPR enquanto tal, antes na fraca qualidade de algumas pessoas que por lá passaram e, ao que se diz, dessa passagem bem terão sabido aproveitar-se. Se o problema são as pessoas, não se rejeite ou suprima, simplesmente, as PPP: crie-se, antes, eficazes mecanismos de supervisão.

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A fazer fé no rosário de erros e de trapalhadas que a comunicação social nos traz, a atual titular da pasta da saúde não tem, nunca teve, qualquer capacidade para gerir o que quer que fosse na área da saúde, apenas tendo tido a ventura de, no tempo da pandemia, contar com o apoio e a assessoria de gestores e técnicos competentes, cujo contributo lhe terá permitido manter uma ténue aura de suposta eficácia e competência que o sorriso tímido - e, agora, cada vez mais forçado e amarelo - sempre ajuda a iluminar..

Hoje, pandemia ultrapassada - ou, pelo menos, irresponsavelmente desvalorizada -, apenas fica, quiçá, o fanatismo, a gestão do que lhe resta de uma imagem entretanto cada vez mais esbatida pela notória propensão para a birra caprichosa - ou, se quisermos ser simpáticos, para a teimosia política, que outro político teimoso tem vindo a sancionar.

Reduzida a tão puídos pergaminhos, pouca, muito pouca, capacidade de efetiva atuação se reconhece, já, à Governante em situações de crise; e, sobretudo, no vital e sempre adiado planeamento, na estruturação de fundo de uma área que, antes de muitas outras, do Governo deveria merecer mais generosa e empenhada atenção.

Leva isto, inevitavelmente, a pensar em quem alcandorou a Senhora Ministra onde está e lá a mantém; em quem a terá convencido a, repentinamente, tornar-se militante do omnipresente Partido Socialista; e entrando logo pela porta grande, que é como quem diz, com eventual acesso quase direto ao lugar de Secretária-Geral.

A Senhora Ministra fala, agora, de planos de contingência; e muito bem, já que ficar inerte na atual situação seria, a todos os títulos, um desastre. Há, pelo menos, que dar a ideia de que alguma coisa está a ser feita, embora, do que importa e como estamos cansados de saber, nada o esteja, de facto. É que, ao cabo de meia dúzia de anos do Senhor Primeiro-Ministro à frente do Governo, Educação, a Justiça e Saúde - os três principais pilares do funcionamento do Estado - conservam todo o seu desolador aspeto: magros, escanzelados, doentes, atabalhoados, pouco mais do que inertes relativamente à gigantesca dimensão das necessidades.

A que chamará o Partido Socialista "reforma estrutural"? A tapar buracos financeiros com uma coisa chamada Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que pouco mais não parece do que um contentor repleto de flores artificiais, para deslumbre de meia dúzia de tontos e gáudio de quantos dele julgam que alguma coisa irão sacar? Ou estará convencido de que uma reestruturação, uma reforma de fundo mais não é do que uma pontual simplificação administrativa, como a recente automatização da atribuição do abono de família?*)

A suposta estrutura dos edifícios que integram as mais importantes áreas da governação não passa, em Portugal, de uma instável amálgama de massas fracas, com o empreiteiro sempre em sobressalto perante a iminência de uma derrocada, nestas circunstâncias mais do que natural.

Se não era previsível a conjuntura específica em que o problema agora emergente, relacionado com o pessoal médico, se iria manifestar, inegável era a forte probabilidade da ocorrência de uma muito semelhante, da ocorrência de um quadro fortemente adverso, pelo que a sempre adiada reforma do sistema deveria ter-se processado tranquilamente. Há muito tempo. Naquele tempo em que não existia qualquer calamidade.

Da forma como as coisas vão, e no que à saúde se refere, a única reforma previsível será a da Ministra , se volta a ter de ser chamada à pedra pelo Primeiro-Ministro por, no meio do pandemónio, preferir continuar a gozar uns diazitos de férias, em lugar de vir até à Capital dar a cara quando o castelo de cartas do SNS começa a ruir*).

Desta vez, a ruir talvez mais a sério do que vem sendo habitual...

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Se há problemas estruturais na saúde*), a Ministra que os resolva agora no papel, e o Governo que valide e implemente a solução. Não foi para isso que se candidataram? Não é para isso que estão lá? Ou pensarão  basta, quando muito, assegurar a gestão corrente da quase desesperada situação?

Anuncia-se uma comissão de acompanhamento. Mas não terão as comissões de acompanhamento sido pensadas para prevenir, para evitar, e não para limpar o caldo entornado? Parece que não...

O estado de graça - merecido ou não - da pandemia há muito que já lá vai, e a desculpa com a queda do anterior Governo só faz sorrir, atendendo a que as verdadeiras reformas do Estado são desenvolvidas por técnicos que pouco têm de políticos e que, como tal, pouco sensíveis são às idas e vindas dos governantes e à cor política dos mesmos, continuando aqueles o seu trabalho mesmo no meio das maiores tribulações.

Entre 2015 e 2019 não havia pandemia, o Governo não tinha sido derrubado. Nesses quatro anos, que reformas estruturais fez? Quantas lançou? Em quantas, pelo menos, seriamente pensou?

Os males que afetam a Saúde são, essencialmente, os mesmos que inquinam a Justiça e a Educação, não valendo a pena descarregar a culpa nas Finanças que, independentemente da opinião que possa ter-se do respetivo Ministro, a verdade é que ninguém lhe ensinou como fazer germinar papel-moeda semeado no chão.

Aliás, no espantoso dizer do Governante, a Saúde não padece de falta de dinheiro (Aqui entre nós, estará a mal preparada pessoa apenas a procurar sacudir a água do capote, ou bem ciente do que está a dizer? E das consequências? Alguém, no Partido, lhas faça entender...)

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A Senhora Ministra da Saúde não fica, apesar de tudo, aquém da calamitosa média do nível de quem há anos nos vem governando: não passa de mais um militante da última fornada, de mais um ministro bem exemplificativo daquilo que resta de um Partido Socialista outrora grandioso e, agora, apenas... grande.

O que, a cada dia que passa, se torna mais evidente é a incapacidade de o Partido mobilizar alguns quadros sabedores, competentes e sábios que ainda possa ter; e de, fora das suas hostes, recrutar cidadãos de igual qualidade que as lacunas possam, eficaz e credivelmente, preencher.

Como é típico das ditaduras - e das  maiorias absolutas... - falta a coragem política, a mera vontade de negociar, a mais simples demonstração de respeito pelo brutal investimento feito por médicos que são colocados em centros de saúde do tão querido SNS a ganhar pouco mais de mil euros, depois de uma vida de estudante das mais exigentes e extenuantes que há.

Quando irão eles recuperar o investimento, os anos a mais de estudo que tiveram enquanto outros saíam mais rapidamente das faculdades e mais cedo começavam a progredir nas respetivas carreiras?

Tudo isto é demasiadamente radical, fanático, irracional e irresponsavelmente esquerdo... sinistro. Pronto a servir, para a venturosa extrema-direita aproveitar.

Na sua irritante insegurança e desconfiança, o Senhor Primeiro-Ministro parece continuar a contratar governantes pelo critério da proximidade pessoal ou política, não querendo - ou não conseguindo... - congregar esforços de quem tenha alguma capacidade efetiva de levar a bom porto a jangada que qualquer ministério do nosso minúsculo Retângulo é, quando comparado com ministério de países bem maiores. Londres, que tem, praticamente, a mesma população que a totalidade do território lusitano, é, entre as cidades do Mundo, apenas a trigésima sétima maior.

Somos um país pobre? Pois somos. Mas, até por maioria de  necessidade e de razão, a competência e a organização são exemplares em muitos lares das camadas mais pobres da população. Não há, assim sendo, como desculpar, com a falta de fundos, a incompetência e a desorganização na governação.

Além de pequenino, comezinho, ridículo, muito do que tem vindo a acontecer é, realmente, sinistro, inexplicável, a começar pelo facto de o voto útil continuar a manter no poder quem pouco ou nada lá saberá fazer. Talvez porque, muito convenientemente, do lado de cá, do lado de quem vota, se de economia e de finanças quase ninguém entende patavina, na Educação, na Saúde e na Justiça, já ninguém, mesmo ninguém, acredita com a mais leve convicção..

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A cada vez mais desengraçada e politicamente desgraçada Ministra da Saúde deveria, sensatamente, arranjar outra ocupação e ceder o lugar.

Mas, quanto ao mais, haverá, apesar de tudo, quem queira e consiga fazer melhor do que o Partido Socialista e o seu Secretário-Geral para gerir os destinos da Nação?

Assim de repente, talvez... não.

terça-feira, 29 de março de 2022


Médicos sem Fronteiras à Moda Tuga

Desde pequeno que me ensinaram a nada esconder do meu médico, pois só assim poderia ele garantir, dentro daquilo que é humanamente possível, um diagnóstico correto e uma terapêutica eficaz. Esta necessidade de uma comunicação plena e perfeita é tão importante na relação entre médico e paciente, que, para que flua sem barreiras de qualquer espécie,  se tornou necessário instituir a figura do segredo profissional, indispensável ao exercício da profissão.

Como explicar, neste quadro, a recente decisão da Ordem dos Médicos de permitir que clínicos ucranianos refugiados em Portugal aqui exerçam medicina sem um razoável domínio da língua portuguesa? *) Num tal cenário, que comunicação irá, efetivamente, acontecer?

Constituída que é por médicos, com quem se encontra, antes de mais, comprometida a Ordem? Qual a sua missão? O que se espera, primeiro, da Ordem dos Médicos: que se ocupe do acolhimento dos refugiados ucranianos, ou que cuide de assegurar a qualidade do exercício da medicina em Portugal?

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Será legítimo esperar que o inglês da esmagadora maioria dos utentes dos hospitais e centros de saúde portugueses - para não falar da boa parte da população mais idosa ainda analfabeta... - lhes permita, com um mínimo de fiabilidade, informar um médico ucraniano dos males que o afligem?

Serão, unicamente, os males físicos os que um médico trata? Apontando para o pescoço, talvez o paciente dê a entender que lhe dói a garganta... ou será uma bem mais grave dificuldade em engolir? Neste caso, como saberá o clínico se se trata de uma consequência de tensão emocional e quais os fatores que poderão estar a provocá-la, ou de algo bem pior? Passar-se-á a fazer exames por tudo e por nada? Será isto que a Ordem quer para a medicina em Portugal?

Esta autorização popularucha, demagógica e deletéria da Ordem não encontra justificação minimamente aceitável na vontade de acolher e integrar as vítimas da guerra, antes inevitavelmente deteriora a qualidade dos cuidados de saúde enquanto os médicos ucranianos "vão aprendendo português", nas palavras do Senhor Bastonário que nada mais exemplificam do que a lastimável propensão bem portuguesa de pôr o carro à frente dos bois.

Que justificação poderá, ademais, encontrar-se para desafiar o Estado, "através dos professores, a organizar cursos de português para estes médicos ucranianos"? Através dos professores, ou através dos doentes, assim trespassados por uma formidável espada no seu direito a ser devidamente tratados em segurança?

Quanto tempo levarão estas acções de formação? Entretanto, transforma-se em vítimas os pacientes?

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Mesmo que a ideia seja trabalharem junto a colegas portugueses, sempre acabarão aqueles médicos por empecilhar e atrasar o trabalho destes, agora arvorados em tradutores - partindo do princípio de que, numa área tão sensível, ucranianos e portugueses se entendem na perfeição num idioma que não é o deles.

Além das consultas, haverá, por certo, na medicina tarefas que estas vítimas dos desmandos de um alucinado e narcísico ditador possam desempenhar sem comprometer a qualidade da prestação médica do Serviço Nacional de Saúde. Se não houver, que tal o mesmo Estado que irá promover o ensino da língua portuguesa pensar em subsidiar essa formação e assegurar o sustento dos médicos a quem a formação se destina?

Meritório é, sem dúvida, o esforço benévolo de integração de refugiados de um tão desgraçado conflito, mas jamais à custa da saúde dos que cá vivem, incluindo dos imigrantes ucranianos por cá há muito estabelecidos. Todavia, e independentemente da elevação dos ideais que possam ter estado na génese da disparatada decisão anunciada pela Ordem, nada, mas nada, deverá permitir que estes possam intervir, negativamente, naquilo que é sagrado em tão nobre ocupação.

"Estamos de acordo que esses médicos tenham integração enquanto estão a aprender a língua, justamente depois de terem os seus cursos reconhecidos pelas faculdades de medicina, e que possam, com a ajuda dos seus tutores, contribuir para o Serviço Nacional de Saúde" não passa, pois, da expressão, por parte do Senhor Bastonário, de uma permissividade, de um facilitismo, até de uma certa ignorância que, através da Ordem, ao exercício da medicina nada de bom prometem trazer.

sábado, 12 de fevereiro de 2022


Indiferença

"Como explicar que, a par de um atendimento reconhecidamente mais próximo e eficiente
por boa parte do funcionalismo público, seja, paradoxalmente, na área da diplomacia
que tamanha aberração acontece? Que de forma tão grosseira se manifesta, não apenas a ineficiência funcional,
mas a desoladora indiferença, a desgraçada falta de coração, de formação, de educação?

Num Estado que se diz humanista, não há lugar para uma diplomacia fria, dura,
indiferente a quem, com dois, um ou quase nenhum pulmão caminha
por uma rua cheia de pessoas que não choram, e impede que, pelo menos,
sobrevivam juntas pessoas que poucas outras têm a quem dar a mão.
"


Da missão da comunicação social já muitas linhas se escreveu. Também das múltiplas formas como é desvirtuada tão nobre missão, formas essas que a fértil imaginação humana não pára de, pela negativa, enriquecer. Chegaram, mesmo, as coisas a ponto de serem criados produtos informativos, impropriamente chamados polígrafos, cuja única função é averiguar e denunciar mensagens e notícias falsas, num Mundo cada vez mais profundamente mergulhado na dúvida quanto à bondade das intenções de quem noticia, seja nas mais agressivas redes sociais, seja na teoricamente mais cândida blogosfera, seja, enfim, na teoricamente bem mais responsável imprensa tradicional.

Nada disto é novo
Nada disto é novo, tal como novo não é o facto quase apenas o que é mau ser capaz de atrair a atenção de uma cada vez menos educada e menos diferenciada opinião pública, essa solitária mole de mais ou menos desgraçados mas quase sempre desengraçados seres humanos ávidos de qualquer coisa picante, ou lastimável, ou terrível que lhe permita sacudir, ainda que por breves momentos, a poeira que lhes forra o vazio do coração.

Tornam-se, assim, raros os casos em que os mais consagrados media se podem, do ponto de vista económico, dar ao luxo de, a um ou outro caso pessoal verdadeiramente desesperado, dedicar algumas letras por entre os pingos da chuva desta bombástica e inesperada maioria absoluta que até as repetitivas e já nauseantes notícias da pandemia para enésimo plano acaba por conseguir relegar.

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Assim aconteceu há uns dias, com o semanário Expresso*), relativamente à notícia da impossibilidade de obtenção de visto para entrada em Portugal por parte de uma senhora guineense que pretendia apoiar a filha doente; com carinho e companhia, já que pouco mais terá para dar. Uma filha que mora sozinha num primeiro andar sem elevador que, pelas escadas, mal consegue alcançar. Uma filha, que há vários anos, aguarda um indispensável transplante pulmonar, e a quem, mesmo com o aparelho portátil de fornecimento de oxigénio regulado na potência máxima, o ar falta até para se deslocar até a uma biblioteca para estudar.

Enquanto espera e quase desespera, Isabel Bapalpeme luta para não enlouquecer, agarrando-se à penosa frequência e estudo de um curso profissional que poderá, um dia, permitir-lhe outros horizontes vislumbrar.

Apesar de, cinicamente, tendermos a dizer que temos muita pena mas que a pobreza é preocupação do Estado e cada um de nós, individualmente, pouco ou nada poder fazer para a debelar, a verdade é que, a menos que não passemos de bestas insensíveis, notícias de casos de pobreza sempre nos hão de entristecer e de, de longe a longe, fazer pensar. Mas, por cruel que possa parecer, a verdade é que casos de pobreza como este - em que, até há poucos dias, os trabalhos de casa eram feitos no telemóvel por nem um pequeno computador ter para estudar - não são notícia, ou os noticiários ocupariam as emissões de dias inteiros, e seriam necessários vários volumes para publicar os jornais.

O que torna este caso escabroso é, antes, o facto de, apesar das diligências levadas a cabo junto da Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau alertando para a gravidade da situação e para a necessidade fundamental da presença da família, vai para quatro anos que a Mãe de Isabel vê o seu visto de entrada em Portugal negado pelas autoridades: ora por não ser possível comprovar a intenção de abandonar o território português antes de o jamais concedido visto caducar, ora porque o tipo de visto pedido não era o adequado e ninguém do facto se dignou esclarecê-la, ora porque há documentos em falta no processo, ora sabe-se lá por que mais que nem vem nos jornais.

Píncaros do Ridículo
Nos píncaros do ridículo da ação do autoproclamado humanitário Estado, lá continua Isabel Bapalpeme, ao fim de quatro longos anos, privada da companhia clinicamente imprescindível da Mãe apenas porque esta, em lugar de um visto de tipologia E7 terá  pedido um visto de tipologia "E" não sei que mais.

O editor de quem escreveu que "a juventude esbate-se, o amor esmorece, as folhas da amizade tombam, mas todos sobrevive a esperança secreta de uma mãe" esqueceu-se, por certo, de enviar um exemplar da obra à Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros...

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Eis senão quando, humilhado pela atenção que a inenarrável indiferença de responsáveis e subalternos a este caso trouxe, salta o bem-aventurado humanismo mediático do dito Ministério a dar instruções urgentes à Embaixada no sentido de proceder, sem mais demora, à tão desejada  emissão do visto.

Mas, qual visto?... Isto só visto.

Logo a Embaixada liga, à Mãe a marcar uma hora para lá comparecer a fim de lhe ser dado o visto nunca visto; comparece até antes da hora; fá-la o segurança esperar mais duas, alegando não ter sido informado de qualquer agendamento; por causa desta comezinha questão, telefonemas ao mais alto nível da diplomacia são trocados; e a mãe, Sábado Babalpeme, lá acaba atendida por um qualquer funcionário.

Sucesso, finalmente? Não...

Sábado não foi atendida por um simples funcionário qualquer: foi atendida por um funcionário tão qualquer, mas tão qualquer que, ao que parece, em lugar de, perante a dificuldade, se ter mexido como a relevância e urgência do caso requeriam, se terá limitado a, uma vez mais, recusar a entrada do pedido de visto por... falta de documentação.

Depois de todos os cordelinhos que a notícia do Expresso tinha feito puxar em bem altas esferas, um enferrujado mas todo importante funcionário limita-se a entregar à Mãe uma lista do calvário administrativo todo que teria, ainda, de percorrer. Ela, que nem sabe ler...

Corre, então, o Semanário junto do altivo e displicente Ministério, o qual, pressionado, logo transmite, à Embaixada ordem de que, para emitir o visto, nada mais exija do que o relatório médico já em seu poder.

Estarão, finalmente, criadas todas as condições? Talvez...

A verdade, porém, é que o visto ainda não foi emitido, mas apenas foi processado na Embaixada: falta o "parecer das entidades competentes em matéria de entrada de estrangeiros em Portugal, aguardando-se a emissão a breve trecho"*).

Decididamente, a débil simplificação administrativa cá do Retângulo não chega aos casos que, mesmo desesperados, apenas se resolvem depois de um considerável arraial...

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Terão sido, possivelmente, situações como esta que inspiraram a definição segundo a qual "diplomacia é a arte de dizermos ´lindo cachorrinho' até encontrarmos uma pedra". Seria, porém, de pensar que Portugal fosse um estado uno, senhor de uma identidade própria, desejavelmente homogéneo onde quer que se encontre representado, e seja em que circunstâncias for.

Como explicar, então, que, a par de um atendimento reconhecidamente mais próximo e eficiente por boa parte do funcionalismo público, seja, paradoxalmente, na área da diplomacia que tamanha aberração acontece? Que de forma tão grosseira se manifesta, não apenas a ineficiência funcional, mas a desoladora indiferença, a desgraçada falta de coração, de formação, de educação?

Num Estado que se diz humanista, não há lugar para uma diplomacia fria, dura, indiferente a quem, com dois, um ou quase nenhum pulmão caminha por uma rua cheia de pessoas que não choram, e impede que, pelo menos, sobrevivam juntas pessoas que poucas outras têm a quem dar a mão.

* *

Ou será que a diplomacia anda de mãos dadas com o racismo?

(leia aqui o desenvolvimento)


domingo, 9 de janeiro de 2022


Vamos à Bruxa? Que Emoção!


Elaborando um pouco sobre o anúncio da 'poderosa e competente' Dona Maria com que ilustrei o artigo do passado dia 8, qualquer de nós não deixará de notar, naquela coisa, aspetos curiosos que, lamentavelmente, não parecem merecer a atenção, quer de organizações das quais se esperaria que defendessem os interesses dos seus fiéis ou associados, quer dos poderes públicos mandatados para a defesa da lei e da ordem.

Não existindo, que se saiba, qualquer imagem autenticada e fidedigna de Jesus Cristo, dúvidas não poderão, porém, restar quanto ao facto de a ele se pretender associar a figura representada naquele miserável panfleto em que se publicita os serviços de uma 'famosa senhora de poderes naturais e sobrenaturais', seja lá isso o que for; e, até, 'divinos', o que pouca margem deixa quanto ao propósito de se recorrer a uma alegada e fraudulenta relação com a Divindade cuja imagem é representada no panfleto. Mesmo porque a penúltima linha expressamente a nomeia, numa saudação de paz...

Não obstante, a Igreja Católica parece indiferente a estes despudorados aproveitamentos tendentes a cobrar chorudos honorários vendendo o que não existe e tendo como veículo a crendice e a ignorância de muitos dos nossos concidadãos; ou com eles não sabe lidar, preferindo continuar a assistir à disputa entre a Senhora de Fátima e as bruxas, como aqui, a este propósito, já referi.

Por outro lado, e não menos surpreendentemente, os médicos parecem conformados com a concorrência ilícita - e contraproducente para aqueles de cuja saúde lhes compete cuidar - por parte de quem chama, aos potenciais pagadores, 'Querido Paciente' e refere, além dos tais poderes, um aprofundamento de conhecimentos, necessariamente na área da saúde, ou não designaria por paciente os incautos que lá irão parar.

Não obstante, e tal como acontece com a passividade eclesiástica, a Ordem dos Médicos parece dedicar às Donas Marias desta terrinha um desprezo altivo, de efeito nenhum no combate a esta variante da banha da cobra de cariz popular.

Note-se que a pessoa em questão - e, como ela, tantas outras... -, não apenas se arroga infalíveis e especialíssimos poderes curativos, como se propõe comercializar, está-se mesmo a ver que  mediante a emissão de fatura e recibo, 'poderosos talismãs para si e para a sua casa que lhe darão toda a sorte em menos de quinze dias terá todos os seus problemas resolvidos'.

Atentos os valores astronómicos de que a comunicação social vem dando presumivelmente rigorosa notícia, parece claro estarmos em presença de crimes de burla, alguns deles de valor elevado, para os quais, dada a aparente inércia das autoridades judiciárias e fiscais, talvez a Igreja e a Ordem pudessem ter algum papel relevante ao pressioná-las, se não no interesse das próprias organizações, pelo menos como ato de intervenção cívica elementar nas respetivas áreas de atuação.

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Será que investigar, devidamente, este tipo de crime de colarinho pardacento é considerado pouco meritório por quem com coisas mais mediáticas tem com que se entreter? Serão as Donas Marias e seus equivalentes masculinos - como, com as devidas adaptações, o célebre Padre Gama*) - já tantos, mas tantos, que rapidamente tornariam insuportável a vida nas já sobrelotadas cadeias?

Seria interessante conhecer algumas respostas, já que o problema existe com 'consultas em todo o País', não é uma mistificação.

Agora, a minha vida vai começar a correr mal, cheio que vou ficar de alfinetes espetados num boneco, como mais que merecida e justa retaliação.

* *

Existem, no entanto, certas amplamente disseminadas formas de adivinhação que apresentam, nos fundamentos, alguma base científica e lógica e que, por isso mesmo, são merecedores de um escrutínio atento, da nossa maior atenção.

(leia aqui o desenvolvimento)

terça-feira, 21 de dezembro de 2021


Liberalismo ou Encapotado Negacionismo?

De entre tantos outros defeitos herdados da educação que recebi, ressalta o da convicção de que a nossa liberdade termina precisamente onde começa a dos outros. Ou, como já aqui citei, que "a única maneira de defender a liberdade é limitar a liberdade de cada um".

Corolário inevitável deste facilmente compreensível pressuposto, é que o liberalismo que extravasa a fronteira precisa em que entramos no domínio do interesse social legítimo dos nossos concidadãos não passa de incitamento à mais abjeta e caótica anarquia, ao primado do egoísmo e do egocentrismo, à irracionalidade de quem pretende, à viva força, que a liberdade individual de qualquer um - ao que quer que seja e por mais doentia e desvairada que ela seja - se sobrepõe, sempre e incondicionalmente, a qualquer esforço sério e socialmente legítimo do Estado de direito na defesa dos interesses da população.

Esquece-se, porventura, quem o defende de que, se ele e os outros acérrimos defensores circulam em segurança pela via pública e se sentem seguros nos seus lares, tal se deve à ação do Estado na perseguição, detenção, julgamento, condenação e - quando não os deixa fugir... - detenção de quem comete crimes, designadamente contra as pessoas e contra a propriedade, em tais atividades estando o mesmo Estado, afinal, a fazer precisamente aquilo que dele se espera e que é, ao fim e ao cabo, parte importante da sua razão de ser.

Olvidam, também, essas pessoas que, tal como a lei penal considera criminoso quem mata, quem fere, quem, de alguma forma, causa prejuízo grave a outrem, criminoso é, também, quem causa ou se arrisca a causar-lhe sério dano à saúde. Isto, seja o agente um mal intencionado e mal formado ser humano  ou um virus na sua atividade legítima e habitual.

Pretender, mesmo sem assumir contornos negacionistas, que cada indivíduo tem a liberdade de escolher ser vacinado ou não quando estão em causa a eficácia, a eficiência e, mesmo, a sobrevivência do Sistema Nacional de Saúde - não apenas no tratamento de doentes com COVID-19 mas no dos que padecem de qualquer outra doença - é ultrapassar todas as linhas encarnadas do que é natural, legítimo, razoável; é ultrapassar o mais liberal limite da própria definição de humanidade.

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Dar eco, como há dias deu o jornal Observador, a um arrazoado de infindáveis aberrações*) por parte de uma representante da assim chamada Oficina da Liberdade*) que sustenta que se torna cidadão de segunda quem vive em países que, à falta de alternativa, se vêem constrangidos, para evitar a propagação da pandemia, a decretar a vacinação obrigatória não estará, propriamente, a agir no exercício da liberdade de imprensa, antes talvez a propagar ideias perigosas, bem próximas de um acéfalo e parolo negacionismo e que, numa altura tão crítica para estas andanças como é a do Natal, se arriscam a prejudicar gravemente o mais legítimo e sagrado interesse nacional.

Pretender, por exemplo, que "por toda a Europa, parece renascida a ideia de que quaisquer medidas adotadas pelo poder político, em nome da saúde pública, são legítimas, mesmo que sejam absurdas, como é o caso da irónica divulgação de dados pessoais de saúde para aceder a um restaurante de fast food" diz bem da verdadeira natureza das ideias expressas, quando é certo e sabido que, para aceder a qualquer restaurante, basta apresentar um certificado digital a uma aplicação que apenas responde "Válido", sem especificar se o é por a pessoa ter contraído anteriormente a doença, por ter sido vacinada ou por qualquer outra razão admissível. Ou seja: sem revelar qualquer dado pessoal de saúde, mas apenas o estado de conformidade ou de inconformidade perante uma lei que vai de encontro ao mais básico e universal interesse nacional.

Como pode, de facto, alguém pretender que é do interesse ou do bem-estar de qualquer indivíduo estar permanentemente sujeito a uma contaminação potencial?  Como pode alguém de boa-fé alegar que a administração de uma vacina viola a dignidade humana? Ou que está a ser discriminado alguém impedido de entrar num restaurante por não apresentar a prova possível de que tudo fez para não contaminar outros?

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O apodado "certificado digital da discriminação" não passa de um "certificado digital da diferenciação", apenas condenável por aqueles que defendem a liberdade de tudo e a qualquer preço, não hesitando em, a contrario, violar a própria Constituição que dizem defender, já que insistem em considerar tudo igual a tudo. Mesmo ao que, manifestamente, por natureza ou por estado é tudo menos igual.

A manipulação da comunicação com os espíritos de leitores menos críticos ou menos preparados a troco de algo que, num tal quadro, poderá ser facilmente confundido como ânsia de protagonismo ou de promoção social ou profissional parece pouco prudente, nada profícua e, até, contraproducente para a imagem própria de alguém que ciosamente se possa estar a procurar promover ou socialmente alardear.

A defesa dos interesses e direitos de cada cidadão é fundamental para evitar abusos e desmandos como aqueles que durante décadas conhecemos em Portugal. Mas é pernicioso e atenta contra os mais elementares e nobres propósitos de qualquer organização societária insurgirmo-nos contra aquilo que, objetiva e fundamentadamente, a Ciência e os seus representantes consideram uma precaução essencial.

ª ª

No âmbito da defesa dos interesses e direitos, até que ponto será lícito o Estado conceder gratuitidade de tratamentos a pessoas que, simplesmente, se recusam a tomar as precauções consideradas essenciais a limitar a propagação da doença?

(continua aqui)

sábado, 11 de setembro de 2021


INEM 112: Socorro! A Ambulância Perdeu-se!


"A Referência Exata de Local (REL) responde positivamente
a cada uma das ineficiências da extensa lista apresentada ao permitir,
de forma muito dificilmente sujeita a erro, direcionar um condutor ao ponto exato,
seja da emergência, seja da entrega de bens, seja onde determinado serviço deva ser prestado
"


1. Introdução: Caricatura

2. Enquadramento: Situação Atual

    2.1. Possíveis Fontes Humanas de Problemas na Localização de uma Morada

        2.1.1. Semelhanças na Toponímia
        2.1.2. Escassez de Sinais de Direção
        2.1.3. Confusão entre os Diversos Tipos de Artéria
        2.1.4. Indicações Essenciais Inexistentes ou Ilegíveis
        2.1.5. Dificuldade na Localização de Edifícios Isolados
        2.1.6. Síntese das Fontes Humanas de Problemas na Localização
        2.1.7. Custos Marginais Evitáveis Associados à Ineficiência na Localização

    2.2. As Limitações e os Erros na Informação das Coordenadas GPS

        2.2.1. Problemas Práticos da Referenciação das Coordenadas
        2.2.2. O que Não Tem, Mesmo, Remédio

    2.3. Síntese do Enquadramento

3. Modelo: A Referência Exata de Local (REL)

    3.1. Apresentação
    3.2. Especificação
    3.3. Confirmação da Morada por Identificação Visual do Local
    3.4. Recolha e Armazenamento dos Dados
    3.5. Processamento e Disponibilização da Informação

4. Conclusão

    4.1. Limitações, Cuidados e Sugestões
    4.2. Reflexões Finais

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1. Introdução: Caricatura

Caricatura ao Telefone
Temos bem vivos na memória os “Bombeiros de Mafamude”, farsa dos Gato Fedorento*) ao incidente ocorrido quando de uma chamada ao Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), incidente esse que acabou por se tornar paradigma da ineficiência dos serviços de urgência em Portugal.

Corria a primeira semana de Janeiro de 2008.

Na raiz desse triste episódio estava a nímia esqualidez organizacional do Instituto, que não tinha protocolo assinado com qualquer das corporações de bombeiros de Alijó*), concelho onde se deu a ocorrência.

Para agravar a situação, o sinistro aconteceu em Castedo, aldeia de cuja localização a equipa da viatura médica de emergência e reanimação (VMER, ambulância) nem desconfiava, pelo que houve necessidade de estabelecer diálogo com um descontraído e aparentemente meio adormecido bombeiro de Favaios que, durante um longo minuto, lá foi tentando explicar como a ambulância poderia chegar ao Castedo, partindo de Vila Real.

Aqui fica um pequeno excerto do diálogo, para recordar do que estamos a falar…

    “Médica - Podia-nos dar algumas indicações, então, sobre aquilo?   /   Bombeiro – Como? Como?

    Médica – Onde é que é? Se nos podia dar algumas indicações…   /   Bombeiro – (suspiro) Ora bem, eu não sei como é que lhe vou dizer… que lhe vou explicar… eeeh… aquilo chega-se ali a Alijó… aaahhhh… vai ali ao pé das bombas de gasolina…

    Médica – Sim.   /   Bombeiro – Nas bombas de gasolina em cima tem uma rotunda à esquerda… aaahhh… na rotunda corta à esquerda, que é para ir para o Intermarché, e sempre, sempre, sempre em frente é Castedo, sempre pela estrada a fora.

    Médica – É?   /  Bombeiro – É.

    Médica – Para onde, desculpe?   /   Bombeiro – Para o Castedo.

    Médica – Castedo, ok. Pronto, obrigada.   /   Bombeiro – E agora, o que é que eu faço?

    Médica – Diga?   /   Bombeiro – E eu o que faço? É preciso lá ir eu?”.

(Antes de continuar a ler, será conveniente ouvir aqui*) a inesquecível gravação
para se saber ao certo do que estamos a falar).

Conversação
A conversação com o bombeiro durou quase dez minutos, dos quais um inteiro foi gasto com a transmissão de indicações - imprecisas e com relativamente baixa probabilidade de sucesso - quanto à forma de chegar a uma aldeia no Concelho de Alijó, minuto esse ao qual haverá, inevitavelmente, que acrescentar o tempo gasto pela VMER, uma vez em Castedo, a procurar, primeiro, o Bairro e, depois, o número de polícia*) da porta onde se teria dado a ocorrência.

Não será exagero dizer que, toda esta confusão com o endereço terá custado dez preciosos minutos a uma vítima… em provável paragem cardiorrespiratória.

Isto aconteceu treze anos atrás.

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Na altura, o Ministro da Saúde admitiu que “há muito trabalho a fazer”, designadamente “cobrir o país com ambulâncias*), como se fosse essa a única falha emergente da comunicação telefónica e o facto de cobrir o País com ambulâncias valesse por si só, sem ser acompanhada da preocupação de tornar a rede eficiente no que diz respeito ao rápido e fácil acesso a qualquer local de sinistro.

Claro está que a efetiva falta de ambulâncias era, então – e eventualmente ainda será – um tema de extrema atualidade e que importava sobremaneira resolver. Mas, também não é menos certo que este tipo de falha não é transversal a todo o País, havendo zonas em que, apesar de a quantidade de veículos ao serviço ser adequada, as coisas nem sempre correm pelo melhor.

Entre as variáveis que afetam e atrasam a prestação de socorro praticamente por todo o território encontra-se a imprecisão que, pelas mais diversas razões, ocorre, quer na indicação da morada durante a chamada de emergência, quer, por causas também variadas, na anotação da mesma pelo operador do call center do Número Naional de Emergência (112), quer, ainda, na procura da localização precisa do destino por parte do condutor da VMER.

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Há algumas semanas, embora em urgência de menor gravidade clínica, uma pessoa dos meus conhecimentos que caminhava na estrada viu a assistência que solicitara através do 112 prejudicada por um atraso de mais de vinte minutos na chegada da ambulância devido ao facto de a operadora do call center haver registado como localidade uma outra, de nome semelhante mas situada a uma meia dúzia de quilómetros por estrada lenta, daquela onde ocorrera o sinistro.

VMER na localidade errada
Dirigiu-se, assim, a VMER à localidade errada – dez minutos de desvio num sentido e outros dez no outro -, além do que por lá perdeu, pelo menos, cinco minutos à procura do sinistrado, até que acabou por contactá-lo através do telemóvel cujo número tinha sido informado quando do pedido de assistência. Enfim, como em tantos casos semelhantes, lá se esclareceu a situação, desta vez sem consequências de maior.

No entanto, a ambulância esteve ocupada mais tempo do que o estritamente necessário; a equipa que a tripulava, também; gastou-se combustível desnecessário; a vítima permaneceu ferida e ansiosa também durante mais tempo do que o estritamente necessário, e por aí fora na lista de custos supérfluos e de evitáveis inconvenientes.

Era, de facto, coisa de pouca gravidade. Mas, caso se tratasse, como no incidente de Castedo, de uma provável paragem cardiorrespiratória, que impacto teriam estes vinte e tal minutos tido no desfecho da situação?

Pois é…

Têm em comum estes dois episódios, de gravidade e de natureza distinta, dificuldades de navegação do veículo de socorro até ao local do sinistro, problema que afeta, naturalmente, todos os condutores que conduzem viaturas de socorro - como nas forças policiais, nos bombeiros, empresas de segurança e afins - sem falar de todo o tipo de empresas cuja atividade implica deslocações frequentes a destinos não conhecidos previamente dos motoristas.

Como será possível, na quase totalidade dos casos, de forma significativa, eficiente e económica, reduzir drástica e definitivamente o tempo perdido com a condução até destinos errados devido a desconhecimento da localidade e da artéria, a uma incorreta anotação do endereço ou, até, a erro na sua interpretação?

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Refletirei, de seguida, sobre as diversas fontes de erro sempre latentes na indicação de endereços na forma tradicional, bem como sobre a problemática da eficácia ou ineficácia da indicação alternativa de coordenadas para navegação por GPS.

Passarei, então, a propor um modelo de referenciação complementar de prédios urbanos, rústicos ou mistos, visando a sua eficiente e eficaz localização.

Ambulância torcida
No quadro da modernização administrativa de um setor tão crítico como o da prestação de socorro, é imperativo reduzir o tempo de assistência, bem como o de ocupação das viaturas e das suas tripulações. São, assim, destinatários principais da solução proposta, os serviços de urgência, médica, medicamentosa policial e afins.

Colateralmente, beneficiarão do aqui proposto as empresas de distribuição postal ou de mercadorias, bem como os prestadores de serviços pontuais ao domicílio ou em instalações públicas ou empresariais - como, por exemplo, os serviços de enfermagem, os de limpeza ou os de assistência técnica, ente tantos outros possíveis -, além das equipas de reportagem de órgãos de informação, assim se obtendo, designadamente, ganhos de eficiência que permitirão significativas melhorias na qualidade do trabalho e na rentabilidade operacional, além da redução na emissão de poluentes para a atmosfera.

Como mais à frente veremos, a solução proposta é de implementação muito fácil e rápida - aproveitando sistemas informáticos já ao serviço da Administração Pública - além de implicar um investimento muito reduzido por parte do Estado e de ser gratuita para as empresas e particulares, aos dois últimos apenas sendo pedido, no próprio interesse a manutenção de uma minúscula placa e, a título facultativo e por uma única vez, alguns minutos de atenção e de dedicação.

Impossível?

Vamos ver…


2. Enquadramento: Situação Atual


2.1. Fontes Humanas de Problemas na Localização de uma Morada


2.1.1. Semelhanças na Toponímia

Os condutores residentes ou que trabalham na região onde é originado o pedido de socorro tendem a conhecer a maior parte dos locais vizinhos e a saber distingui-los, assim se tornando relativamente rara – mas não totalmente evitável – a confusão entre localidades próximas entre si e com designações semelhantes. 

Operadora tranquila
De idêntica vantagem não dispõem, porém, os distantes operadores do call center do 112, centralizados numa mesma localização geográfica e dos quais seria desrazoável esperar que estivessem igualmente familiarizados com todas as regiões e localidades onde são originados pedidos de socorro.

Para estes, num momento de desconcentração de um dia e hora de maior movimento e por mais legítimas que sejam as razões na sua génese, fácil se tornará confundir, no concelho de Barcelos, Rio Covo – Santa Eulália com Rio Covo – Santa Eugénia. Principalmente se, como é natural acontecer, quem faz a chamada se esquecer, num momento de tensão, de especificar o nome da Santa, dizendo apenas Rio Covo e assim abrindo portas ao equívoco.

Ora, entre as duas aldeias – Santa Eulália e Santa Eugénia – existem sete minutos de estrada para cada lado, aos quais haverá a acrescentar o tempo desperdiçado pela VMER na tentativa de localização de um endereço inexistente; e foi, precisamente, um destes o caso que acima referi como ocorrido com uma pessoa minha conhecida, que ficou desnecessários vinte e tal minutos suplementares à espera de socorro, em plena estrada estreita, bastante esburacada e de não muito fácil acesso.

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Estes casos de designações toponímicas semelhantes e propiciadoras de erro na referenciação não são assim tão poucos. Sem procurar ser exaustivo, extraí alguns de uma listagem de freguesias por concelho*), os quais passo a apresentar.

Localidades mais sujeitas a erro na rota da VMER

Num tal panorama, as possibilidades de erro são, como é bom de ver, diversas e variadas: de baixo/de cima, nova/velha, nomes de santos diferentes para uma mesma designação principal. 


Veja-se o caso extremo dos São Bento do Ameixial, de Ana Loura e do Cortiço,  muito próximos uns dos outros no concelho de Estremoz: se disserem ao operador que anota a chamada 'aqui em São Bento’, ele escreverá apenas São Bento já que, como não é do mesmo concelho nem lá mora, nem desconfia de que três aldeias do mesmo nome nele possam coexistir. Depois, quando o bombeiro ou o condutor da VMER perguntam ao mesmo operador ‘Mas, São Bento? Qual?’, vá de ligar para o participante do sinistro e de gastar mais preciosos minutos a esclarecer o equívoco, que poderá, ainda, piorar quando descobrirem que ali por perto anda, também, uma… Santa Vitória do Ameixial.

Entretanto, o sangue corre, o AVC continua a progredir, ou, mais simplesmente, a ferida começa a infetar…

Isto, para não falar da existência, num mesmo Concelho, de designações principais diferentes para um mesmo santo, de vilar ou vilela disto ou daquilo, de designações semelhantes (Boivães/Bravães), de ordem invertida (Ribeira de São João/São João da Ribeira), todas propícias a confusões de muito provável ocorrência, implicando, um pouco por todo o território, tempos de percurso agravados em múltiplas situações que o quadro acima apenas parcamente exemplifica, para a enumeração se não tornar fastidiosa.

Mesmo nos casos de curta distância, será sempre significativo o tempo decorrido à procura do endereço errado até que o motorista se aperceba da anomalia.

Se a situação clínica for realmente grave, ao fim desses poucos minutos… mais uma família estará de luto precoce.

Evitavelmente.


2.1.2. Escassez de Sinais de Direção

A fabricação, em expressiva quantidade, das placas que, por toda a parte, deveriam indicar aos automobilistas a direção de localidades, de lugares, de bairros ou de locais dignos dessa menção é dispendiosa, e a manutenção das mesmas em boas condições de legibilidade implica o recurso a mão de obra também dispendiosa e nem sempre disponível em quantidade suficiente para se antecipar às causas da deterioração, que vão desde a ação da Natureza aos atos de vandalismo por parte de uns quantos degenerados que andam por aí.


Contexto
Neste contexto, ainda que a morada esteja completa, mesmo que seja a constante do registo do prédio e tenha sido exatamente anotada pelo operador de call center, sempre poderá suceder que os dados dela constantes não correspondam a um local devidamente sinalizado dentro da localidade. Se, por exemplo, o endereço for Bairro de São Pedro, Lote C-D, será necessário que, em cada entrada da localidade, exista um sinal de direção relativo ao dito Bairro, a fim de que o condutor para lá possa dirigir a VMER, o que nem sempre acontece, mormente em casos de bairros de construção recente.

Nestas circunstâncias, o recurso habitual será, como se de um veraneante em tranquilo gozo de férias se tratasse, o condutor parar a ambulância em marcha de urgência para perguntar o caminho a um qualquer transeunte – que pode, também ele, não saber informar -, ou para indagar num estabelecimento comercial, com a inevitável demora que tudo isto não deixará de significar..


2.1.3. Confusão entre os Diversos Tipos de Artéria

Da listagem das abreviaturas recomendadas pelos CTT*), constam perto de trinta tipos de artérias, como avenida, rua, travessa, calçada e calçadinha, e outras que tais.

Não será, pois, de admirar, muito especialmente nas maiores cidades, a ocorrência de inúmeras dúvidas e de numerosos erros ao transmitir ou anotar um endereço, particularmente em pouco tranquilas situações operacionais.

Essa dúvida, pode, aliás, nem sempre ser expressa ou, mesmo, apercebida, limitando-se o operador que desconhece a existência, na mesma localidade, de uma Rua das Flores e de uma Travessa das Flores a anotar o endereço Rua das Flores, 43-F que um primo afastado de visita ocasional à vítima telefonicamente transmitiu em estado de desespero, quando a verdade que é se encontravam na Travessa das Flores, distante largos minutos da rua do mesmo nome, e bastantes mais em horas de ponta, que é, quase sempre, quando estas coisas acontecem, vá lá saber-se porquê…

O certo, é que mais umas boas dezenas de irrecuperáveis minutos ficam para trás, enquanto a VMER faz o que pode para dar com a rua, quando era para a travessa que, quando partiu, deveria ter sido direcionada.


2.1.4. Indicações Essenciais Inexistentes ou Ilegíveis

Indicações essenciais ilegíveis
Bairro de São Vicente, Lote C é um destino que faz qualquer motorista torcer o nariz.

Ainda que uma sequência clara de sinais de direção indique o dito Bairro, o Lote C pode ser uma entre dezenas ou centenas de casas que o constituam e, contrariamente ao que sucede com um arruamento tradicional no centro de uma localidade – em que a localização aproximada do edifício é facilmente previsível por os números de polícia se encontrarem em sequência de números ímpares ou pares -, resulta praticamente impossível encontrar o dito lote sem perder tempo a parar para perguntar a um residente.

Ora, se a pessoa interpelada nem um residente for, quantos transeuntes ocasionais saberão onde fica o Lote C de um bairro que, por mero acaso, estão a atravessar?

A quantos terá o motorista de perguntar? Quanto tempo precioso deverá desperdiçar?

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Pode, também, dar-se o caso de a morada ser insuficientemente conhecida ou incompletamente indicada pela pessoa que pede auxílio – por exemplo, um passante, para alguém que, à sua frente, tombou no solo diante da entrada de um edifício. Se o número da porta estiver visível, o que nem sempre acontece, poderá indicá-lo; mas, se for um passante, que probabilidade teremos de que saiba o nome exato da rua? E se nem uma placa com o número da porta existir para ajudar?

Nestas circunstâncias, e se mais ninguém por ali estiver a passar, que probabilidade haverá de que o operador do call center receba uma informação fidedigna que possa transmitir ao condutor da VMER?

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Admitamos, apesar de tudo, que a pessoa sabe o nome da artéria e que esse nome está visível para o motorista; ou, até, que quem pede socorro é alguém que reside com o sinistrado, e conhece perfeitamente o endereço completo do local: se, numa série de meia dúzia de edifícios, nenhum tiver a placa com o número da porta – como tantas vezes sucede -, como saberá o condutor à frente de que prédio parar?

Esta situação é semelhante à que poderá, facilmente, ocorrer numa das nossas estradas, nas quais a maior parte dos marcos quilométricos há muito deixou de existir – nomeadamente os que indicam os hectómetros - ou se encontram em estado de tal forma degradado que se torna impossível deles extrair qualquer informação válida: ainda que a indicação esteja perfeitamente legível no marco que sinaliza o hectómetro “5” do quilómetro “12”, sempre haverá que perder tempo a conduzir – ou a caminhar… - quinhentos metros até ao quilómetro inteiro mais próximo até o participante que passou pelo local do acidente se inteirar do número da estrada secundária, coisa que muito poucos terão presente quando a estão a percorrer.

Puzzled operator 2.1.5. Dificuldade na Localização de Edifícios Isolados

Operador – “Pode informar-me a morada, por favor?

Participante do sinistro – “Fica a uns cinquenta metros da Quinta das Maravilhas, naquela estradinha que vai de Canecas de Baixo a Garrafas de Cima. Antes de chegar àquela curva à esquerda, mete à direita por um caminho de terra batida, anda uns duzentos metros, chega ao cruzamento, vira à direita, anda um bocadinho e é logo ali”. Lembram-se da descrição feita pelo bombeiro à médica do INEM? Pois será mais ou menos isso…

Quantas vezes acontecerão situações destas? Quanto tempo irá o operador do call center demorar a interpretar e anotar tudo aquilo da forma mais clara possível? Quem chegará ao local com indicações tão pobres? E quanto tempo depois, se acabar por chegar?...

Quando, na melhor das hipóteses, acabar por conseguir aproximar-se razoavelmente do local, como o identificará se no portão de entrada não existir uma placa com os dizeres “Quinta das Maravilhas”?

Como irá a história acabar?


2.1.6. Síntese das Fontes Humanas de Problemas na Localização

Sem prejuízo, naturalmente, de outras situações que poderão ocorrer e que os motoristas profissionais conhecerão melhor do que ninguém, as anteriormente exemplificadas têm, essencialmente, como fontes:

   i Semelhança do nome da localidade de destino com o de localidades limítrofes ou próximas no mesmo município

   ii Insuficiência ou inexistência de sinais de direção

  iii Existência, na mesma localidade, de mais do que uma artéria com a mesma designação, embora de diferentes tipos

  iv Inexistência ou ilegibilidade de indicações essenciais relativas à localização do prédio de destino

   v Inexistência ou ilegibilidade de marcos quilométricos

  vi Impossibilidade prática de indicar com precisão a localização de prédios isolados

VMER em loop
Saliente-se que, nos casos referidos nos pontos i., iii., v., vi. e, em certos casos, também no ponto iv., o erro não é evitável pela introdução do endereço tradicional no Waze®, no Google Maps® no TomTom® ou em qualquer outro sistema de navegação, que apenas em algumas situações do ponto ii. poderão auxiliar.

Num tal panorama, e mesmo num dia calmo do call center e em que o quartel dos bombeiros e o centro de saúde estejam repletos de ambulâncias, quem poderá estranhar a demora na chegada do socorro?

Que preço em cuidados de saúde – ou em vidas… - estaremos a pagar por tudo isto, diariamente, durante todo o ano? Sem falar nos casos em que as forças policiais detêm, indevidamente, anciãos pacatos e indefesos por terem confundido a morada da residência deles com a do criminoso que procuravam…

Faz-vos lembrar alguma coisa?*)


2.1.7. Custos Marginais Evitáveis Associados à Ineficiência na Localização

Os custos não se limitam, porém, ao impacto negativo na rapidez e na qualidade global da assistência prestada.

Como impactos económicos marginais negativos há a destacar, desde logo, a ocupação indevida da viatura de socorro e de uma equipa de duas pessoas – exceto no caso das motorizadas - que anda de um lado para o outro, a perguntar a este e àquele, até encontrar o local onde deve dirigir-se.

O desperdício não só é significativo quanto ao tempo despendido, mas também, em números agregados da frota, em muitos milhares de quilómetros percorridos desde o início ao fim do ano, com o dispêndio de combustível inerente e a necessidade de manutenções de rotina mais frequentes, para não falar do inútil desgaste suplementar das viaturas, tendente a determinar o seu abate precoce.

Se atentarmos no quadro exemplificativo acima incluído em 2.1., facilmente concluiremos pela enorme desproporção entre os 9 km a percorrer em treze minutos até um endereço completo e claramente indicado em Barrosas – Santo Estêvão por uma ambulância estacionada em Vila Verde ou, caso ocorra erro ou imprecisão na indicação da freguesia, os 17,2 km (17 minutos) de Lousada a Santa Eulália onde se constataria o erro, acrescidos dos 9,3 km (15 minutos) de Santa Eulália a Santo Estêvão, onde deveria ser assistido o sinistrado.

Preço a pagar em vidas
Ou seja: em lugar de 9 km em treze minutos, a VMER e os dois profissionais da saúde percorreriam 26,5km em 32 minutos, o que representaria um acréscimo de 194% na distância e de 146% no tempo de percurso – e, possivelmente, um óbito ocorrido nos 23 minutos perdidos no trajeto, mais alguns passados a procurar uma casa simplesmente não existia, ou na qual nada tinha ocorrido que requeresse urgente auxílio.

No caso da já referida pessoa das minhas relações, o tempo de espera total foi de 35 minutos – os dez correspondentes ao socorro eficiente, acrescidos dos vinte e cinco em que andou a deambular uma ambulância que estava de prontidão à porta do centro de saúde e partiu, no máximo, quatro minutos após a chamada para um percurso total de… oito quilómetros, sempre a direito, por um Itinerário Principal.

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Dir-se-á que casos de tamanha desproporção não serão assim tão frequentes, o que é aceitável. Mas quantos casos com acréscimos menores, mas sempre significativos, não existirão? Qual a aritmética final em combustível gasto, horas de oficina e… vidas?

A tudo isto haverá, evidentemente, que adicionar o risco acrescido de ocorrência de acidentes de viação  durante o tempo em que a VMER anda perdida, não apenas dada a maior distância percorrida, como pelo facto de, como a tripulação não é composta por robots, esta ficar, compreensivelmente, perturbada por saber que uma vítima acabará prejudicada devido ao erro, assim havendo, ainda, que adicionar o desgaste emocional associado à tensão nervosa ao facto de, tal como a ambulância, os recursos humanos ficarem retidos mais tempo do que o necessário, logo, menos disponíveis para acorrer a outras situações.

Tal como os elementos da equipa da VMER, o operador do call center ficará, também ele, retido ao telefone mais tempo do que o necessário, já que irá ser, inevitavelmente, contactado pelos tripulantes na tentativa de obter esclarecimentos complementares quanto ao endereço.

Não será, assim, de admirar que uma outra ligação para o 112, efetuada poucos minutos depois, demore a ser atendida, e que, por via do atraso escusado no serviço, as vítimas de outros episódios de urgência em que o endereço seja corretamente processado acabem por ver o socorro atrasado por indisponibilidade de quem anda de Herodes para Pilatos à procura do edifício correspondente a uma morada que lhes deveria ter sido transmitida com toda a precisão. Mas não foi...

Decorrentes de todos estes atrasos e ineficiências, haverá, naturalmente, que considerar também os custos de imagem para o INEM e para o Estado, nos quais todos, em princípio, deveríamos confiar.

Dificuldade na localização de endereços
Por fim, juntando às ambulâncias e outras viaturas de socorro todos os veículos cujos condutores experimentam idênticas dificuldades na localização de endereços – carrinhas e camionetas de distribuição, equipas de reportagem, veículos de empresas de serviços ao domicílio, como enfermagem e assistência técnica -, não será difícil imaginar o impacto negativo global na receita do Estado por via da redução do IRC decorrente de menos favoráveis resultados económicos das empresas afetadas, bem como o impacto ambiental agregado das emissões de gases poluentes.

Aqueles que acham que nada disto tem a ver com eles, pensem então quanto, ao longo de um lustro ou uma década, tudo não representa em impostos desnecessariamente cobrados aos cidadãos.  A cada um deles!

Porque, até pelas coisas que acontecem só aos outros, de alguma forma acabamos por pagar todos nós.

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Em síntese, temos como custos marginais supérfluos:

  » Quanto ao Equipamento

      • Maior gasto de combustível

      • Necessidade de mais frequantes operações de manutenção das viaturas

      • Menor duração útil das viaturas

      • Maior risco de acidente rodoviário

      • Maior tempo de indisponibilidade da ambulância


  » 
Quanto às Pessoas Diretamente Envolvidas

      • Agravamento da situação clínica e da probabilidade de óbito do sinistrado

      • Maior tempo de indisponibilidade da tripulação da VMER

      • Maior desgaste emocional da tripulação com inevitável impacto negativo sobre o desempenho na prestação do socorro

      • Maior tempo de indisponibilidade do operador do call center

Mapa de São Domingos de Ana Loura
 
» 
Quanto à Generalidade da População

      • Menor rentabilidade das empresas de distribuição, de assistência técnica e de prestação de outros serviços ao domicílio

      • Impacto negativo sobre a imagem do INEM e do Estado

      • Efeitos nocivos da emissão de gases poluentes

      • Impacto dos custos na receita fiscal

Num tal quadro, os atrasos e as frustrações serão, mesmo, de admirar?


2.2. As Limitações e os Erros na Informação das Coordenadas GPS

Bem, dir-se-á, mas as ambulâncias estão equipadas com dispositivos de navegação por GPS – ou, pelo menos, os telemóveis dos tripulantes permitem-na … – e, quem pede auxílio, sempre poderá indicar, além do endereço na forma tradicional, as coordenadas exatas do local do sinistro.

Ninguém duvida. Mas, como adiante veremos, contrariamente ao que acontece com os endereços em língua de gente que a todas as horas e minutos introduzimos no telemóvel para obter o melhor caminho para lá chegar, a indicação por coordenadas do sistema GPS foi pensada mais para as máquinas e menos para as pessoas, o que aparece como uma das razões possíveis para que, se considerarmos a generalidade da população e das situações – particularmente em casos de picos de enervamento, como nos pedidos de socorro -, poucas vezes essa indicação seja publicitada ou pontualmente transmitida.

Lá se vai vendo um ou outro anúncio de restaurante, ou de andar para venda com a indicação das coordenadas; mas muito raramente, e em muito poucos tipos de situação, também.

Quais serão, então, as razões específicas para tão fraca adesão?


2.2.1. Problemas Práticos da Referenciação das Coordenadas

Uma razão provável da fraca utilização das coordenadas como referência de local será a existência, não de uma única, mas de três notações distintas e, mesmo dentro de cada uma delas, com variações:

     • Notação complexa, em graus, minutos, segundos e decimas de segundo (DMS): gg°mm'ss.s"

     • Notação decimal, em graus e centésimas-milésimas de grau: (DD): gg.ggggg

     • Notação mista, em graus, minutos e décimas-milésimas de minuto (DMM): gg mm.mmmm

Mapa distorcido
Como se não bastasse, a indicação dos pontos cardeais também varia, podendo acontecer antes ou depois do valor numérico, e utilizando letras ou sinais aritméticos.

Assim, teremos, por exemplo, “N gg.ggggg W gg.ggggg” ou “gg.ggggg N gg.ggggg W”, ou, ainda, “(+)gg.ggggg -gg.ggggg”, ou qualquer uma de outras dezenas de combinações possíveis.

Dado que boa parte dos navegadores apenas aceita uma destas notações, e nenhum deles aceita todas, imagine-se o tempo perdido a procurar o conversor adequado e a utilizá-lo quando o participante do sinistro informa N 38°51’23.080” W 9°6’11.455” e o navegador GPS do condutor da VMER só aceita o formato gg.ggggg -gg.ggggg, o que corresponderia a 38.856411 -9.103182.

Alguém normal se entende no meio de uma confusão destas?*)

A agravar o que já de si é bem grave, também existem diversos sistemas, não apenas de notação mas de medição, como o Datum 73, o WGS84 e o ED50 - mais ou menos utilizados, é certo -, para dar com qualquer um em doido, e inviabilizar totalmente o recurso fiável à indicação das coordenadas geográficas para localizar, com inequívoca precisão, o destino de um condutor.

Sobretudo ao atender uma emergência…

Tão útil, indispensável e preciso é, pois, o sistema GPS no seu funcionamento, como é perigosamente falível na transmissão ou introdução de coordenadas por humanos.

- x –

A indicação da coordenadas é inesperadamente equívoca num sistema de tamanha precisão, não apenas devido à existência de variados sistemas de medição e de notação, como ao facto de a combinação das duas coordenadas resultar numa expressão indesejavelmente extensa e, em certos casos, praticamente sem separadores, o que dificulta a transmissão verbal e, até, a simples leitura, gerando erros potencialmente catastróficos quando se trata de prestar auxílio urgente.

Pode, pois, dizer-se que, no que se refere à indicação do endereço mediante a entrada das coordenadas, o GPS, tão preciso no funcionamento, nasceu com o formato infetado pelo vírus da confusão.


População de Ambulâncias
2.2.2. O que Não Tem, Mesmo, Remédio

O problema mais sério que afeta a utilização das coordenadas para referir um local não reside, porém, na inevitável ambiguidade gerada pela diversidade de formatos e pela extensão e falta de clareza da notação.

Em boa verdade, estes inconvenientes até poderiam, em tese, ser resolvidos mediante a normalização para um sistema de notação único, acompanhado de um separador complementar de traço ou de ponto a intercalar nos decimais extensos – a ser esse o formato finalmente adotado - ou por expediente similar, um pouco na linha dos traços que separavam os grupos alfanuméricos das matrículas portuguesas de automóveis, cuja supressão a leitura por humanos acabou por dificultar.

Isto, apesar de as tentativas de normalização de sistemas tenderem a perder-se em discussões intermináveis, e de, faça-se o que se fizer, a sequência de algarismos ou de letras e algarismos das coordenadas continuar extensa, confusa e, sobretudo, difícil de ditar.

Mas o mau, mesmo, é que além da possibilidade de erro na localização por circunstâncias diversas – como as condições ambientais e as características técnicas do equipamento de leitura no que se refere, por exemplo, à antena ou à potência de receção -, o que não tem solução é a impossibilidade material de validação da mais do que falível indicação de coordenadas transmitida.

Vejamos…

Voltando ao exemplo anterior das coordenadas 38.856411 -9.103182, se o participante do sinistro indicasse, por lapso, 38.856411 -9.103183 - em vez de 2, como seria correto –, mesmo que não ocorresse erro significativo na precisão do dispositivo de leitura a VMER desviar-se-ia escassos dez centímetros da localização informada, o que, por ser impercetível, não teria qualquer importância.

Se o erro fosse, por exemplo, 38.856411 -9.103192, a diferença seria também insignificante, cifrando-se em pouco mais de um metro, também sem provocar qualquer dano.

No entanto, e como é mais do que evidente, o erro – ou os diversos erros… - pode ocorrer com a mesma facilidade ao indicar um dos últimos dígitos de cada coordenada, como ao indicar um dos primeiros!

Por isso mesmo, se o erro fosse, por exemplo, 38.856411 -9.104182, a ambulância dirigir-se-ia para um quarteirão adjacente ao do edifício onde a vítima se entraria; e, se fosse 38.856411 -9.203182 o desvio seria de uns bons dez quilómetros*), acarretando consequências que poderiam ser mais nefastas do que aqui seria viável descrever.

O que não tem mesmo remédio
Ora, o que não tem, mesmo, remédio é a impossibilidade prática de adicionar à indicação das coordenadas um ou mais dígitos de verificação (check digits *)), como acontece, por exemplo, no IBAN, nos números dos cheques bancários e em tantas outras situações da vida corrente em que dessa existência nem nos apercebemos.

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Clarificando um pouco, os check digits são algarismos que não fazem parte da numeração e têm como única função procurar garantir que a parte significativa da referência numérica se encontra corretamente indicada.

Exemplificando com uma situação bem simples, o código internacional de Portugal a duas letras é “PT”, de acordo com a norma ISO 3166-1 alpha-2*). Esta é também, como todos sabemos, a designação que corresponde às duas letras iniciais de uma referência IBAN.

No entanto, dado que seria relativamente fácil alguém cometer um erro ao transmitir ou ao digitar o “PT”, estas duas letras são sempre seguidas dos algarismos “5” e “0”, assim se formando as quatro primeiras posições do IBAN correspondente a uma conta bancária num banco português que é, como se sabe, a sequência “PT50” – em Espanha, “ES39”, em França “FR14” e assim por esse Mundo fora, sempre com o objetivo de evitar erros numa indicação unicamente alfabética a duas letras do país.

O efeito prático é o “chumbo” do IBAN se alguém introduzir um daqueles números compridos começando por “PT40” ou "PW50" em vez de “PT50”, algo que o sistema informático nunca aceitará porque essas combinações de código de país com os dígitos de verificação – o PT mais o 40, o o PW mais o 50 - simplesmente não existem na referida norma ISO!

A propósito, os dois últimos dígitos do IBAN são, também, check digits, que nada têm a ver com a identificação da conta bancária a que o IBAN se refere, apenas servindo para evitar que o dinheiro que acabou de transferir vá parar onde não deveria ter ido só porque quando lhe informaram, por telefone, o número da conta de destino o seu ouvido estava um pouco entupido, o interlocutor constipado ou tinha sotaque, algum dos dois estava distraído ou… um comboio perturbou a conversa ao passar.

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Ora, as coordenadas a introduzir num sistema de navegação por GPS não têm check digits; nem podem ter, já que, para tanto, seria necessário criá-los e divulgá-los para cada coordenada possível, sendo elas, como facilmente se depreende, aos milhares de milhões!

Mapa de cubos
Restar-nos-ia, pois, sem nos enganarmos, informar as coordenadas, nada fiáveis apesar do aspeto rigoroso e certinho daqueles números todos, e esperar que fossem corretamente entendidas no call center e o condutor também corretamente as introduzisse no telemóvel ou no dispositivo de navegação.

Caso contrário, haveria que perder mais tempo a ligar de volta para quem pediu assistência e procurar esclarecer o equívoco, depois retificar a rota para um ponto a dezenas de quilómetros de distância enquanto a vítima se ia esvaindo em sangue e demorando, toda esta trapalhada, bastante mais tempo do que o desperdiçado, em Janeiro de 2008, numa inesquecível conversa telefónica entre uma médica da VMER de Vila Real e um bombeiro de Favaios, no concelho de Alijó...


2.3. Síntese do Enquadramento

Por muito que a aplicação de navegação por GPS e o dispositivo em que é utilizada sejam fiáveis e precisos, nada poderá evitar um direcionamento errado da viatura de socorro no caso de o endereço de destino ser, no formato tradicional, indevidamente transmitido ou anotado.

Uma eventual ambiguidade na toponímia, a escassez de placas de direção, a multiplicidade de ruas, estradas, calçadas e calçadinhas, a facilidade com que, em situações de perturbação extrema, podem ser transmitidas ou rececionadas informações de endereço erradas, e a dificuldade na identificação da localização precisa de quintas isoladas ou de prédios semelhantes são fatores potenciais de elevado risco de quebra grave – por vezes fatal - na celeridade da prestação do socorro, com consequências nefastas, não apenas para a situação do doente ou do sinistrado, mas para a tripulação do veículo, sobre o dispêndio com a deslocação e sobre a intensidade dos riscos a ela inerentes, sendo também responsáveis por um inevitável e significativo impacto ambiental.

A alternativa à indicação do endereço no formato tradicional - que todos estes erros repetidamente provoca e muitos mais potencia -, não passa, porém, pela substituição daquela pela informação das coordenadas geográficas, extensas, confusas e sem possibilidade mínima de validação, o que as torna, também elas, suscetíveis de provocar desvios de dezenas de quilómetros em relação ao local do incidente.

À custa de tanta diferenciação e de tanta especialização, as coordenadas geográficas, que poderiam representar uma vantagem imensa para a comunidade, transformaram-se, no que respeita à especificação de endereços, numa miragem inacessível para a grande maior parte dos eventuais utilizadores.

VMER a desviar-se
Resta, neste quadro, conceber e implementar, com inegável urgência, um sistema de referenciação que, preferencialmente conjugado com a indicação do endereço no formato tradicional - mas sendo, também, eficaz e funcionando autonomamente -, permita conduzir até ao destino com o erro de navegação limitado ao máximo de escassos metros próprio de um equipamento de navegação digno de tal designação.


3.  Modelo: A Referência Exata de Local (REL)


3.1. Apresentação

A Referência Exata de Local (REL) responde positivamente a cada uma das ineficiências da extensa lista apresentada ao permitir, de forma, se não absolutamente fiável, pelo menos muito dificilmente sujeita a erro, direcionar um condutor ao ponto exato, seja da emergência, seja da reportagem, seja da entrega de bens, seja onde determinado serviço deva ser prestado.

A sua estrutura traz-nos, simultaneamente, as seguintes vantagens:

     i. é incomparavelmente mais precisa do que a do endereço indicado no formato tradicional de artéria, número e localidade;

     ii. é de muito mais fácil leitura do que a informação das coordenadas do local, qualquer que seja o formato considerado;

     iii. contém caracteres de validação que a tornam infalível na exata medida em que anulam a possibilidade de erro na transmissão e na receção da informação;

     iv. é de ditado simples, alternando letras com números, em grupos de reduzida dimensão;

     v. permite que, à indicação da REL pelo participante do incidente, responda o operador do call center pedindo para confirmar que a morada real corresponde à que lhe é apresentada no monitor do sistema de apoio, assim reduzindo drasticamente a possibilidade de equívoco.

A informação quanto ao local exato de destino será, naturalmente, complementada com a indicação do andar e lado ou letra, sempre que aplicável.

Exemplificando, a REL 12.34.AB.56.78.904 pode ser lida como “doze, trinta e quatro, à bê, cinquenta e seis, setenta e oito, novecentos e quatro”, ou como “um dois ponto três quatro ponto Algarve Barreiro ponto cinco seis ponto sete oito ponto nove zero quatro”, ou algo semelhante, ao que o operador de call center responderá “a sua emergência situa-se na Calçadinha dos Morangueiros número trinta e cinco. Confirma?”, seguindo-se, se aplicável, a indicação pelo participante do andar e lado ou letra, e assim se eliminando qualquer razoável possibilidade de engano por troca, por exemplo, com uma travessa do mesmo nome que também exista na localidade.

Mas, vejamos mais pormenorizadamente em que consiste a REL e, seguidamente, como poderá proceder-se à sua implementação.


3.2. Especificação

Os dois primeiros dígitos da Referência Exata de Local correspondem à identificação do distrito*), de um a 18, para este efeito correspondendo os números 19 e 20 às regiões autónomas dos Açores e da Madeira. Assim, uma REL começada por “02” referir-se-á, sempre, a uma localização no distrito de Beja.

O terceiro e o quarto dígitos correspondem ao código de cada concelho dentro do distrito correspondente. Como exemplo, saberemos que uma REL iniciada por “02.06” dirá respeito a uma localização no concelho de Castro Verde, do distrito de Beja*).

Quinta e Sexta posições
As quinta e sexta posições, alfabéticas, correspondem a check
letters, em lugar dos tradicionais check digits já aqui referidos.

Esta opção pelas check letters deveu-se, essencialmente, a duas considerações:

     • Por um lado, porque com a saúde e a vida não se brinca, e a validação com duas das vinte e seis letras do alfabeto garante uma possibilidade de erro cerca de seis vezes menor (1 : 26² = 0,0016) do que a que é proporcionada por dois dos dez algarismos do sistema numérico (1 : 10² = 0,0100).

     • Por outro, em virtude de a utilização de um grupo alfabético intercalando outros numéricos assegurar uma maior fiabilidade do ditado, na medida em que permite evitar erros de transmissão dos grupos numéricos decorrentes da troca eventual da posição relativa de cada um deles.

Por fim, as posições sete a onze designam o código numérico do local de destino dentro do concelho em que está situado, servindo o ponto que separa a oitava posição da nona unicamente para facilitar o ditado e para o tornar menos sujeito a erros.

Há que dizer que, inicialmente, se pensou na possibilidade de fazer o código numérico do local coincidir exatamente com o número constante do registo predial da freguesia em que o prédio estivesse localizado – já que, como adiante veremos, o processamento informático estará intimamente relacionado com esse registo. Corresponderiam, assim, as posições sétima e oitava ao código numérico daquela.

No entanto, além de tal opção reduzir substancialmente a quantidade de números de ordem disponível, a recente dança entre freguesias e uniões de freguesias a que recentemente assistimos, aliada à vontade latente de autonomização de umas relativamente a outras, desaconselha tal escolha, já que o assunto que aqui nos entretém é demasiadamente sério para que fique sujeito a alterações constantes da REL ao sabor de manifestações de bairrismo, de estados de alma, de campanhas eleitorais autárquicas, em suma, da vontade política de uns e de outros.

Num assunto sensível como este, requer-se rigor e estabilidade, deixando a ânsia de protagonismo para outras ocasiões e outras atividades de menor responsabilidade e premência.

A Referência Exata de Local deverá ser obrigatoriamente comunicada por escrito pelos locadores aos locatários e constará dos contratos de arrendamento e de compra e venda de imóveis, bem como dos respetivos anúncios, nos termos que a lei prevê para o Certificado Energético.*)


3.3. Confirmação da Morada por Identificação Visual do Local

Como vimos em 2.1., a possibilidade de erro na indicação ou interpretação da REL no momento da comunicação da emergência fica, praticamente, eliminada pelo facto de, uma vez introduzida aquela no sistema informático, o endereço correspondente ser imediatamente apresentado no monitor do operador do call center, que o lerá ao participante a fim de que este o valide por comparação com a informação que é do seu conhecimento.

Mapa de São Bento
Por outro lado, na generalidade dos casos, não haverá o perigo de a equipa da VMER entrar no prédio errado, já que a exatidão do destino sempre será validada no local mediante a observação no nome da artéria, do número de polícia, da designação da propriedade rural, ou de indicação congénere que desejavelmente existirá junto à entrada.

Utilizando a REL, mesmo se, no caso de imprecisão na navegação devida a variáveis atmosféricas pontuais e impossíveis de controlar, a localização correta não for aquela para a qual o veículo de socorro se dirigiu, será outra no raio máximo do erro do GPS, o qual não deverá, mesmo em casos extremos ultrapassar os cinquenta metros – logo, bem menor do que os quilómetros que separam uma aldeia de outra com nome semelhante -, o que, no local, facilmente pode corrigir-se.

- x –

Acontece, porém, que a Referência Exata de Local se destina, também, a facilitar a localização de emergências ocorridas no exterior de prédios urbanos, rústicos ou mistos, ocorrências geralmente participadas por transeuntes que, em boa parte dos casos, não saberão o nome da artéria em que se encontram; ou de automobilistas que circulam numa estrada e acabam de passar pela Quinta das Maravilhas (v 2.1.5.), próximo de cuja entrada ocorreu o sinistro, e não fazem a mais remota ideia de como informar o operador do call center do 112 de como a ambulância lá poderá chegar em tempo útil .

Assim, e porque importa que o socorro a prestar o seja de forma eficiente, quer dentro, quer fora dos prédios, deverá ser obrigatória a afixação de uma pequena placa – discreta, mas facilmente localizável – na entrada principal do local identificado pela REL, a fim de que qualquer pessoa que passe e presencie o sinistro possa pedir socorro de forma eficiente e eficaz.

A utilíssima plaquinha servirá, até, às mil maravilhas para marcar encontro para umas comprinhas, para beber um copo ou para qualquer outra coisa a que se possa adaptar.

A fornecer e enviar gratuitamente pelo Estado para a morada dos proprietários ou usufrutuários – e será este, além das campanhas publicitárias, o único investimento mais ou menos significativo, dependendo da quantidade e da voracidade dos intermediários que se acabar por contratar para chegar a quem a irá fabricar -, a placa deverá:

Consequências da ambiguidade na toponímia
     • conter, unicamente, "REL ", seguido da referência;

     • ser fabricada em material plástico razoavelmente flexível;

     • ser gravada ou impressa em material e por processo resistentes à humidade e à luz solar;

     • ter as dimensões estritamente necessárias a uma rápida localização e a uma correta leitura na porta ou portão em que estiver afixada, a fim de evitar resistências alegando ser a placa desproporcionadamente grande e inestética;

     • estar dotada de uma banda autocolante e, próximo de cada extremo, de duas pequenas perfurações que permitam a respetiva aposição em superfícies nas quais a colagem não seja eficaz.

A afixação da placa é obrigatória, sendo a contravenção punível com coima - proporcional à capacidade económica do infrator, como já se defendeu aqui*) - aplicada solidariamente aos diversos proprietários e ao responsável pela gestão do prédio, sem prejuízo da eventual responsabilidade civil e criminal originada na demora no socorro por dificuldade na localização.

Também não fará mal se um pequeno dístico a afixar em local visível no interior da habitação ou estabelecimento for enviado, por correio eletrónico, para o endereço de cada um dos proprietários, usufrutuários ou arrendatários - tal como a Autoridade Tributária e Aduaneira volta e meia envia aquelas importantíssimas notícias relativas aos sorteios da e-Fatura *).


3.4. Recolha e Armazenamento dos Dados

Dado que se destina, antes de mais, a direcionar para prédios urbanos, rústicos e mistos, a Referência Exata de Local ficará associada ao correspondente registo na conservatória do registo predial em, pelo menos, três campos especialmente acrescentados para o efeito: um para a designação alfanumérica, outro para a coordenada correspondente à latitude e outro para a correspondente à longitude, informações que serão, desde o início da operação, livre e gratuitamente disponibilizadas a toda a população, designadamente aos serviços públicos, empresas e pessoas individuais:

Ficheiro de dados VMER e SMS
     • através de ficheiro de dados a ser descarregado pela Internet por quantos o pretendam utilizar em aplicações próprias para fins específicos – como para que as coordenadas exatas e sem possibilidade de erro sejam imediatamente transmitidas eletronicamente (por exemplo, por SMS), tanto ao condutor de uma VMER como ao de uma a carrinha de distribuição de um supermercado ou a alguém que apenas pretende visitar uma casa que está para comprar ou arrendar ou ao restaurante ir jantar;

     • através de aplicações para telemóveis que, uma vez eletronicamente recebida a REL - ou manualmente introduzida em campo próprio -, exportem as coordenadas para o navegador (ex: Waze®, Google Maps®) utilizado no telemóvel ou no computador, assim evitando qualquer possibilidade de erro que subsista na cópia, para a memória temporária, da indicação das coordenadas e subsequente colagem no campo de pesquisa adequado;

   • através de aplicação na Internet que, a partir da REL introduzida, informe as coordenadas correspondentes, para utilizações de qualquer natureza ou tipo.

Diz quem penso saber do que fala que as aplicações informáticas de suporte são tão simples de desenvolver, mas mesmo tão simples, que poderão ser entregues a qualquer estudante dos níveis médios de um curso de informática, não existindo assim qualquer necessidade de, para o efeito, contratar dessas empresas de parques de campismo - detidas por maridos de autarcas e intermediadas por padeiros - que fornecem golas que eram à prova de fogo mas afinal não são*), ou consultores mirabolantes e muitíssimo bem remunerados externos ao Portal da Habitação.

Em qualquer caso, os custos de desenvolvimento não chegarão aos calcanhares dos absorvidos pelo tão propalado ivaucher*), atrasado*) e de eficácia ainda por apurar, ou daquela coisa mirabolante denominada StayAwayCOVID*), que nunca alguém chegou a entender muito bem para que servia e que, ou me engano muito, ou tinha uns errozitos de análise que desde o início a condenaram ao insucesso, já que, feitas as contas, do grandioso projeto apenas se conseguiu entender pouco mais do que a intenção. Ao vírus, pelo menos, parece não ter feito a mais leve comichão…

Também não é necessário enfeitar e encarecer as páginas da Internet e as agora chamadas apps com caríssimos e parolos bonecos e mapinhas, ou com aquelas frases pategas de encorajamento de que certos políticos e fabricantes de jogos para consolas tanto gostam, do género "Fixe! Conseguiste, Meu!", uma vez que o assunto aqui é sério, e o único propósito das tais app será o de copiar para a área de transferência (clipboard) as duas coordenadas a colar no campo de pesquisa do Waze® ou do Google Maps® ou similar.

Por uma vez, façam as coisas de forma célere e simples, focando o essencial, como sempre deveria acontecer em Portugal.

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Especificação da Referência Exata de Local
A gravação dos dados competirá, numa primeira fase facultativa, aos proprietários ou moradores, logo se seguindo a confirmação por técnicos camarários dotados de formação e de equipamento adequados a tais operações, confirmação essa que, porque, tal como o nome sugere, os imóveis se caracterizam pela imobilidade, serão realizadas uma única vez, sem que os dados necessitem de qualquer manutenção – a menos que os satélites do sistema GPS endoideçam ou a Terra resolva inverter o sentido da rotação.

O processo será muito simples:

     I. No primeiro arranque, o software afetará, a cada um dos prédios à data registados na base de dados do Instituto dos Registos e do Notariado*), uma REL, sendo os cinco últimos dígitos atribuídos sequencialmente dentro do concelho em que o prédio se situa, começando na primeira freguesia e terminando na última.

     II. De seguida e após abundante divulgação, os cidadãos interessados – por exemplo, proprietários, coproprietários, administradores de condomínio, proprietários de frações no caso de não haver condomínio constituído -, devidamente identificados, utilizarão, se assim o entenderem e a fim de agilizar procedimentos, uma muito simples página da Internet criada para o efeito para, acedendo pela morada ou pelo número de registo do prédio, nela introduzirem as coordenadas correspondentes.

     III. À medida que as coordenadas forem sendo gravadas – ou de uma vez só, logo de início, como for julgado mais funcional e conveniente -, o Estado remeterá aos interessados as placas normalizadas onde estarão inscritas as REL, que eles obrigatoriamente afixarão ou farão afixar, sendo também deles a responsabilidade pela manutenção das condições de visibilidade e de legibilidade, bem como, eventualmente, pela substituição caso a deterioração chegue a um ponto tal que não possam ser repostas tais condições.

     IV. A informação originada nos cidadãos – extremamente útil numa fase inicial, mas menos precisa - será posteriormente validada pelos técnicos municipais já referidos, competindo ainda aos mesmos ir, gradualmente, medindo e gravando as coordenadas correspondentes a cada REL que não hajam sido, entretanto, informadas pelos primeiros.

     V. Posteriormente, sempre que um novo prédio seja adicionado, concentrado ou dividido será automaticamente gerada para o mesmo uma REL, com número de ordem igual ao primeiro disponível por ordem numérica ascendente, sendo obrigatória a indicação manual, pelo operador responsável pelo registo, das coordenadas correspondentes.

   VI. Qualquer registo de um novo prédio ou alteração a um já existente estará, obrigatoriamente, dependente de declaração de medição de coordenadas a emitir pela câmara municipal.

Apresentação da Referência Exata de Local

Escusado será dizer que, aos três campos a acrescentar ao registo predial já referidos, outros se deverão juntar, nomeadamente para, em nome da fiabilidade e da segurança do sistema, registar a data em que as coordenadas foram gravadas no sistema e a identidade do cidadão responsável pela informação, bem como, numa fase posterior, a data da validação e a identidade do técnico municipal que a tiver efetuado.


3.5. Processamento e Disponibilização da Informação

Diariamente, será a informação relativa à Referência Exata de Local e às correspondentes coordenadas exportada para um ficheiro de texto ordenado e formatado de forma a assegurar, simultaneamente:

     • a utilização por qualquer cidadão, por visualização direta e, eventualmente, por aplicação que, para o efeito, alguém entenda desenvolver;

     • a pesquisa eficiente e segura.

O ficheiro – que poderá, evidentemente, ser desdobrado por distrito ou, até, por concelho a fim de que a consulta e pesquisa se tornem mais rápidas e simples – será livremente descarregado a qualquer momento a partir do Portal da Habitação, ou, melhor ainda, de um sítio simples e económico desenhado com esse propósito específico, do qual uma explicação pormenorizada da REL e do seu funcionamento deverá constar.


Conclusão
4. Conclusão

4.1. Limitações, Cuidados e Sugestões

Poderá argumentar-se que a generalidade dos cidadãos não quererá dar-se ao trabalho de tomar nota, no telemóvel ou num papelinho que guardará na carteira, de uma referência que apenas irá utilizar no caso de lhe bater à porta uma daquelas desgraças que se está mesmo a ver que só aos outros irão acontecer.

Uma boa campanha publicitária saberá, no entanto, alertá-los para o facto de que a REL dará bastante jeito para agilizar a entrega daquelas coisas todas que os mesmos cidadãos passam a vida a encomendar pela Internet, para fornecer ao senhor que lá vai hoje reparar a televisão e para um sem-número de outras coisas de que os publicitários se não esquecerão de enfatizar.

Sempre haverá, naturalmente, que lembrar que quem, unicamente para agilizar a distribuição da correspondência, aderiu ao Código Postal Português, não terá grandes argumentos para se furtar a acolher com agrado uma REL pensada, antes de mais, para garantir o socorro pronto e eficaz ao próprio, seus amigos e familiares.

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Embora com sacrifício tolerável do rigor da validação, haverá que ter em conta uma certa vantagem no facto de o algoritmo a desenvolver para a atribuição das check letters não contemplar as letras k, w e y que, por muito que isso possa doer a quem quer convencer-se de que os portugueses são todos muito cultos, eruditos e, até, licenciados, são de existência desconhecida pela maior parte da população mais idosa que não fala inglês, mormente em zonas rurais desfavorecidas onde, não obstante, as emergências acontecem e há que, de forma especialmente segura e expedita, as reportar, o que não será possível a menos que se possa soletrar.

Aprendamos, pois, por uma vez, no terreno o que só pode ser constatado no terreno, em lugar de fingir que não existe quando nos entretemos a ler papéis e páginas da Internet como esta nos gabinetes ministeriais, uma vez mais dizendo “Stay away!” à eficácia de projetos, de aplicações e de outros que tais.

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A dança das freguesias e uniões de freguesias
Além dos prédios urbanos, rústicos e mistos, haverá considerável vantagem em estender a utilização da Referência Exata de Local a locais públicos relevantes, como monumentos isolados, pontos críticos de estruturas viárias e afins.

No caso de edifícios ou espaços especialmente vastos, deverá contemplar-se a atribuição de mais do que uma REL, a distribuir pelas diversas entradas ou pontos de interesse existentes no interior.

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Embora pensada para o território português, será de considerar a utilização internacional, eventualmente fazendo preceder a REL das mesmas quatro posições que antecedem o NIB para a formação do IBAN (PT50).

Poderá, também, dar-se o caso de, com tal objetivo, a estrutura proposta dever ser modificada a fim de acomodar estados com maior quantidade de distritos e concelhos, ou de unidades administrativas equivalentes.

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Sempre haverá, no entanto, que cuidar de que nada do que neste ponto antecede atrase o desenvolvimento e implementação urgente do demais.


4.2. Reflexões Finais

Fala-se muito de mudanças estruturais e de outras inconsequentes divagações. Porém, quando uma ineficiência de tamanho impacto subsiste numa área tão sensível como a emergência sanitária, parece não se lhe encontrar urgência na necessidade de resolução.

Erros efetivos de localização, levados às últimas consequências, poderão não ser assim tantos, mas todos aqueles que ocorrerem representarão, inevitavelmente danos acrescidos para a saúde ou, mesmo, perda de vidas, além, entre outros, dos diversos efeitos colaterais já enumerados.

Call center
Assim, o custo irrisório de implementação da Referência Exata de Local - dispêndio que, recorde-se, acontecerá de uma só vez e sem necessidade de manutenção ou de repetição - torna aberrante, condenável, quase criminosa, até, não apenas a rejeição do que aqui se propõe, como a mera demora na sua implementação.

Em qualquer caso, os danos colaterais para a economia, para a eficiência do call center, para as tripulações das VMER e para o ambiente são tão recorrentes, como frequentes são as perdas de tempo diárias a corrigir e confirmar, telefonicamente, informações evitavelmente confusas (a propósito: alguém sabe como estarão agora as coisas lá pelos bombeiros de Favaios e de Alijó?).

A Eletricidade de Portugal (EDP) já há muito tem o seu CPE (Código do Ponto de Entrega). Como entender, então, que, numa área tão crítica como os serviços de socorro, o omnipresente Estado Português não tenha já adotado idêntica medida?

Se não fosse o incidente ocorrido com um conhecido meu, é verdade que nem da gravidade do problema sistémico me teria apercebido. Mas, tendo ele sempre existido, estando, necessariamente, identificado, e sendo a solução tão simples e pouco dispendiosa, por que razão, num país com tantas cabeças supostamente pensantes em exércitos de assessores, ninguém se deteve a pensar no assunto e investir, seriamente, em investir seriamente nun think tank - como, para parecerem estrangeiros importantes, agora gostam de dizer... -, visando encontrar uma solução, fosse esta ou outra pelo menos igualmente eficaz, segura  e eficiente?

Por que não foi tão elementar problema há muito resolvido num País e, pelo menos, numa Europa que não para de inventar, para tudo e mais alguma coisa, classificações, e referências, e códigos novos a que ninguém liga deles se consegue, sequer, lembrar?

Portugal que, apesar de tudo, é pioneiro em tantas áreas, por que não o foi já também na definição de uma fórmula precisa, económica, funcional, eficaz e segura de indicação dos locais?

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Não apenas ao nível da ideia, mas com razoável desenvolvimento e vasta fundamentação, aqui fica uma possível solução que pode ser desenvolvida num máximo de três ou quatro meses, sem necessidade de análise por comissões e mais comissões.

Porque é simples, inacreditavelmente simples, como se viu.

Quanto à implementação, o mais moroso ainda poderá acabar por ser a conceção e fabricação das placas identificativas do local, já que é onde acaba por estar dinheiro com algum interesse nisto tudo, apesar de gasto quase de uma vez só - pelo que haverá que gastar algum tempo a escolher, criteriosamente, quem o, mesmo assim, razoável cesto de maná irá engordar: se o homem das golas, se alguma empresa do "grupo", mais ou menos habilmente encapotada, que coisas destas não são de se desperdiçar.

Informática
A programação informática, num computador doméstico, seria, dizem-me, coisa para escassas horas, incluindo uma razoável bateria de testes para garantir que tudo correria sobre rodas. Como não é feito em casa, poderá, com empenho a sério, ser coisa para um ou dois meses. Não mais.

Junte-se-lhe a campanha publicitária – que também irá render bastante a certas empresas e não só -, e lá para a Primavera de 2022, a REL poderá estar a funcionar, e a economia e a saúde a melhorar.

Não nos esqueçamos de que, como disse um eminente cirurgião português em entrevista subsequente a uma pequena intervenção cirúrgica na pessoa de outro ilustre português, “a saúde é um estado transitório que não augura nada de bom”.

Ou que, como diziam os romanos,

Salus populi suprema legis est