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segunda-feira, 18 de abril de 2022


ALAIN (Émile-Auguste Chartier)


 
"Nada é mais perigoso do que uma ideia,
quando se tem uma única ideia


"Rien n’est plus dangereux qu’une idée,
quand on n’a qu’une idée
"

Atribuída a Alain*)           


Tal como na citação de Oliver Wendell Holmes, Jr que aqui já referi, também esta nos fala, essencialmente, do fanatismo na defesa de causas - quase sempre perdidas e de legitimidade discutível... - por parte de políticos incapazes de discernir a falta de interesse da generalidade das populações em, séria e exaustivamente, considerar tais mudanças ou, mesmo, em discutir tais assuntos.

Entre todas, a mais abjeta, condenável, hipócrita e mesquinha das causas, será, porém, a do enriquecimento da imagem e da bolsa de autodenominados políticos que nada mais são, na verdade, do que empresários, agentes de negócios, penduras, seres enfatuados, vazios de outros sentimentos e emoções que não sejam, ora a glorificação dos insignificantes feitos e das desgraças alheias que estes causam, ora a mortificação pela triste sorte e pelo invejado sucesso dos opositores - e, quantas vezes, de correlegionários e parceiros.

Tal é, por exemplo, o caso do caricato deputado Alípio Abranhos, senhor daquele sobranceiro, ourado e implacável olhar sobre o próximo que caracteriza os oportunistas, os incompetentes, os seres vazios daquela riqueza de substância, daquela nobreza de caráter que deveriam ser apanágio de quem as mais altas funções do Estado se propõe desempenhar.

Esse é, também, o caso de quantos presumidos ascendem de indiferenciados militantes a garbosos e enfatuados protagonistas, antes de o crime os precipitar no fosso da prisão e do anátema, de onde, graças a amigos como eles, alguns saem para nova eleição ou nomeação que lhes permita os mesmos ou idênticos ilícitos voltar a praticar.

Com uns e outros se identificam, por fim, os patetas que admiram  - quando não idolatram... - quem deles necessita para voos próprios, convencendo-os de uma inteligência, de uma capacidade política e governativa que, manifestamente, não detém.

Tal como nas relações sociais mais corriqueiras quase sempre acontece, impera a ideia fixa do incomensurável euDentro de nós, e em cada lugar ou esquina que a nossa presença vá, supostamente, "iluminar"...

* *

No caso dos "operários e camponeses" é o Partido Comunista Português quem se arroga o exclusivo da defesa dos respetivos interesses, escamoteando, no entanto, os verdadeiros propósitos da sua (ainda) existência e dos princípios que sempre o regeram.

(leia aqui a sequência)

quinta-feira, 3 de março de 2022


A Ucrânia e o Inefável PCP

Dos treze votos -  dois por cento - contra a proposta de condenação da invasão da Ucrânia pela Federação Russa contados no Parlamento Europeu, dois foram, para grande vergonha nossa, dos deputados da despudorada relíquia comunista portuguesa, que, com os habituais absurdos e desproporcionados pretextos,*) uma vez mais deu, de Portugal, uma bem triste imagem junto dos nossos parceiros da União*).

De entre os eleitores habituais que, do facto, se inteirarem, quantos continuarão a votar naquela obstinada coisa? Quantos, sobretudo, de entre os certamente muitos que, generosamente, de alguma forma têm contribuído para as ações de solidariedade de que, por esse País fora, nos tem dado conta a comunicação social?

Quem, de facto, continuará a votar nas gentes de um partido que continua, cega e obstinadamente, a apoiar um regime russo - que não há como confundir com comunista - que, indiferente ao sofrimento do próprio povo, mais não defende, afinal, do que as colossais fortunas dos oligarcas? Que sanciona com coimas quem escreve ou pronuncia invasão ou guerra, e com penas de prisão de entre quatro e seis anos quem ousa participar numa manifestação?

Naquilo que à liberdade e à democracia diz respeito, o regime russo e outros como ele são, para o Partido Comunista Português*), o paradigma da sua predileção. É isto que querem para Portugal.

A este respeito, não tenhamos ilusões...

Talvez os comunistas não comam criancinhas ao pequeno almoço. Mas, o regime russo que apoiam, prende crianças *), crianças *). Crianças*)

Cuspindo palavras ocas e monocórdicas a um ritmo tal que, assim, não há mensagem que alguém consiga entender, o deputado-metralhadora de serviço do PCP foi, anteontem, à RTP3*) "explicar" que, não só condenam a invasão da Ucrânia, como até condenam todo o processo que a tal levou.

Ora, o que ninguém se lembrou, ainda, de lhe perguntar é a razão pela qual, se o PCP condena, até, mais do que a invasão, por que razão não apoiou a resolução que condenava, pelo menos, a invasão.

A razão é óbvia e bem simplória: o voto contra apenas se destinou a ganhar algum tempo de antena para utilizar na divulgação de um antiamericanismo primário do qual o bolorento e anquilosado Partido não tem como libertar-se, sob pena de ainda acabar por apressar a já inevitável implosão.

A mesma Constituição da República Portuguesa com que o PCP não cessa de acenar, em campanha, como se do seu programa eleitoral se tratasse é bem clara: "Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão" (art.7º n.º 3)

Como pode, então, o PCP demitir-se de fazer corresponder o seu voto aos bons propósitos que votou na Constituição?

* *

Claro que a pergunta é de mera retórica. Ninguém duvida que a anfibológica recusa em não apoiar a posição da Ucrânia ao mesmo tempo que condena a invasão desta pela Rússia acaba por ser a última cana que um partido político imerso no pântano da entropia inexorável e irreversível ainda tem para se agarrar.

[não perca, aqui, a sequência deste artigo]




terça-feira, 1 de março de 2022


A Ucrânia e a Adesão à UE: o Tiro no Pé

 

A Ucrânia é um estado assumida e intensamente nacionalista, e a simples ideia de nacionalismo compromete, decisivamente,
a possibilidade de consenso, e ofende, fortemente, o conceito de
união

Com apenas meia dúzia de Estados-membros, a exigência de unanimidade faz sentido. Mantê-la, com quase trinta, não passa de temeridade;
no plano prático, e quanto às pretendidas unidade e solidariedade, é garantia de ineficácia; quanto aos ideais, é subversão

Que, aos europeus, jamais falte ânimo ou empenho no apoio a quem dele necessita;
mas, que não lhes falte lucidez e bom senso na defesa de uma cada vez mais indispensável União

 

Federação Russa
Independentemente das razões que possam assistir-lhe, a atuação prepotente, arrogante e, muito provavelmente, criminosa da Federação Russa e do seu Presidente facilmente aparece, aos olhos de qualquer ser humano minimamente civilizado, como absolutamente inaceitável, quer no que exclusivamente ao país sob ataque diz respeito, quer no que se refere ao posicionamento do agressor perante uma Europa com a qual mantém relações comerciais de relevo e com a qual diz pretender continuar a cooperar.

Sem prejuízo do que antecede, a introdução no panorama político internacional, pela Ucrânia, da formalização do pedido de adesão à União Europeia não apenas se afigura inoportuno, como poderá comparar-se à atitude de quem aproveita para pôr o pé no caminho da porta quando, em lugar de procurar fechá-la, alguém do outro lado até a está a escancarar.

No presente cenário de guerra, num quadro de forte necessidade de apoio militar e solidário, a Ucrânia exibe, desta forma, um oportunismo inaceitável, uma evidente tentativa de exploração do presente estado de intensa emotividade evidenciado, em seu benefício, pelos restantes países - designadamente dos europeus, que, por todos os meios ao seu alcance, procuram valer-lhe - para, do nada, lhes pespegar bem à frente do nariz uma quase imposição de aceitação numa organização de cariz predominantemente económico e desprovida de qualquer vertente militar como é a União Europeia; para forçar algo que, noutro contexto, faria tanto sentido como a apresentação de um pedido de adesão urgente à estritamente militar NATO por parte de um estado militarmente estabilizado, mas cuja economia se estivesse a degradar.

Claro que a situação económica da Ucrânia é tudo menos invejável. Mas, numa altura em que os apoios voluntários chovem de todo o Mundo, não será, seguramente, o tempo indicado para, com dificilmente reversível impacto, pedir à Europa um compromisso para o futuro.

Ou seja: pedir ainda mais, e mais.

- x -

Combinado com a postura menos alinhada e, sem margem para grande dúvida, mediática e interventiva adotada pelos governantes e outros responsáveis ucranianos, a intempestividade do pedido não pode deixar de nos fazer refletir, seriamente, naquele que, uma vez admitida à União, seria o comportamento do prospetivo novo Associado.

Inoportuno pedido de adesão
O inoportuno pedido de adesão imediata faz-nos parar um pouco, abrir os olhos, e contemplar a luta pela independência da agora martirizada Ucrânia com menos calor, menos emoção, mais ponderação, porventura menos adesão. É que, a despeito de todo o auxílio e de toda a solidariedade que qualquer estado em idêntica situação nos merece, também a União tem direito à identidade, à independência e, sobretudo, a uma consistência essencial à eficaz e eficiente prossecução dos ideais e dos objetivos que presidiram à sua fundação.

Ora, o que não cessam os entrevistados ucranianos de proclamar como uma virtude? Que “somos muito nacionalistas!”, característica com que explicam a abnegada defesa da independência do seu Estado e da integridade do respetivo território.

Ainda bem”, pensarão, de início, os europeus da União, cuja defesa contra uma eventual agressão por parte do Governo Russo tem, neste preciso momento, na Ucrânia a sua mais corajosa e valorosa linha da frente, arrojada e ousadamente exposta a mísseis e balas, lutando pela causa da sua tão querida nação. Mas, ainda que o termo nacionalista utilizado em mais ou menos emotivas entrevistas possa, aqui e ali, ser utilizado com menos rigor, esquecem-se os mesmos europeus da União de que a Ucrânia é um estado assumida e intensamente nacionalista, e de que a simples ideia de nacionalismo compromete, decisivamente, a possibilidade de consenso, além de ofender, fortemente, o conceito de união.

O patriotismo radica no amor saudável pelo país de origem ou de adoção, na sua defesa, na alegria de o ver desenvolver-se e sobressair pelas melhores razões, mantendo-o no lugar que lhe cabe na cena internacional, respeitando o lugar dos outros e congratulando-se com o bem comum; já o nacionalismo tem por base a supremacia da pátria sobre as restantes nações, o amargo de boca vindo de um complexo de inferioridade relativamente a outros que se despreza, a inultrapassável tendência para nos tornarmos “orgulhosamente sós”.

Patriotas, desejavelmente, todos somos. Mas, nacionalismo, já por cá tivemos, e não ansiamos, propriamente, em Portugal ou na Europa, por uma nova edição.

- x -


Os chamados frugais
Algo inesperadamente, nos tumultuosos dias que correm os Estados-membros encontram-se, pelo menos no essencial e de forma cada vez mais consequente e efetiva, em perfeita sintonia na condenação da invasão da Ucrânia pelas forças da Federação Russa. Mas, não nos esqueçamos por exemplo, dos atrasos ainda há bem pouco tempo provocados pelos chamados frugais *) numa questão tão importante como a fixação dos montantes das contribuições para a recuperação dos danos económicos da pandemia.

Tais atrasos deveram-se, como é sabido, à necessidade de unanimidade entre os Estados-membros na tomada de decisões.

Esta obrigação de unanimidade poderia fazer todo o sentido numa Comunidade Económica Europeia a seis, mas, numa União Europeia a vinte e sete, mostra-se um anquilosado fator de instabilidade e, se o bom senso prevalecer, um cada vez mais forte inibidor de novas adesões, designadamente por parte de países de cariz nacionalistas liderados por indivíduos que aliam a inegável coragem pessoal a uma também inegável ânsia de protagonismo capaz de os levar a, no Futuro, frequente ou sistematicamente inviabilizar ou, pelo menos, atrasar obrigatoriamente consensuais tomadas de decisão.

Por tudo isto, o mesmo nacionalismo que tanta coragem, força e substância à Ucrânia dá na guerra, deverá, inequivocamente, afastá-la de qualquer possibilidade de aderir à União Europeia em qualquer momento anterior a uma revisão da questão da unanimidade, pelo menos em direção a uma maioria qualificada de quatro quintos dos Estados-membros, o que, cada vez mais, se constitui como uma indispensável evolução.

Com apenas meia dúzia de Estados-membros, a exigência de unanimidade faz sentido. Mantê-la, com quase trinta, não passa de temeridade; no plano prático, é garantia de ineficácia; quanto aos ideais, é subversão.

- x -

A defesa que, como efeito colateral, a Ucrânia está a fazer contra uma eventual tentativa de invasão da Europa por mais um governante alucinado, convém-nos, sobremaneira; mas admitir no seu seio mais um país marcadamente nacionalista será aquilo que, com o seu estatuto atual, menos convém a uma União já fragilizada na sua pouco planeada expansão: se criticamos as opções do Presidente da Federação Russa pela aparente irracionalidade, não é lícito que caia também a Europa em idêntica alucinação.

A perspetiva europeia reconhecida à Ucrânia não é suficiente para justificar a adesão; e, por muito comovente que esta possa parecer enquanto gesto simbólico, não podemos, com ele, comprometer aquilo que, melhor ou pior, a União ainda representa, e a proficiência no exercício das competências específicas que são, afinal, a razão última da sua manutenção.

A Ucrânia pode, e deve, ser um país amigo de uma União Europeia que, pelo que representa o terrível sacrifício, muito lhe ficará a dever. Mas, para tanto, não terá, inevitavelmente, de se tornar um Estado-membro. A coragem no campo de batalha é um atributo raro e nobre, mas, no que toca a uma união económica, não é um requisito ou uma mais-valia num processo de adesão.

A eficácia da União Europeia depende, fortemente, da credibilidade, e esta da racionalidade na gestão, enquanto a Ucrânia é hoje, pelas razões piores, mas mais legítimas e evidentes, um estado governado com o coração.

Não nos deixemos, pois, embalar pelo mediaticamente empolgante, pelo politicamente correto, nem pelas atualmente mais fortes batidas do nosso coração: uma vez admitida num quadro de exigência de unanimidade, a nacionalista Ucrânia não deixará de representar mais um espinho na já esbroada coroa da União.

Que, aos europeus, jamais falte ânimo ou empenho no apoio a quem dele necessita; mas, que não lhes falte lucidez e bom senso na defesa de uma cada vez mais indispensável União.

* *

Portugal apoia, com naturalidade, a defesa da Ucrânia. Apoia, com uma pequena exceção, um pequeno feudo de irredutíveis e anquilosados militantes, soturnos, bisonhos, alienados, simplesmente o oposto dos irredutíveis gauleses conterrâneos do saudoso Astérix.

[encontrará aqui a sequência deste artigo]


domingo, 6 de fevereiro de 2022


Era Uma Vez... Onze Porquinhos

Penso que foi num livro de Miss Marple, não me lembro em qual, que Agatha Christie definiu planta invasora como uma planta que está onde não devia estar.

Veio-me esta definição à memória quando passei, há dias, por uma dessas localidades portuguesas que, nem meia dúzia de milhares de almas lá tendo, se não coíbem de, garbosamente, ostentar o inútil título de cidade *), apenas para se sentirem os munícipes mais cheios de si, e parecerem eficazes os autarcas que a elevação conseguiram à custa de outrora vigente e inenarravelmente demagógica legislação.

Numa pastelaria engraçada, de bom aspeto exterior e interior, meia dúzia de criaturas indescritíveis, notoriamente sujas, de vestes deliberadamente rasgadas e enxovalhadas, rostos bem vermelhos e inchados, ululavam um insuportável palavreado, para gáudio dos próprios e considerável incómodo de quem, a pouco e pouco, se apressava a pôr-se a andar dali para fora. Estavam os seis sozinhos, em torno de duas mesas onde pontificava dúzia e meia de garrafas de cerveja vazias.

Tudo aquilo me fez lembrar a definição de plantas invasoras, e o velhinho dístico que dantes se via nos locais públicos: "RESERVADO O DIREITO DE ADMISSÃO".

- x-

Quem por aqui passa regularmente, sabe bem o que penso do partido Chega!, de quem por lá pontifica*) e daquilo que representa. Conhece, também, a minha posição relativamente ao racismo*), o que torna insuspeito o que vou dizer.

Um deputado da nação é, sempre e para todos os efeitos, um deputado da nação, independentemente do partido que representa, bem como da ideia mais ou menos favorável ou simpática que, sobre este, possamos ter. Eleitas em eleições livres, exige o mais elementar respeito pela democracia que estas pessoas sejam tratadas - e nos tratem - com toda a deferência formal que o seu estatuto lhes confere e exige; além do que, evidentemente, mesmo enquanto cidadãos não podem ser gratuita e impunemente insultadas por um patego qualquer.

Independentemente do ensino que lhe tiver sido ministrado e dos títulos académicos que possa deter, bem como da causa que disser defender, entendo que não passa, assim, de um alarve sem um mínimo de formação e de educação, de um apóstata da democracia, quem, na sequência da recente eleição legislativa ousa escrever que "vamos ter 11 suínos na AR, entre eles, um terrorista assassino de extrema-direita. A luta não será na AR, mas na rua! Preparem-se!"*).

Quem assim pensa, diz e age, não é um ativista, nem um político, nem, como diriam os pretensos suínos, um português de bem *): no que me diz respeito, não passa de um arruaceiro histérico, sem crédito, de um danoso passivo no balanço da causa anti-racista, de alguém que, eivado de ódio, agiu com indisfarçável hipocrisia, apenas visando a promoção da própria imagem junto de radicais que a possam apreciar, nem se dando conta de a estar, afinal, a assassinar aos olhos de quantos a Organização pretende sensibilizar.

Além do mais, ou falou antes de tempo, ou anda distraído: são doze, e não onze, os porquinhos do seu conto de encantar.

Integrado numa Organização que promove a luta contra o racismo, quem assim pensa e age faz-me lembrar, precisamente, o discurso desbragado do Presidente do Chega!; faz-me lembrar aquela meia dúzia de arruaceiros de pastelaria na minúscula cidade, as plantas invasoras, alguém que está onde não deveria estar.

Trata-se, apenas, de alguém que deveria ter ficado à porta da Organização que representa, à qual deveria ser "RESERVADO O DIREITO DE ADMISSÃO", para que gente desta o trabalho dos outros não viesse, recorrentemente*), depreciar.

Por quanto tempo, ainda, irá por lá ficar? Quousque tandem*) teremos de o aturar?

* *

O dano impacto brutal que, vindas de onde vêm, pérolas de sabedoria como esta trazem à nobre causa antirracista é evidente e não necessita de qualquer desenvolvimento, restando manifestar estupefação pelo facto de as organizações em que os autores militem não terem, ainda, cuidado da respetiva expulsão.

Da causa em si, muito há, pelo contrário, a dizer. Não apenas a dizer, mas a arrumar ideias, a estruturar, já que, sem uma inequívoca conceptualização e definição de fundo, dificilmente haverá como a defender.

[continua aqui]

quarta-feira, 19 de janeiro de 2022


André Ventura

 


"O que é que vale mais:
a vontade do povo português,
ou a Constituição da República?"

André Ventura*)     
(Entrevista à RTP - 01.12.2001)


Não entenderá o Presidente eleito e, regularmente, auto-demitido e reeleito do Chega! que, numa democracia representativa - cuja verdadeira natureza, apesar de se apresentar a eleições, parece ter significativa dificuldade em entender -, a vontade do povo se encontra plasmada, acima de tudo e antes de mais, na Constituição da República?

Doutorado que é em direito, não se aperceberá de que a alarvidade que disse equivale a perguntar se vale mais a vontade de roubar do que as disposições penais que tal ato proíbem?

Que tipo de gente insistirá, tendo alternativa, em confiar o voto a alguém com pensamentos como este, subversivos da ordem pública, da paz e da estabilidade que a todos são essenciais e estruturantes da vida em sociedade?

Poderá, por mero capricho, um cidadão ou grupo de cidadãos fazer, impunemente, prevalecer os ditames da sua vontade à letra da lei ou do próprio Texto Constitucional?

- x -

A prática política e as sucessivas declarações do mesmo género permitem excluir que se tenha tratado de um lapso - aliás sempre deslocado em pessoa de tão viva e aguda inteligência. A enormidade da ideia contida na pergunta não pode, assim, deixar de suscitar as mais sérias dúvidas quanto à verdadeira motivação do Autor ao deixar o Partido Social Democrata para fundar o Chega!.

Este partido é, inegável e assumidamente, nacionalista e de extrema-direita. Mas, sê-lo-á, também, o seu Fundador? Até que ponto poderá um outrora quadro destacado de um partido democrático inverter, no seu íntimo, de forma tão fraturante e do dia para a noite, o seu posicionamento político?

Qualquer pessoa, para ser eficaz, tem de acreditar naquilo que faz. Qualquer político, para ser eficaz, tem de acreditar naquilo que diz.

Perante os resultados até agora conseguidos e com tamanha rapidez, dificilmente poderá considerar-se ineficaz o Presidente do Chega! Ficam, no entanto, as perguntas: quais serão os seus verdadeiros propósitos? Estará, afinal, a ser eficaz em quê?

Será, como se apresenta, um genuíno radical, empenhado em defender uns estranhos, aberrantes, anquilosados e patéticos ideais?

Será, quem sabe, um genuíno democrata que terá, em dado momento, decidido manipular uma crescente mole humana que ia surgindo na extrema-direita, inicialmente com um discurso firme e agressivo para depois, insinuando-se junto do PSD, a neutralizar?

Será, como alguns pretendem, um mero oportunista sem escrúpulos, um perigoso ditador unicamente interessado na exaltação da própria imagem e na rápida ascensão ao exercício do poder - eventualmente como ministro da justiça... -, manipulando e usando tudo e todos ao serviço desse desiderato?

Pouco importa, de facto.

Do que não pode haver dúvida é de que se trata de uma personagem de ambiguidade perigosa, politicamente escorregadia, despudorada e subversiva a ponto de insinuar que deve a vontade do legitimamente descontente povo português sobrepor-se, por ilegítima, antidemocrática e injustificada ação direta, aos preceitos que essa mesma vontade popular, expressa no voto, na Constituição fez plasmar.

Preside, assim, a um partido que dói ver merecer um lugar no boletim de voto da supostamente democrática eleição de quem nos irá governar.


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POLÍTICA
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NÃO PERCA!

terça-feira, 21 de dezembro de 2021


Liberalismo ou Encapotado Negacionismo?

De entre tantos outros defeitos herdados da educação que recebi, ressalta o da convicção de que a nossa liberdade termina precisamente onde começa a dos outros. Ou, como já aqui citei, que "a única maneira de defender a liberdade é limitar a liberdade de cada um".

Corolário inevitável deste facilmente compreensível pressuposto, é que o liberalismo que extravasa a fronteira precisa em que entramos no domínio do interesse social legítimo dos nossos concidadãos não passa de incitamento à mais abjeta e caótica anarquia, ao primado do egoísmo e do egocentrismo, à irracionalidade de quem pretende, à viva força, que a liberdade individual de qualquer um - ao que quer que seja e por mais doentia e desvairada que ela seja - se sobrepõe, sempre e incondicionalmente, a qualquer esforço sério e socialmente legítimo do Estado de direito na defesa dos interesses da população.

Esquece-se, porventura, quem o defende de que, se ele e os outros acérrimos defensores circulam em segurança pela via pública e se sentem seguros nos seus lares, tal se deve à ação do Estado na perseguição, detenção, julgamento, condenação e - quando não os deixa fugir... - detenção de quem comete crimes, designadamente contra as pessoas e contra a propriedade, em tais atividades estando o mesmo Estado, afinal, a fazer precisamente aquilo que dele se espera e que é, ao fim e ao cabo, parte importante da sua razão de ser.

Olvidam, também, essas pessoas que, tal como a lei penal considera criminoso quem mata, quem fere, quem, de alguma forma, causa prejuízo grave a outrem, criminoso é, também, quem causa ou se arrisca a causar-lhe sério dano à saúde. Isto, seja o agente um mal intencionado e mal formado ser humano  ou um virus na sua atividade legítima e habitual.

Pretender, mesmo sem assumir contornos negacionistas, que cada indivíduo tem a liberdade de escolher ser vacinado ou não quando estão em causa a eficácia, a eficiência e, mesmo, a sobrevivência do Sistema Nacional de Saúde - não apenas no tratamento de doentes com COVID-19 mas no dos que padecem de qualquer outra doença - é ultrapassar todas as linhas encarnadas do que é natural, legítimo, razoável; é ultrapassar o mais liberal limite da própria definição de humanidade.

- x -

Dar eco, como há dias deu o jornal Observador, a um arrazoado de infindáveis aberrações*) por parte de uma representante da assim chamada Oficina da Liberdade*) que sustenta que se torna cidadão de segunda quem vive em países que, à falta de alternativa, se vêem constrangidos, para evitar a propagação da pandemia, a decretar a vacinação obrigatória não estará, propriamente, a agir no exercício da liberdade de imprensa, antes talvez a propagar ideias perigosas, bem próximas de um acéfalo e parolo negacionismo e que, numa altura tão crítica para estas andanças como é a do Natal, se arriscam a prejudicar gravemente o mais legítimo e sagrado interesse nacional.

Pretender, por exemplo, que "por toda a Europa, parece renascida a ideia de que quaisquer medidas adotadas pelo poder político, em nome da saúde pública, são legítimas, mesmo que sejam absurdas, como é o caso da irónica divulgação de dados pessoais de saúde para aceder a um restaurante de fast food" diz bem da verdadeira natureza das ideias expressas, quando é certo e sabido que, para aceder a qualquer restaurante, basta apresentar um certificado digital a uma aplicação que apenas responde "Válido", sem especificar se o é por a pessoa ter contraído anteriormente a doença, por ter sido vacinada ou por qualquer outra razão admissível. Ou seja: sem revelar qualquer dado pessoal de saúde, mas apenas o estado de conformidade ou de inconformidade perante uma lei que vai de encontro ao mais básico e universal interesse nacional.

Como pode, de facto, alguém pretender que é do interesse ou do bem-estar de qualquer indivíduo estar permanentemente sujeito a uma contaminação potencial?  Como pode alguém de boa-fé alegar que a administração de uma vacina viola a dignidade humana? Ou que está a ser discriminado alguém impedido de entrar num restaurante por não apresentar a prova possível de que tudo fez para não contaminar outros?

- x -

O apodado "certificado digital da discriminação" não passa de um "certificado digital da diferenciação", apenas condenável por aqueles que defendem a liberdade de tudo e a qualquer preço, não hesitando em, a contrario, violar a própria Constituição que dizem defender, já que insistem em considerar tudo igual a tudo. Mesmo ao que, manifestamente, por natureza ou por estado é tudo menos igual.

A manipulação da comunicação com os espíritos de leitores menos críticos ou menos preparados a troco de algo que, num tal quadro, poderá ser facilmente confundido como ânsia de protagonismo ou de promoção social ou profissional parece pouco prudente, nada profícua e, até, contraproducente para a imagem própria de alguém que ciosamente se possa estar a procurar promover ou socialmente alardear.

A defesa dos interesses e direitos de cada cidadão é fundamental para evitar abusos e desmandos como aqueles que durante décadas conhecemos em Portugal. Mas é pernicioso e atenta contra os mais elementares e nobres propósitos de qualquer organização societária insurgirmo-nos contra aquilo que, objetiva e fundamentadamente, a Ciência e os seus representantes consideram uma precaução essencial.

ª ª

No âmbito da defesa dos interesses e direitos, até que ponto será lícito o Estado conceder gratuitidade de tratamentos a pessoas que, simplesmente, se recusam a tomar as precauções consideradas essenciais a limitar a propagação da doença?

(continua aqui)

domingo, 12 de dezembro de 2021


E que tal Fazê-los Pagar a Continha?

Da pusilanimidade e falta de objetividade do Governo de Portugal na gestão da crise pandémica, muito especialmente na altura do Natal, já aqui falei após o descalabro vivido no início deste ano de 2021.

A par de algumas medidas que, na época festiva que se avizinha, se afiguram, à partida, mais avisadas e fundamentadas do que no ano anterior, assistimos, no entanto, a nova demonstração de timidez e omissão governativas, eventualmente devidas à proximidade de mais um ato eleitoral.

Tem isto ao ver com a conclusão expressa em estudos recentemente divulgados segundo os quais, juntamente com os imunodeprimidos, os não vacinados constituem a grande maioria dos internados com COVID-19 em Portugal*); e no Brasil também*), e não é de agora.

Ora, como é sobejamente sabido, a todos os portugueses com idade e nas condições clínicas adequadas, foi, gratuitamente, dada a oportunidade de serem atempadamente vacinados, não apenas no interesse da comunidade, mas no interesse próprio, tão querido a quem tende a pouco querer saber dos outros.

Esquecem-se aqueles que recusaram a vacina de que oportunidade implica responsabilidade, designadamente a responsabilidade económica pela recusa da vacina.

Não parece, assim, fazer qualquer sentido que continue o Estado para o qual economicamente todos somos obrigados a contribuir a suportar os custos com o internamento de indivíduos egocêntricos, medrosos ou apenas ansiosos de protagonismo a qualquer preço, que recusarem vacinar-se, assim acabando, quase inevitavelmente, por apanhar o sempre incómodo, dispendioso e, por vezes, letal bicharoco.

Que o Serviço Nacional de Saúde os trate, acho muito bem. Agora, que todos tenhamos de pagar a continha de uns quantos idiotas que, ainda por cima, comprometem a eficiência e eficácia do Serviço que, desnecessariamente, solicitam já me parece muito além daquele razoável que um governo, por muito pouco razoável, deverá tolerar.

- x -

Em democracia, e por uma elementar questão de justiça, não é lícito tratar igualmente o que não é igual.

Todos fomos postos em pé de igualdade no processo de vacinação. Agora, os benefícios devem ser, também, iguais para quantos foram vacinados, mas bem diferentes para quem recusou a inoculação.


PS: Como já espero reações apatetadas ao texto, aqui transcrevo um elevadíssimo comentário afixado no artigo "Juiz Negacionista ou Advogado Oportunista, que diz bem do que vai na cabeça de alguma desta gente:

    "Prepara-te para um contra ataque em breve do https://forasteiro.net
    Vão ser todos abatidos, tu e o Scimed e mais uns quantos, prometemos.
    A bem ou a força irão ser todos expostos, como vieste ao mundo nú asism o serás em breve.
    Aguarda".

sábado, 16 de outubro de 2021


Juíz Negacionista ou Advogado Oportunista?

 
Um dos mais escabrosos episódios exemplificativos de uma degradação
da qualidade dos magistrados que se torna cada vez mais sensível e evidente,
num Estado que se diz
de direito, mas de cuja Justiça
a prática judiciária cada vez mais nos faz duvidar

Limites Abstratos da Validação
1. Dos Limites Abstratos da Validação
2. Um Caso de Estudo
    2.1. Cronologia
    2.2. Das Faltas Injustificadas e do Seu Significado
    2.3. Algumas Hipóteses
            2.3.1. Promoção da Atividade Profissional Enquanto Advogado
            2.3.2. Promoção Genuína da Causa Negacionista
            2.3.3. Outras Possibilidades
3. (In)Conclusão

1. Dos Limites Abstratos da Validação

De tenebrosos contornos, aterrador enunciado e inimagináveis consequências sociais futuras, certas hipóteses arrepiam no próprio momento de as formular.

Talvez por isso, a uma grande parte dos investigadores – mesmo os mais sensacionalistas – elas nem ocorram, como efeito de um bloqueio natural do espírito e da mente perante a perversidade, a maldade intrínseca, a quase sociopatia associável aos correspondentes atos, e imanente das pessoas dos imaginários autores.

Todavia, apenas poderá, alguma vez, atingir-se um conhecimento razoavelmente pleno da realidade quando, a par do apuramento dos factos e das respetivas circunstâncias - fundado na certeza oferecida por prova positiva fidedigna -, cuidarmos de, procurando com objetividade, com incansável empenho e até ao limite material e humano do possível, prova negativa aceitável das hipóteses menos prováveis, das mais caricatas, das indizivelmente abjetas, das virtualmente impossíveis.

Desta forma, e só desta forma, se estará, mediante a aplicação da dúvida sistemática*), a fazer, efetivamente, tudo quanto é possível para anular qualquer fator de incerteza, por ínfimo que seja, suscetível de inquinar a segurança que sempre se quer presente na validação de uma formulação em qualquer área do conhecimento.

Pois não é, afinal, a dúvida a única certeza da vida?

- x –

Introdução da Dùvida Sistemática
A introdução da dúvida sistemática nos domínios da Justiça revela-se indispensável designadamente no direito penal das nações livres - em que a presunção inicial da inocência é regra -, devendo a culpabilidade que legitima qualquer punição ser demonstrada para além de qualquer dúvida razoável, e sempre fazendo prevalecer o princípio in dubio pro reo*).

Assim, e por mais improvável e ridículo que se nos possa afigurar, o mais ínfimo resquício de incerteza que possa subsistir só poderá ser eliminado se todas, mas mesmo todas, as pistas em presença forem seguidas e rejeitadas, num esforço sério, honesto, empenhado e levado a cabo até aos mais exigentes, porquanto razoáveis, limites.

Isto é válido, não apenas para a Justiça dos estados, como para a validação, por cada cidadão, da opinião que, em cada altura, forma sobre terceiros, seja no âmbito estrito das relações sociais com o núcleo próximo de familiares e amigos, seja na formação de juízos críticos tendo como objeto personalidades que, na maior parte das vezes, pessoalmente não conhece, a elas apenas tendo acesso através das informações até si veiculadas pelos meios de informação.

Deve, assim, ver-se com olhar crítico quanto de bom e de mau nos chega relativamente a cada um, procurando, mediante o complementar da informação disponível e a aplicação à mesma da mais exigente lógica, encarar de frente e com espírito aberto e rigor científico, quer a mais divinal hipótese, quer a mais abjeta.

 

2. Um Caso de Estudo

Sem prejuízo do desfecho de reclamações ou de recursos pendentes sobre a drástica decisão, acaba de ser, pela quarta vez em Portugal*), um juiz de direito (adiante “Visado”) expulso da magistratura, ou seja, afastado compulsiva e definitivamente do digno cargo que lhe fora confiado, bem como das funções a ele inerentes.

Os atos subjacentes à inevitável e há muito esperada decisão foram objeto de ampla cobertura por jornalistas, juristas, pelos mais diversos comentadores.

A Generalidade das Abordagens
Acontece, porém, que a generalidade das abordagens parece ter, deliberada ou, inconscientemente evitando mergulhar nas profundezas da eventual podridão humana, nomeadamente furtando-se a elaborar exaustivamente sobre as motivações possíveis: não através da especulação infundada, difamatória, emotiva, inconsequente e gratuita, mas partindo da sólida base factual não desmentida que nos chega da comunicação social,.

Cumpre, assim, que sobre ela nos debrucemos a fim de procurar afastar qualquer dúvida que, em qualquer plano, possa, ainda, manifestar-se sobre tão triste caso.

 


2.1. Cronologia

Posto que a sequência dos factos parece não ter, ainda, sido objeto de qualquer tentativa de sistematização, aqui fica, a fazer fé no que foi noticiado e no que se refere apenas ao mais relevante, o que quanto nela parece adequado incluir:

i.
Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa*), inicia o Visado, em 2003 ou 2004 as funções de juiz de direito*), que terá exercido até 2011 (ou, segundo alguns, apenas durante quatro anos).

ii.
Por essa altura, e a seu pedido, passa à situação de licença sem vencimento, para se dedicar à advocacia, tendo, no mesmo ano, rumado ao Brasil, onde permaneceria até 2017.

iii.
De regresso a Portugal, algures durante o Outono de 2020 funda o sítio “Juristas pela Verdade”*), centrado na negação da existência de uma pandemia da doença COVID-19.

iv.
Entre 2011 e Fevereiro de 2021, tem como atividade profissional o exercício da advocacia numa sociedade de advogados presumivelmente sediada no Brasil, mas licenciada para operar também em dois escritórios em Portugal, em Oeiras e em Lisboa.

Juiz Negacionista
A página de apresentação dessa Sociedade*), evidencia, além da sua capacidade de advogado, a qualidade de  magistrado judicial em Portugal, em regime de licença”, sendo esta situação de licença omitida no perfil existente no LinkedIn*), onde se apresenta, simultaneamente como “Law Judge (Portugal)/Attorney at law (Brazil and Portugal)

Os serviços da Empresa são apresentados como centrando-se em “Homologação de divórcio”, ”Direitos trabalhistas do estrangeiro ilegal”, “Contumácia: como resolver?” e obtenção da cidadania europeia - embora, na apresentação do escritório português no Linkedin*), se apresente o Visado, de forma bem diferente, como especializada em “Direito Penal e Direito Processual Penal”.

v.
De 19 de Fevereiro de 2021 data a mais recente publicação no sítio “Juristas pela Verdade”.

vi.
Em 01 de Março – não é claro se, automaticamente, no termo da licença sem vencimento, ou na sequência de solicitação do próprio -, retoma o Visado as funções de juiz de direito, tendo sido colocado no tribunal de Odemira.

vii.
Em 02 de Março requer a suspensão da inscrição na Ordem dos Advogados.

viii.
No exercício das funções de magistrado judicial, continua a aparecer como principal rosto da já anteriormente existente página do Facebook ”Habeas Corpus”*), negacionista e, aparentemente, sucessora da “Juristas pela Verdade”.

Cronologia
ix.
Entre 01 e 12 de Março, falta o Visado nove dias úteis consecutivos ao serviço sem apresentar qualquer justificação. Ou seja: demorou nove dias úteis a apresentar-se ao serviço em que, no dia um do mesmo mês, deveria ter iniciado funções.

x. A existência de um inquérito disciplinar*) na sequência da publicação de pequenos filmes manifestando-se contra o estado de emergência é noticiada em 23 de Março.

xi.
A Ordem dos Advogados faz saber, em 25 de Março, que irá proceder disciplinarmente contra o Visado por ter ela tomado conhecimento de atos de competência própria de advogados por ele praticados já com a inscrição suspensa.*)

xii.
No mesmo dia, é o Visado suspenso do exercício de funções*) pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM).

xiii.
Em 29 de Março é noticiado que desafiara, para um combate de artes marciais, o Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública (PSP).*)

xiv.
Em 16 de Junho apresenta defesa no âmbito do processo disciplinar.*)

xv.
Em 29 de Julho, publica no YouTube, um pequeno filme em que classifica como pedófilo o Presidente da Assembleia da República.*)

xvi.
Em 25 de Agosto, apresenta na Procuradoria-Geral da República queixa contra o Presidente da República e o Primeiro-Ministro pela prática de crimes contra a Humanidade.*)

xvii.
Na audição levada a cabo em 07 de Setembro, diz-se o rosto dos injustiçados e reprimidos pelas medidas de combate à pandemia cuja existência nega, tal como nega o facto de haver a doença provocado qualquer morte entre os cidadãos.

Presidente do Supremo Tribunal
Após ter exigido que todos os membros do Conselho retirassem as máscaras, já que "Com as caras tapadas não sei quem são", dirige-se ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ)*) dizendo que "O doutor está mais próximo de ser presidente do Supremo Tribunal de Justiça de Marrocos ou da Guiné Equatorial. É esse o prestígio que tem. A sua vaidade e o seu narcisismo não lhe valem de nada. E o mesmo se aplica a todos os outros como é óbvio".

xviii. No mesmo dia 07 de Setembro, depois de um graduado lhe garantir que não iria mandar carregar sobre quem quer que fosse, insiste o Visado em destratar agentes da PSP, nos seguintes termos*): "os Senhores não vão carregar sobre as pessoas, porque senão os Senhores é que vão ser detidos, hoje (...) Ai de você que carregue sobre as pessoas, porque há coisas que vão ser sabidas, se você carregar sobre as pessoas. Diga lá aos seus Chefes!". "O Senhor não tem que me dizer que exemplo é que eu dou ou não. Não me toca, hã? Não me toque. Não me toque. 'tá a perceber? Ponha-se no seu lugar! Ponha-se no seu lugar! Eu sou a autoridade judiciária, aqui. E o Senhor também ponha-se no seu lugar. 'tá a perceber? O Senhor vai ser detido, se carregar em alguém (...). Eu ponho-me no meu lugar, e o meu lugar é este: acima de si, acima de si! 'tá a perceber? O Senhor 'tá abaixo de mim. Portanto o Senhor não vai carregar sobre ninguém".

xix.
Em 08 de Setembro a PSP apresenta queixa contra o Visado por haver desrespeitado alguns agentes*) à porta do edifício onde está instalado o CSM.

xx.
Em 07 de Outubro, o plenário do CSM aplica-lhe, por unanimidade, a pena de expulsão da magistratura*) por “Ter nove dias úteis consecutivos de faltas injustificadas e não comunicadas, as quais ocorreram entre o dia 01/03/2021 a 12/03/2021, com prejuízo para o serviço judicial (...)", “Ter proferido despacho, durante uma audiência e julgamento, no dia 24/03/2021, no qual emitiu instruções contrárias ao disposto na lei no que respeita às obrigações de cuidados sanitários no âmbito da pandemia Covid19 (…)” e “Ter publicado uma série de vídeos em várias redes sociais, nos quais, e não deixando de invocar a sua qualidade de Juiz, incentivava à violação da lei e das regras sanitárias, bem como proferia afirmações difamatórias dirigidas a pessoas concretas e a conjuntos de pessoas”.

Embora a condenação seja passível de recurso, este não suspende a eficácia da decisão.*)

xxi.
Na mesma data, a Associação Sindical dos Juízes de Portugal exprime o seu entendimento*) de que a condenação, “que toda a gente esperava e era inevitável”, “coloca uma pedra sobre o assunto”, salientando o “impacto negativo na imagem da justiça” de “um caso isolado e bizarro para aquilo que é o comportamento dos juízes

 

Direito de Não Comparecer ao Trabalho

2.2. Das Faltas Injustificadas e do Seu Significado

Embora raramente comentado, o aspeto das faltas injustificadas assume, no presente caso, uma importância muito especial.

Qualquer trabalhador tem o direito de não comparecer ao trabalho em situações consideradas justificáveis pelas normas aplicáveis, desde que para a falta apresente justificação.

Não sendo tal justificação apresentada, haverá que presumir uma de três coisas: ou justificação válida inexiste e o trabalhador faltou por razões não atendíveis; ou existe justificação válida mas, denotando desrespeito, o interessado optou por nem se dar ao trabalho de a apresentar; ou a omissão é deliberada, procurando assim marcar-se uma posição.

Em qualquer caso, a conduta subjacente denota desrespeito pelos ditames éticos e deontológicos, na medida em que nenhuma organização alguma vez poderá ser eficaz quando sujeita ao capricho e à arbitrariedade daqueles de quem depende para harmoniosamente funcionar, tampouco podendo os que, por sua vez, dela dependem deixar de ser, de alguma forma, prejudicados nos seus legítimos direitos e expetativas, nomeadamente no domínio da Justiça, cuja solenidade e integridade na administração se mostram essenciais ao funcionamento do Estado de Direito.

- x –

Embora todos sejamos criados e educados de maneiras muito diferentes, qualquer representante do assim chamado homem médio, do bonus pater familiae*), entenderá que é pressuposto da admissão de alguém a um posto de trabalho que esse alguém ao mesmo ser irá dedicar de forma diligente, no interesse de quem contrata e daqueles a quem o empregador presta serviço ou com os quais desenvolve uma relação comercial.

Sendo, no caso do sistema judiciário, o Estado o empregador e sendo a generalidade dos cidadãos aqueles a quem presta serviço, não há como ilidir a inevitabilidade da conclusão pelo dever de o juiz agir com irrepreensíveis brio e empenhamento profissional no desempenho das suas funções, até no superior interesse da dignificação da atividade judicial.

O facto de o Visado ter, nos dezanove dias úteis em que esteve ao serviço, faltado nove – quase metade! - sem apresentar qualquer justificação torna irrazoável não concluir que o regresso do outrora advogado à magistratura judicial se deveu, exclusivamente, a motivação egoísta que, embora de natureza e contornos desconhecidos, nada teve alguma vez a ver com qualquer ideal de missão, de serviço público ou sequer, de aplicado desempenho de qualquer função.

Ganha, assim, esta aparentemente menor questão das faltas injustificadas especial relevância quando se trata de, em vão, procurar afastar qualquer dúvida relativa à falta de bondade da motivação do regresso aos tribunais de quem há muito era o rosto principal de uma sociedade de advogados com o seu nome e, simultaneamente, de uma campanha mediática contrária ao interesse nacional, designadamente na área da saúde pública.

Acresce, naturalmente, o facto de ser humanamente impossível ao Visado desconhecer a inexorável e fatídica sorte a que, dada a sua conduta imprópria, a carreira de magistrado estava, à partida, condenada. Por outras palavras, bem sabia, porque enquanto magistrado não podia deixar de saber, ser impossível não expulsar da magistratura alguém que como ele tivesse agido.

Jamais podendo alguém minimamente lúcido esperar, de facto, poder continuar a ser juiz de direito após tamanhos desmandos públicos amplamente divulgados, seria logicamente aberrante não concluir que sempre o Visado pretendeu que a sua nova passagem pela magistratura fosse efémera e acabasse no meio de retumbante queda, durante um espetáculo cuidadosamente encenado.

Mas com que objetivo? Qual a motivação?

 


2.3. Algumas Hipóteses


2.3.1. Promoção da Atividade Profissional Enquanto Advogado

Todos temos presente o caso de um quase desconhecido advogado que, há não muito tempo, esteve na origem da fundação de um sindicato que acabou extinto por decisão judicial devido a irregularidades na sua constituição*), não sem antes ter quase paralisado o País inteiro por privação de combustível que permitisse aos cidadãos assegurar a mais elementar deslocação.

O rosto do mesmo advogado promover-se-ia, mais tarde, em enormes cartazes de um insignificante partido político, nunca mais, desde então, do portador da triste cara se tendo ouvido falar, mas sendo de presumir que a respetiva atividade profissional tenha muito favoravelmente evoluído graças à ampla e generosa divulgação mediática da imagem do indivíduo, independentemente da motivação da atuação.

A primeira hipótese a eliminar quanto ao que verdadeiramente move um alegado negacionista que regressa à magistratura em plena campanha por si alimentada para, menos de uma quinzena depois, faltar ao trabalho nove dias consecutivos sem justificação, enquanto continua a manifestar, com o alarde de sempre, as suas alucinadas posições, exagerando desnecessariamente no protagonismo e tratando de assegurar que dele muito se ouviria falar é, assim, a de estarmos, não diante de um juiz de direito, mas de um advogado oportunista que viu e aproveitou uma oportunidade única para chamar a atenção pública para a sua pessoa como forma de atrair clientes.

Tratar-se-ia, a assim ser, de algo que se estaria a tornar num hábito na profissão de advogado: dada a proibição de publicitar a atividade profissional, optar pela promoção, embora negativa, da imagem pública da pessoa, indiferente ao prejuízo para o Estado e retirando-se da ribalta logo de seguida – ou sendo removido.

Regressaria, então, à advocacia quando já sobejamente conhecido junto de potenciais clientes pouco sensíveis aos prejuízos causados à coletividade, mas muito atentos aos desacatos, ao tom agressivo, à suposta coragem com que o interessado afrontaria os poderes públicos e as autoridades, comportamentos por alguns considerados fortemente promissores de um bom desempenho na barra dos tribunais.

Dar-se-ia, assim, razão ao velho chavão publicitário segundo o qual não importa o que digam de nós: o que importa é que falem de nós.

- x -

A favor desta hipótese milita praticamente toda a sequência cronológica acima resumida em 2.1., sobre a qual, dada a evidente clareza, não valerá muito a pena elaborar.

Contra ela, temos o facto de se tratar de algo tão abjeto, tão vil, tão manipulador, são indiferente aos interesses e aos direitos do próximo que, considerá-la válida seria o reconhecimento último de que muito pouco haverá, já, que esperar de certos representantes da Humanidade. Ou dela toda…

A propósito: terá, quando deixou a profissão, o Visado vendido as quotas na sociedade de advogados, obrigada que esta está a apenas contar, no capital, com participações de advogados inscritos e no exercício da atividade profissional?

Terá a Ordem cuidado de averiguar o que, efetivamente, se passou?


2.3.2. Promoção Genuína da Causa Negacionista

Outra hipótese que não pode deixar de ser considerada quanto à motivação para o uso e abuso da oportunidade de regresso à magistratura com o fito específico de dela ser rapidamente expulso no meio de enorme alarido será ter o Visado pretendido chamar a atenção, não para a atividade de advogado - que, necessitando de assegurar o sustento, provavelmente irá retomar -, mas para a causa negacionista da pandemia.

Tal possibilidade não pode deixar de nos fazer refletir um pouco também sobre a motivação dos próprios negacionistas: o que ganharão em insistir na tola ideia de que não existe pandemia, de que a evidência científica apresentada não é válida, de que ninguém morreu devido a infeção pelo vírus Sars-Cov-2?*)

O que ganharão elementos da extrema-direita em negar o holocausto nazi*), ou elementos da extrema-esquerda em negar Holodomor?

O que ganhará, afinal, quem quer que seja em, de entre aquilo que se encontra cientificamente demonstrado, negar seja o que for?

No caso da COVID, será assim tão nocivo andar de máscara, ou ser inoculado com uma vacina idêntica a tantas outras? Será que o dano residual a um ou outro vacinado entre largos milhões justificará que milhões se neguem a proteger-se e a proteger os outros?

Não estaremos, antes, diante de pessoas que advogam causas em que não acreditam, que nem chegam a entender bem, às quais aderem apenas pelo ruído mediático que provocam e que, dessa forma, algum protagonismo a um punhado de barulhentos e irracionais frustrados poderá trazer?

Como poderá encarar-se como legítima a posição de um verdadeiro, de um genuíno juiz de direito que, com porventura inconfessáveis ou condenáveis e egocêntricos objetivos, em grupelhos destes se imiscui, advogando posições antissociais e anti o que quer que de saudável e construtivo para o bem de todos queiramos fazer?

Como considerar natural a identificação de um magistrado com gente que é do contra seja no que for, pela notoriedade, pela mera fruição, pelo prazer de o ser?


2.3.3. Outras Possibilidades

Significarão aquelas camisolas pretas, aquele ar agressivo, aquele discurso desconexo e repetitivo, a negação desrazoável, que o juiz apenas estará a advogar, numa toscamente encapotada manobra, práticas extremistas visando a desestabilização e a subversão?

Ou, mais singelamente, não passará de uma personalidade narcísica - característica que se não coibiu de atribuir ao Presidente do STJ quando, durante a audição no CSM, o interrogou?

Estará o pretenso juiz negacionista a agir apenas como advogado oportunista de si mesmo, da própria imagem, consistentemente com as múltiplas fotografias do próprio que povoam a Internet, seja no sítio da Sociedade de Advogados, seja nos sítios das causas que diz defender?

Tratar-se-á, afinal, de uma completa indiferença ao sofrimento que, se atendidas as suas inenarráveis pretensões, estas poderiam causar a todos, desde que o seu estatuto pessoal acabasse elevado por via da defesa exacerbada das mesmas?

Se não, como explicar, a não ser por mero exibicionismo, a insistência em, valendo-se do seu estatuto, proibir uma carga policial sobre quem se manifestava à porta das instalações do CSM, quando já lhe fora, por mais de uma vez, garantido que ela não iria ser ordenada?

Mais a mais, proibiu estando suspenso do exercício de funções, coisa que ninguém se lembrou de lhe recordar…

 

3. (In)conclusão

Se a primeira hipótese for verdadeira, o sujeito rapidamente desaparecerá de cena - e nem terá, provavelmente, chegado a vender as quotas da sociedade comercial.

Se a segunda o for, continuará a manifestar-se como prometido*), pelo menos enquanto a pandemia fizer manchetes - eventualmente mudando depois de bandeira para uma então mais mediática.

Se é válida uma destas duas ou qualquer outra igualmente desprezível, cada um por si o julgará. Jamais poderá, no entanto, uma das hipóteses ser plenamente validada: por um lado, porque só o Visado saberá o que, efetivamente, o moveu; por outro, porque, mesmo que o admita, perante as características que a pessoa tem vindo a manifestar, de muito escassa credibilidade se iria tal admissão afigurar.

Causa cognoscitur ab effectu, mas nem sempre…

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Independentemente de qual a hipótese verdadeira - se alguma -, certo é que todas sempre acabarão por beneficiar, ainda que acessoriamente, da atuação destemperada e imprópria de quem, se um verdadeiro magistrado fosse, também de todas elas deveria ter tido o cuidado de se distanciar.

De facto, quer a imagem enquanto advogado, quer a causa negacionista, quer, eventualmente, as causas de quem milita com camisolas pretas, quer, por fim, a imagem pessoal do Visado acabarão, inevitavelmente, promovidas, se não pelas melhores razões e junto do mais recomendável auditório, pelo menos de quem aprecie o género de pessoa de quem as pessoas certas se não esquecerão.

Tudo isto à custa de irreparável dano para a ideia que cada um tem do sistema judiciário, da magistratura judicial, daquilo que ambos representam, da Justiça que, supostamente, administram e da qual, a assim continuar, pouco mais esperarão os cidadãos.

Estamos perante um então juiz de direito que, enquanto tal, se não coibiu de achincalhar, de humilhar, que se sentiu acima de outros que entendia que deveriam pôr-se no respetivo lugar, em posição de subserviência perante tão distinta e iluminada criatura.

Mais ou menos tenebrosa e arrepiante, cada uma destas quatro hipóteses e qualquer outra que, além delas, possa formular-se, terá estado na origem daquele se apresenta como um dos mais escabrosos episódios exemplificativos de uma degradação da qualidade dos magistrados que se torna cada vez mais sensível e evidente, num Estado que se diz de direito, mas de cuja Justiça a prática judiciária cada vez mais nos faz duvidar.

* *

Negacionista por negacionista, o que será pior? Juiz, ou Médico?

(continua aqui)