quarta-feira, 22 de junho de 2022


Marta Temido: Uma Ministra Sinistra?


"A Senhora Ministra da Saúde não fica aquém da calamitosa média do nível de quem nos vem governando:
não passa de mais um militante da última fornada, de mais um ministro bem exemplificativo daquilo que resta de um Partido Socialista
outrora grandioso e, agora, apenas... grande
"

"O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) parece um contentor repleto de flores artificiais,
para deslumbre de meia dúzia de tontos e gáudio de quantos dele julgam que alguma coisa irão 
sacar
"

"Haverá, apesar de tudo, quem queira e consiga fazer melhor do que o Partido Socialista
e o seu Secretário-Geral para gerir os destinos da Nação? Assim de repente, talvez... não
"


Dos vícios da direita, muitos falamos à boca cheia, em grande parte devido à ditadura no tempo da "outra senhora" e, mais recentemente, aos desmandos de uma extrema-direita que, em Portugal, se torna cada vez mais difícil saber, exatamente, o que é.

Esquecemo-nos, porém, de que, quando a irracionalidade e o fanatismo a levam ao extremo, também a esquerda (sinistra, em italiano) se torna sinistra (em português). Tal acontece sempre que as opções políticas comprometem, seriamente, o tal serviço à população, que, em princípio, qualquer político deveria ter como primeira meta da governação.

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Da fraca resiliência - como agora gostam de dizer - da Senhora Ministra da Saúde já aqui escrevi, a esta me tendo, também, referido a propósito das consequências do manifesto défice de comunicação do Governo. Ambas as questões se tornam, porém, menores quando comparadas com a verdadeiramente sinistra opção da Governante pelo suposto afastamento tendencial e tendencioso da iniciativa privada da área da prestação de cuidados de saúde.

Só a própria o saberá se esse manifesto afastamento se deve a uma básica, elementar, obstinada, extremada opção por políticas de esquerda, a uma preocupação infantil ou oportunista por fazer parecer que é de esquerda, ou, mais simplesmente, a mero folclore destinado a obnubilar uma mais ou menos absoluta falta de rumo e de convicções

Certo é que, como, de alguma forma, todos deduzimos daquilo que vemos e lemos, Portugal não tem - e, pelo menos no curto e no médio prazo, não terá - capacidade financeira para assegurar, a todos os atuais potenciais doentes mais ou menos graves, um Serviço Nacional de Saúde (SNS) que, mesmo de longe, corresponda às mais modestas e legítimas aspirações de quantos para ele obrigatória ou voluntariamente contribuem, das mais diversas formas e nos mais diversos graus.

Embora intuído por todos, isto deveria ser dito claramente aos eleitores - mas, por razões muito claras e precisas, não pode ser, já que aquele inconveniente dos votos teima em continuar pegado que nem uma lapa à qualidade dos cuidados de saúde; e, votos, ninguém quer perder...

Da irresponsável insistência da Ministra - e de quem a convidou e, declaradamente ou não, sanciona as suas decisões - na aparente exclusão, muito além do limite do razoável, da iniciativa privada, outro desenlace não pode esperar-se além do que temos diante dos olhos: forte insatisfação dos operadores do SNS e dos utentes que servem, em muitos casos conduzindo, por parte dos primeiros, àquele baixar de braços a que leva a desesperança no resultado do desempenho de quem manda, e a consequente, inevitável e patente desmotivação.

Este afastamento dos privados é apenas aparente, já que não passa, note-se, de um gigantesco equívoco, ou de uma operação de cosmética para, pelas tais razões que lá saberá quais são, a Senhora Ministra se mostrar como de esquerda: por um lado, porque a desastrosa política salarial apenas serve para empurrar os melhores profissionais para o setor privado, que, à sua maneira, agradece à esquerda o tiro no pé; por outro, porque as empresas de trabalho temporário são, evidentemente, privadas e, simultaneamente, porventura as maiores fornecedoras de mão de obra para as urgências dos hospitais públicos.

Ninguém duvida de que a saúde é a área que movimenta mais milhões. Será por isso que a respetiva Ministra não gosta de parcerias público-privadas (PPP)? Não admira:.independentemente de quem as promova e mantenha, a história recente imediatamente lhes associa o labéu do oportunismo e da corrupção.

No entanto, o problema não reside no instituto das PPR enquanto tal, antes na fraca qualidade de algumas pessoas que por lá passaram e, ao que se diz, dessa passagem bem terão sabido aproveitar-se. Se o problema são as pessoas, não se rejeite ou suprima, simplesmente, as PPP: crie-se, antes, eficazes mecanismos de supervisão.

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A fazer fé no rosário de erros e de trapalhadas que a comunicação social nos traz, a atual titular da pasta da saúde não tem, nunca teve, qualquer capacidade para gerir o que quer que fosse na área da saúde, apenas tendo tido a ventura de, no tempo da pandemia, contar com o apoio e a assessoria de gestores e técnicos competentes, cujo contributo lhe terá permitido manter uma ténue aura de suposta eficácia e competência que o sorriso tímido - e, agora, cada vez mais forçado e amarelo - sempre ajuda a iluminar..

Hoje, pandemia ultrapassada - ou, pelo menos, irresponsavelmente desvalorizada -, apenas fica, quiçá, o fanatismo, a gestão do que lhe resta de uma imagem entretanto cada vez mais esbatida pela notória propensão para a birra caprichosa - ou, se quisermos ser simpáticos, para a teimosia política, que outro político teimoso tem vindo a sancionar.

Reduzida a tão puídos pergaminhos, pouca, muito pouca, capacidade de efetiva atuação se reconhece, já, à Governante em situações de crise; e, sobretudo, no vital e sempre adiado planeamento, na estruturação de fundo de uma área que, antes de muitas outras, do Governo deveria merecer mais generosa e empenhada atenção.

Leva isto, inevitavelmente, a pensar em quem alcandorou a Senhora Ministra onde está e lá a mantém; em quem a terá convencido a, repentinamente, tornar-se militante do omnipresente Partido Socialista; e entrando logo pela porta grande, que é como quem diz, com eventual acesso quase direto ao lugar de Secretária-Geral.

A Senhora Ministra fala, agora, de planos de contingência; e muito bem, já que ficar inerte na atual situação seria, a todos os títulos, um desastre. Há, pelo menos, que dar a ideia de que alguma coisa está a ser feita, embora, do que importa e como estamos cansados de saber, nada o esteja, de facto. É que, ao cabo de meia dúzia de anos do Senhor Primeiro-Ministro à frente do Governo, Educação, a Justiça e Saúde - os três principais pilares do funcionamento do Estado - conservam todo o seu desolador aspeto: magros, escanzelados, doentes, atabalhoados, pouco mais do que inertes relativamente à gigantesca dimensão das necessidades.

A que chamará o Partido Socialista "reforma estrutural"? A tapar buracos financeiros com uma coisa chamada Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que pouco mais não parece do que um contentor repleto de flores artificiais, para deslumbre de meia dúzia de tontos e gáudio de quantos dele julgam que alguma coisa irão sacar? Ou estará convencido de que uma reestruturação, uma reforma de fundo mais não é do que uma pontual simplificação administrativa, como a recente automatização da atribuição do abono de família?*)

A suposta estrutura dos edifícios que integram as mais importantes áreas da governação não passa, em Portugal, de uma instável amálgama de massas fracas, com o empreiteiro sempre em sobressalto perante a iminência de uma derrocada, nestas circunstâncias mais do que natural.

Se não era previsível a conjuntura específica em que o problema agora emergente, relacionado com o pessoal médico, se iria manifestar, inegável era a forte probabilidade da ocorrência de uma muito semelhante, da ocorrência de um quadro fortemente adverso, pelo que a sempre adiada reforma do sistema deveria ter-se processado tranquilamente. Há muito tempo. Naquele tempo em que não existia qualquer calamidade.

Da forma como as coisas vão, e no que à saúde se refere, a única reforma previsível será a da Ministra , se volta a ter de ser chamada à pedra pelo Primeiro-Ministro por, no meio do pandemónio, preferir continuar a gozar uns diazitos de férias, em lugar de vir até à Capital dar a cara quando o castelo de cartas do SNS começa a ruir*).

Desta vez, a ruir talvez mais a sério do que vem sendo habitual...

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Se há problemas estruturais na saúde*), a Ministra que os resolva agora no papel, e o Governo que valide e implemente a solução. Não foi para isso que se candidataram? Não é para isso que estão lá? Ou pensarão  basta, quando muito, assegurar a gestão corrente da quase desesperada situação?

Anuncia-se uma comissão de acompanhamento. Mas não terão as comissões de acompanhamento sido pensadas para prevenir, para evitar, e não para limpar o caldo entornado? Parece que não...

O estado de graça - merecido ou não - da pandemia há muito que já lá vai, e a desculpa com a queda do anterior Governo só faz sorrir, atendendo a que as verdadeiras reformas do Estado são desenvolvidas por técnicos que pouco têm de políticos e que, como tal, pouco sensíveis são às idas e vindas dos governantes e à cor política dos mesmos, continuando aqueles o seu trabalho mesmo no meio das maiores tribulações.

Entre 2015 e 2019 não havia pandemia, o Governo não tinha sido derrubado. Nesses quatro anos, que reformas estruturais fez? Quantas lançou? Em quantas, pelo menos, seriamente pensou?

Os males que afetam a Saúde são, essencialmente, os mesmos que inquinam a Justiça e a Educação, não valendo a pena descarregar a culpa nas Finanças que, independentemente da opinião que possa ter-se do respetivo Ministro, a verdade é que ninguém lhe ensinou como fazer germinar papel-moeda semeado no chão.

Aliás, no espantoso dizer do Governante, a Saúde não padece de falta de dinheiro (Aqui entre nós, estará a mal preparada pessoa apenas a procurar sacudir a água do capote, ou bem ciente do que está a dizer? E das consequências? Alguém, no Partido, lhas faça entender...)

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A Senhora Ministra da Saúde não fica, apesar de tudo, aquém da calamitosa média do nível de quem há anos nos vem governando: não passa de mais um militante da última fornada, de mais um ministro bem exemplificativo daquilo que resta de um Partido Socialista outrora grandioso e, agora, apenas... grande.

O que, a cada dia que passa, se torna mais evidente é a incapacidade de o Partido mobilizar alguns quadros sabedores, competentes e sábios que ainda possa ter; e de, fora das suas hostes, recrutar cidadãos de igual qualidade que as lacunas possam, eficaz e credivelmente, preencher.

Como é típico das ditaduras - e das  maiorias absolutas... - falta a coragem política, a mera vontade de negociar, a mais simples demonstração de respeito pelo brutal investimento feito por médicos que são colocados em centros de saúde do tão querido SNS a ganhar pouco mais de mil euros, depois de uma vida de estudante das mais exigentes e extenuantes que há.

Quando irão eles recuperar o investimento, os anos a mais de estudo que tiveram enquanto outros saíam mais rapidamente das faculdades e mais cedo começavam a progredir nas respetivas carreiras?

Tudo isto é demasiadamente radical, fanático, irracional e irresponsavelmente esquerdo... sinistro. Pronto a servir, para a venturosa extrema-direita aproveitar.

Na sua irritante insegurança e desconfiança, o Senhor Primeiro-Ministro parece continuar a contratar governantes pelo critério da proximidade pessoal ou política, não querendo - ou não conseguindo... - congregar esforços de quem tenha alguma capacidade efetiva de levar a bom porto a jangada que qualquer ministério do nosso minúsculo Retângulo é, quando comparado com ministério de países bem maiores. Londres, que tem, praticamente, a mesma população que a totalidade do território lusitano, é, entre as cidades do Mundo, apenas a trigésima sétima maior.

Somos um país pobre? Pois somos. Mas, até por maioria de  necessidade e de razão, a competência e a organização são exemplares em muitos lares das camadas mais pobres da população. Não há, assim sendo, como desculpar, com a falta de fundos, a incompetência e a desorganização na governação.

Além de pequenino, comezinho, ridículo, muito do que tem vindo a acontecer é, realmente, sinistro, inexplicável, a começar pelo facto de o voto útil continuar a manter no poder quem pouco ou nada lá saberá fazer. Talvez porque, muito convenientemente, do lado de cá, do lado de quem vota, se de economia e de finanças quase ninguém entende patavina, na Educação, na Saúde e na Justiça, já ninguém, mesmo ninguém, acredita com a mais leve convicção..

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A cada vez mais desengraçada e politicamente desgraçada Ministra da Saúde deveria, sensatamente, arranjar outra ocupação e ceder o lugar.

Mas, quanto ao mais, haverá, apesar de tudo, quem queira e consiga fazer melhor do que o Partido Socialista e o seu Secretário-Geral para gerir os destinos da Nação?

Assim de repente, talvez... não.

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