Para eleições antecipadas, extraordinárias, estas irão, sem dúvida, na memória
de muitos prevalecer.
Antes de mais, pela rotação nas lideranças de, pelo menos, três das
organizações concorrentes, cujos cabecilhas de alguma forma já deram a
entender estar de malas aviadas - para não falar do apêndice verde do partido
que governa e daquela outra casa cujas paredes de vidro não permitem ver claro
mas para cujo envelhecido e debilitado chefe não será razoável augurar um
mandato de longa ou, até, de média duração.
Que será dos militantes não se sabe bem de quê, cuja esperança parece apenas
residir agora num eterno delfim - pau para toda a obra quando se trata de
eleições, da autarquia à Europa, mas que ficou em lugar à partida não elegível
no rol da eleição legislativa -, de ar bisonho e apagado, que não sabe
explicar por que admira Maduro e Kim Yong-un? Que será da Mãe-Natureza,
extinta que foi, no Parlamento, a eterna e inane carraça supostamente verde
que, em pecado, com o Partido vivia em coligação? Pobre Alameda que,
para voltar a encher, talvez já só com apoiantes de cartão...
O que será, também, das puídas bandeiras ideológicas dos intelectualoides de
extrema-esquerda sem o ar beatífico e a voz trabalhada da face mais visível do
seu ainda principal movimento, que tão mal combinam com o olhar verde e duro
que nos deita? Quem, naqueles que por lá restam, terá capacidade para, com
pelo menos idêntica dose de artificiosa empatia, a substituir por essas ruas e
mercados, junto da desolada dona de casa e do abrutalhado
maridão?
Que será, também, dos nossos queridos animais de companhia sem direito a voto,
substancialmente emagrecida que ficou a já de si diminuta representação de
quem lhes assegurava a ração?
Roída pelo bicho que há muito lhe mina as entranhas, irá, também, ser podada
na copa a pouco adubada laranjeira que tanto gostaria de ser grande e frondosa
na oposição. Na inabilidade de quem a conduz e no desinteresse manifesto de
quantos poderiam, pelo menos, escorar os seus ramos poderes por mais uns
tempos, internamente irá padecer de inevitável, intensa, dolorosa e,
porventura, letal convulsão.
Que dizer, então, do resultado surpreendente horas antes garantido
pelo responsável máximo por aquele grupinho esvaziado pelos hunos ainda mais à
direita, e que, das nunca plenamente esclarecidas ideias próprias, não
resistiu à erosão? Será que, pateticamente, acalenta a esperança de que venha,
ainda, erguê-lo das cinzas o global outrora patrão?
- x -
As rosas invadiram o Parlamento, mas não é num mar de rosas que a democracia
vive em Portugal, num Parlamento maioritariamente povoado por impreparados
desconhecidos, por jön türkler *) sem experiência ou currículo, muitos dos quais nem lendo conseguem,
decentemente, falar.
Torna-se, assim, no atual panorama difícil entender a euforia de liberais
aparentemente mais radicais do que deles se esperaria, e de uma indescritível
e arruaceira extrema-direita possuída pela idolatria ao respetivo pregador,
quando de nada lhes serve tanto ter crescido num cenário em que todos acabámos
por ficar, inteiramente, à mercê de um único e habilidoso
destroyer cuja arte política e capacidade de hipnotizar ultrapassa tudo
quanto se possa imaginar; que, ao que não passa de arrogância, chama
humildade; que, como ninguém, sabe rodear-se de gente de competência
discutível sobre a qual impera a seu bel-prazer; que tem tanta sorte, que até
as sondagens de terceiros pressurosamente vieram ajudar; que durante mais uns
anos nos irá governar, sozinho no meio de uns catorze ou quinze assessores que
o pomposo título de ministro até faz delirar.
Perante o balde de água fria que tantos encharcou, que tanta gente privou do
supostamente garantido lugar, valha-nos a reconfortante sensação de
estabilidade , uma estabilidade que, daquela que tivemos durante quarenta e
oito anos, a alguns já começará a custar diferenciar... e eis que dei comigo a
contar há quantos anos foi 1974. Dá que pensar...
Valha, também, ao Presidente da República em segundo mandato o privilégio de
não ter de se meter em sarilhos: de poder ficar sentado a promulgar leis e a
assinar decretos, enquanto vê passar a procissão...