Continuamos dominados por uma política de facilitismo e de escancarar de portas à confusão entre ensino e educação.
Parecendo ignorar que existe desemprego entre professores, e apesar de garantir que as turmas do próximo ano já têm quase todos os professores atribuídos*), prepara-se o nosso absoluto Governo para, na forma desajeitada que lhe é habitual, reduzir drasticamente o nível de habilitações exigidas para lecionar no ensino secundário*).
Em lugar de se requerer a habilitação própria, passa a considerar-se suficiente a avaliação em função do "percurso formativo dos candidatos", apenas tendo em conta as disciplinas relacionadas com a disciplina a lecionar.
Por outras palavras, tira-se umas cadeiras que já se sabe que irão ter saída, manda-se às malvas o resto do curso e passa-se a, nos termos da lei, poder ser colocado como professor do ensino secundário.
Assim, e à boleia de uma alegada dificuldade pontual em contratar professores licenciados para ministrar aulas de informática, passaremos a poder ter, ao que parece em qualquer disciplina, docentes não licenciados, muito ao jeito daquilo que aconteceu, com os resultados sobejamente conhecidos, pouco depois de 1974, tema que já amplamente desenvolvi a propósito do desempenho dos magistrados judiciais portugueses nos acontecimentos que antecederam a fuga de João Rendeiro.
A manifesta falta de formação, em áreas fulcrais, da trupe de incompetentes tecnocratas que preside aos destinos desta mole de passivos e subservientes eleitores que lhes vai assegurando o pré, não lhe permite compreender que um professor licenciado detém uma cultura mais abrangente, se encontra mais documentado, mais instruído em áreas relacionadas com a dominante na área que escolheu, e não apenas nesta. Encontra-se, assim, mais apto a lecionar, a passar a mensagem por forma a motivar os alunos, não apenas a empinar, mas a investigar, a ampliar, eles mesmos, o leque de conhecimentos, assim se tornando, potencialmente, indivíduos aptos a um desempenho profissional que honre e eleve lá por fora a marca "Portugal", sem o que jamais passaremos da cepa torta, seja no curto, no médio ou no longo prazo.
Tudo isto, teoricamente, já se sabe, uma vez que, eivadas das maleitas causadas pelo destrutivo virus de Bolonha, as licenciaturas de hoje mal afloram o nível de exigência de outrora, antes de mais por pouco haver quem saiba, de facto, ensinar e, sobretudo, educar.
Além do mais, medidas destas, sobretudo com caráter geral, violam frontalmente o princípio de igualdade, na medida em que conferem oportunidades iguais a indivíduos com competências supostamente desiguais. Fazem tábua rasa do esforço suplementar investido, durante anos, por quem se licenciou com o objetivo de ir, um dia, lecionar, o que as torna, também, injustas e desincentivadoras para quem considere licenciar-se.
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Se não existem professores de informática em quantidade suficiente para fazer face às necessidades, houvessem os sucessivos governos tratado de, atempadamente, incentivar inscrições nas licenciaturas nessa área, em lugar de se limitarem a deixar andar e correr, agora, atrás do prejuízo.
A liberdade de escolha é um direito essencial em qualquer democracia, mas não pode ser confundido com o direito dos governos a demitir-se da função de sensibilizar os governados para as atuais e previsíveis necessidades do Estado.