quarta-feira, 23 de março de 2022


Paulo Portas

Paulo Portas

"
Quando se pretende ser tudo e o contrário de tudo,
não se acredita em nada.
É essa falta de fé no mais pequeno valor
que faz a miséria moral de muitas democracias modernas
"

Paulo Portas*)              
(O Independente)                  


A crescente tendência para navegar sem carta, sem bússola, sem planear, ao sabor do vento, das conveniências, da popularidade, da notoriedade e do desenfreado culto do eu conduziu a Humanidade ao beco sem saída à vista em que todos nos encontramos, situação em que a maior parte continua a preferir não pensar ou, em estado de negação, rejeita encarar com a coragem necessária a procurar reverter.

Os governos e os políticos que os integram limitam-se a fugir para a frente, para um destino desconhecido*), ou adivinhado e temido, que pouco ou nada fazem para evitar ou para dele nos defender. Cada vez mais, vamos ficando nas mãos de meros e anódinos administradores do inevitável, do que tem de ser, que pelos corredores do poder deambulam ao ritmo das aparições na televisão e dos posts nas redes sociais, promovendo-se o melhor que podem para que, pelo menos, quando saem desta mirabolante confusão algo de seu ou para contar ainda possam vir a ter.

Por seu turno, o iludido, manipulado, pouco instruído e mal educado eleitor lá vai votando*), a esmo, em quem lhe parece mais espetacular, quem faz mais barulho, mais promessas, na esperança de que quem hoje vota delas amanhã se irá esquecer.

O cenário está montado para que emerja desta amálgama, deste caos, mais um ditador de pantomina, ávido de riqueza pessoal e de poder, envolto numa aura de respeitabilidade e de resplandecente fulgor que, de início, os pacóvios que somos irá deslumbrar, para, mais tarde e como sempre, amargar num regime autocrático de sofrimento, de pobreza, de tirania, de insuperável torpor, de excruciante dor.

* *

As portas para a entrada da ditadura estão escancaradas, dados o desnorte e a inabilidade política por parte da maior parte dos partidos que nos deveriam representar.

(leia aqui o desenvolvimento)



terça-feira, 22 de março de 2022


Angela Merkel: Onde Pára, agora, a Chanceler?

Por muitos apontada como a grande responsável por um considerável aumento da dependência da Alemanha e de boa parte da Europa dos combustíveis produzidos na Rússia - logo, pela manifesta dificuldade sentida pela União em aplicar, à oligarquia presidida pelo implacável torcionário cultivado no viveiro do KGB, ainda mais severas e eficazes sanções -, não deixa de ser surpreendente ou, pelo menos, inesperado o persistente quase silêncio da anterior Chanceler durante semanas após o eclodir da assim chamada guerra.

Surpreendente ou não, o que parece inegável é que, a despeito daquilo que cada vez mais se revela um clamoroso erro estratégico, terá sido ela o último grande estadista que o notoriamente perturbado e fortemente comprometido Presidente da Federação Russa respeitava numa Europa atualmente nas mãos de governantes pusilânimes como, ao mesmo tempo, jamais se viu: uns, fracos e dependentes; outros, esgrouviados, de cabelos ao vento; outros ainda, habilidosos, mas pouco mais do que isso. Todos eles, enfim, como que catalépticos, estáticos, desnorteados, embrutecidos perante os horrores da invasão da Ucrânia, contrastando fortemente com o lépido, algo gárrulo, mas inegavelmente intrépido Presidente dessa martirizada Nação.

Talvez por isso mesmo, pela postura, pelo carisma, pela bem patente estrutura e solidez do carácter de quem sabia bem por que ali estava e ao que ia, mereceria ela, por parte do ora agressor, uma espécie de respeito, de temor, que, o terá levado a abster-se de enveredar pelo caminho da mais abjeta maldade enquanto o mandato da Chanceler durou.

Claro está que, a essa contenção, não terão sido alheias as sucessivas concessões da Alemanha nas trocas comerciais com a Rússia, na vá esperança de manter a fera amansada, as quais a besta transtornada terá, despudoradamente, aproveitado para aceitar enquanto, pela calada, preparava o seu supostamente grandioso mas de facto lastimável e frustrado ato de saída de cena: a invasão. Da Ucrânia, de mais alguma coisa, ou de tudo e mais alguma coisa e sabe-se lá mais do quê.

Tirando uma ou outra aparição pontual e quase esquiva, onde pára, agora a Chanceler? A que papel poderia, porventura, ser chamada na tentativa de resolver o que parece irresolúvel?

A nenhum, talvez.

Acabaria, provavelmente, destratada e confrontada com o logro que prováveis boa-fé e ingenuidade viabilizaram; com a pouco invejável situação negocial de uma União manietada pela dependência; com considerável culpa pelo arrastar de uma agressão, de uma destruição maciça de pessoas e bens por parte de quem, afinal, controla e controlará os combustíveis tornados indispensáveis à economia dos estados que o agressor poderiam deter.

* *

Entretanto, na Ucrânia, o notório excesso de mediatização da ação do presidente Zelensky tem vindo a lançar sérias dúvidas acerca daquilo que verdadeiramente o move.

[encontrará aqui a sequência deste artigo]



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