ou, aqui, a versão do 'The Muppet Show'
segunda-feira, 30 de agosto de 2021
Marretas: Time in a Bottle
ou, aqui, a versão do 'The Muppet Show'
sábado, 28 de agosto de 2021
Ainda não Sabe o que É Equitenência?
"Bem melhor do que o título Plano de Recuperação e Resiliência
teria sido a menos espampanante escolha do título Plano de Recuperação e Resistência
para significar que, graças ao dito plano, a economia, após recuperar,
seria
capaz de suportar futuros impactos sem sofrer nova quebra"
Oriunda do latim aequitas, -atis (equidade) e tenens, -entis (o que ou aquele que detém), equitenência equivale ao inglês equitenence e, embora pouco divulgada, além do significado vocabular, o termo releva no campo da sociologia na medida que esta está relacionada com algumas palavras essenciais à compreensão da cada vez mais complexa realidade social em que nos vemos respirar.

Há, também, quem utilize resiliência apenas para enfeitar designações de planos de recuperação, quando, na circunstância recuperação e resiliência significam, praticamente, a mesma coisa.
Bem melhor do que o título Plano de Recuperação e Resiliência teria
sido a menos espampanante escolha do título
Plano de Recuperação e Resistência para significar que, graças ao dito
plano, a economia, após recuperar, seria capaz de suportar futuros impactos
sem sofrer nova quebra.
Mas, afinal, quem se importa? E resiliência é bem mais elaborado do que resistência, até tem mais uma sílaba, e demonstra que conhecemos mais uma palavra difícil… que não sabemos o que quer dizer.
- x -
Esta preocupante tendência linguística para a inconsequente e irresponsável
turbulência, tem, também, a ver com uma
equitenosa propensão de certas pessoas para, por se considerarem de
particular excelência, de qualquer mais ou menos medíocre instituto ou
associação aspirarem à presidência. Uma vez alcançado o poder –
equitenente objeto de desmesurada apetência -, independentemente da
inexistência da recomendável competência, é ele exercido com aquilo a que, em
equitenoso assomo de verbal incontinência, qualquer
equitenólogo rapidamente classificaria como ética degenerescência.
A despeito da tendência para manter a aparência, quem dessas organizações
ocupa a presidência rapidamente passa a padecer de grave equitenose,
dedicando-se, de preferência, a discursar com particular truculência, enquanto
deixa processos e procedimentos em eterna e abandonada pendência para se
dedicar a atividades relativas a outas presidências que ocupa por inerência –
por vezes com um grande rasto a pestilência, mas com alegada inocência -,
deixando os ignorados administrados na maior efervescência, enquanto,
despeitados, lavram pelas redes sociais comentários da maior contundência e
passam noites inteiras a digitar na sua pacata residência.

Mas com o que tem, afinal, a ver este equitenencial e intragável
arrazoado acerca da equitenência?
- x –
Equitenência significa... nada. Absolutamente nada, como
inevitavelmente se conclui da vacuidade do esvaziado escrito que antecede.
Se com todas as ências que acabo de referir equitenência algo tem a ver é com a simples terminação em ência, o que sempre é mais do que alguns significados por aí atribuídos, às palavras difíceis, por dicionários que entre si competem na quantidade de sinónimosque, quase ao peso, para cada vocábulo que se pretende definir nos são apresentados, em desenfreada epidemia polissémica.
Não me perguntem qual o processo criativo elaborado pelo qual cheguei ao termo
equitenência: não existe. Dei, simplesmente, comigo a pensar nele, no
que poderia significar; como às vezes sucede com um daqueles temas melódicos
que, vá lá saber-se porquê, às vezes parecem não querer sair-nos do
ouvido.
Pesquisei, e encontrei... nada de nada, fosse em que idioma ou dicionário
fosse, do mais elaborado ao mais elementar.
Dei, pois, comigo a refletir como é fácil, sem conteúdo ou base conceptual, um
palerma qualquer gerar neologismos prenhes daquela presunção bacoca que nos
leva a, avidamente, procurar palavras complicadas para com elas convencer quem
nos ouve de que somos os mais eruditos letrados que é possível encontrar; ou,
no mínimo, que com outros ilustrados podemos, sem dificuldade, competir
ou ombrear.
Como escreveu um presbítero português que, no século XVIII, ensinava a estudar, “estão persuadidos que a eloquência consiste na afectação e singularidade e, por esta regra, querendo ser eloquentes, procuram de ser mui afectados nas palavras, mui singulares nas ideias, e mui fora de propósito nas aplicações”*). Afinal, é tão mais belo e tão simples ser... simples! Dizer resistência, quando não se trata de resiliência...

Apesar da terminação coincidente, equitenência nada tem, bem pelo contrário, a ver com a cada vez mais escassa benevolência; com a envolvência e carinho que nos merece o próximo; com a inocência de uma mente adulta que, em certas coisas, se quer infantil; com a permanência e constância com que devemos manter-nos junto de quem do nosso cuidado necessita; com a desejável florescência e desenvolvimento de tudo quanto é bom; com a discreta transcendência de nós próprios, escondendo-a dos outros; com a deferência para com os que nos merecem respeito, que são todos. Equitenência nada tem a ver com a continência nos nossos apetites e anseios; com a paciência para com os que estão ainda a aprender o que outrora aprendemos nós; com a prudência que a experiência aconselha para as mais simples decisões da vida; com a previdência na gestão do Futuro de cada um; com a consciência com que deve exercer o seu mister o verdadeiro profissional.
Digo que equitenência tem a ver com nada disto, porque, como a
inventei, devo saber…
- x -
Massajando um pouco a origem latina, quisesse eu atribuir um significado a equitenência, poderia escolher, por exemplo, a teimosia de alguns em se aterem à ideia parva de que todos somos iguais em tudo, numa abusiva extensão da ideia de equidade (aequitas) inerente ao princípio da igualdade de oportunidades e de direitos, que inevitavelmente desvalorizado se torna por via de tal ideia.
O princípio, esse sim, deveria ser sagrado em qualquer texto constitucional, deveria ser honrado na aplicação do sistema legal… e deveria ser salvaguardado de deturpações ilegítimas por quem dele, para algumas duvidosas e radicais causas, ilegítimos dividendos não dessa de procurar obter.
Nega este mal cheio punhado de pessoas a mais visível evidência, esquecendo, numa altura em que se fala de solidariedade e de entreajuda, que, se fôssemos mesmo iguais - estruturalmente, potencialmente -como pretendem, qualquer um de nós seria capaz de fazer o que todos os outros fazem, pelo que raramente necessitaríamos dessa ajuda uns dos outros.

- x –
Ora, pensando bem, vou antes adotar o termo equitenente para significar alguém que tem um poucochinho de cada uma daquelas ências de que primeiro falei, as dos ditos poderosos. Como o termo não existe, tenho a certeza absoluta de que ninguém, mas ninguém mesmo, me irá entender; e ao mesmo tempo, a certeza quase absoluta de que, como a ignorância é, para muitos, indizível vergonha, muito poucos mo irão dizer.
Por fim, deixo aos equitenentes mais vivazes a possibilidade de dizer
que foram eles que inventaram o conceito de equitenência.
Prometo que não vou dizer…
quarta-feira, 25 de agosto de 2021
Leonardo da Vinci
Um pungente exemplo da falta de rigor e de rumo de que fala Leonardo será, sem dúvida, aquilo que, de forma cada vez mais preocupante, se passa com a LÍNGUA PORTUGUESA, domínio onde grassa a tendência para a afirmação perentória de posições não fundamentadas, invocando regras gramaticais inexistentes ou interpretadas ad libitum. Não perca, no correspondente separador no topo desta página, diversos artigos polémicos sobre temas com ela relacionados. |
segunda-feira, 23 de agosto de 2021
Shirley Bassey: Moonraker Theme
sábado, 21 de agosto de 2021
Talibãs e Talitugas
Quando o vazio somos nós, domina-nos o pânico.
Com o pânico, vem o oportunismo de outros, vazios como nós, mas que têm a
vantagem de uma ou outra habilidade a que chamam competência e com a qual se
propõem, para nos salvar do avassalador vazio, preencher a nossa vida e, ao
mesmo tempo, o ego ou a carteira deles..
- x -
O grande sonho da maior parte de nós é ter dinheiro: muito, mas muito,
dinheiro, como se fôssemos um daqueles ídolos que gostam de relaxar na
gaiola (perdão, marquise) da cobertura (perdão, da penthouse,
que com estas coisas não se brinca…), enquanto contemplam, numa tela
(perdão, écran) panorâmica o anúncio em que uma progenitora balbucia,
por entre a resplandecente dentadura que não é dela, uma catadupa de sons
ininteligíveis num anúncio de uns óculos belíssimos mas tão acessíveis que
até podem ser comprados por nós, pobretanas vazios e ridículos, que, em
hipnótico desvelo, nos embasbacamos a contemplar riquíssimos pategos
não menos vazios e ridículos – que, naquilo que importa, pouco
ou nada valem -, pela simples razão de terem sido tão bem sucedidos depois
de, coitaditos, terem nascido tão pobrezinhos.
Ou como uma qualquer histérica e desbocada milionária que viva do vigor de
umas cordas vocais que pareçam apenas vibrar para e com a brejeirice, que se
ache maravilhosa e cujo maior sonho da vida seja trepar por cima daqueles
empecilhos que a não deixavam brilhar e acabar a mandar neles; e numa coisa
grande, assim como, sei lá, uma televisão.
Ou como outros como eles que, não sendo habilidosos na política, o sejam –
e de que maneira! – com os milhões dos outros, até ao momento em que nem os
bancos, nem as associações desportivas, nem os poderes públicos consigam
continuar a olhar para o lado porque alguém se terá descaído e propagou
aquele vírus tinhoso, comichoso, chato e incómodo chamado
informação.
Se não pudermos ser ricos e famosos como eles, enfim, ao menos termos o
dinheirito suficiente para mostrar aos outros palermas que somos mais ricos
do que o pai daquele rapaz que é colega do meu e só teve férias num
acampamento daquilo lá da escola - não me lembra agora o nome – e ainda
queria ser um tipo importante na secção do partido cá do bairro, como
eu.
A estes tolos ambiciosos, serve muito bem a miragem do dinheiro ganho ao
jogo, em que o bom do bestializado tuga das jolas e dos
pistachos baralha, parte, dá e eructa alarvemente quando a vida lhe
corre mal; e, ao jogar, fica mais pobre, muito mais pobre, de dinheiro e de
intrínseco valor.
Ou era, porque vieram aí uns senhores com um contrato para assinar e vamos ter um carro daqueles elétricos*) que entregam cá na Sexta-feira*), para irmos, no Sábado, à reunião da concelhia e, depois, ter com aquele primo da Trudes que pinta uns quadros e até nos convidou para… ai! como é aquilo… qualquer coisa que acaba em age… ah!, pois, a inauguração.
- x -
No fim da extensa lista que aqui não teria lugar, há aqueles de nós que não têm dinheiro, não têm miolos, não têm estudos, não acreditam no elevador social da política, não têm o que quer que seja além da enorme vontade de que alguém lhes diga que são alguém. Pelo menos, algo mais do que o outro que mora ao lado e cuja única afinidade connosco é o vazio imenso, o vazio de tudo, um vazio tão grande que não temos dinheiro para preencher com casotas, com ferrares, com trapos, com palmeiras, piscinas e long drinks; só, mesmo, com os pistachos e as jolas. Um vazio tão grande que já nem pode ser preenchido pelas emoções primárias que põem milhões aos urros e à batatada dentro e fora de um estádio de futebol.
A estes de nós, resta a ilusão da transcendência, da elevação daquela
ilusão a que chamam espírito, não por qualquer manifestação do mesmo, mas
pela sensação de pertença a quem um dia, algures, nos há de compensar de
tanto sofrimento, a quem devemos cega obediência, ainda que à custa das
maiores atrocidades e violências sobre o próximo, embora sem saber o que
essa providencial divindade ao certo quer de nós.
Ou melhor: sabemos porque nos disseram, porque nos disse alguém que
fomos ouvir falar naquela reunião prenhe de elementar misticismo e havida
num ambiente de paupérrima encenação, em que um chefe religioso de olhos
esbugalhados, aura impiedosa e sorriso cínico nos enviou a fazer explodir em
bombas uma interpretação espúria e despudoradamente manipulada da mensagem
do Além.
A missão consiste em impor, pela força, a mensagem aos
resistentes, privando-os das formas mais elementares de liberdade que apenas
subsistem nas vidas e nas mentes retrógradas e estúpidas dos alucinados
ideólogos e promotores.
- x -
Quando a divindade tornada fera implacável inventada por uma torpe interpretação das escrituras pede com mais força que os bravos alarves aniquilem os detratores daquilo a que chamam fé, os americanos não gostam do exagero não autorizado nas conversações – três mil conterrâneos mortos, caramba, é demais! - e entram por ali dentro para garantir que os outrora aliados ficam sossegadinhos pelo menos durante um prazo razoável para que aquele disparate do estupor do Bin Laden em Setembro se desvaneça um pouco da memória das dóceis e ditas civilizadas formigas dos States, tão dóceis como as que civilizadas não são - no resto do Mundo, claro.
Enquanto lá estão a aplicar o corretivo, ocupam pela força, impõem as suas
regras, libertam… os corpos, apenas os corpos.
Por ser nada mais do que a restrição da liberdade dos corpos, a mudança resultante da ocupação é ilusória e efémera. Os invasores não educam, não procuram aproximar-se, entender, dedicar àqueles que andam naquilo contrariados uma palavra amiga, um diferente olhar, enfim, algo que os afaste do arrepiante caminho que escolheram ou os obrigaram a trilhar (não muito mal comparando, até faz lembrar a recente legislação publicada sobre a alimentação nas escolas cá da terrinha, feita à pressa e que, em lugar de educar, se limita a proibir).
Depois, cansam-se os americanos de esbanjar dólares com a
presença militar, os aliados e também fazem contas aos
euritos, aquilo já não faz sentido, eles já devem ter aprendido a
lição, e… Butes? Bora lá!
Começa, então, a debandada daqueles que acreditaram ter vivido o ideal da
liberdade, o maior sonho das suas pobres vidas prestes a acabar pela força,
ou a ser brutalmente desalojadas pela fuga num avião de carga americano
qualquer, possibilidade única de sobreviver para ir alimentar o mesmo sonho
noutra terra também qualquer.
- x –
Por cá, as autárquicas estão aí à porta e, com elas, a vazia e
desoladora campanha habitual.
Para a semana há reunião da concelhia.
Tenho de mandar lavar o carro novo que tá parado à porta.
Aquilo é giro, pá, e tu mereces melhor do qu’ó que tens!
Hádes vir também!
* *
A par de toda esta triste figura que não passa, afinal, do resultado de uma necessidade quase compulsiva de seguir os ídolos, a moda, continuam estas pessoas a querer passar por originais, diferentes, alguém digo de se contemplar com admiração.
quarta-feira, 18 de agosto de 2021
Agostinho da Silva
Caso se interesse por QUESTÕES SOCIAIS não deixe de consultar, no correspondente separador no topo desta página, um índice de outros artigos publicados no Mosaicos em Português |
segunda-feira, 16 de agosto de 2021
Tieta
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Imagem: tudosobreprodutos.com |
sábado, 14 de agosto de 2021
COVID: O Palácio das Araras
"Até quanto a ânsia narcísica e obsessiva de um se fazer notar
continuará,
nesta atrasada e mal governada terrinha, a opor-se ao
interesse de todos?”
“Não é ciência aquilo que, todos os dias e a todas as horas, nos entra
pelos olhos e ouvidos:
é uma vozearia ignorante, pedante,
oportunista e, por vezes, desesperada,
que apenas contribui para
agravar a já catastrófica situação"
1. Da Importância da Sustentação
Científica das Opiniões Formuladas
2. Vacina-se os Miúdos ou Não?
3. A Chinfrineira Muda na Comunicação Social
4. Missão de Informar versus Liberdade de
Expressão
5. Pluralismo no
Debate versus Motivação para Aparecer na Televisão

No Estado de Direito, é entendido como do mais elementar bom senso – e a
lei prevê – que um decisor que não domine determinada área do conhecimento
recorra à opinião de peritos visando o rigor da decisão a prolatar, bem como
a clareza de uma exaustiva e clara fundamentação.
Tal recurso à presumível sapiência de terceiros pressupõe, necessariamente,
que o laudo produzido por cada perito consultado se sustente em saber
estabilizado e adquirido segundo as regras do método científico, sob pena de
acabar o decisor enleado numa amálgama de opiniões díspares que, em lugar de
contribuir para o desejado esclarecimento, apenas irão a sua ignorância
nestas coisas acabar por aumentar.
Ainda assim - ou seja, mesmo quando os diversos pareceres solicitados se baseiam numa mesma ciência antiga e são redigidos de acordo com os procedimentos preconizados -, não é raro chegarem os respetivos autores a conclusões substancialmente distintas, já que, contrariamente ao que às vezes por aí se diz, conta bem menos o volume do conhecimento do que a efetiva capacidade para corretamente o processar, para, daquele que existir, alguma coisa aproveitar.
A situação agrava-se, evidentemente, quando a ciência consultada não é
antiga nem conhecimento, verdadeiramente, existe porque o problema é recente
e ninguém domina uma matéria que não houve tempo para, serena e
exaustivamente, investigar.
Assistimos, então, a espetáculos tristes por parte de desesperados e desabridos gestores ou governantes que ficam sem saber o que decidir e como manter confiante e tranquila uma população tão ignorante como eles nestes assuntos – e muito bem, porque, se cientistas existem de determinada área, é porque tudo de tudo todos não têm de saber - e ávida de orientações e esclarecimentos coerentes e seguros, ou que, pelo menos, pareçam fidedignos, que estimulem a vontade de os seguir e de à lei obedecer.
Atarantados, não cessam, pelo contrário, os atores sociais e políticos de
ainda mais inquietar os espíritos, lançando na comunicação social o debate
tipicamente estéril que, de forma inevitável, nasce do costume de espalhar
aos quatro ventos todas as palavras alguém diz, seja lá o que for, seja lá
quem for, como que procurando transferir para os desgovernados a
obrigação de, em cada caso específico, decidir sobre aquilo que não
conhecem, e deixando-os sem saber o que fazer nem em quem, afinal,
acreditar.

2. Vacina-se os Miúdos ou Não?
Enquanto, na imensa praia da insanidade comunicacional típica do Portugal de todos nós o areal vai, a cada dia que passa, ficando cada vez mais poluído, decisões de sentido inverso vão sendo tomadas em regiões distintas do País. Foi o que aconteceu na Madeira, onde, a despeito da recomendação de sentido contrário da Direção-Geral da Saúde – e não de Saúde, como alguns peritos e alguns ólogos, quiçá por soar mais chic gostam de dizer -, se decidiu inocular os menores com idades entre os 12 e os 16 anos*), independentemente da existência ou inexistência de patologias – direito esse que, diga-se de passagem, à Região Autónoma plenamente assiste, nos termos constitucionais.
Não pode, porém, ignorar-se que, se a disparidade de critérios e de
fundamentações que grassa Europa fora é, já de si, sintomática do desnorte
que por aí reina na ciência destas coisas, torna-se, para a fiabilidade do
que cientificamente é dito, simplesmente catastrófico que, para
salvaguardar particularidades da economia de determinada Região ou por mera
ânsia de protagonismo político, sobre questão são importante e sensível como
a vacinação de menores se não entenda uma região autónoma com o poder
central - por muito débil que este possa ser mau grado o folclore gerado por
cada vez mais frequentes e indisfarçáveis tiques ditatoriais.
Mais grave, porém, será o facto de a Direção-Geral da Saúde e a Ordem dos Médicos terem posições diametralmente opostas sobre este tema da vacinação de menores*).
Note-se que se trata de entidades que, desejavelmente, não estão a proferir opiniões de natureza política: em ambas pontificam cientistas das mesmas áreas do conhecimento que estariam, supostamente, a pronunciar-se de forma sensata, ponderada e cientificamente sustentada sobre matérias da sua especialidade, visando, unicamente, proporcionar aos tais mais ou menos desesperados governantes os elementos necessários à tomada de decisões políticas - decisões essas que acabam por quase sempre tardar, por ficarem os governantes à deriva num confuso oceano de contraditórias opiniões.

Bonito!
Não obstante, entende o Senhor Primeiro-Ministro que não se trata de ziguezague - como, à manobra, um definhado partido da oposição chamou à cambalhota -, mas sim de "evoluir na decisão"*)... mais propriamente, evoluir precisamente para a decisão contrária, com os mesmos dados disponíveis e, praticamente, uma semana depois.
Fala-se muito de linguagem inclusiva, mas esta é simplesmente exclusiva, na medida em que exclui do seu entendimento os olhos e os ouvidos de pessoas minimamente inteligentes e de boa fé, que apenas procuram entender o que se passa, sem estar preocupadas com votos ou campanhas eleitorais, como, por maioria de razão, a um Governo conviria em tempo de tão graves e sensíveis decisões.
3. A Chinfrineira Muda na Comunicação Social
No século passado, era eu ainda mais miúdo do que os miúdos cuja vacinação
tanta celeuma hoje levanta, levava-me a minha Mãe ao Palácio das Araras, no
Jardim Zoológico de Lisboa.
Cá de fora, pouco se dava por isso. Mas, uma vez lá dentro, o diálogo entre
humanos tornava-se completamente impossível, tal era a chinfrineira saída
dos bicos das animadas e tagarelas aves.
O mesmo se passa hoje com a vozearia que, sobre assuntos relacionados com a
COVID, por aí vai nos jornais e televisões, resultando numa chinfrineira
muda, vazia de mensagem, já que ninguém ouve nem ninguém se faz ouvir, com
um mínimo de respeito e de credibilidade, no meio de tanto alarde, de tanta
vontade de se pôr em bicos de pés a dizer “eu é que tenho razão!”
quando lá se arranja maneira de, uma vez mais e ganhando ou não uns trocos,
aparecer na televisão.
Manifestamente, não se baseiam estes discordantes palradores em dados cientificamente recolhidos e validados, uma vez que, em quantidade e com fiabilidade suficientes, os não há: proferem palavras tiradas da mera dedução lógica a partir de algumas notícias e elementos insuficientemente interpretados e testados. Ou seja: deitam-se a divinhar, como, mais coisa, menos coisa, qualquer um de nós seria capaz de fazer.
De nada vale o brocardo segundo o qual, quando um burro zurra – digamos
assim -, os outros baixam as orelhas: todos sabem que ninguém sabe, mas
todos fazem por parecer que sabem, porque, para esta gente, é
“vergonha” não saber.
Mas a título de quê e com que legitimidade ou direito tanto palra esta
gente toda?
Até quanto a ânsia narcísica e obsessiva de um se fazer notar continuará,
nesta atrasada e mal governada terrinha, a opor-se ao interesse de todos?
Estruturalmente, a democracia é um regime político muito fraco, dada a
facilidade com que se usa e abusa na interpretação dos direitos, garantias e
liberdades constitucionalmente reconhecidos, invocando-os para tudo e mais
alguma coisa em proveito exclusivo de um indivíduo ou de um grupo restrito,
sem que alguém tenha a coragem de a tal se opor. Se o fizer, o mais certo
será deparar-se com acusações de ser fascista, ditador e
mais isto e mais aquilo, como sempre acontece quando alguém procura, no
exercício de direitos ou de deveres e com a melhor das intenções, moderar o
exercício das amplas liberdades da democracia por parte de quem delas
abusa e volta a abusar.
Já, a propósito dos
festejos da vitória do Sporting na Primeira Liga de futebol, aqui falei sobre a confusão entre, por um lado, o direito de cada um
manifestar as suas posições e ideais políticos e, por outro, invocar tal
direito para atividades que nada têm com os direitos garantidos na
Constituição.
O abuso da liberdade de expressão em tempo de pandemia é claramente, mais
um destes casos.
Na verdade, aquilo a que diariamente assistimos nas televisões não é o
exercício do direito de livremente exprimir posições políticas sobre o
assunto, posições essas que, efetivamente, todos têm o direito de manifestar
e todos têm o direito de conhecer.
O que se escreve nos jornais e passa nas televisões são conclusões
meramente técnicas e, quase sempre, não fundamentadas sobre matéria
científica que apenas meia dúzia de portugueses se encontra em condições de
escutar e interpretar. Para a multidão restante, são coisas sem qualquer
interesse prático, sem conteúdo político, apenas destinadas a preencher
tempo de antena quando nenhuma catástrofe ou desastre espetacular em
Portugal fornece matéria para vender anúncios, e cujo principal efeito é
espalhar a confusão, descredibilizar as decisões e convidar, por
desconhecimento ou descrédito, à prática de sucessivas infrações.

Afinal, o que queremos, verdadeiramente, quando vamos ao médico?
Simplesmente, que nos passe a receita e instrua quanto à posologia. Às
discussões técnicas, que nos poupe e as tenha em local próprio e com os
colegas de profissão!
É no INFARMED, e não na praça pública, que deve ter lugar o debate entre
cientistas que falem a mesma língua e que, nesse e noutros fora da
especialidade, expressem livremente as suas opiniões, procurando chegar ao
bom porto de alguma válida e, finalmente, eficaz conclusão, na falta da qual
o Governo ficará desobrigado de seguir o resultado da difusa e
inaproveitável discussão - mas, mesmo assim, obrigado a decidir com base no
bom senso e segundo os mais altos e saudáveis ditames da administração.
Não é ciência aquilo que, todos os dias e a todas as horas, nos entra pelos
olhos e ouvidos: é uma vozearia ignorante, pedante, oportunista e, por
vezes, desesperada, que apenas contribui para agravar a já catastrófica
situação.
5. Pluralismo no Debate versus Motivação para Aparecer na
Televisão
Bem, dir-se-á, mas, no INFARMED isso já é feito, os especialistas já
debatem estes temas antes e durante as famosas reuniões.
Pois sim, mas o que, aparentemente, acontece, é que, convenientemente, não
são convidados cientistas de todas as tendências para essas reuniões, assim
restando aos excluídos e ignorados badalar cá por fora as razões pelas quais
discordam das conclusões.

- x -
Os editores dos jornais e os diretores de informação das televisões prestariam bem mais válido e sério serviço público se, em tempos tão complicados e difíceis, se recusassem a incentivar e a amplificar a chinfrineira destas araras que nos enchem olhos e ouvidos com a sua ignorante confusão; se pensassem um pouco menos em tiragens e em audiências e se abstivessem de dar eco a quem o não merce - ainda que substituindo o interminável rosário de opiniões dos entendidos por cacofónicas crónicas futebolísticas com vocabulário mais ou menos anedótico ou por mais um programas pimba apresentados por gente cada vez mais mal preparada e mais desinteressante.
Agiriam, assim, em defesa do legítimo interesse do público que os sustenta
e a quem se dirigem, em lugar de dar palco a quem, falando daquilo que
supostamente sabe sem, efetivamente, algo saber, apenas perturba a paz
social, desacredita o legislador e as leis que produz, e assim torna ainda
mais incerto e confuso o que já tão difícil é entender.
Em circunstância nenhuma será boa ideia aumentar a depressão e o pânico numa martirizada população e em desnorteados governantes que, manifestamente, não fazem a mais pequena ideia do que ainda poderão fazer, sem meter o pé na argola e sem dar cabo da próxima eleição.
quarta-feira, 11 de agosto de 2021
Oliver Wendell Holmes, Jr

"A mente de um fanático é como a pupila do olho:
quanto mais a iluminamos, mais se contrai"
"The mind of a bigot to the pupil of the eye;
the more light you pour on it, the more it contracts"
Mais propício se torna, assim, esta conjuntura a que a defesa preferida de um fanático seja fechar-se na exaltação dos seus heróis e na repetição ad nauseam dos dogmas que religiosamente segue, naqueles inspirados. Tal ocorre, sobretudo, quando vê atacadas as suas ideias mais ou menos inaceitáveis, mais ou menos loucas, apressando-se a rejeitar à partida quanto se lhes oponha, ainda que baseado em informação mais fidedigna e elaborada a partir dos dados mais objetivos.
segunda-feira, 9 de agosto de 2021
Rachmaninoff, por Arthur Rubinstein
![]() |
Imagem: www.wqxr.org |
sábado, 7 de agosto de 2021
Nem mais, nem menos: tal e qual!
“Quem, com todo o tempo para refletir, decide, friamente,
pespegar na
primeira página uma porcaria destas,
ilusões não deixa quanto ao que
efetivamente pensa,
ao que efetivamente sente, e ao que,
desgraçadamente,
em futuras capas mostradas nas bancas
não teremos
como os olhos deixar de pousar”
1. A “Gaiola Aberta”
2. Ética? O que É Isso?
3. A Responsabilidade Mediática Permanente de quem Representa a República
4. A Ética Jornalística de Um Defunto Ressuscitado
5. O Importante Papel Social de Leitores e Anunciantes
6. Quem Não Quer Ser Lobo…

Existem diversas definições para pasquim. A Infopedia*), por exemplo, adota:
2. panfleto difamatório
3. figurado jornal que publica calúnias e artigos difamatórios
4. pejorativo jornal de pouca qualidade”
Faz-me isto recordar os meus tempos há muito idos em que por aí circulava um
então bem conhecido pasquim, desengraçado, mas supostamente humorístico.
Além de uma ou outra imagem ou trecho em que o Autor lá tinha algum sucesso no
seu estranho propósito de fazer gente adulta rir com vontade de coisas com
piada nenhuma, aquilo não passava de um desfile de ordinarice da mais rasca,
da mais reles, por vezes cruel.
Em nada diferia, diga-se, das ordinarices desoladoramente desengraçadas com
que um cada vez maior e mais medíocre rebanho ansioso de protagonismo fácil
junto de semelhantes seus vai, ao que me dizem, contaminando certas redes
ditas sociais que, afinal e com mais ou menos melaço, muitas vezes não passam,
em lugar de redes, de ratoeiras, de eficazes armadilhas destinadas a capturar
os espíritos mais simples e às quais, nos nossos dias, não é fácil
escapar.
Garantiam a sobrevivência do tal pasquim idiotas como o idiota que aqui
escreve e também, de longe a longe, a lia. Na recém-libertada mocidade de
então, acabávamos por comprar aquilo porque a "Gaiola Aberta" – assim se
chamava a publicação - era, quiçá, o mais evidente sinal da libertação do jugo
da censura que, por tantos e tantos anos, o anterior regime ditatorial impôs a
quem apenas pretendia livremente escrever e ler, falar e ouvir: nesse tempo,
seria impensável abrir a gaiola - ou sair do armário -, fosse
quem fosse que lá não quisesse estar.
Era, até, impensável deixar sair as ideias de quem apenas pretendia sorrir,
sonhar.
Assumidamente, a Gaiola era um periódico sem qualquer conteúdo
jornalístico: era um pasquim! Apenas um pasquim.
Nem mais, nem menos: tal e qual!
2. Ética? O que É Isso?

No futebol, chuta-se impiedosamente a bola com o intuito principal – ou único,
nos dias que correm - de ganhar dinheiro, muito dinheiro mesmo,
desvalorizando-se, para que a coisa renda, os tão nocivos efeitos sociais
colaterais dessa cada vez mais induzida ânsia de sucesso a todo o custo,
efeitos esses bem patentes aos olhos de quem os quiser ver, como o de só
pensar na vitória desportiva, profissional, política ou social, a qualquer
preço, e por quaisquer meios necessários a atingir tão glorioso fim: ser, na
ordem social, Alguém; com maiúscula, claro!
Por outras palavras: pavonear-se.
Desta forma, aquilo a que outrora se chamava
a virilidade do futebol rapidamente degenerou numa crescente profusão
de faltas ad hominem no campo e fora dele, que nem os cartões
encarnados, os jogos de suspensão, os processos de inquérito e as prisões
domiciliárias ou preventivas conseguem, já, eficazmente travar; e aquilo a que
nos referíamos como combate político leal - frente a frente,
olhos nos olhos -, do carril da ética acabou, inexorável e
irremediavelmente, por descarrilar.
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A divulgação, nas redes sociais, de um pequeno filme em que aparece, fortemente etilizado, como que a abanar ao vento em plena rua, um destacado representante de Portugal no mais alto órgãolegislativo da Comunidade Europeia*), talvez não seja, contrariamente ao que por aí se entende e o próprio diz, uma violação da vida privada desse cidadão: a inoportuna manifestação dos vapores do álcool aconteceu na via pública e por ação do próprio, que nesse estado nela se mostrou a quem o quisesse ver, razão pela qual nenhuma prévia expetativa de privacidade, nessas circunstâncias, poderia ter.

Se qualquer condutor pudesse defender-se dizendo “foi sem querer”,
ninguém iria para a cadeia por conduzir com um grão na asa; ou, neste caso…
com um melão.
Por outro lado, atento o direito que qualquer um tem de ponderar, no momento de votar, se o faz, ou não, num eleito que foi visto no estado que sabemos, é difícil entender como pode alguém pensar que a divulgação das imagens não é de interesse público*); e pouco importa quantos assistiram à cena ao vivo e a cores, já que, mesmo sem filme, estas coisas andam de ouvido em ouvido com tanta facilidade como as pombinhas da Catrina andam de mão em mão.
3. A Responsabilidade Mediática Permanente de Quem Representa a
República
Ninguém é obrigado a ocupar lugares em órgãos legislativos ou da governação.
Se o faz, há que saber comportar-se com a dignidade esperada por quem o elegeu
para a função; e estar ciente de que, embora não trabalhe vinte e quatro horas
por dia, é, durante as vinte e quatro horas do dia, o português investido
nessa obrigação, assim estando vinculado a cuidar de uma reputação que, por
ser ele quem é, inevitavelmente repercute os impactos por ela eventualmente
sofridos em toda a população.
Mesmo não ocupando qualquer cargo, todos devemos ter em conta que, como alguém
já escreveu, “a vida consiste em vários fatores importantes e fundamentais, entre os
quais se encontra o decente e inteligente domínio dos apetites que
partilhamos com os cães. O homem não uiva do alto de um outeiro, de manhã à
noite, nem tritura com voracidade os alimentos que lhe atiram. Come
alimentos bem confecionados, quando os pode obter, e satisfaz os seus
anseios consoante lhe indica a prudência”.
Pode, pois, sem exagero, dizer-se que o pequeno filme transmite um espetáculo
degradante, uma tenebrosa imagem do País veiculada por alguém que, mais do que
muitos, foi mandatado, contratado e é principescamente pago para a
dignificar.
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Mas o que talvez mais choque da parte de quem pôs o triste filme a circular é
a premeditação da decisão de o conservar anos a fio, à espera da
oportunidade perfeita para, causando o maior dano possível às aspirações
políticas do visado, o divulgar.
Tamanha frieza, tão implacável premeditação, apenas se entende no quadro de
uma luta pelo poder hoje travada sem quartel sem ética, sem grande coisa além
do fedor a lixo que habitualmente a caracteriza.
4. A Ética Jornalística de Um Defunto Ressuscitado
Mudando completamente de assunto… há que dizer que, por muito fraca que possa
ser a qualidade de determinada publicação, por muito execrável que possam ser
os propósitos ou as ideias que impulsionam a divulgação deste ou daquele
conteúdo, a pretensão de um pasquim se considerar parte da
imprensa escrita de modo nenhum belisca a dignidade e o prestígio da
profissão jornalística.
Afinal, a prensa da tipografia imprimia no papel qualquer escrito com que lá
se o quisesse esborratar, da mesma forma que a impressora dos nossos dias não
apenas reproduz as letras que um jornalista digno desse título produz, não se
negando, também, a dar corpo a títulos e capas mais ou menos tonitruantes que
qualquer alarve para lá queira mandar.
Qualquer um tem, pois, direito a imprimir o que bem lhe aprouver, desde não
torne público o que não deve, como notícias ou declarações falsas ou ofensivas
da dignidade de outrem, sobretudo, neste último caso, quando, tal como em
certas faltas do futebol, a divulgação apenas visa atingir o indivíduo, sem
qualquer interesse ou finalidade digna do ponto de vista social.

Tudo isto, sem falar no pequeno problema de a decisão de voltar a dar
vida a um representante da imprensa escrita há muito amortalhado ser tarefa à
partida economicamente inviável - um mamute não tem graça -, que nem valerá
muito a pena tentar. Sobretudo no Verão, em que a cabeça dos editores parece
que, de tanto procurar notícias de que valha a pena falar, mais cedo ou mais
tarde acabará por estourar.
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Ressurgiu, há semanas, na imprensa portuguesa, uma publicação em papel que,
logo no primeiro número, até quem lá escreve afirma ser estranha e que
pretenderia, ao que parece, dinamizar a imprensa escrita em Portugal.
Vá lá saber-se porquê, acabou por nascer às portas do Verão, a tal altura em
que, no defeso da bola, sobre outros assuntos só mesmo um grande
alarido consegue tirar os Portugueses da água ou levá-los a, entreabrindo
primeiro um olho, depois ou outro, interromper a sestazinha na esplanada
enquanto destilam uma bem acompanhada caneca ou imperial.
Talvez por isso mesmo, ainda o renascido mamute andava de cueiros, logo uma
capa absolutamente despropositada e jornalisticamente arrepiante veio, a troco
de uns trocos nas tabacarias e de mais uma ou outra tão necessária quanto
modesta fatura de publicidade, irreversivelmente minar quaisquer pretensões de
qualidade e imparcialidade de quem foi uma publicação pioneira no género e
outrora respeitada, até pela distinção que então se reconhecia a fundadores e
colaboradores – alguns dos quais ainda por lá andam, o que não deixa de tornar
ainda mais surpreendente tão tenebrosa evolução.
A badalada capa alardeava, nem mais, nem menos, do que a existência do tal
pequeno filme sobre o andar periclitante do tal deputado europeu, obtido nas
circunstâncias que se conhece, o que, por si só, sugere grande dificuldade em
encontrar temas interessantes, bem como fontes fidedignas que com o dito
jornal ainda aceitem colaborar.

A não ser do vil metal, a troco de quê? Seguindo que critério
jornalístico?
Com que ganho social?
Além de todos os epítetos que a decisão de publicar tal capa me merece, a
associação torpe e indesculpável de um momentâneo, porquanto condenável, passo
em falso à orientação sexual do embriagado é, além de tirada a ferros, também
desinteressante, ilógica, inexistente: não passa de uma manobra rasteira com
objetivos que não será difícil descortinar, além de ser, esta sim, uma
inaceitável intrusão no mais íntimo da vida privada de alguém que sobre ela
tem sabido manter a reserva e o decoro – mérito que a alguns dos seus maiores
críticos se não poderá, talvez, associar.
5. O Importante Papel Social de Leitores e Anunciantes
Nos tempos do anterior regime, não se falava porque não se podia falar. Agora,
fala-se demais porque o Estado diz não ter como controlar.
Claro que a censura prévia é uma perversão do jornalismo e, possivelmente, a
negação maior da democracia. Mas tal não legitima que alguém se distraia do
dever de, independentemente da existência ou não de ilícito criminal, depois
da publicação de uma capa como esta os seus autores e editores
responsabilizar.
Não basta, contudo, que outros políticos venham, supostamente consternados e solidários, alardear veementescondenações de demonstrações de vileza deste jaez*): a sociedade civil tem a obrigação de, em termos efetivos, condenar e procurar neutralizar comportamentos como este – embora não necessariamente perdendo as estribeiras e formulando apreciações injuriosas acerca das mães dos “palermas que aparecem aqui a dizer que até não gostam muito dele mas não gostam do vídeo”, e especificando, com todas as letras onde o apoio dispensado devem enfiar*), o que sugere que, qual infeção por vírus, esta coisa dos descontrolos tende a alastrar.
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Acontece, todavia, que, parafraseando alguém, não é possível viver em dois
mundos diferentes: para se viver legalmente é necessário aceitar os códigos e
a ética. Se quisermos viver numa selva caótica, teremos de pagar caro pela
escolha. Depende de nós.
Assim sendo, quem, em presença de capas destas, optar por continuar a dar
dinheiro a troco de anúncios a quem no-las impinge sujeita-se a ser desses que
terão de pagar caro pela escolha, uma vez que se torna solidariamente
responsável pelo que mais dali vier, já que, ao contratar publicidade, está a
assegurar a viabilidade comercial de quem, sem tais receitas, não teria como
continuar para aí a dizer mal.
Não se alegue, pois, que nada se pode fazer por não haver censura prévia: a
censura do mercado, seja do lado das empresas anunciantes, seja do lado
do público comprador dos jornais, é, sempre será, o maior garante da
qualidade, do rigor e da moralidade do que lemos e ouvimos nos meios de
comunicação, bem como um forte incentivo à hombridade e idoneidade de quem com
estes colabora em funções jornalísticas, editoriais ou de direção.
6. Quem Não Quer Ser Lobo…
A divulgação, por uma criatura maldosa, do filme na Internet pode, no limite
dos limites, entender-se – mas, nunca, aceitar-se – dada a proximidade das
eleições internas no partido político do visado às quais, presumivelmente ele
irá candidatar-se.
Mas a que propósito sai do prelo - e do nada - a publicação de uma tal capa?
Que utilidade para a generalidade dos leitores em férias terá uma aparição
tal?
Não deixa de ser verdade que uma publicação não pode ser avaliada, e muito
menos julgada, por uma simples capa. Mas não é menos verdade que, sobre o que
se publica ou não, há muito tempo antes para pensar; e que, quem, com todo o
tempo para refletir, deliberadamente pespega na primeira página uma porcaria
destas, ilusões não deixa quanto ao que efetivamente pensa, ao que
efetivamente sente, e ao que, desgraçadamente, em futuras capas mostradas nas
bancas não teremos como os olhos deixar de pousar.
O que vai dentro do jornal e na última página, só lê quem quer.
A mensagem na capa, em letras garrafais, não temos a liberdade de ignorar,
por, simplesmente, não termos como para ela deixar de olhar.
Porque está em parangonas. Porque está lá para impressionar.
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Esclareça-se que, do que dela conheço, a pessoa visada me não merece
particular simpatia, uma vez que admiro a vivacidade no debate televisivo
apenas quando não resvala, recorrentemente, para um protagonismo exagerado ou
para a emotividade excessiva e esganiçada, que sempre acabam por se revelar
formas de apresentar ideias seriamente comprometedoras da correta perceção do
conteúdo.
Assim, ao condenar a perseguição discriminatória e estupidamente abusiva de
que foi vítima, não estou a insurgir-me contra o ataque a este ou àquele,
antes contra o aproveitamento abjeto de situações sem interesse jornalístico,
promovido por gente que, a meus olhos, de jornalista demonstra ter muito
pouco, antes se me afigura ambiciosa, oportunista e vaidosa, desprovida de
ideal.
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Honra lhe seja feita, a “Gaiola Aberta” sempre foi um pasquim, e nunca quis
passar por outra coisa.
Nem mais, nem menos: tal e qual!