segunda-feira, 27 de junho de 2022


Marta Temido, António Costa e os Gráficos da SIC

Faz uma certa confusão...

Baseando-se em informação facultada pelo Observatório Português dos Sistemas Saúde, o Comentador do horário nobre da SIC, ao Domingo, apresentou a habitual sequência de gráficos, segundo a qual, entre 2015 e 2022:

  • a quantidade de profissionais - médicos incluídos - afetos ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) aumentou significativamente;
  • a produtividade dos profissionais afetos ao SNS diminuiu significativamente;
  • os salários do pessoal médico baixaram, enquanto os da maior parte dos restantes setores - incluindo outros profissionais de saúde - subiram;
  • a quebra de produtividade deve-se, além das saídas por redução do nível salarial, em boa parte à tensão nervosa em que toda aquela gente vive, resultando num crescente absentismo.

Mesmo sem aqui especificar números, evidente se torna ao cidadão menos informado, ao telespectador mais distraído, que tudo decorre, por um lado, de absoluta incapacidade de planeamento e, por outro, de notória incapacidade até para assegurar a gestão corrente; e, antes que alguns comecem a culpar a COVID, será oportuno salientar que a Senhora Ministra da Saúde se encontra em funções desde Outubro de 2018, embora a doença apenas tenha sido promovida a pandemia já em 2020.

Assim, houvesse a indispensável reforma estrutural começado a ser desenhada ano e meio antes, pelo menos duas coisas bem positivas teriam ocorrido:

  1. a situação no SNS estaria, hoje, razoavelmente controlada e estabilizada, não dando azo àquilo a que temos assistido;
  2. teria sido incomparavelmente menos complicado gerir a pandemia.
Perguntemo-nos, pois:

  • o que andou, nesse primeiro ano e meio, a Senhora Ministra a fazer?
  • o que espera o sorridente Senhor dos Nossos Destinos para a substituir?

Faz uma certa confusão...

(leia aqui o desenvolvimento)

domingo, 26 de junho de 2022


Vitorino Nemésio


"Admirar não é, nem mais, nem menos do que
 prestar atenção.
Uma forma sublimada de prestar atenção

Vitorino Nemésio*)              
>(Se bem Me Lembro)                       


Cabe, a propósito, refletir um pouco sobre aquilo que, nos dias que correm, mais tendemos a admirar; ou a dedicar uma sublimada forma de atenção.

A resposta é, evidentemente, impossível de dar, uma vez que não somos um único ser, antes largos milhões de seres, a cada unidade desses milhões correspondendo um universo muito próprio e irreplicável de focos de interesse e atenção.

Nisto reside uma das maiores maravilhas dos seres: a individualidade.

Pensada, por quem nos terá criado, talvez para ser o veículo daquela diferença que impulsiona a evolução da Humanidade, a individualidade perdeu, nas poucas mas intensas décadas mais recentes, praticamente toda a substância. Impulsionada por uma rede mediática mercenária, voraz e descontrolada, a globalização amalgamou-nos em rebanhos de seres que, como as ovelhas, tendem a seguir os semelhantes que lhes parecem mais sábios, mais sabedores ou, mais propriamente, que lhes parecem mais pujantes, mais proativos, como agora dizem, independentemente das asneiras empreendidas em nome dessa proatividade.

Admiramos, também, os que nos parecem mais belos, apesar da distorção de que o conceito de beleza inferna já. Acima de tudo admiramos, todavia, os mais ricos, que nos deixam ora embasbacados, ora deslumbrados, ora simplesmente invejosos perante o glamoroso sucesso, como gostamos de chamar àquilo que nos aparece como fausto, fartura, tempos livres sem limite, piscinas, iates, relógios de um milhão de euros, viagens, automóveis, aviões, sei lá.

Como o tempo não dá para tudo, deixámos, em contrapartida, de o ter para contemplar e admirar a verdadeira sabedoria, a verdadeira sapiência; com estas, deixámos, de um modo geral, de admirar as outras antigas virtudes, hoje consideradas fora de moda, cenas de velhos, chatices a evitar.

De mentes vazias e espíritos anestesiados, paralisados, lá se vão estes magotes de boa mas mal educada gente queixando de tudo e mais alguma coisa, sobretudo quando vem do Estado, esquecendo-se de que, afinal, somos governados por pessoas como nós, que admiram o mesmo que nós e das quais, por isso mesmo, jamais será de esperar grande coisa. Como de nós.

Não sabemos quem somos, nem queremos saber. Não sabemos para que nascemos, nem queremos saber. Não sabemos para onde vamos, nem queremos saber.

Acreditamos, piamente, que um qualquer criador inconsequente, alucinado, tresloucado cá nos pôs com o propósito exclusivo de nos fazer curtir, aproveitar o máximo da vida, cair que nem uns patos nas esparrelas de anunciantes que diariamente nos espevitam a necessidade de criar dependências, de consumir, de comprar; e muito bem, já que, da maneira como a sociedade acabou por se organizar, se o consumo pára, ficamos todos na miséria.

(Repararam? A inversão de valores já é tal, que até o outrora tão condenado consumismo se transformou, assim, num ato de... altruísmo!)

Para que todas estas maravilhas possam acontecer - mesmo em tempos de pandemias ou desta coisa aborrecida da guerra, que não há de ser nada, se Deus quiser... -, o que importa é seguir o rebanho que, por sua vez, segue o pastor.

Mas não aquele pastor pobre e de feições desfiguradas pelas intempéries de uma vida desgraçada à doentia chuva e ao sol implacável. Esse, desprezamo-lo pela sua falta de sucesso.

Os pastores de hoje são os ídolos, os craques, aqueles que se exibem na montra mediática como se de peças de museu se tratasse. Como se tivessem abdicado da sua condição de seres humanos, de pessoas, para já não passar de objetos numa imensa vitrina que apenas existem para regalar os olhos embrutecidos de quem passa.

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Haverá ambiente mais favorável do que este ao ressurgimento da extrema-direita e de novas e implacáveis ditaduras? Claro que não!

Depois, sim. Lá vamos cair em nós. Lá vão as cabeças recomeçar a funcionar, a olhar para trás, com olhos de ver. Lá vamos horrorizar-nos, retrospetivamente, com a vacuidade daqueles que tínhamos escolhido admirar. Lá vamos, aflitos, começar a pensar em como recuperar a tão querida mas desperdiçada liberdade que, por culpa nossa, outros nos conseguiram tirar.

Mas será que o ser humano não entende, mesmo, a responsabilidade imensa que implica viver em liberdade? Por que continuamos a confundir laxismo e anarquia com liberdade? Riqueza com felicidade?

Será assim tão difícil parar um pouco para pensar?

(leia aqui a sequência deste assunto)