Alguns exemplos que pode ver aqui: Maria José Morgado, João Lobo Antunes, João Amaral, tantos outros...
(Imagem: Arquivo RTP)
Alguns exemplos que pode ver aqui: Maria José Morgado, João Lobo Antunes, João Amaral, tantos outros...
(Imagem: Arquivo RTP)
Um pungente exemplo da falta de rigor e de rumo de que fala Leonardo será, sem dúvida, aquilo que, de forma cada vez mais preocupante, se passa com a LÍNGUA PORTUGUESA, domínio onde grassa a tendência para a afirmação perentória de posições não fundamentadas, invocando regras gramaticais inexistentes ou interpretadas ad libitum. Não perca, no correspondente separador no topo desta página, diversos artigos polémicos sobre temas com ela relacionados. |
"Até quanto a ânsia narcísica e obsessiva de um se fazer notar
continuará,
nesta atrasada e mal governada terrinha, a opor-se ao
interesse de todos?”
“Não é ciência aquilo que, todos os dias e a todas as horas, nos entra
pelos olhos e ouvidos:
é uma vozearia ignorante, pedante,
oportunista e, por vezes, desesperada,
que apenas contribui para
agravar a já catastrófica situação"
1. Da Importância da Sustentação
Científica das Opiniões Formuladas
2. Vacina-se os Miúdos ou Não?
3. A Chinfrineira Muda na Comunicação Social
4. Missão de Informar versus Liberdade de
Expressão
5. Pluralismo no
Debate versus Motivação para Aparecer na Televisão
No Estado de Direito, é entendido como do mais elementar bom senso – e a
lei prevê – que um decisor que não domine determinada área do conhecimento
recorra à opinião de peritos visando o rigor da decisão a prolatar, bem como
a clareza de uma exaustiva e clara fundamentação.
Tal recurso à presumível sapiência de terceiros pressupõe, necessariamente,
que o laudo produzido por cada perito consultado se sustente em saber
estabilizado e adquirido segundo as regras do método científico, sob pena de
acabar o decisor enleado numa amálgama de opiniões díspares que, em lugar de
contribuir para o desejado esclarecimento, apenas irão a sua ignorância
nestas coisas acabar por aumentar.
Ainda assim - ou seja, mesmo quando os diversos pareceres solicitados se baseiam numa mesma ciência antiga e são redigidos de acordo com os procedimentos preconizados -, não é raro chegarem os respetivos autores a conclusões substancialmente distintas, já que, contrariamente ao que às vezes por aí se diz, conta bem menos o volume do conhecimento do que a efetiva capacidade para corretamente o processar, para, daquele que existir, alguma coisa aproveitar.
A situação agrava-se, evidentemente, quando a ciência consultada não é
antiga nem conhecimento, verdadeiramente, existe porque o problema é recente
e ninguém domina uma matéria que não houve tempo para, serena e
exaustivamente, investigar.
Assistimos, então, a espetáculos tristes por parte de desesperados e desabridos gestores ou governantes que ficam sem saber o que decidir e como manter confiante e tranquila uma população tão ignorante como eles nestes assuntos – e muito bem, porque, se cientistas existem de determinada área, é porque tudo de tudo todos não têm de saber - e ávida de orientações e esclarecimentos coerentes e seguros, ou que, pelo menos, pareçam fidedignos, que estimulem a vontade de os seguir e de à lei obedecer.
Atarantados, não cessam, pelo contrário, os atores sociais e políticos de
ainda mais inquietar os espíritos, lançando na comunicação social o debate
tipicamente estéril que, de forma inevitável, nasce do costume de espalhar
aos quatro ventos todas as palavras alguém diz, seja lá o que for, seja lá
quem for, como que procurando transferir para os desgovernados a
obrigação de, em cada caso específico, decidir sobre aquilo que não
conhecem, e deixando-os sem saber o que fazer nem em quem, afinal,
acreditar.
2. Vacina-se os Miúdos ou Não?
Enquanto, na imensa praia da insanidade comunicacional típica do Portugal de todos nós o areal vai, a cada dia que passa, ficando cada vez mais poluído, decisões de sentido inverso vão sendo tomadas em regiões distintas do País. Foi o que aconteceu na Madeira, onde, a despeito da recomendação de sentido contrário da Direção-Geral da Saúde – e não de Saúde, como alguns peritos e alguns ólogos, quiçá por soar mais chic gostam de dizer -, se decidiu inocular os menores com idades entre os 12 e os 16 anos*), independentemente da existência ou inexistência de patologias – direito esse que, diga-se de passagem, à Região Autónoma plenamente assiste, nos termos constitucionais.
Não pode, porém, ignorar-se que, se a disparidade de critérios e de
fundamentações que grassa Europa fora é, já de si, sintomática do desnorte
que por aí reina na ciência destas coisas, torna-se, para a fiabilidade do
que cientificamente é dito, simplesmente catastrófico que, para
salvaguardar particularidades da economia de determinada Região ou por mera
ânsia de protagonismo político, sobre questão são importante e sensível como
a vacinação de menores se não entenda uma região autónoma com o poder
central - por muito débil que este possa ser mau grado o folclore gerado por
cada vez mais frequentes e indisfarçáveis tiques ditatoriais.
Mais grave, porém, será o facto de a Direção-Geral da Saúde e a Ordem dos Médicos terem posições diametralmente opostas sobre este tema da vacinação de menores*).
Note-se que se trata de entidades que, desejavelmente, não estão a proferir opiniões de natureza política: em ambas pontificam cientistas das mesmas áreas do conhecimento que estariam, supostamente, a pronunciar-se de forma sensata, ponderada e cientificamente sustentada sobre matérias da sua especialidade, visando, unicamente, proporcionar aos tais mais ou menos desesperados governantes os elementos necessários à tomada de decisões políticas - decisões essas que acabam por quase sempre tardar, por ficarem os governantes à deriva num confuso oceano de contraditórias opiniões.
Bonito!
Não obstante, entende o Senhor Primeiro-Ministro que não se trata de ziguezague - como, à manobra, um definhado partido da oposição chamou à cambalhota -, mas sim de "evoluir na decisão"*)... mais propriamente, evoluir precisamente para a decisão contrária, com os mesmos dados disponíveis e, praticamente, uma semana depois.
Fala-se muito de linguagem inclusiva, mas esta é simplesmente exclusiva, na medida em que exclui do seu entendimento os olhos e os ouvidos de pessoas minimamente inteligentes e de boa fé, que apenas procuram entender o que se passa, sem estar preocupadas com votos ou campanhas eleitorais, como, por maioria de razão, a um Governo conviria em tempo de tão graves e sensíveis decisões.
3. A Chinfrineira Muda na Comunicação Social
No século passado, era eu ainda mais miúdo do que os miúdos cuja vacinação
tanta celeuma hoje levanta, levava-me a minha Mãe ao Palácio das Araras, no
Jardim Zoológico de Lisboa.
Cá de fora, pouco se dava por isso. Mas, uma vez lá dentro, o diálogo entre
humanos tornava-se completamente impossível, tal era a chinfrineira saída
dos bicos das animadas e tagarelas aves.
O mesmo se passa hoje com a vozearia que, sobre assuntos relacionados com a
COVID, por aí vai nos jornais e televisões, resultando numa chinfrineira
muda, vazia de mensagem, já que ninguém ouve nem ninguém se faz ouvir, com
um mínimo de respeito e de credibilidade, no meio de tanto alarde, de tanta
vontade de se pôr em bicos de pés a dizer “eu é que tenho razão!”
quando lá se arranja maneira de, uma vez mais e ganhando ou não uns trocos,
aparecer na televisão.
Manifestamente, não se baseiam estes discordantes palradores em dados cientificamente recolhidos e validados, uma vez que, em quantidade e com fiabilidade suficientes, os não há: proferem palavras tiradas da mera dedução lógica a partir de algumas notícias e elementos insuficientemente interpretados e testados. Ou seja: deitam-se a divinhar, como, mais coisa, menos coisa, qualquer um de nós seria capaz de fazer.
De nada vale o brocardo segundo o qual, quando um burro zurra – digamos
assim -, os outros baixam as orelhas: todos sabem que ninguém sabe, mas
todos fazem por parecer que sabem, porque, para esta gente, é
“vergonha” não saber.
Mas a título de quê e com que legitimidade ou direito tanto palra esta
gente toda?
Até quanto a ânsia narcísica e obsessiva de um se fazer notar continuará,
nesta atrasada e mal governada terrinha, a opor-se ao interesse de todos?
Estruturalmente, a democracia é um regime político muito fraco, dada a
facilidade com que se usa e abusa na interpretação dos direitos, garantias e
liberdades constitucionalmente reconhecidos, invocando-os para tudo e mais
alguma coisa em proveito exclusivo de um indivíduo ou de um grupo restrito,
sem que alguém tenha a coragem de a tal se opor. Se o fizer, o mais certo
será deparar-se com acusações de ser fascista, ditador e
mais isto e mais aquilo, como sempre acontece quando alguém procura, no
exercício de direitos ou de deveres e com a melhor das intenções, moderar o
exercício das amplas liberdades da democracia por parte de quem delas
abusa e volta a abusar.
Já, a propósito dos
festejos da vitória do Sporting na Primeira Liga de futebol, aqui falei sobre a confusão entre, por um lado, o direito de cada um
manifestar as suas posições e ideais políticos e, por outro, invocar tal
direito para atividades que nada têm com os direitos garantidos na
Constituição.
O abuso da liberdade de expressão em tempo de pandemia é claramente, mais
um destes casos.
Na verdade, aquilo a que diariamente assistimos nas televisões não é o
exercício do direito de livremente exprimir posições políticas sobre o
assunto, posições essas que, efetivamente, todos têm o direito de manifestar
e todos têm o direito de conhecer.
O que se escreve nos jornais e passa nas televisões são conclusões
meramente técnicas e, quase sempre, não fundamentadas sobre matéria
científica que apenas meia dúzia de portugueses se encontra em condições de
escutar e interpretar. Para a multidão restante, são coisas sem qualquer
interesse prático, sem conteúdo político, apenas destinadas a preencher
tempo de antena quando nenhuma catástrofe ou desastre espetacular em
Portugal fornece matéria para vender anúncios, e cujo principal efeito é
espalhar a confusão, descredibilizar as decisões e convidar, por
desconhecimento ou descrédito, à prática de sucessivas infrações.
Afinal, o que queremos, verdadeiramente, quando vamos ao médico?
Simplesmente, que nos passe a receita e instrua quanto à posologia. Às
discussões técnicas, que nos poupe e as tenha em local próprio e com os
colegas de profissão!
É no INFARMED, e não na praça pública, que deve ter lugar o debate entre
cientistas que falem a mesma língua e que, nesse e noutros fora da
especialidade, expressem livremente as suas opiniões, procurando chegar ao
bom porto de alguma válida e, finalmente, eficaz conclusão, na falta da qual
o Governo ficará desobrigado de seguir o resultado da difusa e
inaproveitável discussão - mas, mesmo assim, obrigado a decidir com base no
bom senso e segundo os mais altos e saudáveis ditames da administração.
Não é ciência aquilo que, todos os dias e a todas as horas, nos entra pelos
olhos e ouvidos: é uma vozearia ignorante, pedante, oportunista e, por
vezes, desesperada, que apenas contribui para agravar a já catastrófica
situação.
5. Pluralismo no Debate versus Motivação para Aparecer na
Televisão
Bem, dir-se-á, mas, no INFARMED isso já é feito, os especialistas já
debatem estes temas antes e durante as famosas reuniões.
Pois sim, mas o que, aparentemente, acontece, é que, convenientemente, não
são convidados cientistas de todas as tendências para essas reuniões, assim
restando aos excluídos e ignorados badalar cá por fora as razões pelas quais
discordam das conclusões.
- x -
Os editores dos jornais e os diretores de informação das televisões prestariam bem mais válido e sério serviço público se, em tempos tão complicados e difíceis, se recusassem a incentivar e a amplificar a chinfrineira destas araras que nos enchem olhos e ouvidos com a sua ignorante confusão; se pensassem um pouco menos em tiragens e em audiências e se abstivessem de dar eco a quem o não merce - ainda que substituindo o interminável rosário de opiniões dos entendidos por cacofónicas crónicas futebolísticas com vocabulário mais ou menos anedótico ou por mais um programas pimba apresentados por gente cada vez mais mal preparada e mais desinteressante.
Agiriam, assim, em defesa do legítimo interesse do público que os sustenta
e a quem se dirigem, em lugar de dar palco a quem, falando daquilo que
supostamente sabe sem, efetivamente, algo saber, apenas perturba a paz
social, desacredita o legislador e as leis que produz, e assim torna ainda
mais incerto e confuso o que já tão difícil é entender.
Em circunstância nenhuma será boa ideia aumentar a depressão e o pânico numa martirizada população e em desnorteados governantes que, manifestamente, não fazem a mais pequena ideia do que ainda poderão fazer, sem meter o pé na argola e sem dar cabo da próxima eleição.
“Complicado? Claro que não! É, até, bem simples!
Se não foi por desnorte, incompetência ou desinteresse,
por que será que pelo menos um destes tão simples
como evidentes retoques não foi introduzido no modelo em vigor,
antes tendo-se vindo a insistir, cegamente,
na aplicação continuada de tão descabidas e desnecessárias sanções
a concelhos que já tanto tiveram de sofrer quando para tal havia plena
justificação?”
3. Como Resolver Objetivamente a
Questão?
Há pessoas que falam pelos cotovelos e, algumas delas, não só falam pelos
cotovelos como o fazem em voz impossível de deixar de ouvir por alguém que
esteja menos de uma boa dúzia de metros afastado. Foi assim que anteontem
tomei conhecimento de uma história insólita, quando beberricava,
descontraidamente, numa esplanada um líquido qualquer.
O sujeito da voz tonitroante tinha decidido jantar em Elvas, no regresso de
uma deslocação profissional algures ao Alentejo.
Procurou na Internet um restaurante que correspondesse às suas preferências, e
também pela Internet ficou a sabe que Elvas iria entrar, no dia seguinte, na
situação de risco muito elevado de contágio pelo vírus Sars-Cov-2.
Assim, e como quem o atendeu no restaurante, era algo dado à conversa,
interessou-se o viajante palrador pelas razões que teriam levado aquele fim de
um Alentejo quase imune à doença a apresentar uma tão elevada quantidade de
novos doentes COVID, ao que o outro retorquiu que os infetados eram, na sua
maioria, jovens finalistas em festejos de final de ano letivo.
Ora, gostando o tuga de comemorar desabrida e descontroladamente como gosta e entendendo que, mesmo nestes tempos terríveis, o que importa é viver plenamente com tudo aquilo a que tem direito, razão não haveria para que o efeito destas folias em Elvas, Alentejo, diferisse, nas devidas proporções, do descalabro estatístico resultante das loucuras que se seguiram à mais do que esperada vitória do Sporting Clube de Portugal na Liga NO, loucuras essas cometidas perante a completa passividade do Ministério da Administração interna e da Câmara Municipal de Lisboa.
Dispôs-se o nosso tagarela a aprofundar a questão, ao que o seu interlocutor
no restaurante informou que tinha Elvas atingido, na quinzena que então
terminara, uma taxa de incidência superior a 480 novos infetados por cem mil
habitantes, razão pela qual os alarmados responsáveis por nos salvar a todos
da pandemia tinham decretado novas proibições que iriam, uma vez mais, dar
cabo do negócio dos restaurantes, agora operados por pessoas habilitadas, além
de servir refeições, também a, sem qualquer formação específica, vigiar a
forma como os clientes realizavam os indispensáveis autotestes que lhes
confeririam, se negativos, o direito a desfrutar da refeição.
Como Elvas tem uma população de cerca de 23.000 habitantes, os cerca de 130
casos reais absolutos correspondem a cerca de 520 por 100.000 habitantes,
donde a decisão de regredir no desconfinamento.
2. Ligeireza e Arbitrariedade Redundam em Castigos Inúteis e Injustos
Fazer qualquer coisa implica esforço, já se sabe; mas não poder fazer implica
também, pelas privações que daí advêm, da qual a privação de receitas do já
tão martirizado comércio, entre outros setores, não será, por certo, a mais
desprezível.
Para que alguém aceite confinar-se, privar-se, para que a lei seja por todos -
ou quase todos - aceite e cumprida, tem, também, de ser racional e clara, tem
de fazer sentido, para que os destinatários nela vejam algum propósito
credível e com uma probabilidade de eficácia que justifique um sacrifício já
enorme: não pode, ao invés, ficar nas mãos de amadores incapazes de planear
seja o que for com ponderação e seriedade; de pessoas impreparadas,
irresponsáveis, precipitadas, politicamente desesperadas, até.
Claro que o ideal teria sido, nas datas em que as comemorações eram
previsíveis, vigiar o cumprimento da lei que já proibia os ajuntamentos para
evitar novas doenças COVID. Tal não tendo acontecido, não pode pôr-se em causa
que, no interesse de todos, teria sido necessário reagir quando se ultrapassou
o patamar legalmente fixado, e isto independente de a tal contagem absoluta de
cento e vinte ser cientificamente válida para o efeito ou não, coisa que não
estou, de perto nem de longe, habilitado a discutir.
O que não há como entender são duas coisas muito simples.
A primeira, qual a utilidade de agir só ao fim de uma quinzena, isto é, quando
o vírus já fez criação mais do que suficiente para assegurar uma, para
ele, saudável e profícua expansão pelo sistema respiratório de umas boas
centenas ou milhares de exemplares da tão descuidada e irreverente população
tuga; e da outra, vítima ajuizada e inocente, também.
Evidentemente, se, por mera hipótese, no primeiro dia de uma quinzena, determinado concelho registar uma contagem de, por exemplo, cento e quarenta infetados e, no derradeiro, apenas noventa e sete, sendo a média móvel dos sete últimos dias consistentemente inferior ao longo da segunda semana, estamos perante uma situação obviamente resolvida ou em vias disso, jamais se justificando, em tal cenário, qualquer novo confinamento ou outra imposição.
A Elvas, valeu, apesar dos festejos que não soube evitar, ter uma população responsável que não esperou que as novas medidas restritivas fossem decretadas para, espontânea e rapidamente, pôr cobro à indesejada evolução. Mesmo assim, e graças a modelos obsoletos e, desde o início, descabidos, não teve como evitar o implacável e imerecido castigo, a exemplo, mais do que provavelmente, de muitos outros concelhos na mesma situação de serem punidos, não por a propagação do vírus estar a aumentar, mas por estar prestes a terminar!
Ora, se como na esplanada ouvi ao animado conversador, a quantidade de pessoas
infetadas pelo Sars-Cov-2 na segunda semana da quinzena era inferior em cerca
de metade à da primeira, que justificação poderá, em tal cenário, alguém
invocar para impor novas medidas de restrição? Para tamanha incompetência e
arbitrariedade, onde procurar explicação?
- x -
Traz-nos isto à segunda coisa que não há como entender: que, caso não se
queria recorrer à análise da evolução da média móvel, os indicadores
estatísticos utilizados nesta aparência de governação não estejam sujeitos a
uma, ainda que elementar, ponderação em função do dia da quinzena, mais
próximo do início ou do fim, em que cada leitura é registada.
Não seria lógico que os primeiros dias tivessem um peso reduzido na
decisão e os últimos um peso incomparavelmente maior, assim se tornando
fácil ajustar, de forma automática e objetiva, o número relevante para a
decisão final conforme estivesse a aumentar ou a diminuir a quantidade de
novas infeções?
3. Como Resolver Objetivamente a Questão?
A parte mais triste disto tudo é que, segundo li na imprensa, terá o Governo rejeitado este critério fundamental da aceleração ou desaceleração do contágio*), que teria, muito facilmente, evitado estas situações profundamente injustas e injustificadas que a tantos a própria sobrevivência dos negócios poderão custar, apenas aplicando o do nível de incidência, o dos concelhos circundantes e o do surto localizado.
A justificação terá sido a de que o critério da aceleração do contágio seria
pouco objetivo, ou difícil de explicar.
Numa abordagem apenas destinada a ilustrar quão fácil seria, até para um
amador como quem aqui escreve, dotar o critério rejeitado da necessária
objetividade e facilitar a correspondente explicação, aqui deixo aqui duas
sugestões muito simples de aplicar, e que os especialistas facilmente
afinarão.
- x -
A primeira, consiste na observação da evolução, ao longo da quinzena (duas
semanas) e, a partir do dia em que tal seja possível, da média móvel dos
últimos sete dias (sete, para incluir, obrigatoriamente, os desvios próprios
dos fins de semana): registando-se uma diminuição constante da média móvel ao
longo do período (Quadro 1 infra, Cenário A), não serão aplicadas
quaisquer novas restrições, independentemente da média geral absoluta e
estática apurada no termo da quinzena.
Quadro 1
Caso esta simulação correspondesse a dados reais de Elvas (com uma população
de cerca de 23.000), a média real de 115,64 das duas semanas corresponderia a
cerca de 503 novos infetados por cem mil habitantes [(115,64 : (23.000 :
100.000)].
No entanto, no Cenário A do Quadro 1, cada uma das médias móveis nos últimos
sete dias - de 124,43 > 121,86 > 119,57 e assim sucessivamente até
106,86 - teria sido, consistentemente, inferior à anterior,
pelo que nenhum agravamento da situação haveria de ser aplicado a este
concelho com mais de 480 novos infetados por cem mil habitantes.
- x -
Para o cálculo da média será, assim, utilizado esse valor ponderado, em lugar do absoluto, o que fará com que, no Cenário A do Quadro 2, os 140 casos do primeiro dia tenham um peso de 140 (140 x 1) e os 97 do último dia tenham um peso de 18,878 (97 x 194m92); ou seja: que conte muito mais a redução efetiva do número de casos no último dia do que o valor mais elevado no primeiro, como deve contar numa situação clara de progressivo controlo da infeção.
A soma destas quantidades ponderadas é, então, dividida pela soma das
ponderações, do que resulta, no Cenário A (incidência da doença a descer), uma
média diária ponderada de 103,46, substancialmente diferente da média
aritmética não ponderada de 115,64 resultante da aplicação do modelo que
suponho ser o atualmente utilizado – pelo menos, assim está descrito de forma
simplista.
Quadro 2
Esta retificação ao modelo determinaria que não mais fossem, indevida e
injustificadamente, aplicadas restrições sem qualquer utilidade prática em
concelhos onde, apesar de a média da quinzena ser superior ao limiar
mínimo estabelecido para que as medidas não sejam agravadas, a incidência
de novos contágios estaria, inequivocamente, a descer.
Novamente no caso de a simulação se referir a Elvas, a média ponderada dos 14
dias de 103,46 corresponderia, desta vez, a 449 casos por cem mil habitantes
[(103,46 : (23.000 : 100.000)], assim não havendo lugar a qualquer agravamento
da classificação de risco.
- x -
Complicado? Claro que não! É, até, bem simples!
Se não foi por desnorte, incompetência ou desinteresse, por que será que pelo
menos um destes tão simples como evidentes retoques não foi introduzido no
modelo em vigor, antes tendo-se vindo a insistir, cegamente, na aplicação
continuada de tão descabidas e desnecessárias sanções a concelhos que
já tanto tiveram de sofrer quando para tal havia plena justificação?
Para cúmulo, sendo a explicação a dificuldade de explicação do critério, num governo que dá emprego a não poucos assessores de comunicação!
Mistérios de uma agora gasta e há muito desnorteada governação...
Sic transit gloria mundi...
Não sendo dotado, senti-me, justificadamente, nos píncaros quando depois de
aturados esforços lá consegui absorver toda a matéria relacionada com a
difícil problemática do fora de jogo; vibrei com a novidade do VAR –
vídeo-árbitro, para quem disto ainda menos entende do que eu -; e o
zénite da minha realização como futebolista de poltrona ocorreu quando, há
dias, ouvi o termo trivela e, de uma só vez, consegui entender o que
significava, para o efeito recorrendo a um desses filmezinhos que no
YouTube ilustram tudo e mais alguma coisa, embora nem sempre com a
fiabilidade que seria desejável.
Há muito se desconfiava, e os acontecimentos recentes cada vez melhor ilustram, que o assim chamado futebol profissional de profissional pouco tem além da utilidade de a si atrair a exaltação dos ânimos, melhor ou pior a contendo no perímetro dos estádios e assim permitindo desviá-la de situações em que poderia acabar por se tornar socialmente mais prejudicial ainda, se possível for.
Quanto ao mais, o que a imprensa tem vindo a divulgar da conduta supostamente
cívica de uma generosa quantidade dos mais relevantes
soit disant empresários e dirigentes do futebol chaamado profissional
apenas lança, progressiva e, ao que parece, justificadamente, o futebol num
pantanal de descrédito relativamente a qualquer plano eticamente sustentável
em que o queiramos posicionar.
Num tal cenário, não me sinto elevado, orgulhoso - o orgulho era pecado, mas
agora é qualidade, ao que parece -, enaltecido por qualquer feito glorioso da
Seleção Outrora Campeã em Título, da Seleção das Quinas, da
Seleção de Todos Nós, já que, além de um importante veículo de
marketing para as trocas comerciais internacionais, se limita ela a
agregar o que de supostamente melhor existe num meio que, manifestamente, em
nada contribui para elevar os espíritos, a qualidade humana ou o conhecimento
relevante e válido, científico ou social, que deveria estar na base de
qualquer atividade e, até, da própria essência e razão de ser da espécie
humana.
Quando assisto a jogos como o Croácia-Espanha ou o Holanda-República Checa nos
oitavos de final do Euro 2020 (e um…), vem-me à memória o vivo contraste com a
primeira parte do nosso jogo nos mesmos oitavos de final, no qual o
lusitano onze, às arrecuas, dobrava o corpo a meio, em pose aflita,
estacionando o autocarro em frente à baliza sempre que, também
adormecida, a Bélgica tinha a bola e dava uns passitos em frente - com
ar não muito ameaçador.
Bem vistas as coisas, se a garbosa Seleção das Quinas não tivesse caído nesse jogo, teria caído noutro qualquer, tamanha era a falta de vontade no campo, de coragem, de ousadia, de energia; de alegria, sobretudo, que nestas coisas tanta falta faz para que aquela hora ou duas não redunde num monumental frete para atores, espetadores e outros que tais.
Felizmente, caíram os nossos guerreiros com a Bélgica, o lhes permitirá, pelo resto das suas mui desportivas e bem remuneradas vidas, dizer aos amigos, filhos e netos que perderam contra o número um do ranking da FIFA, o que alguma coisa do desaire permitirá disfarçar; e poderão, até, dizer que também a França, campeã do Mundo em título, caiu nos oitavos de final, que a poderosa Alemanha também não resistiu e que do terrível Grupo F ninguém viveu para contar, além da infinidade de desculpas que em ocasiões destas é hábito ouvi fazer ecoar.
O pior – de que rapidamente se irão esquecer - é que a França caiu, mas caiu
com estrondo, frente a uma incansável e valorosa Suíça, precisamente o tal
adversário supostamente mais fraco que o sábio Selecionador Nacional
dizia nos oitavos de final preferir enfrentar...
Não haverá, mesmo, alternativa viável? É que este homem, que tudo leva a crer
ser bom e sério, parece ter já aprendido, no meio do futebol, o velho truque
dos políticos que nele se misturam cada vez mais: nunca arriscar e, quando a
coisa dá para o torto, assumir, teoricamente, as responsabilidades, na
prática, as consequências rejeitar.
Talvez com o inconfessável propósito de esbracejar procurando manter-se à tona
de uma notoriedade de méritos duvidosos, antes e durante o desafio
mostravam-se às câmaras da televisão alguns outrora craques, hoje
recauchutados, fora de prazo e que, talvez para parecerem ainda jovens,
seguem os tiques de penteado daqueles que ainda mexem, assim se
demonstrando, também aqui, que, apesar das suas academias, dos campus,
das cidades do futebol, das catedrais do futebol, o futebol ensina pouco mais
do que o supérfluo, o ostentatório, o inútil, o artificial, sem esquecer todas
aquelas coisas feias que acabam por colocar algumas das suas mais destacadas
personalidades debaixo da alçada da justiça criminal.
Na
final, ganha-se ou perde-se; no plano desportivo, evidentemente, já que o
abundoso pecúlio percebido por quantos vão ficando pelo caminho também não
será, propriamente, coisa de se desprezar…
Mas aquele jogo dos oitavos de final era capital, era, como qualquer outra
eliminatória, uma final, já que, sem o ganhar, a
Seleção Outrora Campeã em Título levaria para casa apenas uns trocos no
bolso e o amargo de boca de nem ter chegado à final em que um tudo ganha e, do
outro, rapidamente ninguém se irá lembrar, o que, depois de tanta luta,
deita qualquer um abaixo, dentro e fora do campo, nos tais desportos que, como
os de bola, lá vão servindo para fingir que, pelo menos naquilo, somos tão
bons ou melhores do que aqueles que dizem saber analisar e comentar.
Naquele nosso jogo dos oitavos, não havia chama, vontade, equipa; apenas uma exibição muito cerebral e calculista por parte de uma dúzia de milionários doutores da bola, cheios de táticas na cabeça, mas, talvez com uma ou outra exceção, sem garra, sem capacidade de dar vida à competição.
Ou teria o Técnico dos Empates dado contrária instrução?
Portugal passava bolas entre peões que faziam lembrar bonecos inanimados de um
jogo de matraquilhos; outras seleções corriam, corriam que não se fartavam -
coisa que, no futebol como no resto, os Portugueses de hoje parecem já não ter
grande capacidade ou vontade de fazer – e, quando caiam, era com a satisfação,
não apenas do dever cumprido, mas também de ter procurado ultrapassar em muito
esse dever.
Dir-se-á, como sempre, que o que importa não é o espetáculo, mas sim ganhar. Até pode ser verdade, mas desde que se ganhe, ou, nem pelo espetáculo, da vitória moral a memória irá perdurar.
Lágrimas sem suor
Estariam os excelentíssimos e mimados futebolistas sentidos com o facto de,
por uma natural demonstração de boçalidade por parte de quem deveria saber
estar e, nesse campo, não é, seguramente, o campeão, terem os mais altos
magistrados da Nação acabado por não assistir àquele espetáculo de tamanha
falta de desportiva abnegação? Duvido.
Independentemente de quem possa estar a assistir, correr do princípio ao fim exige forma física, persistência, trabalho árduo, acreditar para além do possível, coisas com que apenas um ou outro dos futebolistas da Seleção Outrora Campeã em Título parece comprometer-se e, assim sendo, nos faz desconfiar que, mais uma vez, a ordem do Selecionador Nacional não terá sido para atacar, mas para aguentar.
A Croácia caiu nos oitavos frente à Espanha, mas caiu de pé, “como as árvores" e após prolongamento. A República Checa desfez a muito forte Holanda. Até a fraquinha Ucrânia eliminou a Suécia e apenas caiu frente à finalista Inglaterra, que tão caro vendeu a derrota, também.
Portugal, caiu sentado a fazer contas de somar, com uma equipa a ouvir, desolada, apelos e preces do tristonho e lamuriento Selecionador Nacional.
Esperar-se-á, assim sendo, que fiquemos comovidos com o facto de alguns destes
milionários da bola terem ido para o balneário chorar?
Feitas as contas - ou no fim do dia, como agora é chic dizer... -, ainda bem que caímos cedo: em plena pandemia - do que muita gente parece que já se esqueceu -, com uma parte expressiva população composta por inconscientes e básicos alarves capazes de tudo sacrificar a uma comemoração parola, e na vivência de uma das mais tristes e amadoras desgovernações de que sou capaz de me lembrar, ainda bem que não houve oportunidade para grandes festividades, ou o grande vencedor seria, uma vez mais, o famigerado índice de propagação.
Mas, por que me ralo com isto eu, que nem gosto de futebol?
- x - x -
A Câmara Municipal de Lisboa era, nos termos da lei,
obrigada a
impedir as comemorações do Sporting
"Se se pretende educar uma população
e elevar o nível da sua consciência ética e cívica,
há que fazê-la governar por pessoas competentes
e de reconhecidamente elevada qualidade humana:
não, nunca, por tugas
elementares que,
nada tendo de excelente, devemos tratar por Excelência
apenas por serem amigos de alguém democraticamente eleito"
1. A Política e a Vital Importância
da Comunicação
2. A Comunicação
Política em Tempo de Pandemia
3.
Do Desempenho do Segundo Mais Alto Magistrado da Nação
4. O Bombo da Festa
5. As Contradições de Odemira
6. Inabilidades Avulsas na Comunicação
7. O Primeiro Responsável pela Governação
8. O Estado da Nação
Todos dependemos, em menor ou maior grau, do Estado em que estamos
imersos. Literalmente imersos,
em certos casos quase afogados; e tanto maior é o mergulho quanto mais
impositivo é o Estado, mormente por via da muito justificada insegurança que
lhe incute a incompetência genética grudada a certos órgãos ditos
de soberania, em diversas épocas, sedes e áreas do governo ou da
administração.
Essa incompetência decorre, essencialmente, da abundância e da proliferação,
nos mais diversos lugares, de indivíduos oportunistas, ambiciosos, gente de
defeituosa formação profissional e, sobretudo, humana, políticos feitos à
pressa, abundância essa que fortemente contrasta com a escassez de pessoas
devidamente formadas, educadas e, sobretudo, com aquele verdadeiro espírito de
missão que, ingenuamente, alguns de nós ainda acabam por, ingenuamente,
associar às coisas da governação.
A insegurança endémica - impossível de erradicar de militantes desnorteados
que, uma vez eleitos deputados, certos partidos destacam para altas funções
governativas -, leva os partidos aos quais incumbe governar a, cada vez mais,
querer estar presentes onde não são chamados, a intrometer-se em aspetos do
foro privado ou familiar de cada cidadão, nas decisões mais corriqueiras da
vida quotidiana e, no plano público, em tudo quanto lhes parecer suscetível de
dar visibilidade e de fazer os governantes e os Partidos que os lá poem
parecer indispensáveis e insubstituíveis, na ilusória crença de que essa
aleatória e tonta azáfama os ajudará a ganhar cada próxima eleição.
Crença ilusória, porque, da verdade indiscutível de não ser possível governar
sem comunicar resulta, inevitavelmente, ser impossível governar bem sem
comunicar bem; e resulta, também, que, quando se comunica mal, mesmo
que se governe mais ou menos bem, sempre o comum dos mortais ficará com a
ideia, certa ou errada, de que se está a governar pior do que, efetivamente,
poderá estar a acontecer.
Ocorre, assim, que a comunicação, verbal e não verbal, dos incompetentes e,
também, dos competentes que comunicar não sabem, acaba por se tornar,
progressivamente, tão insatisfatória que redunda, fatalmente, num efeito
desastroso que, seguramente, não explica o peso das intenções de voto que
sondagens certamente muito rigorosas e cientificamente elaboradas possam,
continuamente, assegurar a partidos aparentemente fadados à eternidade no
exercício das suas funções, e aos quais, embora nada tendo contra, cada vez
encontremos menos razões para agradecer.
2. A Comunicação Política em Tempo de Pandemia
Em política, não é verdade que o que importa é que falem de nós, mesmo que
digam mal de nós.
A vontade de nos portarmos bem desvanece-se, nomeadamente, quando, num cenário de emergência sanitária, a comunicação foi, durante longo tempo, assegurada por um sujeito a quem parecia restar apenas uma centelha de vida, como que acabado de arrancar a um sono reparador*), e que, talvez incomodado por lhe ter caído o barrete de dormir, ia soltando palavras entrameladas num arrazoado desconexo e lamuriento*), proferido perante audiências ávidas de estímulo, de segurança, de confiança e de motivação para continuar a acreditar que, contra esta coisa da COVID, valia a pena lutar.
Também não ajuda que uma senhora algo cambaleante, com o ar escanzelado e idoso de uma rígida e implacável mestre-escola de antanho e de palmatória na mão, discorra dias seguidos e horas a fio sobre temas sem novidades que o sejam realmente, procurando, porventura, disfarçar a inutilidade do seu desinteressante e ineficaz esforço comunicacional com um desfilar de toilettes eventualmente apropriado a outras ocasiões*), mas não quando, num tempo já muito sofrido, se trata de transmitir uma imagem de concentração, de seriedade e de rigor no por ela trabalho desenvolvido numa área fundamental.
No meio de muito disparate junto, o que dizer, então, de uma Direção-Geral que, no início de um mês em que se realizava sessenta mil testes diários da COVID-19, afirma que o objetivo é chegar aos cem mil*) para, no fim do mesmo mês e em vez dos tais cem mil, os iniciais e reais sessenta mil terem, ao invés, descido para menos de trinta mil? Claro que, em alguma medida beneficiada por essa efetiva redução de testes, a contagem diária de novos infetados lá acabou por cair para níveis muito convenientes a quem pretendia, à viva força, desconfinar: quanto menos testes se fizer, menos infetados se irá encontrar.
Agora, lançando novamente a confusão, vêm peritos dizer que é
necessário reforçar a vacina de toma única da Jansen, ao mesmo tempo que a
própria Farmacêutica garante que assim não é.
Que dizer, também de um INFARMED que, numa semana, muda duas vezes de opinião
quanto à perigosidade de determinada vacina, ao sabor daquilo que vai ouvindo
lá de fora, até parecendo que apenas pela televisão é informado, e mal?
Tudo isto numa área “onde, sem esquisita erudição, é melhor não tocar semelhantes matérias”.
Procurando trazer alguma humanidade à coisa, uma Ministra da Saúde de aspeto jovem e aparentemente cheia de boas intenções – e que agora, ao que parece, apenas sonha com o dia em que se irá embora - dirigia-se às câmaras com a timidez de uma colegial na sua primeira e mal preparada prova oral; e, até falando, por vezes, com as mãos atrás das costas*), dizia, já no início de Março e perante uma audiência ávida de soluções, que ainda era cedo para se perceber o que tinha acontecido… no Natal passado. Isto, quando todos - menos, pelos vistos, a dita Senhora - há muito sabíamos ter sido o facilitismo governativo que nos pôs a circular no Natal por esse País fora, o que o vírus muito agradeceu.
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3. Do Desempenho do Segundo Mais Alto Magistrado da Nação
Se, como no Partido Socialista há quem pretenda, a Assembleia da República é o coração da democracia*), cumpre, para que se mantenha saudável, livrá-la das gorduras, do colesterol, o que se revela particularmente difícil quando é dirigida por um histórico militante socialista constantemente chamado à atenção – pelos vice-presidentes, pela secretária, e, até, pela dirigente da bancada do partido a que pertence – pelo seu patente desconhecimento, do Regimento, e pelas consequentes irregularidades na condução dos trabalhos do plenário, deixando a ideia de que muitas mais seriam se não fosse o diligente desempenho de quem o assessora em tão altas funções.
Talvez por tudo isto já poucos lhe liguem, no Parlamento, quando, esgotado o tempo, os manda calar...
Além do mais, essa importante figura do Estado arrasta-se, literalmente, nas cerimónias públicas em frente às câmaras de televisão e apresenta, no Parlamento, um ar permanentemente exaurido, por vezes bufando o ar num gesto de enfado que podem alguns confundir com boçalidade e falta de educação, o que não ajudaria no que se refere à eficácia da parlamentar comunicação.Depois, diz coisas, profere apartes e desabafos que mais valeria guardar para si, como é o caso do último mimo que acabou por fazer com que ficasse apeado em Lisboa, tal como o Presidente da República*), tendo antes um infeliz ministro sido enviado a Sevilha para ficar associado ao desaire da nossa também enfadada Seleção.
Sendo a pessoa bem conhecida e tudo isto há muito sabido – além do facto de se estar a, digamos, marimbar para o segredo de justiça*) e com este, quem sabe, para outros pilares do funcionamento da democracia e do Estado -, não poderemos deixar de nos questionar sobre as verdadeiras razões na base da eleição do dito militante para um segundo mandato, depois de um primeiro que, com a qualidade do seguinte, dificilmente poderia ter permitido, sequer,sonhar.
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Que qualquer um possa candidatar-se a Presidente da República, assim se correndo o risco de o mesmo qualquer um, ainda que iletrado, pouco educado e intelectualmente pouco dotado, vir a ser eleito, é um mal da Constituição para o qual já aqui chamei a atenção*).
Mas, sendo a segunda figura do Estado Português – teoricamente, pelo menos, já
que, por vezes, chega a parecer que é um certo ostensivamente abastado e
arrogante jogador de futebol -, o Presidente do Parlamento é eleito pelos seus
pares, supostamente mais letrados, educados e dotados do que a generalidade de
uma população para a qual saber dar uns toques na bola parece importar bem
mais do que estar apto a dirigir eficazmente o principal órgão legislativo da
Nação.
4. O Bombo da Festa
Não param os partidos, a imprensa, toda a gente de bater no monolítico
Ministro da Administração Interna, exemplo ímpar de fidelidade canina ao seu
amigo Primeiro-Ministro.
Nada empático, de ar sempre zangado e façanhudo, um dos governantes mais
essenciais à manutenção da ordem pública comunica pior que mal, movimenta-se
atabalhoadamente e aos arranques como um robot; tem, globalmente, uma
linguagem corporal que afasta, quase causa alergia e gera, seguramente,
estupefação.
A completa falta de aparência da mais ténue humanidade no caso do atropelamento mortal de um funcionário da BRISA pela viatura oficial em que o Ministro seguia, e a contradição entre versão oficial do Ministério da Administração Interna (MAI) e a da Concessionária da autoestrada em que o sinistro ocorreu, não podem deixar de suscitar as maiores dúvidas quanto à eficácia política da obstinação do Primeiro-Ministro em manter em funções tal personagem*). A menos, naturalmente, que mais ninguém de confiança aceite ocupar o difícil lugar, de má memória no que aos mais recentes titulares diz respeito*).
A viatura acidentada imobilizou-se a escassos metros da vítima, que ficou
mesmo ali ao pé, e não houve um momento da mais elementar humanidade que
impulsionasse o Ministro e sua companhia a precipitar-se para junto do
sinistrado.
O homem não só nem saiu do carro para ver o que se tinha passado – e não será
fácil imaginar qual teria sido a reação espontânea, em idênticas
circunstâncias, do Presidente da República… -, como não se interessou, mais
tarde, pela família da vítima. Até emitiu um comunicado sugerindo que seria do
próprio trabalhador vitimado toda a responsabilidade pelo sucedido; e, mesmo
quando convidado pelo Presidente a dizer alguma coisa que fosse, apenas
respondeu, perante as câmaras da televisão, com um seco: “Não! Não!”
A cereja no topo do bolo terá, porém, sido a afirmação da Guarda Nacional Republicana (GNR) quanto ao facto de ter sido impedida, por ordem superior, de efetuar, na viatura sinistrada, todas as diligências de prova que entendeu necessária*) . Ora, sabendo-se quem é o superior hierárquico máximo da Guarda – o MAI -, não será difícil adivinhar de onde terá vindo a ordem superior.
Que um político proeminente, atolado até aos ouvidos em suspeitas de nepotismo*) - e que, provavelmente por isso mesmo, tenha sido convidado a não se recandidatar a deputado – venha a terreno falar de imoralidade para defender o dito ministro*), não será, talvez, a melhor forma de lhe limpar a imagem, também…
O que mais espanta é que, em plena audição parlamentar, o dito cônjuge,
questionado quanto a alguma entidade reguladora europeia ter como
administrador “um familiar direto de um ministro” – não “uma mulher” –, se tenha manifestado ofendido enquanto mulher e vítima de “tentativa de menorização” por “machismo e misoginia”, apenas tendo sido timidamente chamada a
sua atenção para o desfasamento da resposta relativamente à pergunta
formulada.
Trata-se de mais um episódio de exploração notoriamente abusiva da estafada lengalenga feminista para justificar o injustificável*), e para alguém se insurgir, como que por automatismo, contra um tema com que não tinha sido confrontado.
Como se o que transparece do desempenho do Ministro não bastasse, por si só,
para lhe retirar toda a legitimidade substantiva para se manter no lugar,
faltava, para piorar as coisas, esta nova vertente familiar.
5. As Contradições de Odemira
Igualmente danoso para a imagem da governação não deixa de ser o facto de o
mesmo Ministro da Administração Interna se achar no direito de ordenar a
forças de segurança que irrompam à bruta, com armas e canídeos, por uma
propriedade privada a fim de dela o Estado tomar posse, numa desesperada,
incompetente e autoritária tentativa de resolver uma situação de
emergência sanitária nascida de outra situação, porventura bem mais grave, de
aparente exploração de trabalho quase escravo de imigrantes amontoados em
contentores apinhados de beliches arrendados a preço do ouro por pessoas
indignas de ser chamadas empresários.
Também não terá ajudado o facto de uma ministra procurar justificar a anterior
inércia governativa sobre este tema da quase escravatura com o facto de os
empresários cumpridores não haverem denunciado às autoridades o que se passava
noutras empresas, assim demonstrando a Ministra que, ao mais alto nível do
Estado, ainda se confunde a atividade empresarial com a de informador, outrora
essencial ao funcionamento da polícia política em tempos que até custa
recordar. Isto, tratando-se de uma situação de exploração de humanos cuja
existência era, patentemente, impossível o Governo ignorar.
A jovem Ministra da Presidência justificava, entretanto, a entrada de rompante
de forças de segurança, às quatro da manhã, numa propriedade privada em
Odemira, com alegadas dificuldades em assegurar adequada tradução aos
trabalhadores migrantes; mas, mesmo às quatro da manhã e, supostamente,
contando eles já com a tal tradução tão difícil de assegurar, os embasbacados
realojados à força – alguns dos quais falavam inglês e poderiam, facilmente,
servir de intérpretes junto dos outros - não faziam a mais pequena ideia do
que se estava a passar.
Desconheciam, nomeadamente, a razão pela qual estavam os miseráveis tugúrios
que habitavam a ser invadidos e eles de lá removidos contra vontade, como se
se tratasse de coisas ou de animais.
Já para a GNR, o facto de haverem os trabalhadores sido desalojados a desoras
deveu-se a não especificadas “razões de segurança”. Para o Presidente
da Câmara Municipal de Odemira, terá sido, antes, por causa da necessidade de
articular, com representantes da massa insolvente – que, mais do que
provavelmente, dormiam a sono solto nessas horas impróprias -, tão precipitada
e achaboucada intervenção.
Ah, como seria bom para a tranquilidade de todos nós que certas pessoas não
contornassem tanto a verdade, e o Estado falasse todo a uma só voz!
Toda esta exploração humana se refere, ainda para mais, a uma zona onde a sempre atenta Secretária de Estado da Integração e das Migrações considera viver-se um notável exemplo de integração de migrantes que para cá vêm trabalhar*).
Assim sendo, quantas mais “desconhecidas” e exemplares Odemiras como
esta por esse Portugal iremos, ainda, encontrar?
- x -
A tarefa de qualquer Governo minimamente civilizado e cívico não se resume a cuidar dos interesses daqueles que pagam impostos: cabe-lhe, também - e principalmente - zelar por aqueles para quem, por nunca terem tido o direito de viver plenamente, o dia mais importante da vida é, porventura, o da morte, já que, da vida, pouco ou nada de bom terão para recordar.
Em equipa que ganha, não se mexe.
Mas esta não ganha, só (nos) empata, e bem mereceria uma boa mexida, para se
manter na competição. Perdão, na suposta governação.
Noutro tempo e lugar, a Ministra da Justiça mostrou-se notoriamente incapaz de entender que, perante a opinião pública, se não é corrupto ou aldrabão, é incompetente quem aparece como procurando, em benefício de mais uma daquelas tão cobiçadas candidaturas europeias, encobrir erros curriculares básicos*) que alguns não deixarão de aproveitar para denegrir a imagem de todo um país, muito especial se esta nebulosa sobre a área da Justiça pairar.
Calar demasiado, fugindo, simultaneamente, à questão formulada e às mais elementares normas da cortesia, também não será o mais adequado a uma Ministra da Cultura que, questionada sobre a pressão social e económica sentida pelos profissionais do setor que tutela, se limitaria a sugerir que se reunissem para uma bebida ao fim da tarde*); ou quando o apagado ministro da tutela e a exuberante deputada orientadora - ex-Ministra da Administração Interna nomeada pelo mesmo Partido Socialista - ficam, meses a fio, mudos e quedos perante uma alegada semelhança de quarenta e seis por cento, por plágio, na dissertação de mestrado apresentada numa universidade privada portuguesa por um recém-empossado magistrado do Supremo Tribunal de um país irmão*).
Tampouco ajudará, entre tantos outros episódios, que uma jovem governante diga, em determinado dia, que sobre determinado assunto nem valerá a pena falar para, apenas dois dias decorridos, se não coibir de, discursando perante outros jovens do mesmo partido que ela, adiantar pormenores sobre o mesmo determinado assunto do qual, na antevéspera, nem queria ouvir falar, talvez ignorando que, como terá dito um presbítero português do século XVII, “consiste a virtude do silêncio não em cessar o ofício de falar, mas em calar e falar a seu tempo”; ou que a mesma jovem venha, agora, anunciar, com horas de antecedência e o ar hesitante e comprometido de quem sabe estar a fazer asneira e à espera de que não lhe ralhem muito, medidas de utilidade duvidosa e de formulação confusa tendo como alvo setores vitais para a economia nacional, designadamente a restauração e a hotelaria*).
Além do Primeiro-Ministro e, quando muito, do Ministro dos Negócios Estrangeiros, quem tem autoridade, entre toda esta gente, como nunca tanta foi?
Sem autoridade, não há soberania. É como se o Governo não existisse: alguém faz coisas, muitas delas disparatadas, mas a ninguém pode ser associada uma governação efetiva. E os ministros e secretários de estado são tantos, tantos...
As contradições entre mensagens no Governo e na Administração são já encaradas com naturalidade por uma população convenientemente anestesiada pela desconexa ação de quem, excetuando os quase sobrepostos faits divers do originados no Ministro da Administração Interna, parece limitar a sua ação visível à gestão de uma pandemia que parecia ter entrado em velocidade de cruzeiro, mas que as comemorações da vitória do Sporting Club de Portugal na Primeira Liga de Futebol, viabilizadas pela Câmara Municipal de Lisboa*), vieram, agora nas camadas mais jovens, fazer acelerar.
Na primeira Primavera da COVID, era ouvi-los elogiar, uma vez mais, o tal
civismo do povo português que ainda bem pouca gente alguma vez terá tido o
privilégio de, ao menos, vislumbrar. Vê-se, agora, o impacto negativo da
comunicação hipócrita e inábil de quem os males estruturais da sociedade
portuguesa teve, então, medo de salientar e de, contra os seus perigos, a
restante população alertar.
Além da gestão da pandemia, nada mais parece interessar, atualmente, à política que não seja garantir que, desta vez, não se deixa de aproveitar até ao tutano os fundos europeus que aí estarão para chegar*), e até darão para fazer, daqui a cinco anos, uma festa de arromba para comemorar os cinquenta anos de uma democracia que ainda ninguém chegou a entender no que irá dar, enchendo, entretanto, os bolsos de um coordenador e de uma data de penduricalhos que, pelas benesses da romaria a que, provavelmente, uma escassa meia dúzia irá acorrer, nem se lembrarão de qualquer agradecimento expressar.
Perante o prolongado mutismo do Primeiro-Ministro sobre o assunto, a nomeação unilateral – sem consultar os outros partidos ou, até, o primeiro Presidente da República eleito em democracia - do principescamente remunerado comissário executivo das comemorações do quinquagésimo aniversário da revolução de 25 de Abril de 1974 chocou o País inteiro*). O País inteiro, menos o Partido Socialista, que parece julgar-se o dono das comemorações, tal como a Associação 25 de Abril se julgou dona do aniversário comemorado em 2021*).
Tiques ditatoriais de um Partido que se julga “o dono disto tudo”; e
com alguma razão, já que os nada parecem entender, mesmo em casa própria, de
política ou do ofício de governar.
“A anarquia está em toda a parte, quando a responsabilidade não está em parte alguma”*), e a verdade é que, nestes primeiros seis meses de 2021, enquanto o Primeiro-Ministro andou – e muito bem - a larear a Presidência Portuguesa por essa Europa fora, ficou o País à mercê de um punhado de desarticulados governantes, manifestamente incapazes de, sem o treinador, dar conta do recado.
Num tal cenário, não pode deixar de vir ao espírito o desnorte e o quase
silêncio da Administração da Benfica SAD quando há poucos dias, abruptamente
deixou se poder contar com os bons ofícios de um presidente com um estilo de
governação também monolítico e centralizador.
Aparentemente, ninguém capaz havia para deixar a governar cá na terrinha, onde
a irresponsabilidade reinava e os lobos iam tomando conta de um povoado
guardado por gente com ar inseguro, como a Ministra da Presidência nas suas
comunicações hesitantes, tíbias e desconexas, em que já ninguém entende quem
entender se não faz.
É verdade que, no que à popularidade diz respeito, o sorriso, ainda que tenso
e fechado, de um primeiro-ministro pode valer milhares de votos contra
desiludidos, perdidos, estafados e sisudos oponentes; tal como para assegurar
uma certa boa-vontade dos contribuintes pode servir, de vez em quando, o
permanente sorriso de um Ministro das Finanças, por muito malquista que a sua
atuação possa ser.
O que a maior parte dos políticos não entende, porém, é que o sorriso – mas um
sorriso franco, aberto – e um discurso coerente e firme são componentes
essenciais da comunicação.
Ora, o Primeiro Ministro já deu sinais de irascibilidade*) e, pelos vistos, aprecia, entre os seus amigos, o estilo, começando pelo eterno Ministro da Administração Interna que, teimosamente, o primeiro se obstina, não apenas em, contra tudo e contra todos, manter em funções, como até em elogiar na sua atuação.
Vale também, quanto a irascibilidade, a pena lembrar o Secretário de Estado Adjunto e da Energia que, referindo-se ao programa da RTP Sexta às Nove, disse, com todas as letras, que "estrume, só mesmo essa coisa asquerosa que quer ser considerada um programa de televisão"*).
Chegam as eleições autárquicas e, apesar de amigos, Primeiro-Ministro e Ministro da Administração Interna andam de candeias às avessas*), defendendo cada um deles o seu modelo de votação, enquanto o primeiro e o Ministro das Infraestruturas e da Habitação – como eles gostam de nomes compridos… - se envolvem numa sempre negada mas evidente peleja*), a que agora se junta, para ajudar à festa, a normalmente apagada chefe da bancada parlamentar do Partido Socialista.
A agir assim, não será de admirar que o cidadão comum acabe, progressivamente,
por comparar quem o governa a egocêntricos indivíduos sem rei nem roque, sem
rumo, incapazes de, primeiro, planear e, depois, resolver eficazmente os
imprevistos, mais não lhes restando do que o recurso a tiques ditatoriais de
quem parece sempre preferir entrar à força, através de requisições civis e
outras medidas extremas. Falam o menos possível, como quem tem culpas no
cartório ou não está inteiramente à vontade com a sua consciência – ou, mais
simplesmente, não faz a mínima ideia de como atuar -, em lugar de convidar,
não apenas à negociação, mas à própria colaboração de pessoas eventualmente
habilitadas a encontrar formas alternativas de resolução.
Também em nada beneficia a credibilidade do Primeiro-Ministro o silêncio – ou o falar tardio - em questões sensíveis, como a da passagem de informações aos russos pela Câmara Municipal de Lisboa. “Não devemos juntar à demência do real a tolice de uma explicação”*), mas há limites para aquilo que o CEO do País pode calar; e dentro desses limites não se inclui, seguramente, o silêncio quanto à detenção e às acusações que impendem sobre o recandidato à presidência da dita Nação Benfiquista a cuja comissão eleitoral de honra o dito CEO teve a imprudência de se associar*).
Depois, quando a falta de coordenação política permite que a autonomia ministerial vá longe demais, alguns ajustes têm de ser feitos, como a desautorização do Ministro da tutela no caso da nomeação do presidente do conselho de administração da TAP*), com todo o impacto mediático negativo que consigo acarretou.
Ora, voltando à mulher de César – o romano, não o açoriano -, a soberania,
para ser efetiva, depende muito da aparência de qualidade e de consistência no
seu exercício, que atitudes pouco ou nada edificantes por parte de quem tem
obrigação maior de saber estar não contribuem para dignificar. Isto acontece
especialmente quando lugares de topo de um ministério ou de uma câmara
municipal forem ocupados por militantes diletos do Secretário-Geral do Partido
que, esquecendo-se de que quem começa como figurante raramente chega a astro,
nem tentam disfarçar as suas candidaturas a uma mais ou menos rápida sucessão
de quem poderá ter-se esquecido de que, em política, é insensato dar força a
alguém sem, ao mesmo tempo, nos prepararmos para mais tarde poder
vencê-lo.
Será distanciamento, ou uma já muito expressiva debilidade política do Primeiro-Ministro no seio do próprio Partido Socialista? O recente incidente com a Concelhia do Porto dá que pensar…*) tal como não pode deixar de fazer pensar a indigitação, para presidir ao novíssimo Banco de Fomento, de um putativo conselheiro financeiro de um certo empresário recentemente detido para interrogatório e de cuja comissão de honra, na recandidatura à presidência da Nação Benfiquista, o mesmo Primeiro-Ministro fez parte *). E, tanto tempo depois, ainda falam da mulher de César, coitada...
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O Governo tem lepra.
Está a cair aos bocados, com ministros a precisar de ser removidos*), e outros a querer ir, recatadamente, tratar das suas vidinhas*), em lugar de, independentemente do eventual mérito de um ou outro, estar a deixar desgastar a imagem pela incontrolável e justificada irrisão que o ridículo de que se reveste, em Portugal, o exercício da soberania, suscita em milhões de desgovernados que por aqui andam a penar.
8. O Estado da Nação
O défice de soberania que inquina uma qualquer estrutura governativa e
parlamentar eivada de impreparados arrivistas - alguns dos quais pouco mais
terão feito na vida do que arrastar-se pelo pantanal dos órgãos partidários e
afins e, outros, lambuzar-se com as benesses e proventos proporcionados pelos
mesmos – decorre da perda de legitimidade para governar e legislar por parte
de quem, em lugar de refletir sobre as questões de fundo e planear
estrategicamente grandes opções de acordo com uma linha coerente e bem
definida, mais parece preocupar-se em cuidar de, sob o ponto de vista da
popularidade fácil, maximizar o aproveitamento mediático de emergências com as
quais, patentemente, está impreparado para lidar e satisfatoriamente
resolver.
Recorre-se, assim, à velha tática de pintar o quadro mais tenebroso em que os
governados sejam capazes de acreditar para, em seguida, aparecer como o
obreiro de… coisa nenhuma.
Num tal quadro, o facto de, no topo da pirâmide, poder estar alguém que pareça
carregar às costas um aeroporto móvel que ora vai ser construído aqui, como
sem dúvida alguma ali, como desta vez é que é mesmo acolá e, quando enervado
ou irritado, come metade das palavras que pensa, não agravará muito, talvez, o
enorme dano causado pelos seus seguidores mediante uma comunicação
institucional tão pobre como a que estas linhas procuraram caracterizar.
No mesmo cenário, não será de admirar que na população se instale a convicção
crescente de que a democracia poderá não passar de uma excelente ideia com um
péssimo resultado, pelo qual ninguém parece querer responsabilizar-se.
Não estamos em presença de um simples e pontual défice de autoridade, mas já de um inilidível défice de soberania, desde há meses agravado, e de que maneira, pelo défice de escrutínio democrático decorrente da redução drástica da quantidade de debates parlamentares, redução essa da responsabilidade, em conluio, do Partido Socialista e do Partido Social Democrata, contra toda a restante oposição e perante um primeiro veto presidencial, cuja verdadeira mensagem nem houve o cuidado de respeitar*).
Portugal continua, assim, em imparável deriva para o paraíso de oportunistas e
de incompetentes em que meia dúzia quer transformá-lo, como acontece em
qualquer pseudodemocracia que, a tais abusos e desmandos, verdadeira e eficaz
oposição não saiba concertar.
Já as sondagens – com cujos indicadores tantos se admiram – são bem fáceis de
explicar: mal ou bem, lá vão estes socialistas formados à pressa levando o
barco, ora a um porto, ora a outro, às apalpadelas, cedendo aqui, cedendo
acolá, sem rumo definido, enquanto as tripulações alternativas que governar se
propõem, além de claramente incapazes, nem têm, ao menos, quem as saiba
comandar.
Em quem mais iriam os Portugueses, num tal cenário, votar?
- x -
Quando, algures, aos primeiros raios de Sol do último Sábado de Fevereiro e fazendo vista grossa ao dever geral de confinamento, mais de quarenta por cento dos habitantes saem de casa para, pelo paredão da praia, ir caminhar; quando, por parte de quem supostamente governa, é flagrante a pusilanimidade perante a oligarquia do futebol, a ponto de, com os novos casos de COVID a triplicar, termos ficado sem as romarias dos Santos e as inerentes receitas comerciais, por causa das imprudentes e ilegais comemorações de uma final estrangeira da Champions e da muito tuga vitória do Sporting na Liga NOS*), algo está a funcionar mesmo muito mal, quer ao nível da soberania, quer ao da indispensável e subjacente necessidade de comunicar.
Como escreveu um autor irlandês da atualidade, num trecho bem ilustrativo da
comunicação política que por aí vai:
“Vivemos numa cultura de advocacia extrema, de confronto, de julgamento e de
veredicto.
A discussão cedeu lugar ao debate. Comunicar transformou-se numa competição
de vontades. O discurso público tornou-se obnóxio e insincero. Porquê?
Talvez seja porque, no fundo, debaixo de todo este palavreado,
tenhamos chegado a um ponto em que sabemos que sabemos... nada.
Mas ninguém está disposto a dizê-lo”.
Sic transit gloria mundi
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