7. Conclusão
1. Anátema
O espetro de pandemias, guerras e outras calamidades paira,
permanentemente, sobre nós. No entanto, impotentes que somos para contra
elas eficazmente nos precavermos, preferimos, em tempos de relativa paz -
e talvez, sabiamente... -, olhar para o lado e continuar a deambular,
tranquilamente por aí, optando por nos preocuparmos apenas quando as
coisas acontecem e já pouco ou nada podemos fazer para minimizar o
inevitável impacto negativo sobre as nossas vidas e sobre as daqueles com
quem interagimos.
A previsão de tão infaustas ocorrências não constitui, porém, o propósito
principal das visitas com que alguns insistem em continuar a honrar
videntes, astrólogos, quiromantes e outros que, como eles, se dizem
adivinhadores do Futuro - acreditem eles próprios nisso ou não.
Lá bem no fundo de quem a tais consultas recorre existe uma mais ou
menos secreta esperança de voltar com boas notícias, acerca da família,
dos amigos, dos colegas, mas, sobretudo, sobre si próprio: se vai morrer
já ou não, como vai, até lá, andar de saúde, e se vai pingar ou não o rico
dinheirinho que tanta falta lhe faz. Existe, ainda, a crença de quem
entende que, por conhecer, de antemão, os infortúnios que lhe irão cair em
cima, melhor se poderá preparar para os suportar.
Este hábito, bem típico e sintomático da insegurança endémica que grassa
pelo território português, de ir à bruxa, de recorrer a
adivinhos como forma de reduzir a ansiedade gerada pelo medo do
desconhecido que aí vem ou está, movimenta, na economia paralela,
verdadeiras fortunas despendidas no pagamento de serviços que, na maior
parte dos casos, para nada servem. As mais das vezes consistem, de facto,
em meros e fantasiosos palpites ou intuições de profetas, de feiticeiros e
de outros iluminados, palpites esses sem qualquer substrato lógico ou
suporte científico,
devendo-se a eficácia média das ditas previsões a uma astuta e, de
alguma forma, experiente interpretação da comunicação não-verbal e da
história de vida posta a nu pelos consulentes, cuja conversa é,
magistralmente, manipulada para o assegurar.
Comunicação não-verbal e história de vida constituem, de facto, excelentes
bases para a formulação de hipóteses de evolução do destino a curto
prazo, o único em que, afinal, importa acertar, tendo em conta que,
no médio e no longo, já a lembrança do que foi dito pelo adivinho há muito
estará esquecido - ou que, pelo menos, das palavras exatas já o
cliente, entretanto, se esqueceu.
Seja como for, na visão fortemente subjetiva do incauto, o adivinho
raramente
falha, ainda que os factos futuros contradigam a previsão. É que,
sendo o bruxo a última esperança dos desesperados, a simples ideia do
falhanço corresponde à extinção da última centelha de algo que os faça
continuar a acreditar, a viver.
Destas artes mais ou menos trapaceiras, mais ou menos folclóricas,
escarnece, compreensivelmente, quem se acha mais esclarecido.
Escarnece ou ignora, despreza, banindo-as sumariamente do discurso e da
cogitação. Sujeita-se, assim, a que, por um lado, os que insistem na
possibilidade de prever o futuro lhe apontem o mesmo vício de falta de
fundamentação que inquina a mera adivinhação oportunista; por outro, a
que, liminar e impensadamente, esteja a abdicar do que de válido que
nestas coisas ditas esotéricas possa existir.
A verdade é que, seja por nada de verdadeiramente substancial a crescente
panóplia de áreas e de técnicas de adivinhação em si
ter, seja pela impossibilidade de, verdadeiramente, se
conhecer algo que, desgarrado da ciência, nenhuma teoria objetiva e
validada alguma vez poderá produzir, a crendice de uns grassa incólume a
par da ganância de outros cujas fortunas continuam a engordar.
Vivemos, entretanto, à sombra do implacável e cego anátema sobre o tema
lançando por uma sociedade que se tem por esclarecida e evoluída, mas
que, paradoxalmente, continua alérgica a qualquer afloramento de discussão
séria sobre uma matéria que considera indigna de ser levada em conta por
gente que se tem por sábia, sensata, educada; e, sobretudo, politicamente
correta.
2.
O Joio e o Trigo*)
A despeito das considerações que antecedem, nada nos impede
de, com a objetividade possível, aqui refletir um pouco sobre o tema.
Comecemos, para tal, por separar o que não passa, claramente, de
mera fantasia, daquilo que poderá, apesar de tudo, relacionar-se
com factores naturais suscetíveis de, em maior ou menor grau,
influenciar os indivíduos num Futuro relativamente próximo. Isto,
admitindo que, se sobre os seus comportamentos operarem de forma
regular e consistente tais factores, a observação e subsequente análise
dos comportamentos por eles influenciados poderão permitir, com um certo
grau de confiança, alguma coisa prever.
Ao primeiro conjunto - o da mera crendice, da mera fantasia - pertencem,
necessariamente, coisas tão aleatórias e ocas como a predição de
acontecimentos com base na disposição de folhas de chá ou de borras de
café coladas à chávena, no estado de entranhas de animais mortos para o
efeito, ou, ainda, a
técnicas mais elaboradas, como o recurso à cartomancia,
ou mais folclóricas, como a utilização de uma bola de cristal.
Tão fiáveis e exatos como o são os vaticínios para ganhar a lotaria, todos
estes processos não passam, evidentemente, da montra utilizada pelo dito
vidente, que para elas distrai a atenção dos incautos que o procuram,
enquanto aproveita a conversa para os avaliar segundo o que de si e dos
outros vão contando e o modo como o fazem, assim fornecendo dados
preciosos a uma previsão para a qual, como já se disse, são
essenciais a história do cliente e a leitura da componente
não-verbal da comunicação.
Não é fácil errar quando se diz, a quem é pobre, que em breve acabará por
receber algum dinheiro sem referir quanto, ou uma fortuna, sem
referir quando; ou que - se a conversa o indiciar... -, mesmo
continuando pobre, será feliz porque as suas escassas poupanças saberá
administrar. Ou, a quem tem filhos, que eles lhe irão dar alegrias e
problemas; ou que irá ter alguma doença quem todos os dias respira este
infetado ar. Ou que a alguém lançou mau olhado uma vizinha com a qual
jamais se conseguiu relacionar.
Como estes, cada vez mais meios de absolutamente
enganosa adivinhação existem, já que a criatividade de
embusteiros e oportunistas que enriquecem à custa da ignorância e da
credulidade alheias não pára de inventar.
Poderia, é verdade, no limite do absurdo estudar-se e medir-se relações de
causa-efeito com base em informação estatística. Afigura-se, no entanto,
que a recolha da amostra sempre resultaria do processamento de dados
fornecidos por inquiridos tão incapazes de os facultar com um mínimo de
objetividade como o é, seguramente, quem em tais patetices insiste em
acreditar.
Já no segundo conjunto, o que aqui interessa, serão de incluir processos
que, sem prejuízo de dificilmente serem suscetíveis de fornecer um retorno
válido quanto à confirmação, ou não, dos prognósticos do adivinho, acabam
por se apresentar como menos aleatórios, uma vez que partem da observação
de factos concretos relacionados, quer com sinais do corpo humano, quer
com fenómenos naturais confirmados por evidência científica.
Tal é o caso, quanto aos primeiros, da quiromancia e, quanto aos segundos,
da astrologia: a primeira, baseada no indesmentível facto de, por razões
que inteiramente desconhecemos, termos linhas na palma da mão; a segunda,
pela cientificamente comprovada existência também dos fenómenos
astronómicos a cuja observação a astrologia se tem vindo a dedicar.
3. A Importância dos Astros sobre a Vida
Não obstante a proverbial tendência para nos desculparmos, sacudindo para
a envolvente natural e humana as causas dos erros que cometemos e a
responsabilidade pelo mal que nos acontece, há que reconhecer que, nem a
Natureza, nem os outros humanos são, na maior parte dos casos, os
principais culpados do nosso por vezes lastimável e danoso
desempenho.
Muito mais do que uma ou os outros, somos nós mesmos, esta nossa
personalidade edificada sobre inúmeros pilares de entre os quais se
destacam a genética e a educação, quem origina, quem provoca os
acontecimentos que protagonizamos ou em que participamos e,
inevitavelmente, as inerentes consequências. Somos, pois, os causadores da
maior parte do mal ou do bem que nos acontece, também o sendo os outros no
respeito que lhes diz.
Assim sendo - ou seja, se, não descurando a vital importância dos impactos
naturais, a nossa vida é, maioritariamente, influenciada pelo desempenho
de outros animais, humanos ou não -, como poderá alguém não considerar a
simples possibilidade de prever comportamentos alheios algo de
sumamente atraente, interessante, relevante? Importante, até?
Prever, sim, mas apenas se for possível fazê-lo com fundamentos sólidos,
preferencialmente científicos.
Sem com isto se pretender, naturalmente, significar que a Ciência permite
predizer com exatidão seja o que for, almeje-se, pelo menos, uma antevisão
com a probabilidade possível, sempre preferível ao pouco sério recurso à
leitura das folhas de chá e a outras tontices que, a velocidades
astronómicas, se vão disseminando aqui e ali.
Como vimos, quer a quiromancia, quer a astrologia, se apresentam como
suscetíveis de tratamento estatístico, mediante a observação da ocorrência
de factos relativamente aos quais poderá existir correlação válida com
aspetos da personalidade; e, por via dela, do comportamento de cada ser
humano enquanto influenciador do bem-estar ou do mal-estar de um mais ou
menos significativo conjunto de terceiros.
A tal correlação existir, estaríamos, na verdade, perante uma provável
ação direta - mas não fatal ou de efeitos inevitáveis - da movimentação e
consequente disposição dos corpos celestes sobre o comportamento dos
humanos; o que, à partida, não se mostra estranho ou, muito menos, choca,
se nos lembrarmos da relação bem real entre as fases da Lua e as marés, ou
da forma como as estações do ano operam, por exemplo, no desenvolvimento
das plantas e na vida sexual das espécies animais.
Duvidar destas relações conhecidas entre os astros e o vai-vem dos mares
ou o quotidiano das espécies seria negar o conhecimento obtido de dados
empíricos conhecidos desde tempos imemoriais, e de informação entretanto
validada deles extraída.
De outra forma dito, negar o papel, firmemente estabelecido, que os astros
desempenham sobre alguns aspetos da vida terrena seria lançar no caos toda
a teoria científica.
Por outro lado, admitir esse papel, reconhecê-lo, para alguns aspetos da vida,
impede-nos de, objetiva e fundamentadamente, simplesmente o negar
cegamente no que se refere a outros.
Resta, pois, dizer que, embora não disponhamos de informação credível que
permita confirmar tal hipótese, a possibilidade e, até, a probabilidade de
os astros influenciarem múltiplos aspetos do comportamento humano é bem
real e, como tal, não deve ser descurada, menosprezada e, muito menos,
desprezada, como alguns tendem a fazer.
4. Os Outros e Eu
Desta nebulosa de dúvida, uma quase certeza emerge, porém: a de que, a
existir influência cósmica sobre alguma vertente do Futuro, apenas se
afigura possível que ela incida, seja, diretamente, sobre o comportamento
dos indivíduos, seja sobre eventos da Natureza determinantes do mesmo,
como acontece, no primeiro caso, com as ações e reações de outros animais
e, no segundo, com as estações do ano. O que, por absoluta inexistência de
substrato lógico ou científico, não pode, de modo algum, se tido por
credível, é que, arrimando-se no que quer que seja ou se esforce por
inventar, alguém venha, algum dia, a prever os números que irão sair no
loto do clube da aldeia, no Euromilhões ou na lotaria das variáveis que,
sob tantos aspetos, influenciam a vida de cada um de nós.
Continuará, não obstante, ao alcance do vidente prever, com razoável
probabilidade, que alguém irá receber uma herança, desde que, na conversa
com o cliente, se inteire da existência de um abastado, idoso e
doente ascendente, e a integre, depois, numa combinação astral ou
imaginariamente maléfica para a saúde do dito infeliz.
Estaremos, no entanto, neste caso em presença,
não de uma previsão específica de que se irão encher de ouro os bolsos
do descendente, mas de uma previsão de que a vida do autor da herança em
breve irá terminar, assim não se relacionando o recebimento da herança com uma previsão
diretamente feita ao Futuro do cliente do adivinho - vinda do nada ou de
inspiração cósmica ou divina -, mas feita à provável evolução do estado do
enfermo, que qualquer um de bom senso poderia fazer.
Se determinada combinação astral for propícia termos hoje um dia chuvoso e
tristonho, mais provável se torna que tomemos decisões menos empenhadas,
menos lúcidas, logo, menos eficazes, e que, como consequência delas, a
nossa vida se complique. Num dia tépido e ensolarado, pelo contrário, tudo
parece bem menos complicado, e a vida corre melhor. Mas, isto nada tem a
ver com combinações astrais, antes com o privilégio de poder contar com um
dia de Sol.
Da mesma forma, se outra combinação astral favorecer a vida e a disposição
da pessoa a quem mais dedicamos a nossa atenção e carinho, bastará ao
adivinho conhecer o respetivo signo para nos dar a boa nova de que seremos
"felizes no amor":
não porque o nosso signo o diga, mas pelo que, relativamente a outros
aspetos da vida, disser o signo da pessoa amada
- caso isto dos signos nos afete de alguma maneira.
O que dizer, então, do que nos espera sempre que, supostamente, os astros
não forem propícios à disposição de um funcionário de cujo poder
discricionário depende a emissão de licença ou autorização do Estado para
qualquer ação que queiramos empreender ou obra que pretendamos realizar?
Ou de um juiz que os nossos atos ou interesses irá julgar?
Todas estas e outras decisões se fundamentam, idealmente, na estrita
aplicação do direito; mas, sendo materialmente impossível que a lei
preveja todas as combinações e variantes possíveis para idênticas
situações, sempre haverá o decisor de recorrer à hermenêutica e, segundo o
seu melhor critério - inevitavelmente influenciável pela disposição no
momento... -, colmatar lacunas e os preceitos interpretar.
Eis, pois, a mais importante distinção a reter:
não será a influência direta dos astros sobre o próprio que, algum dia,
permitirá, a ele ou a outrem, prever o próprio Futuro, mas, quando
muito, a influência cósmica sobre a Natureza e sobre a vida dos
terceiros que, por sua vez, irão operar em aspetos importantes do que
mais proximamente lhe irá acontecer.
5. Da Viabilidade Estatística
Pelo menos dois obstáculos de monta se opõem a um tratamento estatístico
minimamente fiável da astrologia: por um lado a impossibilidade prática de
classificar, de forma significativa e abrangente, todas as vertentes da
vivência humana; por outro, o facto de não haver como, objetivamente,
validar os dados recolhidos e a informação colhida do respetivo
processamento.
A qualidade desta validação não passaria do nível básico atribuível
à de artigos científicos que por aí andam acerca da personalidade de cada
um, baseando-se em traços fisionómicos, estruturas corporais ou aspetos
comportamentais. Buscam os estudos que redundam em tais artigos
extrair conclusões supostamente firmes de respostas naturalmente
subjetivas fornecidas por familiares, amigos e conhecidos do objeto do
inquérito; e, em certos casos, até de respostas dadas pelo próprio. Pergunta-se a alguém que tem o nariz com este ou aquele formato "Considera-se uma pessoa honesta?", ele responde "Sim" - todos responderão "Sim"... -, e
conclui-se que quem tem um nariz de assim ou assado é honesto; e, como
ninguém irá admitir que não é honesto, o mesmo acontecendo,
necessariamente, com quem tiver qualquer outro tipo de nariz.
No campo da astrologia, as questões seriam, talvez, do género "Nestes últimos dias, tem tido sorte aos amores?" e, se a maioria dos nascidos sob o signo do Carneiro responder
"Não", concluir-se-á que, estando a Lua e Vénus em conjugação com
isto ou daquilo, os ditos indivíduos terão propensão para ser infelizes no
amor... fazendo tábua rasa de coisas tão simples como factos de natureza
política, social, ou económica que poderão estar a afetar toda a gente,
independentemente do signo em que tiver nascido. Já para não falar,
obviamente, dos diferentes e eminentemente subjetivos graus de exigência
quanto à felicidade de cada um, da própria noção de felicidade e de
um não mais acabar de subjetividades que inviabilizariam qualquer
validação científica, por muito rigorosa que a seleção de inquéritos
pudesse ser.
A despeito de alguma correlação efetiva que, de facto, possa existir entre
os astros e algum aspeto da nossa vida, o facto de ela jamais poder vir a
ser conhecida com uma, ainda que mínima, base científica desaconselha que
continuemos a falar de astrologia assentes, unicamente, na intuição
ou na observação de amostras ínfimas extraídas meramente do conhecimento
direto e da experiência de vida de adivinhos de agora ou de tempos há
muito idos.
Neste contexto de validação impossível,
que razoável contrapartida terá o serviço do astrólogo a oferecer ao
expressivo desembolso económico de quem o vai procurar?
6. A Mão de Deus?
Independentemente da possibilidade ou impossibilidade de validação, o
exercício da influência dos astros, direta ou indiretamente, sobre os
humanos suscitará, inevitavelmente, questões quanto à forma como a Razão
Criadora de tudo e de todos, gere o Universo. Isto, claro está, partindo
do princípio de que esse Criador ainda existe; e de que, a existir,
continua a interferir na evolução da Sua obra, designadamente nos destinos
da Humanidade.
De facto, sejam quais forem os objetivos na génese do Mundo - seja ele o
que for... -, até que ponto fará algum sentido que seja a nossa vida
gerida ou influenciada por signos, em duodécimos, em doze fatias de
dimensão presumivelmente idêntica, correspondentes aos nascidos em cada um
dos signos do Zodíaco? Ou não passarão os signos de uma fantasia e, no que
diz respeito ao que possa ser determinado pelo Cosmos, haverá outras
formas de classificar mais consentâneas com a realidade?
Certo é que, enquanto a quiromancia, por exemplo, se foca, inteiramente,
no caso específico do indivíduo que detém esta ou aquela combinação -
única - de linhas nas palmas das mãos, enquanto a fisiognomonia se
centra no conjunto - único - de traços fisionómicos de um indivíduo
-, a astrologia parte do pressuposto do exercício da ação benéfica ou
maléfica de corpos celestes sobre conjuntos imensos de pessoas formados
por um duodécimo da Humanidade, se não determinando o respetivo destino
em lotes, pelo menos assim o tornando mais provável em detrimento
da individualidade, da originalidade e, consequentemente, da riqueza da
evolução das espécies.
A esta afirmação opõem-se os que dizem que a revelação do desconhecido
relativo a determinado indivíduo apenas é possível mediante recurso a um
mapa astral, o que gera, para o respetivo autor, chorudos proventos e um
acréscimo de credibilidade para aquilo que afirma, já que, além da
proverbial ingenuidade cultivada na crendice popular, os mais simples
tendem a acreditar e a confiar em tudo aquilo que vê como complicado e,
sobretudo... caro, que só alguns podem pagar.
Como pode, porém, dar-se alguma credibilidade a mapas astrais baseados,
simplesmente, no posicionamento relativo de uma ínfima quantidade de
corpos celestes no momento do nascimento de um indivíduo, ignorando,
completamente, variáveis tão importantes como a genética, a geografia e a
inserção social?
Sempre poderá, é verdade, argumentar-se que, tal como cada um de nós foi
plantado em diferentes circunstâncias de tempo, de meio e de
lugar - cabendo-lhe, independentemente delas e em benefício dos
semelhantes, desenvolver as próprias qualidades e combater os inevitáveis
defeitos -, também o facto de a data do nascimento se situar neste ou
naquele signo implicará uma disparidade dos desafios que, por influência
astral, cada qual terá de enfrentar.
No entanto, a assim ser, a questão essencial do propósito da Criação
apenas se tornará mais confusa, tudo se complicando à medida que novos
parâmetros e critérios cientistas e adivinhos forem sendo capazes de
imaginar; e, seja qual for o vaticínio resultante da aplicação dessa
complicada teia de influências,
sempre a individualidade acabará prejudicada, uma vez que, por pequenas
que se tornem as fatias da população abrangida, sempre haverá mais do
que uma nascida à mesma hora, do mesmo dia do mesmo ano, e no mesmo
lugar.
7. Conclusão
Ao contemplar a imensidão do Cosmos face à ridícula pequenez do planeta
que habitamos, não poderemos deixar de nos questionar até que ponto será
legítimo e aceitável enunciar a mera hipótese de tudo aquilo nada mais
servir do que o exercício de manipulação ou, pelo menos, de influência por
parte de quem tudo possa ter criado, por qualquer razão que nos não é dado
descortinar.
Assim não sendo, como explicar a existência de um Espaço virtualmente
infinito onde, além da que encontramos na Terra, de nenhuma outra vida
inteligente sabermos ainda, a não ser as que povoam o nosso imaginário e
algumas obras de ficção?
Como poderemos conhecer a razão de ser do Universo, se desconhecemos até a
da nossa Criação?
Validar cientificamente uma teoria astrológica, ou similar poderia ser um
importante contributo para uma melhor compreensão da vida e da função que
nela se espera que desempenhemos. Parecem, no entanto, inultrapassáveis
até os mais próximos e elementares obstáculos a tal validação.
Resta assim, aos mais crédulos, na sua desenfreada busca da felicidade que
não sabem o que é continuar a ir à bruxa, e a esbanjar rios de dinheiro a
procurar debelar a angústia e os mais ou menos dramáticos estados de
aflição...
(continua aqui)