quarta-feira, 3 de novembro de 2021


O Caos Seria a Alternativa...

Não há como não nos sensibilizarmos perante a angústia de pais que, apenas por quererem educar os seus filhos de acordo com as suas convicções, tenham acabado por provocar a reprovação dos mesmos na sua vida académica, como aconteceu no caso bem conhecido daquela família de Vila Nova de Famalicão.*) Nem perante os anos de prejuízo que a sua vontade de combater ideologias absolutamente espúrias à mais elementar ideia de democracia aos jovens estudantes não deixarão de provocar.

No entanto, mesmo sem conhecer o processo, não me ocorre como poderia um tribunal vinculado a decidir no estrito cumprimento da lei, deixar de indeferir o pedido de providência cautelar, da mesma forma que não vejo como poderá outro tribunal deixar de prolatar uma decisão definitiva em desfavor da pretensão da família, pretensão essa moralmente legítima mas legalmente inadmissível.

Como alguém, que anteriormente citei, recentemente disse, "um juiz, quando vesta a toga, tem de despir as suas convicções".*)

Não é, pois, o sistema judiciário que deve ser responsabilizado, mas sim um Governo que, focado em garantir a sua permanência no poder durante esta meia dúzia de anos que agora finda, sempre tendeu a ceder, com a maior das facilidades, a sucessivas exigências de uma extrema-esquerda radical, também ela preocupada com a sobrevivência política de ideias completamente desfasadas da realidade e da prossecução do bem-estar e da estabilidade das populações.

Não obstante insistir em declarar-se democrática, essa esquerda radical continua a agir sem qualquer contemplação pela vontade e pelos valores defendidos pela maioria, a procurar impor ideologias e originalidades sem qualquer justificação, substância ou conteúdo, à partida condenadas a permanecer tanto tempo na memória dos vindouros quanto qualquer irrelevante banda de garagem alguma vez permaneceu no top de vendas apenas porque resolveu que, pelo simples facto de existir, tanto mérito merecia quanto os The Beatles, os Bee Gees ou outros de igual valor.

Por muito que nos revolte a situação daí resultante, podemos, naturalmente, insurgir-nos e indignar-nos quando confrontados com ela, mas haverá que considerar que sempre será preferível a um Estado levado à anarquia pela eventual capacidade de qualquer cidadão discordante das opções políticas de quem governa poder, por um simples ato de vontade, ignorá-las e agir como muito bem entendesse, lançando no caos social e económico o que, a breve trecho, deixaria de ser um país, para se tornar, ainda mais do que agora, numa monstruosa amálgama de interesses.

Em democracia, a vontade popular manifesta-se através de canais próprios e há muito consagrados, designadamente por via do voto sempre que são convocadas eleições.


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- A injusta e evitável desproporcionalidade na fixação do valor de coimas e multas' Leia AQUI
- Pensamento sobre a imparcialidade dos tribunais Leia AQUI



Erle Stanley Gardner


Stanley Gardner
"Não é preciso ver um homem, olhar o seu rosto, apertar-lhe a mão e ouvi-lo falar, para o conhecer. Basta observar como se comporta. Podemos vê-lo através dos olhos dos outros"

"You don’t need to see a man, look in his face, shake his hand, and hear him talk, in order to know him. You can watch the things he does. You can see him through the eyes of others"

Erle Stanley Gardner*)
The Case of the Silent Partner


Não sei porquê, ao ler isto, vieram-me à memória aquelas carantonhas inenarráveis que, durante semanas a fio, diretamente - e não através dos olhos dos outros - sempre temos de contemplar em milhares de cartazes da campanha para as eleições autárquicas.

Mas não são, apenas, feios: vê-se logo, naqueles olhares fixos, vazios, o real grau de capacidade e de competência para gerir nem que fosse a mais insignificante autarquia, atributos que, aliás, os debates entre candidatos tragicamente confirmam.

Há também aqueles com o tradicional ar de chicos espertos, de candidatos à perda prematura do mandato, que só não é mais rápida porque, no nosso Torrão Natal, a justiça é lenta como a alguns convém, e o sistema judiciário vive à míngua de esmolas que lhe são lançadas pelos sucessivos orçamentos do Estado.

O arquivo Ephemera*) conserva um vasto acervo, cuja visita recomendo, de imagens de cartazes ilustrativos das mais recentes campanhas eleitorais autárquicas. Diz-se que, quem vê caras, não vê corações, mas até uma vista de olhos superficial por aquela galeria nos fará entender a profundidade do pensamento de Stanley Gardner sobre o assunto...

Não se assustem!...

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Por outro lado, o que vemos através dos olhos dos outros, designadamente dos da comunicação social, diz-nos muto, sobretudo acerca do caráter, da personalidade, da eventual bondade cívica das figuras públicas de políticos, de desportistas, de comunicadores, de toda essa gente que não conhecemos pessoalmente mas, mesmo assim, muitos de nós idolatram, talvez não tanto por aquilo que parecem ser, mas pelo bem que esperamos que nos possam trazer ou fazer.

Já parece preocupar-nos cada vez menos o que outros leiam de nós através daquilo de que, pelo nosso comportamento, se possam aperceber, preferindo, quantas vezes, mostrar o que comprámos, o que temos e que, na maior parte dos casos, connosco pouco ou nada tem a ver.

Vivemos, em suma, numa época de primado da imagem pessoal e institucional, quase sempre manipulada, logo, desprovida de significação válida, resultando num mero e desprezível engodo, num logro onde já só cai mesmo quem preferir fazer de conta que não está a entender.

O que pretendemos, afinal: ser, ou... apenas parecer?

terça-feira, 2 de novembro de 2021


As Casas Assombradas de LIsboa

Estarão assombrados? Serão malditos?

O que aconteceu para por lá ficarem tanto tempo, naquele estado lastimoso, estes mamarrachos que ainda assombram a Avenida Fontes Pereira de Melo, em Lisboa?

As Coisas Deixam Marcas
Só recentemente, em vésperas de eleições autárquicas e na última reunião do mandato, a Câmara Municipal lá terá aprovado, finalmente, um projeto*) para arrasar com o miolo de tudo aquilo, mantendo, no entanto, as fachadas, com aquelas caixas de vidro por trás, que ficam tão bem, não ficam? Sim, porque não se espere que os prédios fiquem só com aqueles andares...

Irão conservar os graffiti?

Já se sabe que o anterior Presidente da Câmara - futuro ministro e, se tudo lhe correr bem apesar de tudo, talvez, um dia, primus inter pares - primava pela irascibilidade, pela antipatia, pela arrogância e, já agora, pela incompetência, também. Não é, pois, de admirar que as coisas se arrastassem anos a fio no seu mandato, embora se trate de uma herança de outros que por lá passaram antes dele.

As Três Casas Assombradas da Fontes Pereira de Melo
Será que, com todos os seus bons propósitos, o novo Presidente terá garra e vontade para fazer andar o projeto? Será que não valerá a pena, por outro lado, adiar um pouco as coisas a fim de pôr a descoberto uma ou outra negociata latente que possa interessar a quem se dedica ao estudo dessas coisas de colarinho branco de que tanto se fala?

Não nos esqueçamos de quem por lá andou a mandar no urbanismo até há um par de anos. E estas coisas deixam marcas.

Se deixam...




segunda-feira, 1 de novembro de 2021


Almeirim - Estação de Correios

 

Estação de Correios de Almeirim

Tal como anunciei na Apresentação*), irei afixar aqui, preferencialmente às Segundas-feiras e alternando, nesse dia, com as "Obras de Arte", postais antigos de um lote que encontrei num daqueles cantos da casa onde, volta e meia, descobrimos coisas que nem imaginávamos que andassem por lá.

Acrescentarei, em alguns casos, um ou outro comentário ou ligação para página alusiva na Internet, sempre que entenda que tal se justificará.

Embora não sendo seguido qualquer critério na apresentação dos postais, começo pelo primeiro da ordem alfabética, Almeirim, cuja estação dos correios ainda hoje funciona no mesmo local de quando foi obtida esta imagem, sabe-se lá há quantos anos já...

sábado, 30 de outubro de 2021


Um Momento verdadeiramente Singular

"Nem tudo o que acontece é notícia, nem pode, objetiva e eticamente,
ser transformado em notícia simplesmente porque… não há notícias"


Chumbo do Orçamento do Estado para 2022
Há coisas de que nem sei como falar...

Não, não é do chumbo do orçamento, nem das eleições que talvez aí venham, nem da inanidade do resultado previsível das mesmas - a menos que uma coisinha má dê aos eleitores portugueses, a ponto de votarem pela destruição do pouco que ainda nos resta de valores, de princípios, enfim, de algum resquício de moralidade que um governo filisteu de uma sociedade maioritariamente de filisteus possa ter deixado, e ao qual, quando tudo der para o torto, nos possamos, ainda, agarrar.

Não. O que aqui me traz é um facto insólito, um “momento único“, “absolutamente fora do comum”, como o classificou o pivot do Jornal das 8 da TVI24 da passada Quarta-feira, dia em que a proposta de Orçamento do Estado chumbou logo na votação na generalidade.

Honra seja feita à comunicação social que temos, se não fosse seu o olhar atento e arguto, teria este acontecimento de extrema importância política e social corrido sério risco de ter passado despercebido e de, muito provavelmente, acabar por nunca chegar ao conhecimento dos eleitores lusitanos.

Tratou-se, no entanto, de um evento da maior relevância para a democracia, tal como todas as anteriores ocorrências do mesmo fenómeno as quais, sabe-se lá porquê, a nenhum órgão da comunicação social ocorreu, no entanto, relatar: o Presidente da República foi pagar umas contas no Multibanco!

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É inaudito!

Acabava a proposta de orçamento de ser rasgada no Parlamento; acabava o País de ficar condenado à mais abjeta miséria, a viver, sabe-se lá por quanto tempo, dos misérrimos duodécimos do generoso orçamento do ano anterior; acabava de ser seriamente posta em causa a estabilidade do pantanal económico e social em que esbracejamos, e o Presidente da República Portuguesa aproveita para, enquanto não chegavam os convidados para jantar, sair do Palácio de Belém pela porta lateral para ir cumprir as suas obrigações para com um ou outro fornecedor, e voltar a entrar, desta vez pela porta principal (isto das portas deve ter um qualquer significado oculto, para os repórteres, que ainda não consegui discernir...).

Como é possível? "Que momento absolutamente fora do comum!", como não conteve o extasiado apresentador - como chamam, agora, aos locutores.

Imprevisto Ocorrido no Parlamento
Perante tamanho e tão dramático imprevisto ocorrido, nesse mesmo dia no Parlamento, como pode não ter o Presidente permanecido triste, acabrunhado, num canto escuro da residência oficial, a roer as unhas enquanto consumia as meninges a pensar no que fazer, à procura de uma solução para tão inesperado desenlace?

Será que teve, até, o desplante de conseguir tomar um café, comer alguma coisa, para se recompor do choque que não teria podido adivinhar? Terá, mesmo, continuado a respirar, enquanto todos os outros lusitanos sufocavam na imensidão da suas preciosas ansiedades?

Como tolerar tamanho desplante, que arrepiou todos os repórteres – perdão, jornalistas -,   numa altura em que as gráficas já faziam contas às existências de papel para os cartazes; em que as televisões já tinham nas telas dos computadores as reservas de publicidade para as dezenas de debates e de comentários para as semanas seguintes; em que as infalíveis empresas de sondagens esfregavam as mãos de contentamento; em que aqueles tipos que há algum tempo esperavam por um lugarzinho para entrar fosse onde fosse se precipitavam a ligar para o telefone do conhecimento político lá da terra a saber se ainda dava tempo; em que até as piruetas do jogador sete com a bola e as brejeirices da apresentadora desbocada foram esquecidas pelos habituais basbaques; em que muitos que já se julgavam bafejados tremiam de medo de que a mama do Plano de Recuperação e Resiliência acabasse por tardar, ainda mais, a começar pingar e a permitir  começar a pagar as prestações atrasadas.

No meio desta confusão toda, o que ousa fazer o mais alto magistrado da Nação? Vai, como tanta gente tantas outras vezes fez, ao Multibanco tratar de assuntos pessoais, gerando uma enorme onda de indignação!

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Mas não tem esta gente mais que fazer?

Mandaram-nos para ali, ao frio, esperar que os dois convidados para jantar com o Presidente da República chegassem, apenas para lhes filmar os automóveis e os ouvir, às perguntas, dizer nada, porque nada ainda haveria, naturalmente, para dizer.

Como, entretanto, tinham de arranjar alguma coisa com que ocupar as antenas, vá de meter o nariz onde não eram chamados, alardeando um assunto sem interesse algum e cobrindo de ridículo a estação televisiva cujos responsáveis deram cobertura a tamanho dislate, a ponto de o destacarem como primeira notícia desenvolvida no bloco noticioso do horário nobre, para gáudio dos mais elementares palermas, que vibram com estas coisas chocantes, como, para aumentar a excitação, gostam de lhes chamar.

Herman José - Miguel Guilherme
Não pude deixar de me lembrar de um trecho, já não sei de que programa de Herman José, em que Miguel Guilherme, no papel de apresentador de um qualquer telejornal, baixava as calças para exibir as cuecas do apresentador, último recurso de alguém a quem tinha sido ordenado que aguentasse os espetadores a olhar mais uns minutos para a televisão.

Ingénuos!

Acaso pensam que, antes de descer à rua, um tão mediático Presidente não teria perfeitamente visto que estavam todos especados à porta, ávidos do que quer que fosse que lhes atirasse da janela? Acaso duvidam de que foi por isso mesmo que escolheu aquele momento para ir liquidar as suas continhas lá abaixo?

Acham, mesmo, que ia perder uma oportunidade de, pedagogicamente, alertar para o ridículo daquilo que bem sabia que o seu passeio noturno não deixaria de provocar? Que não sabia estar a criar uma manobra de diversão para arrefecer um pouco o clima de excitação à volta do chumbo do orçamento? Para, habilmente, desdramatizar o chumbo?

Os experientes e muito competentes profissionais da informação caíram que nem uns patos, proporcionando um espetáculo triste de falta de discernimento e de capacidade de seleção daquilo de que vale, verdadeiramente, a pena dar conta, daquilo que é notícia. Porque nem tudo o que acontece é notícia, nem pode, objetiva e eticamente, ser transformado em notícia simplesmente porque… não há notícias.

Aqui, o facto político cedeu, uma vez mais, lugar a uma cena de telenovela barata.

As perguntas eram muito elaboradas, bem preparadas, e de complexidade tal que só o involuntário Entrevistado poderia responder-lhes: “Sabe-nos dizer, pelo menos, a que horas vai receber o Primeiro-Ministro e o Presidente da Assembleia?”, pergunta a que, evidentemente, ninguém mais no Palácio saberia responder; ou “Esta caminhada é para refletir sobre o que vai decidir?”, coisa que já estava mais do que decidida há não sei quanto tempo; ou “Para que é que serve este seu passeio aqui”, já que jamais pode ser tomado como um dado adquirido que, se uma pessoa vai ao Multibanco pagar contas, é para… consultar ou movimentar a conta bancária.

A sofreguidão era tal que, assim que o apanharam a jeito, a urgência de obter um esclarecimento cabal para a impensável ousadia presidencial levou os repórteres a atropelar-se a ponto de um deles se ter estatelado na calçada! Bem, esse, pelo menos, lá conseguiu, dessa forma, arrancar aos Presidente a única palavra que, na altura, lhe ouvimos: “Magoou-se?”.

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Mas para que perco tempo a escrever sobre coisas destas?...

Para quem pensar que exagero, termino aqui deixando, ipsis verbis, a transcrição destes três minutos alucinados:

Pivot: “Um momento verdadeiramente singular: o Presidente saiu do Palácio de Belém pelo acesso lateral da Calçada da Ajuda, acompanhado pelo seu Ajudante de Campo, e aí, naturalmente, passou pelos jornalistas que se aglomeravam para ouvir as palavras aguardando a chegada de Ferro Rodrigues e de António Costa, e que, subitamente, depararam com esta imagem única: Marcelo Rebelo de Sousa não respondeu, e o mais surpreendente estava para acontecer. O Presidente dirigiu-se a uma caixa Multibanco e efetuou vários movimentos com o cartão bancário, incluindo o que parecia ser o pagamento de contas. No regresso, entrou pela porta principal para o Palácio, deixando os jornalistas atónitos e, alguns, magoados, porque a agitação súbita levou à queda de um deles. As perguntas ficaram… por responder”.

Voz no local: “Sabe-nos dizer, pelo menos, a que horas vai receber o Primeiro-Ministro e o Presidente da Assembleia?

Voz no local: “Tem horas para receber o Primeiro-Ministro?

Voz no local: “Esta caminhada é para refletir sobre o que vai decidir?

Voz no local: “Diga-nos lá se já tomou alguma decisão, e para que é que serve este seu passeio aqui

Voz no local: “É um passeio de reflexão, Senhor Presidente?

Pivot: “Que momento, absolutamente fora do comum! A Alexandra Monteiro é a jornalista da TVI que foi surpreendida por esta manifestação presidencial. Alexandra, boa noite. Começo por perguntar se já há alguma explicação para o que sucedeu com esta saída do Presidente, e se há movimentações, porque é isso que aguardamos, efetivamente, no Palácio de Belém, esta noite”.

Repórter no local: “Boa noite, Zé. A explicação para este passeio de Marcelo Rebelo de Sousa, eu julgo que a explicação exata só mesmo o Presidente da República saberá dar. Fomos, de facto, surpreendidos. Não estávamos, de todo, à espera que, numa altura destas, depois daquilo que aconteceu no Parlamento, da seriedade do momento, víssemos o Presidente da República sair do Palácio de Belém a pé para vir fazer um pagamento ao Multibanco. Foi isso que Marcelo Rebelo de Sousa veio fazer, veio pagar uma conta, aqui no Multibanco que fica mesmo ao lado da entrada principal do Palácio de Belém. Quanto a movimentações, de certeza que Ferro Rodrigues já se encontra no Palácio de Belém, e eu arrisco dizer que António Costa poderia vir, também, nesse carro. Isto porquê? Porque a TVI sabe que António Costa e Ferro Rodrigues vão jantar com o Presidente da República e, portanto, é provável que tenham vindo na mesma viatura. Portanto, este encontro será à volta de uma mesa, à volta de um jantar, talvez para descontrair um pouco este ambiente tenso que envolveu todo este dia de votação, na generalidade, do orçamento que acabou neste chumbo”.

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quarta-feira, 27 de outubro de 2021


António Cardoso e Cunha

Estrutura e Estratégia


"A estrutura vence sempre a estratégia"


António Cardoso e Cunha

Debate na RTP 1                
  13 de Junho de 1999             


Numa terra como a nossa, e que a política é feita de improvisos, de jeitos, de favores e de truques de prestidigitação, seria interessante que alguém se lembrasse de investir em dotar a governação e a administração pública de alguma estrutura duradoura, consensual, suprapartidária, que transmitisse aos governados alguma sensação de, efetivamente, estarem a sê-lo.

Em vez disso, continuamos imersos numa imensidão de desconchavos, de arbitrariedades de motivação meramente eleitoralista e de favores destinados a procurar garantir a permanência no poder a quem o exerce já sem qualquer autoridade.

Parece ser nosso destino que, ao fim de meia dúzia de anos os governos fiquem de tal forma desgastados que, tanto nós como eles, tudo o que queremos é que a legislatura acabe depressa, para o que contamos com os favores daquele que pode acelerar o fim.

Triste terrinha, de facto, em que a política se tornou alimento de si própria, em lugar de servir a comunidade para cujo bem terá sido pensada. Em princípio, claro.