quinta-feira, 13 de janeiro de 2022


Já não Posso Trocar a Varinha Mágica...

Talvez por o assunto principal dizer respeito a poucos, parece ter conseguido passar sem grande celeuma o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que, uniformizando jurisprudência, decidiu que o cliente não tem o direito de reclamar por o produto não obedecer às características publicitadas pelo fornecedor, a menos que demonstre que, se conhecesse aquela que alega como determinante da compra, não teria efetuado o negócio.

Foi, precisamente, isto que o douto Tribunal decidiu quanto ao caso dos lesados do BPN, como aqui já referi, assim abrindo a porta a que qualquer fornecedor de eletrodomésticos se recuse a aceitar de volta algo tão insignificante como uma varinha mágica que, afinal, não tritura amêndoas, como dizia no anúncio, ou tão complicado como uma máquina de lavar e secar que, afinal, não seca.

Curiosamente, não vejo qualquer clamor público por parte de associações de defesa do consumidor, embora esteja em causa a violação de direitos constitucionais. Também não li sobre eventuais recursos para o Tribunal Constitucional.

Como se esperará que alguém demonstre o que lhe ia no espírito no momento da compra? Com que legitimidade vem o Tribunal exigir uma prova que será quase sempre impossível de produzir? Com decisões deste calibre, como poderá dizer-se que se prossegue a paz social?

Será que anda tudo tão entretido com a habitual politiquice que antecede os atos eleitorais que só vai acordar e reagir quando as coisas começarem a acontecer?

Ou seja, quando alguém com capacidade de intervenção, tendo sido vítima de publicidade enganosa, se vir obrigado a ficar com algo que não queria ter encomendado e depois não vai poder devolver?

Aguardemos para ver...

2 comentários:
  1. Caro Ladrilhador,
    Piso os seus "mosaicos" com frequência e, de um modo geral, aprecio as suas composições.
    Por vezes acho-as demasiado rendilhadas, ou mesmo com muitos floreadas... A leveza dos dias, a pressa e a ligeireza a que estamos cada mais habituados, não nos predispõe ao aprofundamento das questões... Mea culpa! Admiro a sua cultura e louvo os seus esforços para levar informação e saber, por certo de experiencia feita , à generalidade das pessoas que queiram saber e conhecer mais, nomeadamente na área jurídica, que parece ser a sua praia! Pela parte que me toca, os meus agradecimentos.
    A questão que hoje aborda e sobre a qual já tinha lido há dias quando o senhor comentou o acordão do STJ relacionado com os lesados do BPN, deixa-me perplexo e indignado. Como é possível que instancia suprema da justiça do nosso país, tenha dado à estampa semelhante aberração!
    Estou certo que, passada a histeria coletiva e adormecente do atual período eleitoral, há de haver alguém que vai agarrar neste tema e o leve á praça publica, por forma a suscitar um debate aprofundado que leve á reversão de tal idiotice do STJ, cuja ela é um total atropelo ao mais básico senso comum.
    Seu leitor nem sempre devoto...
    TRN

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  2. Caro TRN
    Muito grato pelas suas palavras, sempre simpáticas, a despeito das saudáveis divergências que nos vão enriquecendo. Grato, também, pela crítica ao estilo, a qual procurarei acomodar.
    De facto, não entendo o que terá passado pela cabeça de alguns dos doutos Conselheiros que deram ao Mundo uma 'coisa' tão mal amanhada como esta.
    Tem explicação para o silêncio das associações de consumidores? Eu, não. Nem considero admissível que só passada a histeria alguém olhe para um assunto que poderá, desde já, estar a lançar sementes que poderão, a curo prazo, afetar a vida de muitos portugueses.
    Há coisas que incomodam, mesmo, quer queiramos, quer não.
    Bom fim-de-semana.

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